Revista RURIS del CERES de la UNICAMP
Transcripción
Revista RURIS del CERES de la UNICAMP
RURIS • REVISTA DO CENTRO DE ESTUDOS RURAIS é uma publicação do Centro Interno de Estudos Rurais (Ceres), do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (IFCH/Unicamp), cuja proposta é apresentar e discutir resultados de pesquisas realizadas em contextos nacionais e internacionais que envolvam atores e situações relacionados ao mundo rural, de forma a trazer para o leitor temas e questões que emergem dos processos sociais contemporâneos. A revista, seguindo o caráter interdisciplinar do Ceres, publica trabalhos inéditos realizados no âmbito de diferentes campos do conhecimento. Editores ANA PAULA FRAGA BOLFE, CARMEN SILVIA ANDRIOLLI, EMÍLIA PIETRAFESA DE GODOI, FERNANDO ANTONIO LOURENÇO, JOSÉ CARLOS ALVES PEREIRA, JULIANA BIONDI GUANAIS, MARIANA MIGGIOLARO CHAGURI, MARISA BARBOSA ARAUJO LUNA, MAURO ALMEIDA, NASHIELI RANGEL LOERA, SENILDE ALCÂNTARA GUANAES, THAIS TARTALHA DO NASCIMENTO LOMBARDI, VANDA APARECIDA SILVA, VERENA SEVÁ NOGUEIRA Comissão Editorial (Ceres/IFCH/Unicamp) EMÍLIA PIETRAFESA DE GODOI, FERNANDO ANTONIO LOURENÇO, MAURO WILLIAM BARBOSA DE ALMEIDA, NEUSA MARIA MENDES DE GUSMÃO, SONIA M. P. P. BERGAMASCO Conselho Editorial AFRÂNIO GARCIA JÚNIOR (CRBC/EHESS – Paris), ALDENOR GOMES DA SILVA (UFRN), ALFREDO WAGNER BERNO DE ALMEIDA (Ufam), ANDREA CIACCHI (UFPB), ANDRÉ PIRES (PUC – Campinas), ANTONIO CARLOS DIEGUES (Nupaub/USP), ARIOVALDO UMBELINO DE OLIVEIRA (USP), CARLOS RODRIGUES BRANDÃO (Unicamp), CRISTIANO RAMALHO (UFS), DARLENE AP. DE OLIVEIRA FERREIRA (Unesp), EDGARD MALAGODI (UFCG), EDSON LUIS BOLFE (Embrapa/Unicamp), ELIANE DA FONTE (UFPE), ELIDE RUGAI BASTOS (Unicamp), ELLEN WOORTMANN (UnB), ERIC SABOURIN (Cirad – França), GUADALUPE RODRÍGUEZ GÓMEZ (Ciesas – México), JADIR DE MORAIS PESSOA (UFG), JOÃO DE PINA CABRAL (Universidade de Lisboa), JOHN CORDEL (Nupaub/USP), JOSÉ MACHADO PAIS (Universidade de Lisboa), JOSÉ MAURÍCIO ARRUTI (PUC-Rio), JOSÉ SÉRGIO LEITE LOPES (UFRJ/Museu Nacional), JOSEFA SALETE B. CAVALCANTI (UFPE), LEONILDE S. DE MEDEIROS (UFRRJ), LÍGIA MARIA OSÓRIO SILVA (Unicamp), LYGIA SIGAUD (UFRJ/Museu Nacional – in memoriam), MANOELA CARNEIRO DA CUNHA (Universidade de Chicago), MARIA DE NAZARETH BAUDEL WANDERLEY (UFPE), MARIA APARECIDA DE MORAES SILVA (Unesp), MARIA DO LIVRAMENTO (UFRN), MARIA JOSÉ CARNEIRO (UFRRJ/CPDA), MARIA TEREZA D. P. LUCHIARI (Unicamp), MARILDA APARECIDA DE MENEZES (UFCG), MOACIR PALMEIRA (UFRJ/Museu Nacional), NEIDE ESTERCI (UFRJ), NEUSA MARIA MENDES DE GUSMÃO (Unicamp), RENATA MEDEIROS PAOLIELLO (Unesp), RUBEM MURILO LEÃO REGO (Unicamp), RUSSEL PARRY SCOTT (UFPE), SIMONE MALDONADO (UFPB), SONIA MARIA PESSOA PEREIRA BERGAMASCO (Unicamp) Pareceristas ad hoc deste número JOHN MONTEIRO, RAUL ORTIZ, MARIANO BAEZ LANDA Revisores ad hoc deste número ERNENEK MEJÍA, PERLA FRAGOSO, JOSÉ MANUEL FLORES Projeto gráfico ANA BASAGLIA Diagramação LUCIANA CAMARGO BUENO Criação da capa VITOR LOURENÇO {02} agosto 09 fevereiro10 revista do centro de estudos rurais ifch - unicamp Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Ruris: Revista do Centro de Estudos Rurais / Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. v. 3, n. 2. (2009-2010). Campinas: Unicamp/IFCH, 2009-2010. 226 p. 2009 (2) ISSN 1980-1998 Título da capa: Ruris. Revista do Centro de Estudos Rurais 1. Sociologia rural. 2. Desenvolvimento rural – Aspectos sociais. 3. Agricultura – Aspectos ambientais. 4. População rural – Aspectos antropológicos. I. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Centro de Estudos Rurais. II. Título. CDD – 307.72 Programa de Doutorado em Ciências Sociais do IFCH Unicamp S U M Á R IO DOSSIÊ ESTUDOS RURAIS E ETNOLOGIA INDÍGENA: ENCONTROS E INTERSEÇÕES APRESENTAÇÃO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9 Emília Pietrafesa de Godoi e Nashieli Rangel Loera ENTREVISTA ALFREDO WAGNER BERNO DE ALMEIDA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 Por Guilherme Mansur Dias DE INDÍGENAS A CAMPESINOS. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55 MIRADAS ANTROPOLÓGICAS DE UN QUIEBRE PARADIGMÁTICO Mariano Báez Landa ALGUNOS PROBLEMAS CON LAS CATEGORÍAS “INDÍGENA” Y “MESTIZO” EN EL MÉXICO CONTEMPORÁNEO. . . . . . . . . . . . . . . 75 Roger Magazine LOS MAPUCHE DE CHILE. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99 SIGNIFICADOS A PARTIR DE SU DISCURSO Elba Soto MIRADAS SOBRE LA INTEGRACIÓN.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125 EL TEQUIO Y LA GESTIÓN DE TIERRAS EN LA CHINANTLA MEDIA, OAXACA, MÉXICO 1928-1950 Patricia Legarreta MERCADO DE TIERRAS, HERENCIA Y CAMBIO GENERACIONAL EN UN EJIDO ZOQUE-POPOLUCA DEL ESTADO DE VERACRUZ, MÉXICO . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . José Manuel Flores López 151 ARTIGOS CAMPO E CIDADE, COMIDA E IMAGINÁRIO. . . . . . . . . . . . . . . . . . 195 PERCEPÇÕES DO RURAL À MESA Renata Menasche CONTENTS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 219 PROCEDIMENTOS PARA PUBLICAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . 221 D O S S I Ê DOSSIÊ APRESENTAÇÃO Este número da Ruris é resultado, em grande medida, da retomada de um diálogo iniciado há mais de uma década quando pesquisadores de diferentes instituições brasileiras encararam o desafio de debater a partir de diferentes campos de estudos rural, urbano e indígena - um tema aglutinador e transversal: o território1. Passados mais dez anos desta publicação, os universos rural e indígena prosseguem marcados como contextos de grande efervescência social e política, em decorrência dos vários processos neles desencadeados, que ao tempo que impõem modalidades variadas de coerção, evidenciam novos atores e novas configurações sociais. No caso brasileiro, assistimos, hoje em dia, a caboclos que se “redescobrem” índios, seringueiros que se “transfiguram” em povos da floresta, ribeirinhos que se “descobrem” população tradicional, trabalhadores rurais que “se tornaram” quilombolas, agricultores tradicionais transmutados em comunidades de fundo de pasto, e mais recentemente populações indígenas que se “tornam” sem-terra, pois numa tentativa de retomada de terras consideradas por eles como ancestrais ocupam uma propriedade ou beiras de estrada e montam acampamentos, estratégias que até pouco tempo atrás estavam relacionadas a trabalhadores rurais. Tais processos atingem tanto grupos étnicos em distintas situações históricas, quanto grupos genericamente denominados tradicionais. Uns e outros estão, em geral, submetidos a relações de dominação que lhes constrangem, material e simbolicamente, e em face das quais agem mediante o apelo a novas identidades ou velhas identidades ressignificadas, ou mediante velhas formas de ação 1 Como resultado desse esforço foi publicado o livro Além dos Territórios: para um diálogo entre a etnologia indígena, os estudos rurais e os estudos urbanos, organizado por Emília Pietrafesa de Godoi e Ana Maria Niemeyer (Mercado de Letras, Campinas, SP, 1998). 9 R UR I S 2 Trata-se da VIII Réunion de Antropología del Mercosur, ocorrida em Buenos Aires, Argentina, entre os dias 29 de setembro e 02 de outubro de 2009, no âmbito da qual coordenamos o GT Estudios rurales y Etnología indígena: Diálogos e intersecciones. Este GT foi coordenado por Emília Pietrafesa de Godoi (Depto. de Antropologia, Ceres, IFCH-Unicamp) Nashieli Rangel Loera (Ceres, IFCH-Unicamp), Mariano Baez Landa (CIESAS, México) e Josefina Fernández (Cátedra F. Fernández - CLACSO, Argentina). Acordamos que os textos de autores de outros países latino-americanos que compuseram o nosso GT na VIII RAM seriam publicados na Ruris e os textos dos autores brasileiros seriam publicados na Desacatos, Revista do CIESAS, México. Isto explica a composição do dossiê deste número da Ruris estar em espanhol. 10 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 revestidas de novos conteúdos e demandas. A rigor, essas novas e velhas identidades ou formas de ação constituem escolhas constrangidas que, não obstante, revelam a grande plasticidade dos sistemas de classificação social e a fluidez das suas fronteiras. Os conceitos e abordagens analíticas tradicionais têm se mostrado pouco eficazes, do mesmo modo que o tratamento do rural e do indígena como domínios disciplinares tem ameaçado reificar as ricas realidades objetivas que os constituem. Em alguns países da América Central e da América do sul, o estudo do chamado campesinato indígena, como veremos em alguns artigos do dossiê temático deste número da Ruris, tem sido um desafio para os estudiosos que partem desde ambas as perspectivas. Pesquisadores que durante anos realizaram projetos sociais e acadêmicos tendo como foco as populações indígenas e/ou rurais têm se deparado com uma eminente heterogeneidade difícil de ser apreendida através de conceitos e categorias gerais ou de uma perspectiva restrita a construtos disciplinares (estudos rurais, etnologia indígena). Com essa constatação, retomamos, então, no último Encontro de Antropologia do Mercosul, o esforço de colocar em debate trabalhos construídos na intersecção destes campos 2. É deste Encontro que resulta o Dossiê Temático “Estudos Rurais e Etnologia Indígena: encontros e interseções” que apresentamos neste número da Revista Ruris. Além dos artigos que compõem o dossiê, abrindo este número da Ruris trazemos uma entrevista e para fechá-lo trazemos um artigo. A entrevista realizada com o professor Dr. Alfredo Wagner Berno de Almeida, por Guilherme Mansur Dias, atravessa várias questões caras ao nosso debate, e aqui destacamos algumas delas. Com uma visão processual do campo científico, mostranos como o campesinato emerge como uma questão sociológica importante e chega a isso mostrando-nos as rupturas no pensamento antropológico que se estava construindo no e sobre o R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Brasil e como as interpretações vinham, de certa maneira, sendo reforçadas pela própria produção literária. Um tema central na entrevista são os conflitos agrários, o tratamento a eles conferido pelo Estado, e a atuação do antropólogo nas agências do Estado. Elementos importantes para a compreensão da problemática fundiária brasileira são trazidos nesta entrevista, destacando processos diferenciados de territorialização - expressos em categorias êmicas como “terras de preto”, “terras de santo”, “terras de índio” - dificilmente apreensíveis somente como “questão fundiária”, impondo-se uma reflexão sobre etnicidade e formas de organização política. As reações do Estado frente às demandas dos movimentos sociais por direitos étnicos e territoriais, são, outrossim, um tema de destaque nesta entrevista. O artigo de Mariano Baez Landa abre o dossiê temático e, tal como a entrevista, vem marcado por uma perspectiva processual do campo antropológico, mas, desta vez, no México. A imbricação das interpretações antropológicas com os projetos de nação está posta. Mostra-nos como, em diálogo com as várias correntes do pensamento antropológico, foi se dando a construção do indigenismo como política de Estado no México e como isso implicou na transformação do “índio em camponês”, uma vez que a “comunidade rural” era pensada como sendo “mais integrada” à nação do que a “comunidade indígena” . Era a imagem de um México mestiço e moderno, cosmopolita que se estava a construir e, como mostra o artigo de Mariano Baez Landa, é eclipsado pelo México indígena e rural com a insurreição zapatista ocorrida em 1994. O artigo de Roger Magazine vem em estreito diálogo com o artigo que o precede. Recupera o processo de “transformação de índios em mestiços” como um projeto do Estado para “modernizar” o país; mais precisamente, trabalha o esforço do Estado em categorizar essas populações como não-indígenas. O autor chama a atenção para o fato de que as categorias “índio” e “mestiço” ou “não-índio”, quando assumidas pelo investigador 11 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 sem o confronto com o campo empírico ocultam processos muito mais complexos de mudança social. É através de exemplos de seu trabalho etnográfico realizado em diversos “pueblos” na região de Texcoco, próxima à cidade do México, que o autor vai nos propor uma outra maneira de entender a relação camponêsindígena-urbano, que contraria grande parte das representações históricas e antropológicas, que vêem a experiência da modernidade como uma “força que se impõe e domina” a vida camponesa e indígena, não deixando espaço para a agência destas populações. Mostra-nos que as categorias quando não confrontadas com a realidade empírica podem reificá-la. No terceiro artigo do dossiê, Elba Soto, que realizou sua pesquisa entre mapuches da VIII região do Bío-Bío no centro sul do Chile, tal como os dois autores anteriores também faz uma leitura crítica de noções e pré-noções, neste caso, sobre o povo mapuche, pré-noções que têm servido de pano de fundo para levar a cabo, por parte do Estado chileno, uma política de intervenção através de projetos que não dialogam com a forma de vida e desenvolvimento social desse povo. A autora expressa abertamente seu posicionamento político e menciona que um dos principais objetivos do seu trabalho é trazer a voz dos mapuches. Assim, a voz dos seus interlocutores é “escutada” pelo leitor através de narrativas que a autora analisa ao longo do texto utilizando-se do método de análise do discurso, numa tentativa de observar a relação entre língua e ideologia e questionar a posição que tem tido o discurso mapuche, não como interlocutor do Estado, mas, como subordinado, nos lembrando, dessa maneira, que a língua é um objeto sócio-histórico. Os dois últimos artigos que compõem o dossiê, o de Patricia Legarreta e de José Manuel Flores trazem uma analise cuidadosa das evidências empíricas encontradas por eles nas regiões estudadas no México. Ambos os autores analisam situações etnográficas distintas no sul do país– comunidades ruraisindígenas no estado de Oaxaca e em Veracruz respectivamente- 12 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 mas que dizem respeito a formas locais de gestão do território. Legarreta analisa duas instituições sociais contemporâneas presentes até hoje na região da Chinantla media (Oaxaca): O Tequio e a Mano vuelta, duas formas de trabalho coletivo adotadas por populações rurais daquela região. Em um contexto de reforma agrária ou distribuição fundiária (1928-1950) a autora demonstra que essas formas de trabalho solidário coletivo tornaram-se fundamentais na disputa pela gestão do território. Ainda, a autora vai enfatizar a existência de distintas percepções históricas, geográficas e sociais de uma região, de um espaço determinado, percepções que dialogam com uma visão de mundo das populações que o habitam e que muitas vezes não correspondem com a visão de antropólogos, historiadores ou representantes do Estado. Para Legarreta, o paradigma do isolamento das comunidades indígenas-camponesas que prevaleceu durante muitos anos no pensamento social mexicano é questionável, pois, como demonstrado na análise, as comunidades da Chinantla nunca estiveram isoladas pois, a troca de bens, serviços, trabalho, e idéias entre distintas localidades sempre foram fundamentais para o sustento e reprodução social das comunidades estudadas. José Manuel Flores López traz uma interessante análise, de cunho etnográfico, da dinâmica do mercado de terras ejidales no município de Tatahuicapan, especificamente na localidade Piedra Labrada, uma comunidade indígena-camponesa localizada ao sul do país, ancorada na região Sierra de Santa Marta, região que faz parte da Reserva ambiental Los Tuxltlas, no estado de Veracruz. O autor, logo após uma excelente contextualização do processo de reforma agrária -acontecido em todo o território nacional, iniciado em 1917 e que culminou com as reformas constitucionais de 1992- analisa de maneira minuciosa as implicações dessas reformas na organização social do ejido, nas regras de herança, nos mecanismos de gestão e transação das terras e na própria estrutura ejidal. Através da análise dessas 13 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 transações de compra-venda do usufruto das terras o autor nos mostra a complexidade e heterogeneidade desse processo e a modificação interna da propriedade social (ejido). Nesse processo, ele demonstra que há uma diversidade de categorias relacionadas com a possessão, transação e gestão das terras: ejidatarios, avecindados, posesionarios, colonos e rancheros. Para Flores, as transações estão ancoradas em mecanismos de reciprocidade entre vizinhos, parentes e conhecidos e as regras de herança e transmissão da terra muitas vezes vistas e analisadas como tendo características fixas são móveis e podem variar de acordo com múltiplas circunstâncias as quais pais e herdeiros se enfrentam. Para o autor, uma mera análise estatística, sem sustentação empírica e etnográfica, não consegue dar conta de descrever esse dinamismo das relações e transações. O artigo de Renata Menasche, que fecha este número da Ruris, mesmo não fazendo parte do dossiê, sem dúvida também nos traz contribuições para pensarmos o diálogo entre distintas tradições e campos de estudos, como os estudos rurais e os estudos urbanos. Menasche analisa as percepções que pessoas (agricultores e citadinos de contextos rurais e urbanos no Rio Grande do Sul) têm do rural, através das suas práticas alimentares. A autora encontra que o rural emerge valorizado e idealizado em determinados contextos e nos descreve, através de exemplos etnográficos e narrativas, mecanismos classificatórios dos alimentos operados e acionados pelos seus interlocutores também em determinados contextos e situações. Sem dúvida, a análise de Menasche nos mostra metodologicamente, um dos caminhos possíveis para ir além da dicotomia rural-urbano e nos faz lembrar que os alimentos efetivamente podem ser “bons para pensar”. Este número da Ruris, que ora apresentamos, está, pois, composto principalmente por estudos que se apóiam em pesquisas empíricas e pretende produzir no leitor uma reflexão teórico-metodológica e epistemológica, tendo em vista a 14 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 produção de um diálogo mais efetivo entre campos de pesquisa comumente pensados como tradições distintas. Emília Pietrafesa de Godoi (Departamento de Antropologia, Ceres, IFCH/Unicamp) Nashieli Rangel Loera (Ceres, IFCH/Unicamp) Campinas (SP), abril de 2011 15 R UR I S 16 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 ENTREVISTA* ALFREDO WAGNER BERNO DE ALMEIDA GUILHERME MANSUR DIAS** Tendo em vista seu trabalho de mestrado, que foi publicado com o título “Jorge Amado: política e literatura”, eu queria começar perguntando se o senhor encontra em Jorge Amado o germe de algumas das preocupações teóricas que veio a desenvolver posteriormente e que se tornaram norteadoras de sua trajetória intelectual, como, por exemplo, a questão da “raça”, a questão do “proletariado rural”. No final do século XIX, Sílvio Romero asseverava, um pouco antes da Abolição, que “o negro não era uma máquina econômica”, como o sistema de plantation nos fazia pensar, e começava a se constituir enquanto “objeto da ciência” no Brasil. Edson Carneiro reproduziu essa assertiva mais de meio século depois, na Antologia do negro brasileiro1. Ele abre o livro fazendo vista grossa para os elementos estigmatizantes presentes na formulação de Sílvio Romero e reiterando com o autor que o negro se transforma em objeto da ciência. Por que se faz essa discussão e surge esse interesse de o negro se tornar objeto da ciência? Porque, até então, os estudos de antropologia estavam referidos à antropologia biológica, marcados pelos determinismos biológicos e geográficos. Os primeiros passos das pesquisas antropológicas concerniam aos “tipos humanos” classificados a partir de medidas craniométricas, ou melhor, antropométricas. Um dos exemplos mais relevantes dessa perspectiva encontra-se no livro de Nina Rodrigues intitulado As coletividades anormais2. Aí Nina Rodrigues narra como, no final do século XIX, examinou os crânios de Antônio Conselheiro e * Esta entrevista faz parte do livro A regularização fundiária de quilombos: outros olhares, organizado por Givânia Maria da Silva e Guilherme Mansur Dias (no prelo). Agradecemos ao Incra, a Guilherme Mansur Dias e a Alfredo Wagner Berno de Almeida por ter autorizado a publicação desta entrevista na Ruris. ** Antropólogo (Incra, Unicamp). As perguntas foram formuladas com a colaboração de Paula Balduíno, Marta Magalhães Clemente e Roberto Almeida, da Coordenação-Geral de Regularização de Territórios Quilombolas do Incra. 1 CARNEIRO, Edson de Souza. Antologia do negro brasileiro. Porto Alegre: Globo, 1950, p. 6. 2 RODRIGUES, Nina. As coletividades anormais. Brasília: Editora do Senado Federal, 2004. de Lucas da Feira, um ex-escravo que fugiu dos domínios de seu 17 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 senhor em 1828, em Feira de Santana, e organizou um grupo de escravos fugidos. Procedendo àquelas medidas craniométricas de Lucas da Feira, ele se opõe à observação de Lombroso, de que haveria nos criminosos uma tendência ao exagero dos índices étnicos. E constata que poderia tratar-se de um criminoso para a civilização europeia, mas para os africanos se tratava de um rei – e não de um escravo de raça supostamente inferior. Então, é como se a conclusão do trabalho desdissesse o determinismo racial e os princípios hierárquicos de raça superior/ raça inferior e desdissesse também todos os outros trabalhos que estavam em jogo naquele momento, nos estudos antropológicos inspirados em autores como Gobineau. Esse tipo de abordagem relativista representou, digamos assim, naquele final do século XIX, o início de uma profunda ruptura. Bacharéis em direito, como Sílvio Romero, e médicos, como Nina Rodrigues, que era da Escola de Medicina da Bahia, recolocavam os termos do pensamento antropológico colocando em questão a hegemonia das interpretações biologizantes. Recorde-se de que o campo do direito foi marcado por polêmicas acirradas, porquanto aglutinou inúmeros produtores intelectuais em torno do tema da escravidão e da passagem do trabalho escravo para o trabalho livre. Mesmo considerando que muitos abolicionistas eram racistas, tem-se que as medidas libertárias defendidas por Joaquim Nabuco, Rui Barbosa e Evaristo de Moraes iriam oporse àquelas de Perdigão Malheiro, Tobias Barreto e outros. Tais discussões foram sendo deslocadas do campo jurídicoformal e cada vez mais reforçadas na produção literária. O ápice dessa projeção sobre o campo literário acontece em 1902 com Os sertões, de Euclides da Cunha. Predominavam na narrativa as metáforas geológicas, como: “o sertanejo é forte como uma rocha”. O quadro natural ainda era apresentado como determinante. Mas os agentes sociais, com formas organizativas próprias e por meio do conflito, começavam a se autonomizar. Essa dimensão descritiva ganhou corpo na chamada 18 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 “literatura regional”, sobretudo no final dos anos 1920. Quando o chamado “romance social” (e também “romance proletário”) vai transcrever isso a partir de 1930, um dos temas que Jorge Amado elege é político e significa mais que interpretar o negro como objeto. Há, inclusive, um livro de Jorge Amado que vai reproduzir tais discussões dentro da própria Universidade de Medicina da Bahia. Então, isso foi um elemento de inspiração para ele. Mais do que isso, o “romance social” de Jorge Amado, sobretudo Cacau (1933), que poderia marcar uma diferença, é um romance que trata o negro como “proletariado rural”. Para Amado, ele estaria naquela transição de escravo para trabalhador rural, proletariado rural. Importa lembrar que esse gênero de romance consistiu numa forma descritiva de processos sociais e realidades localizadas por demais relevantes nos anos 1930. Jorge Amado, José Lins do Rego, Guimarães Rosa e Graciliano Ramos produziram, desse modo, uma literatura sociológica. Quer dizer: o que estava em jogo nesses “romances sociais” é que eles elegiam questões sociológicas, e uma dessas questões vai ser exatamente essa passagem do sistema de plantation, com trabalho escravo, para uma situação de emergência de campesinato. Aliás, o meu interesse pelos livros de Jorge Amado iniciou-se a partir de uma disciplina denominada “sociedades camponesas”, ministrada por Moacir Palmeira, em 1973, no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional. A interpretação que Jorge Amado tem desse negro em Cacau (1933), Suor (1934), Terras do sem-fim (1943), São Jorge dos Ilhéus (1944) é que ele tinha as “raízes” presas à terra. Seus pés eram como “raízes” e seus braços eram como “galhos”. Era como se ele “antropomorfizasse” a natureza. Ele humanizava a natureza e, ao mesmo tempo, desumanizava o trabalhador, ao lhe emprestar todos os atributos da botânica: raízes, troncos, galhos. Sobressaíam todas essas metáforas botânicas. Então, ele, de certa forma, desumaniza aquele proletário rural. A libertação do negro, de escravo para objeto, leva, do ponto de 19 R UR I S 3 ROCHA, Glauber. Deus e o diabo na terra do sol. Rio de Janeiro: Copacabana Filmes, 1964, ficção, longa-metragem, 35 mm, preto e branco, 125 min. 20 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 vista da modalidade de percepção, a um aprisionamento no plano descritivo. Ele vira refém da natureza. É como se ele fosse um sujeito “biologizado”. E esse seria um primeiro momento da produção literária de Jorge Amado. No segundo momento, em que o Jorge Amado já está em uma fase transitória de “convertido ao catolicismo”, País do carnaval (1931), a um socialismo, com o Romance de tese (1933), vai-se dar a mudança. Quer dizer, se num primeiro momento aparece o negro como sujeito “biologizado”, num segundo momento há a tentativa de descrever o negro enquanto sujeito social. Um exemplo seria Terras do sem-fim (1943), que traça o combate, a luta e a morte – recuperando um pouco a terceira parte dos Sertões (1902), de Euclides da Cunha. Lembre-se de que a primeira parte, em Os sertões, se refere à “Terra”. Só depois que vem o “Homem”, ou seja, primeiro vem o fisiográfico, o meio natural, e só depois vem o agente social, finalizando com a terceira parte que é a “Luta”. Esse rígido esquema interpretativo de Euclides da Cunha ainda tem sua legitimidade sucessivamente atualizada. Jorge Amado, num sentido próximo, aprisiona e depois promove a libertação. Então, dentro do trabalho dele, já nos anos de 1930 para 1940, verifica-se essa transição do sujeito “biologizado” para o sujeito social, ou, em outros termos, do sujeito atomizado, isolado, descrito pela metáfora botânica, para o sujeito social. A luta aqui é reinterpretada. Em Seara vermelha, que é de 1946, as três vertentes da desagregação da plantation açucareira nordestina acabam-se colocando, o que é bastante interessante. E quais seriam essas três vertentes? A primeira concerne ao messianismo, que é um pouco do que o Glauber Rocha mostra cinematograficamente através do beato Sebastião3 ; a segunda é representada pelo cangaço ou banditismo social em eterno confronto com as polícias militares; e a terceira é o quilombo. Os três irmãos do romance se distribuem entre a polícia, o cangaço e os beatos. Jorge Amado resume em uma família uma R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 complexa transição sociológica. Um dos irmãos vai seguir o Conselheiro, o outro vai ser o que vai reprimir os messiânicos e um terceiro entra para o cangaço. São as três figuras externas, de certa maneira, à grande plantation açucareira. E todos vão para o sertão. Todo mundo se encontra no sertão. Lembre-se de que, no senso comum erudito, do qual essa versão de Jorge Amado seria uma variante, se tem uma ruptura em três tempos: quilombolas, messiânicos e cangaceiros. Aparecem simbolizados por Antônio Conselheiro e Canudos, Lampião e a guerra de movimento, e Ganga Zumba e Zumbi no Quilombo de Palmares. Seriam estes os três elementos de ruptura com a ordem das grandes plantações monocultoras baseadas na concentração fundiária e no trabalho escravo. Pode-se dizer que em Jorge Amado esse esquema explicativo é reatualizado. A leitura do Jorge Amado me ajudou muito a perceber as implicações sociológicas dessa transição essencial para a compreensão da sociedade brasileira. Seus escritos e sua experiência profissional como antropólogo refletem uma longa e efetiva preocupação quanto aos antagonismos sociais em torno das modalidades de uso comum dos recursos naturais por diferentes grupos e povos tradicionais. Nesse sentido, o senhor coordenou e participou de inúmeros projetos relacionados, dentre outros, à migração de trabalhadores maranhenses e amazônicos para o Pará, à interpretação da decadência da lavoura maranhense no século XIX, à análise da estrutura agrária e colonização na fronteira amazônica, além, obviamente, daqueles relacionados à afirmação étnica das comunidades negras rurais. Eu queria saber quando e como se foi dando esse seu envolvimento com as comunidades tradicionais brasileiras e, particularmente, com as comunidades negras rurais. Em julho de 1972, João Pacheco de Oliveira Filho, Terri Valle de Aquino e eu, alunos de pós-graduação em antropologia, fomos para a Baixada Maranhense participar de uma equipe 21 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 de pesquisa, como assistentes de campo de Regina Prado e Laís Mourão, que estavam produzindo suas dissertações. Quando chegamos à área de campo, nós nos dividimos pelas regiões correspondentes à pesquisa. Fui morar num povoado de beira campo. Esse povoado era considerado “terra de preto” e assim era designado pelos que a ele se referiam. De posse dessa informação prévia, eu me dirigi para esse povoado e lá fiquei morando na casa de uma das lideranças. Na primeira semana fui percebendo que, não obstante as famílias considerarem e fazerem livre uso dos recursos naturais, aquela área se tratava de um imóvel rural. Era uma grande propriedade, era um antigo engenho do período colonial. Era uma fazenda, inclusive com uma família proprietária, que consistia na viúva e nos filhos do sempre lembrado “senhor”. Eu não havia percebido isso no primeiro momento e não dispunha de uma informação prévia dessa ordem. Estava morando dentro de uma “propriedade”, numa casa localizada a menos de 300 metros da casa-grande, que era denominada “sobrado”, embora fosse de um só piso. As famílias tinham uma liberdade tamanha de se locomoverem e de terem acesso aos recursos que me dificultavam imaginar que constituísse uma propriedade privada de terceiros, ainda mais ali residentes. Mais dificultava isso o fato de o antigo senhor ter esposado uma das mulheres de uma família que havia sido escrava. Os moradores tinham ademais laços de parentesco com a senhora viúva, que era proprietária, e seus filhos. Era um engenho de fogo morto e eu não percebi que havia uma família proprietária. A rede de parentesco certamente dificultou isso. Só depois de alguns dias que eu percebi porque me perguntaram: Você não vai falar com o “pessoal do sobrado”? E foram eles mesmos que agenciaram essa aproximação. Porque a recomendação inicial de pesquisa que eu possuía não passava pelo proprietário. E foi aí que eu comecei a perceber o que era uma “terra de preto”, o que caracterizava uma “terra de preto”. Ressaltava, 22 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 primeiro, uma autonomia no que produzir, onde plantar, o que plantar, quando plantar, como plantar, para quem vender, o que vender, o que escolher. E existia uma categoria que organizava toda aquela forma de vida ali e correspondia ao que chamavam “em comum” ou o uso comum dos diferentes recursos. Nesse povoado de beira campo, havia, assim, inúmeras situações de uso comum. Uma situação referia-se ao uso dos campos naturais onde estava todo o gado daqueles que ali moravam, que eram os descendentes das famílias de escravos que ali estavam e que dali nunca haviam saído. E o gado era criado sob um regime de uso comum. Quando você olhava, você via um rebanho só, mas os vaqueiros sabiam qual rês era de quem. Possuir uma ou mais reses era uma forma de manter uma reserva para qualquer emergência. Aliás, os escravos podiam possuir reses nessa região em meados do século XIX, ou seja, que já era uma situação permitida pelo sistema escravista. Essa autonomia, então, já brota, de certa maneira, no próprio sistema escravista. Alguns vão dizer que isso é “natural” da condição de um “campesinato escravo”. Alguns vão dizer ainda que já havia historicamente essa forma de uso comum, à qual aliás chamam de comunal e a consideram pré-capitalista. Outros vão afirmar que se trata de uma forma que emerge a partir das crises de mercado no próprio capitalismo. Para efeito de entendimento, evitando falsos debates, o que importa reter é que os escravos passavam a usufruir de um tempo cada vez mais livre, em que trabalhavam para si próprios, satisfazendo suas necessidades básicas e ampliando as possibilidades de comercializar a produção de alimentos. Sidney Mintz, em seu estudo clássico, no Caribe, aborda isso, e também Ciro Flamarion Cardoso, historiador, que recupera essa ideia de um “protocampesinato escravo” no sistema de plantation em crise. O argumento é que esse tempo livre foi aumentando cada vez mais. Primeiro, era só o domingo, depois eram dois dias. Quando o algodão e a cana-de-açúcar estavam no preço mais elevado, aos 23 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 escravos não era permitido cuidar da sua reprodução. De outra parte, com a queda abrupta do preço, as famílias escravas tinham que se incumbir da produção de alimentos para sua reprodução. Então, quando o preço do algodão e da cana-de-açúcar subiam, a farinha, o peixe e os demais alimentos eram adquiridos fora dos limites da grande plantação. Quando o preço baixava, os proprietários permitiam que os escravos cuidassem de suas roças. Aumentava o tempo livre em que eles trabalhavam para si próprios. Trabalhavam um dia ou dois ou mais, consoante à extensão da crise, até haver casos de eles trabalharem um só dia para o patrão ou mesmo de recusarem as proibições de não mais colocarem cultivos alimentares. Isso representou a emergência de uma certa autonomia diante da autoridade do senhor de escravos, corroendo essa mesma autoridade e enfraquecendo as formas de imobilização da força de trabalho. Ora, o povoado de beira campo era um lugar onde essa autonomia havia chegado a uma situação específica. Refirome ao fato de um descendente do proprietário se casar com uma descendente de escravos. As relações aparentemente se embaralhavam, sobretudo porquanto flexibilizaram a rigidez das normas senhoriais. Assim, embora exercessem autonomia, foi possível observar no trabalho de campo que os moradores do povoado tinham que pagar uma “joia” ou um “agrado”, também chamado “foro”, que era estipulado a partir da medição das áreas plantadas. Quem media as roças era um membro do próprio povoado, sem que houvesse por parte do “sobrado” qualquer verificação maior. Desse modo, comecei a repensar a noção de escravidão. A escravidão incidia sobre famílias e não necessariamente sobre indivíduos? O Brasil tinha uma escravidão na qual o escravo detinha um pecúlio? No laudo antropológico sobre os quilombolas em Alcântara, por exemplo, há várias passagens em que mostro que havia ladrão roubando gado dos escravos, gado este que pastava nos campos naturais. Então, o primeiro contato foi esse trabalho de 1972. Eu 24 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 apontei uma forma própria de organização das famílias, uma situação de matrifocalidade acentuada, quer dizer, os homens circulavam e as mulheres permaneciam nas casas, os homens tinham mais de uma mulher e era uma situação em que os homens rodavam pelas casas. Então, isso me deu uma primeira ideia dessa categoria “terra de pretos” e de sua extensão. A noção de “uso comum” estava ligada a uma expressão identitária, na qual o preto era designativo daquele coletivo, ao mesmo tempo em que funcionava toponimicamente. Em fevereiro de 1975, concluí, em parceria com Laís Mourão, um texto intitulado “Questões agrárias no Maranhão”4, que buscava sintetizar as medidas de reestruturação formal do mercado de terras diante das distintas formas de apropriação da terra. Ampliei meus estudos, nesse mesmo ano, realizando trabalhos de campo no sertão central do Ceará, abrangendo outras situações de uso comum dos recursos naturais, como as chamadas “terras soltas”, em regiões de colonização antiga. O mesmo verifiquei logo depois em regiões de ocupação recente da pré-amazônia maranhense e no sul do Pará. 4 ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno de; MOURÃO, Laís. Questões agrárias no Maranhão contemporâneo, Pesquisa Antropológica, Brasília, n. 9-10, p. 1-27, 1976. Agora, eu queria que o senhor comentasse um pouco sobre sua participação no Ministério da Reforma e do Desenvolvimento Agrário. O Mirad foi um ministério de transição política que propôs o I Plano de Reforma Agrária da Nova República e acabou sendo extinto em 1988. No entanto, vários antropólogos foram chamados a trabalhar no Mirad, naquela época. Como foi a atuação daquelas pessoas, que conflitos surgiram e que barreiras tiveram de ser superadas naquele momento histórico? Os caminhos foram caminhos diferenciados. Eu cheguei a Brasília em novembro de 1984. Já estava definido praticamente o que iria acontecer. Eu fui com a intenção de fazer uma avaliação da Funai, a convite de João Pacheco. Não obstante às tensões, produzimos um trabalho analisando os arquivos de 25 R UR I S 5 Posteriormente publicado por ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno de; OLIVEIRA FILHO, João Pacheco de. A demarcação como afirmação étnica: um ensaio sobre a Funai. In: OLIVEIRA FILHO, J. P. de. (Org.). Indigenismo e territorialização – Poderes, rotinas e saberes coloniais no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Contra Capa, 1998, p. 69-124. 6 Fundador da Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra) e autor de inúmeras publicações sobre a questão agrária no Brasil, José Gomes da Silva era presidente do Incra em 1985. 26 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 terras e os projetos da Funai5. Ficamos dois meses perscrutando arquivos da instituição e produzimos esse trabalho com muita dificuldade. Quando se foi elaborar a proposta ao Plano Geral de Reforma Agrária, que foi em fevereiro e março de 1985, eu fui convidado pelo José Gomes da Silva6, em função desse trabalho em que tinha participado, sobre os arquivos da Funai. E nós, João Pacheco e eu, fomos convidados para compor o GT sobre terras indígenas. No entanto, com o processo de discussão, que começou a esquentar entre março e abril daquele ano, a questão dos conflitos agrários se acentuou em demasia. A esse tempo eu já havia trabalhado antes no Maranhão, no Ceará e no Pará, fazendo trabalhos bastante expressivos sobre conflitos agrários no âmbito da CPT (Comissão Pastoral da Terra) e dos STRs (Sindicatos de Trabalhadores Rurais) e detinha uma certa bagagem. Mas, nos dois primeiros meses, fiquei discutindo tão somente as questões indígenas. No terceiro mês, já houve uma cisão e algumas pessoas não queriam mais continuar em Brasília. Pessoas vindas de São Paulo não queriam mais continuar e começamos a enfrentar os primeiros obstáculos. E os primeiros obstáculos eram relacionados à área preferencial para reforma agrária, a partir das desapropriações em Londrina. Houve uma tensão muito forte, pois estava sendo estruturada a UDR com uma postura beligerante. A essa altura eu estava no Mirad, eu não fiquei no Incra. No Incra, o Moacir Palmeira, com quem eu sempre mantive uma relação muito boa por ter sido meu orientador no período de mestrado, ficou na Divisão de Assuntos Fundiários. E, no Mirad, o ministro queria que se organizasse uma secretaria que abrangesse terras indígenas e conflitos. Nós acabamos então nos dividindo em coordenadorias. Uma Coordenadoria de Terras Indígenas e outra Coordenadoria de Conflitos Agrários. João Pacheco organizou a primeira e eu organizei a segunda. R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Convidei alguns colegas nossos que foram para lá: Márcia Anita Sprandel, Maristela Andrade, Murilo Santos, Átila Roque, Célia Correia, Luís Fernando Linhares, Andréa Victor e Ana Paulina, dentre outros. Ambas as coordenadorias tinham uma modesta capacidade de intervenção pontual em qualquer lugar do país, rapidamente. Telefone aberto todo tempo, a cobrar. Tínhamos um livro de registros, as pessoas ligavam, nós anotávamos e dávamos as providências. Então, tínhamos uma situação próxima a um centro de decisão burocráticoadministrativa, mas nunca renunciamos à nossa capacidade operacional de ir para as áreas, fazer os relatórios de campo in loco. Nós produzíamos, a cada verificação, informações técnicas. Nós elaboramos algumas centenas de informações técnicas. E produzimos relatórios muito grandes. Inclusive alguns que foram para a ONU. E tratávamos de tudo que era relacionado a conflito de terras. Qualquer que fosse o conflito e não importasse onde. Então, montamos uma pequena engrenagem, mas com mecanismos de intervenção bastante ágeis. Vocês conseguiram, naquela época, trazer para o âmbito do Mirad uma reflexão sobre a diversidade de ocupações das comunidades tradicionais no território brasileiro e sobre sua regularização fundiária? Foi iniciada uma discussão. Havia uma ideia de se montar um banco de dados e um cadastro de glebas. E estava em discussão uma reorganização e revisão do cadastro do Incra. Eu tinha tido aquela experiência na “terra de preto”, tinha tido outra experiência em “terra de santo”, que era terra de irmandades religiosas. E pensava: Por que isso não está incluso? Não se trata de uma forma de apossamento legítima? Aí nós começamos a discutir as limitações da categoria “imóvel rural”. Será que não há alguma forma de ocupação – que certamente não é propriedade, mas ocupação – que seja uma “ocupação 27 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 especial”? Porque não eram só posseiros, eram “mais” do que isso. E aí no “especial” estava embutida a ideia do tradicional. Estava embutida uma ideia de ocupação que levava em conta fatores identitários, culturais. Havia uma presunção quanto a isso. E foi por aí que nós trabalhamos. E começamos a montar isso com vistas à composição de um cadastro de glebas, que seria montado em quatro anos e em que se aplicaria esses dados sobre “ocupação especial”. E às “ocupações especiais” correspondiam as chamadas “terras de preto”, as chamadas “terras de santo”, as “terras de índio”, que não eram terras indígenas, as chamadas “terras de ausentes”, as “terras de herdeiros”, sem formal de partilha, as “terras de patrimônio”. Nós tínhamos, assim, um protocolo do Incra com todas essas situações. Era só examinar o protocolo do Incra. Em uma olhada que dei, consegui reclassificar todo aquele material. E esse material que foi produzido? Esse material todo foi copiado e as cópias referidas distribuídas para todas as unidades da Federação. Tudo que foi despachado e que gerou processo foi apenso aos processos. E tudo que foi parado, que não deu andamento, foi deixado lá como “arquivo morto”. Então, restou dividido. Esse acervo não era um acervo fixo. Era um acervo relacional. Quer dizer, você tinha uma parte que dava início a processos administrativos. Você tinha uma parte que ia ou foi para as superintendências. E havia uma parte que não teve qualquer andamento. Agora, outro ponto que eu gostaria de colocar é se o senhor teve participação nos debates da Assembleia Nacional Constituinte de 1988? Para o senhor, qual foi o papel das diferentes militâncias (movimento negro, intelectuais, lideranças políticas) na redação do artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT)? 28 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Nossa situação dentro do ministério só foi possível circunstancialmente e só durou até fevereiro de 1987 – foi quando nós saímos, organizamos nossa saída e não permitimos que nos colocassem para fora. As pressões sobre a Coordenadoria de Conflitos Agrários aumentaram por conta da discussão em torno da concessão de incentivos fiscais a imóveis rurais com registros de ocorrência de conflitos. Nós estávamos apontando falhas e sugerindo indeferimento em casos de comprovação de conflitos sociais e eles estavam deferindo o que nós indeferíamos! Por exemplo, uma fazenda que tem conflito com posseiros, onde houve registro de trabalho escravo ou que intrusa terras indígenas, não pode receber incentivo fiscal. Uma fazenda que tem conflito não pode receber nenhuma forma de incentivo creditício oficial. E isso estava sendo desrespeitado. E nós chamamos a atenção, pois estávamos indicando que havia problemas que impediam a concessão. Então, isso gerou uma tensão muito forte, com 200 situações na Sudam e Sudene, não menos do que isso. E nós fomos acusados de estar procrastinando a tramitação dos processos. E dizíamos que não, nós não estávamos procrastinando, estávamos indeferindo tecnicamente, porquanto havia irregularidades. Mediante nosso parecer técnico, cabia à autoridade administrativa tomar a ação que lhe aprouvesse. Do nosso ponto de vista, o que estava ilegal, o que era uma situação ilegal, o que não tinha direito a incentivo creditício ou fiscal não tinha, e ponto final. Então, isso gerou um conflito inimaginável e nós tivemos que receber políticos, lobistas e “emissários”; portando, explicações quanto ao imóvel. O Jornal do Brasil publicou então uma reportagem imensa na época, mostrando quantos políticos haviam telefonado para o Incra, objetivando algum grau de ingerência quanto aos incentivos fiscais. Era uma coisa inimaginável... Quando não, chegamos a receber telefonemas da própria Presidência da República. Pessoas que se intitulavam ajudantes de ordem nos comunicavam o 29 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 seguinte: “De ordem do senhor Presidente...” Você imagina? Uma coisa totalmente indevida, pois o presidente deveria reportar-se ao ministro e este nos informar. A Coordenadoria de Conflitos Agrários funcionava no mesmo andar do gabinete do ministro e a via correta facilitaria a discussão. Mas não era assim. Agia-se ao arrepio da lei. Em virtude disso, sempre ignorei essas ordens verbais e as influências vindas de terceiros dispostos fora da cadeia hierárquica. Mas o senhor estava em Brasília pouco antes da Constituinte... 7 Projeto desenvolvido a partir da década de 1980 no âmbito da Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDDH) e do Centro de Cultura Negra (CCN) do Maranhão, com apoio da Fundação Ford. 30 De fato. E aí, o que ocorreu? Em 1986, ocorreu o I Encontro das Comunidades Negras Rurais no Maranhão. Havia uma certa mobilização. O falar em “terras de preto” pelos corredores em Brasília por si só já prenunciava uma determinação de existência e uma forma organizativa. Uma já dialogava com a outra. O que não havia e não houve naquele momento foi uma interpretação do movimento negro das “terras de preto” enquanto quilombos. Isso foi posterior. A “ressemantização” ocorreu ainda em 1988, mas posterior à Constituição. Estava ocorrendo em dois planos quase simultâneos. E o caso do Quilombo do Frechal, nesse sentido, foi bastante importante para nós, do mesmo modo que o Projeto Vida de Negro7 no Maranhão. Esse projeto começou no início de 1988, antes da Constituição. Quando nós fizemos o primeiro levantamento das áreas, foram apontadas quatrocentas áreas, e nós constatamos: temos uma grande quantidade de “terras de preto” no Maranhão e, em algumas áreas, isso aparecia na própria designação do topônimo “preto”. Por exemplo, Mandacaru dos Pretos, Outeiro dos Pretos, Santo Antonio dos Pretos, Bom Jesus dos Pretos, Jamary dos Pretos etc. Então, você tem um forma sufixal que concorria para definir a etnicidade daquela situação. Diante dessas 400 situações de terras de preto, passávamos a ter outra abordagem sobre a estrutura agrária do Maranhão. R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Mas o que estava sendo discutido na Constituinte, por outro lado, não era isso. O exemplo que muitos do movimento negro tinham na cabeça, não todos, mas muitos, era o da figura idílica e heroica do quilombo. Não tratavam a atualidade do quilombo. Realmente, o termo que eles tinham na cabeça era o termo de uma abordagem evolucionista: “remanescente”, resíduo. E foi assim que os legisladores interpretaram. Mas isso representava também uma divisão interna do movimento negro, que era mais urbano e que estava operando com a noção de monumento. E não tinha muito essa feição identitária, porque continuava tratando a questão do campesinato negro em sindicatos. Isso não era entendido como étnico. E ainda se tinha uma abordagem “racial” consoante com teorias científicas relativamente superadas. Só houve essa abertura para entender o negro, no sentido político-organizativo, projetando uma identidade étnica em um momento posterior. E isso foi em meados de 1988 mesmo, quando a Constituição estava tendo sua elaboração definitiva. Temos que atentar, nesse contexto das reconstituições, para os riscos das autobiografias. Todo narrador que se empenha numa reconstrução autobiográfica está sujeito a se ver como agente essencial nesse processo. E o ponto é tentarmos entender mais os processos sociais do que a versão que cada um tem de si próprio nesse processo. Eu acho que essa diferença é essencial porque vejo, não raras vezes, representações triunfalistas daquele momento. O que eu estou tentando é apontar para as dificuldades do que estava em jogo naquele momento. A meu ver preponderava uma divisão, não havia uma aproximação perfeita, não se coadunava aquela formulação idealizada e heroica de quilombo com as chamadas “terras de preto”. Não houve uma tradução imediata e transitiva. A noção de quilombo enquanto “escravos fugidos” prevaleceu inicialmente e não foi demovida facilmente. As autoevidências falavam mais forte e eram difíceis de serem removidas. Só foi possível se juntar elementos de definição ressemantizada de quilombo, neutralizando as 31 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 visões evolucionistas, a partir da experiência do CCN (Centro de Cultura Negra) no Maranhão. Ali foi um laboratório. No próprio setembro de 1988, as experiências já apontavam para a relativização da monumentalidade e da noção de “negro fugido”. E foi dali que se imprimiu isso para fora, e a primeira discussão, lembro-me muito bem, foi com a Bahia, onde tinha um movimento negro mais estruturado e com maior poder de decisão política. E sua participação no Projeto Vida de Negro foi naquela época também? 8 ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno de. Terras de preto, terras de santo, terras de índio: posse comunal e conflito. Humanidades, Brasília, UnB, vol. 15, p. 42-29, 1987. 32 Sim, e ela foi acidental também. Porque eu estava vindo dessa experiência com as “terras de preto” via Mirad. Tinha produzido um trabalho que a revista Humanidades, da Universidade de Brasília, havia lançado, que era uma primeira versão em que ainda não falava do sentido completo de “uso comum”8. Estava trabalhando ainda com uma ideia de “uso comunal”. Não tínhamos ainda feito aquela distinção entre “comum”, “comunal”, “coletivo” e “comunitário”, que só consegui entender melhor posteriormente. Tratava-se de um período em que eu, particularmente, estava ainda muito ligado àquelas experiências anteriores e as determinações de existências se impunham aos conceitos teóricos. Mas não fui chamado para o Projeto Vida de Negro no primeiro momento. O PVN foi aprovado pela Fundação Ford e a Fundação Ford colocou alguns senões. E um deles era que tivesse um antropólogo para acompanhar. Foram feitas gestões e o antropólogo indicado, no caso, fui eu. Então, eu entrei nessa contingência. Não fui o escolhido de antemão, fui aquele sobre quem recaiu a escolha. Mas eu fazia parte do processo de discussão que existia e não estava alheio. Isso me permitiu entrar sem condicionantes. O trabalho anterior sobre “ocupações especiais” deixou, de certa maneira, um lastro. As pessoas R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 perceberam outras coisas que não estavam cabendo na ideia de imóvel rural, que não estavam cabendo dentro do cadastro e que havia outras formas de uso dos recursos que não estavam sendo convenientemente reconhecidas e que precisavam de reconhecimento jurídico-formal. Nesse sentido, nós ajudamos um pouco no esforço crítico. Agora, falando um pouco do presente, eu queria sua opinião sobre as respostas que o Estado brasileiro tem dado às demandas do movimento quilombola, e, em especial, sobre a incumbência dada ao Incra para a regularização de territórios quilombolas. Bom, eu coloquei muita ressalva nisso. Eu fui um dos que colocou ressalvas à maneira como isso foi passado para o Incra, embora aparentasse ser a única solução de operacionalidade naquele momento. Nesse sentido, eu discordei de maneira veemente de tantos outros que colocaram isso. Mas, do meu ponto de vista, havia o seguinte: o Estado tardiamente incorporou essa questão e incorporou de maneira incompleta. Essa questão não foi incorporada em 1989. Em 1991, nós tentamos debalde o reconhecimento de Frechal, consoante o artigo 68. Não conseguimos. Apenas em 1992 veio uma solução burocráticoadministrativa. Ocorreu o reconhecimento de Frechal, mas como uma Reserva Extrativista Quilombo do Frechal. O Estado a reconhecia como reserva extrativista, mas não como quilombo nos termos do artigo 68. Mas não deixou de ser um reconhecimento indireto a partir da afirmação das pessoas e do dispositivo jurídico-formal de que ali era o quilombo do Frechal. No fundo do pensamento evolucionista, persistia a noção de Frechal como uma fazenda, um antigo engenho. Acompanhavam essa formulação um sem-número de indagações: “Como é que se tem um quilombo a 100 metros da casa-grande?”, “Se não há negros fugidos, não há quilombo?”, “Um quilombo se localiza em lugar afastado, remoto e distante?” Acompanhavam também 33 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 a formulação as assertivas evidentes: “O que agrupa escravos nos domínios da fazenda é a senzala”, “Quilombo é sempre onde não há fazenda” etc. O trabalho de pesquisa implicou examinar criticamente essas autoevidências e refutá-las. Então, esse tipo de discussão retirou a espacialidade da ideia de quilombo. O quilombo é onde o grupo está e pode manter e exercer sua autonomia de decisão produtiva e de vida diante daqueles que querem subordiná-lo. E, nas discussões em Frechal, diziam: “O quilombo do Frechal não é aqui”, dizia o perito técnico da parte da empresa de construção, “nós temos um documento histórico que mostra que o quilombo do Frechal é lá e não aqui”. “Se vocês querem o reconhecimento do Frechal, vocês vão ter que sair daqui e ir para lá onde os documentos do século XIX dizem que se localizava o quilombo!”. Ao que dizíamos: “Lá é o quilombo do Frechal do século XVIII, mas as tropas de linha não foram lá, aprisionaram essas famílias negras e trouxeram para cá? Quando vocês trouxeram para cá, vocês “aquilombaram” a casa-grande. Porque o quilombo são os sujeitos sociais que se organizam e exercem sua autonomia, não é o lugar físico. Frechal sem as pessoas não é um quilombo! Definir pelo espaço físico frigorificaria aquele sentido de quilombo. A aceitação de que Frechal pudesse ser um quilombo foi também vital para esse processo de ressemantização. E isso foi em 1989 e 1990, para você ter ideia. E em 1992 foi o reconhecimento, em fevereiro, mas como Resex. Nos estudos que abordam a questão quilombola no Brasil hoje, o senhor não percebe uma ênfase temática excessiva na relação identidade–território (até em função da própria demanda social existente)? Eu acho que, com a ideia dos quilombos urbanos, nós conseguimos relativizar um pouco a ideia de prender o quilombo a uma situação de ruralidade ou confundir quilombo 34 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 com fazenda, tendo que distinguir a todo tempo quilombo de fazenda. Relativizando a dicotomia rural–urbano, o quilombo pode ser considerado um agrupamento de unidades residenciais, onde os grupos exercem autonomia através do direito à moradia – e têm, nesse ponto, um elemento essencial em sua reprodução física ou cultural –, ou pode ser uma unidade a partir de um conjunto de recursos naturais dos quais os sujeitos usufruem. Conseguir entender que se pode territorializar pelo modo de ser, pela língua, pelas unidades culturais, residenciais ou não, já foi um avanço, quer dizer, nós conseguimos retirar todos aqueles elementos “geografizantes” da ideia do território e projetamos o espaço social sobre o espaço físico. Conseguimos trazer para a ideia de identidade outros elementos que não dependiam de nascimento, de laços de sangue, de ancestralidade, de estar vinculado à mesma área, de partilhar de uma mesma religião, de uma mesma língua etc. Quer dizer, não há uma religião dos quilombolas, não há uma língua dos quilombolas, não há um ou mais traços físicos definidores do quilombola. Então se tem tentado refletir, mas é um desafio que não é muito fácil e que vai exigir para cada situação uma capacidade de relativizar e um procedimento dialético bastante profundo de relacionar, segundo a autorrepresentação dos próprios agentes sociais que se autodefinem como quilombola, os diversos elementos em jogo. Bem, com relação aos paralelos entre a questão quilombola e a questão indígena ou de outros povos tradicionais, gostaria, primeiro, de saber como o senhor associa a movimentação política pela reivindicação de direitos das comunidades negras rurais com as movimentações de outros povos tradicionais. Eu acho que a Constituição de 1988 foi muito importante porque ela prenunciou a percepção de direitos territoriais desses grupos e tornou mais factíveis suas reivindicações. Por exemplo, a Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das 35 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Comunidades Negras Rurais) não foi a primeira organização dos povos tradicionais, a primeira foi indígena, através da UNI (União das Nações Indígenas) em 1979. A segunda organização foi a dos seringueiros. Os seringueiros percebem que não podiam ser reduzidos a uma mera ocupação econômica. Passam a se ver como uma categoria política de peso, cuja organização é de 1985. Então, apesar de os índios terem saído na frente ao trilharem suas reivindicações coletivas diante do Estado, o caráter plural da Constituição de 1988 facilitou a emergência dos outros povos e comunidades e criou condições de reconhecimento pelo Estado dessas novas identidades coletivas. Então, em 1989-1990, as quebradeiras de coco babaçu já se organizam também, já que antes elas não tinham nenhuma possibilidade jurídica de “emergir”. Do mesmo modo, no caso dos quilombolas, o fato de transformar “terras de preto” em quilombo tornou-se factível a partir da Constituição de 1988. Assim como o seringueiro, o castanheiro etc. A reivindicação desses grupos surgia como um corolário da aplicação legal. Então, a Constituição de 1988 foi muito vantajosa nesse sentido, favorecendo a diversidade social e o pluralismo jurídico. Agora, em termos de abordagens teóricas no campo da antropologia, em que medida as discussões tecidas no âmbito da etnologia poderiam incrementar as discussões sobre a temática quilombola? Com relação às abordagens teóricas, nós temos um problema ainda que concerne a uma análise crítica das tradições nesse domínio de conhecimento. No caso das comunidades negras, as duas tradições que nós temos remetem inicialmente a Franz Boas. Boas, distinguindo raça e cultura, teve dois orientandos principais referidos a essa situação brasileira: Melville Herskovitz, que orientou Richard Price, mas que orientou também Otávio da Costa Eduardo, que fez o primeiro 36 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 trabalho sobre comunidade negra rural em Santo Antônio dos Pretos, Codó, Maranhão; e Charles Wagley, que por sua vez orientou Eduardo Galvão e ambos estudaram Gurupá, Pará, onde observaram o que designaram de “lugar dos pretos” ou Jocojó. De maneira simplista, os classificadores assinalam que o primeiro privilegiou os fenômenos religiosos, enquanto o outro se voltou para as relações econômicas. Arthur Ramos, Nunes Pereira, René Ribeiro e outros mantiveram-se vinculados a Herskovitz. Wagley procurou com Galvão outra intervenção e fizeram dos museus centros de produção científica, formando a partir daí os seus epígonos. Pode-se afirmar, grosso modo, que a antropologia no Brasil para tratar dessa temática conhece uma bifurcação a partir de um só autor-fonte. E tal bifurcação persistiu até os anos 1980, estruturando um domínio de reflexões complexas, que constitui, por assim dizer, uma préhistória social do conceito de quilombo, levando-se em conta as pesquisas antropológicas a partir de 1988. O “lugar dos pretos” ou topônimo designativo de uma etnicidade só vai aparecer incidentalmente no trabalho de Wagley e Galvão, tal como deixam entrever seus cadernos de campo. Quando ele aparece nos epígonos de Herskovitz, ele aparece sob uma forma “afro-religiosa”, que consistia numa interpretação do que era a identidade. A identidade, nesse caso, era religiosa e inclusive o poder político era transmitido via religião e a língua se preservava nos cânticos e orações. Foi essa a “tradição cultural” expoente desses estudos. Então, para se falar de negro, falava-se de religião. Para mim, foi um pouco difícil no início da pesquisa no PVN porque ou “negro era visto do prisma da religião” ou negro era um elemento submerso dentro de categorias econômicas. Identidade e território ficavam ancorados nesses esquemas interpretativos. A definição da fronteira do grupo e a busca do “eu” tinham seus itinerários cartografados. Cada um a seu modo, conjugando os efeitos de lugar com aqueles do sagrado. Em certa medida, os esforços 37 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 iniciais de ressemantização do conceito de quilombo, afastando qualquer concepção fixa de identidade, tiveram que enfrentar o peso dessa bifurcação, que, em alguns momentos, foi (e é) acionada como uma pinça, que, comprimindo, inibia (inibe) a sua dinâmica e o seu sentido relacional. Isso se teria dado de forma diferente com os indígenas... Exatamente. Se bem que, nesse momento, a abordagem evolucionista dizia que os índios estavam acabando e que estava surgindo um tipo intermediário, que era o “caboclo”, que era resultante de uma aculturação também chamada de processo de “assimilação”. Nesse sentido, acho que os censos desde 1872 ajudaram indiretamente os autores a pensarem isso pela via quantitativa. Em 1872, segundo o primeiro censo brasileiro, em termos da população total, havia 19,68% de negros no Brasil. No censo de 1991, quase 120 anos depois, só havia 5,01% de negros. Aliás, a categoria censitária refere-se a “pretos”. A sociedade brasileira estaria, então, passando por um processo de “embranquecimento”. O negro estava virando um tipo intermediário – indo para caboclo ou pardo e o índio também estava virando pardo, e daí embranqueceria. A categoria pardo acabou-se transformando em uma categoria residual, que recebia, idealmente, contingentes de ambos os lados. Com isso, você tinha um modelo de assimilação, baseado nas três raças, que resolvia o problema da composição étnica da sociedade brasileira. Depois de 1988, começam a surgir algumas questões que colocam em dúvida as aplicações usuais dos direitos republicanos universais da Revolução Francesa. E começam a aparecer grupos de difícil “enquadramento”. Tem-se uma sociedade plural, uma diversidade social reconhecidamente mais ampla e, em decorrência, formas de classificação mais abrangentes do que se imaginava. Abre-se uma situação de lutas entre classificadores 38 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 e há conflitos continuados. Começam a ganhar corpo as vozes dominantes das autoevidências, circunstancialmente abaladas, que buscam reinstituir o arbitrário das classificações preconcebidas. Logo sentenciam: “eles não são índios” ou “estão inventando que são índios”; “eles não são quilombolas, estão inventando que são quilombolas”; “elas não são quebradeiras, estão fingindo que são quebradeiras”. Começa a existir aquele que tem necessidade de definir “o que é” para, a partir dessa definição do que é, poder dizer que os outros não são. As falas se investem de autoridade ou buscam no Judiciário o endosso da legitimidade de sua fala, como no caso da Adin no 3.239 do PFL contra o decreto no 4.887, visando desautorizar a autodefinição tal como preconizada na Convenção no 169. Nesse caso, nós temos uma situação muito particular na sociedade brasileira, que seria um refinamento jurídico-formal da exclusão pela reedição disfarçada de uma forma sutil de limpeza étnica. Os procedimentos técnicos têm, portanto, que lidar com os novos conceitos de etnia e território que confrontam essas visões preconcebidas. Então, aproveito para fazer uma questão inspirada em um ensaio intitulado Narrativas agrárias e a morte do campesinato9, em que o professor Mauro Almeida argumenta que a categoria campesinato, como parte de uma história da modernização e como categoria que subsumia uma enorme variedade de objetos locais sob uma única linguagem teórica, foi desconstruída e transfigurada para a política agrária e, em particular, para a ideia de reforma agrária. Segundo o autor, o que está em curso hoje é uma nova reforma agrária de certo modo transfigurada em uma pluralidade de movimentos e de questões e trazendo consigo novos recortes da luta pela redistribuição do espaço natural-humano. Para ele, esse movimento significa a recuperação da diversidade social e política muitas vezes reprimida no passado e das novas alianças dos movimentos que antes eram englobados no “guarda-chuva” do ruralismo. O que o senhor acha dessa interpretação? 9 ALMEIDA, Mauro William Barbosa de. Narrativas agrárias e a morte do campesinato, Ruris – Revista do Centro de Estudos Rurais, Campinas, Unicamp, v. 2, p. 157-186, 2007. 39 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Bem, enquanto você falava, eu fiquei recordando de quantos trabalhos publicados em inglês falaram, no início dos anos 1990, no fim do campesinato ou na reconceituação do campesinato. Isso se colocou de forma muito forte durante um certo tempo. Entretanto, eu sempre tive muitas dúvidas porque, para mim, campesinato consiste num conceito teórico, numa forma de entendimento e num instrumento analítico, antes que sujeito a uma determinação de existência. Por exemplo, se você consultar Raymond Firth, em Malay fishermen – Their peasant economy, ele inclui no significado de camponês os pescadores. Se você consultar Eric Wolf, ele alerta que o sem-terra não é camponês, porquanto seria camponês aquele que possui terra. Conforme o instrumento analítico acionado, os autores incluem ou excluem determinados agentes sociais. Robert Redfield, em The little community and peasant society and culture, achava que o camponês, como tipo humano, requer cidade para ele surgir. Tem que existir a cidade para ter campesinato. Para ele, os povos “primitivos” não seriam camponeses. Haveria uma relação estrutural entre a comunidade rural e a cidade em termos políticos, econômicos e religiosos. Aquela ideia dele de “folk urbano” é construída a partir daí. Trata-se de um conceito. Quando nós vamos falar do fim do campesinato, do que se trata realmente, do fim da possibilidade desse conceito e seus múltiplos significados ou do fim de um grupo com existência determinada? O que morre é o campesinato, grupo que eu estou observando empiricamente, ou é o campesinato produto de instrumentos analíticos que me ajudam a compreender e interpretar grupos que eu estou empiricamente observando? Essa distinção tem que ser refinada, contornando os riscos de estarmos substantivando. A provocação do ensaio é justamente por aí e as provocações de Mauro Almeida também problematizam essa distinção... 40 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Retomando, vale frisar que Wolf limita o conceito de camponês aos produtores agrícolas que têm terra. Sem-terra não seria camponês para ele. Ele exclui, portanto, assalariado rural, pescador, artesão, extrativistas etc. porque, para ele, campesinato está ligado ao cultivo da terra. Já para Firth, não haveria necessidade de ter cultivo da terra. O elemento natural pode ser a água! O território do camponês, enquanto espaço físico, pode ser um território aquático. Se houver uma unidade familiar, trabalho em cooperação simples, produção em pequena escala, equipamentos simples, organização de mercado segmentado e relações econômicas não subordinando outros, empregados de maneira permanente, haverá campesinato. Para Firth, você tem campesinato com os pescadores. Já para Kearney o camponês tem sido constantemente reinventado. Foster, por sua vez, não faz uso de critério ocupacional para definir o camponês. Elege um critério estrutural e relacional, ou seja, não se detém no que produzem, mas como e para quem. Para ele, nem todos os agricultores são camponeses, não seriam camponeses os farmers norte-americanos nem os agricultores europeus atrelados a uma economia de mercado. Todas essas interpretações são conceitos, são instrumentos analíticos que podem ser acionados para se estudar empiricamente determinados grupos. E esse arsenal de relações não pode ser abandonado, ou seja, seu fim não pode ser simplesmente decretado. Mas eu concordo que o termo camponês consistiu também, na sociedade brasileira, numa personificação do coletivo. Pelo critério político, você designava como camponês os mobilizáveis pelas Ligas Camponesas, de Francisco Julião, mas por esse mesmo critério chamava de lavradores aqueles que estavam trabalhando com a Ultab (União dos Lavradores e Trabalhadores do Brasil), ligada ao Partido Comunista. O significado de camponês aparece no âmbito dessas mobilizações como ligado a um critério político-organizativo. 41 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Hoje, o camponês não aparece mais explicado por tal critério e são muitos os que leem isso como o fim do campesinato. No momento atual, considerando-se as formas organizativas, podese dizer que, a não ser o “movimento das mulheres camponesas”, os outros movimentos não utilizam a categoria como critério político-organizativo. Esses movimentos estariam utilizando outras categorias, sobretudo aquelas derivadas de processos de autodefinição e de construção de identidades coletivas objetivadas em movimentos sociais. O que parece que “morre” é uma forma de interpretar. Agora, quem se opõe à emergência de novas identidades coletivas insiste em dizer que os quilombolas, na verdade, seriam a continuidade do campesinato ou, mais particularmente, do campesinato negro. Outros asseveram que com o fim do campesinato é que emergiram os quilombolas. Parece-me que esses termos estariam em planos de abstração diferentes. O “fim do campesinato” estaria num plano teórico, enquanto a “emergência” dos quilombolas está referida a um processo real e vinculada a um plano político-organizativo. São situações distintas. Quer dizer, “a quebradeira não apareceu com o fim do camponês”, um não substitui o outro, como uma realidade empiricamente observável não substitui um conceito teórico. Sabemos que há hoje uma demanda crescente de atuação de antropólogos no Estado, principalmente nas regiões onde há ações que afetam comunidades tradicionais. Eu queria saber sua opinião sobre a atuação desse profissional no Estado. O senhor acha importante a experiência do antropólogo com laudos, relatórios, pareceres? Como o senhor vê a relação entre conhecimento científico e conhecimento aplicado? Eu acho, primeiramente, que a leitura de monografias clássicas ajuda muito a resolver problemas teóricos. Esteja no 42 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Incra ou não esteja, penso que os antropólogos têm que fazer um aperfeiçoamento de tudo que eles puderem produzir e fazer um esforço no sentido de produzirem de uma forma mais crítica. Tudo que for possível trabalhar de uma maneira mais crítica, fazê-lo. Bem, o que ocorre é que, nos Estados Unidos, na Segunda Guerra Mundial, se criou essa relação entre a antropologia e os organismos públicos e os antropólogos foram trabalhar nessas “ações” públicas. E já naquele período, do ponto de vista do Estado, fica explícita uma ideia, que é muito comum hoje, de que os antropólogos podem contribuir na resolução de conflitos. Percebe-se a prevalência de uma visão aplicada e utilitarista da antropologia. E essa ideia parece-me uma ideia deveras conservadora! Imaginar o antropólogo como artífice do diálogo e da mediação e como proponente de soluções são ideias conservadoras. Embora muitos antropólogos acreditem que possam fazer isso, faz-se necessário relativizar. Relativizar as formulações que acreditam que podem “levar” para o grupo alguma categoria e forma de mobilização. Tal pré-noção permeia muito as organizações voluntárias da sociedade civil, as organizações não governamentais, os políticos, as assessorias técnicas de movimentos que imaginam e superestimam o poder do antropólogo, pois trabalham ainda com uma abordagem iluminista de “farol”, de especialista etc. A ideia mesma de perito é pré-weberiana. Tem-se uma compreensão absoluta dos direitos universais e republicanos. E sabemos que não é exatamente assim. Os caminhos que os grupos têm para perceber as suas condições reais de existência podem não passar pelo antropólogo e pelos demais candidatos a mediadores. Os antropólogos correm o risco de superestimarem a si mesmos e são tentados a superestimar os que possuem a pretensão de mediadores, nessa farsa de intelectuais iluminados que sabem o caminho. Tendem a se autorrepresentar com essa metáfora do farol, não levando em conta por vezes os desfechos das cisões 43 R UR I S 10 SILVA, Gláucia (Org.). Antropologia extramuros: novas responsabilidades sociais e políticas dos antropólogos. Brasília: ABA, Paralelo15, 2008. 11 Ironicamente, a entrevista foi concedida um pouco antes da publicação da instrução normativa no 49/2008 do Incra, que revogou a instrução normativa nº20/2005, tornando o Relatório Antropológico uma peça bastante “manualesca”. 44 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 internas entre lideranças. Quer dizer, essa ilusão de participação e da imprescindibilidade de seus atos de mediação tem que ser colocada em xeque. Quando o antropólogo entra para o serviço público, isso pode tender a se agravar, porquanto se investe da fala do poder. Em virtude disso, a primeira exigência para quem entra para o serviço público é aquela que Bourdieu sublinha bem, que é a reflexividade. Foucault vai atalhar: De que lugar institucional está produzindo? Quais as implicações desse lugar institucional? Quais os critérios de competência e saber desse lugar institucional? A ABA chamou recentemente esse lugar de “extramuros”10, mas será que se trata realmente daquilo que está fora da universidade? Será que não tem uma ponta da universidade que tem extrema atração por apresentar soluções para aplicação de políticas públicas? Nesse sentido, eu me lembro muito do Luiz de Castro Faria dizer, quando houve o primeiro concurso do Ministério Público Federal (não sei nem se estou autorizado a falar isso em termos da memória dele), que não lhe parecia razoável ter um “antropólogo do Incra”, um “antropólogo da Procuradoria”, um da Funai etc. Porque esse antropólogo dividido nos meandros do serviço público pode comprometer os critérios de competência do saber. Ele pode ser presa fácil da manualização. Ele vai ficar tentado por um manual. Você imagina a instrução normativa no 20 do Incra pensada de forma “manualesca”, como uma manualização11. E ele vai ser tentado a seguir ou impelir outros a seguirem aquelas prerrogativas. E, quando você começa a cumprir os preceitos de um manual, você começa a deixar de ser antropólogo, porque o antropólogo, pela sua própria definição, é antagônico a qualquer ideia de manual. A manualização aprisiona o conflito, frigorifica o conceito e esteriliza a capacidade criativa e intelectual. Ela é outro componente mais burocrático da ação do antropólogo do que um componente científico. Então, o antropólogo que está R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 nessa estrutura vai ficar sempre numa situação pendular entre a burocracia e a ciência, entre o conceito teórico e a noção empírica, entre o cumprimento à norma manualesca e a esperança de que a universidade lhe dê um guia. O mesmo que era esperado da antropologia do século XIX, que tinha aquele guia do Real Instituto Britânico de Antropologia. Só que os antropólogos de hoje estão esperando que alguém lhes dê isso, que a universidade lhes dê isso, que a ABA lhes dê isso. Que alguém vai dar o guia para ser resolvido o problema dessa perícia, desse parecer etc. E nós vemos cada vez maior a dificuldade institucional dos nossos organismos representativos de traduzir isso. Não conseguem traduzir. Então, aquilo que era para ser uma ponte com a sociedade transforma-se num fosso intransponível. Esse é que é o grande problema. Nós não estamos em uma cidadela isolada que a ilusão de ciência nos dá. Mas tampouco estamos no meio do redemoinho como o personagem do Guimarães Rosa, que imagina que, no meio do redemoinho, está cortando a luta do bem com o mal, dos bandidos com os mocinhos, dos usurpadores contra os usurpados, dos colonizadores contra os colonizados. Nós não estamos no meio desse redemoinho senão por uma imaginação, por uma ilusão do rigor que atribuímos a nós mesmos. Então, para mim, este é o grande dilema hoje, o grande dilema desse trabalho que se faz no Estado. Além disso, o grau de exigência do trabalho do antropólogo vai aumentar e está aumentando terrivelmente. Eu confesso que comecei a estudar coisas que nunca pensei que fosse estudar. E comecei a imaginar que estou entendendo de coisas que nunca pensei que fosse entender. E não sou bom nisso! Meus alunos que trabalham comigo são muito superiores a mim em lidar com GPS, em lidar com a programação de ARCGIS 9.2 e com a operacionalidade que todo trabalho de campo tem que ter. Porque nós, para nos livrarmos também dos auxiliares técnicos, previstos no Código de Processo Civil, que representam as disciplinas e competências sempre a serviço do grande empreendimento, nós 45 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 temos que começar a ter esses atributos intelectuais para poder responder aos quesitos com maior acuidade e rigor. E com isso nós ficamos numa certa solidão. Nosso campo, geralmente, enquanto perito, é de uma solidão extrema. Por que como é que você vai responder a isso tudo? Você se embaralha. Tem a norma legal, tem a norma agronômica, tem a norma que seria própria de um linguista, enfim, nós ficamos geralmente confusos. E na solidão do campo você tem que responder a isso. Então, a indicação para um trabalho de perícia, de laudo, de parecer, ela não é mais como se fazia anteriormente a indicação de terras indígenas. Há uma diferença de procedimento entre o que está sendo colocado agora para povos e comunidades tradicionais e o que foi colocado para as terras indígenas pré1988. Há uma diferença essencial. E o grau de exigência hoje é maior, não tenha dúvida. E a antropologia está sofrendo uma inflexão nisso, porque ela passa a comportar dentro de seu domínio outros elementos e conceitos que ela não abarcava. E fatalmente isso leva a um dissenso cada vez mais acentuado entre os antropólogos. Imagina quem se aferroou a manuais, aprendeu daquele jeito e só consegue trabalhar daquele jeito. As colisões são, então, permanentes e, se você não se recoloca, você vai ficando. E nós temos vivido isso de uma maneira muito intensa em nosso trabalho. E basta, em relação à mesma situação, colocar os dois laudos. Provocaria risos, como diz o Foucault lendo Borges na “enciclopédia chinesa”...12 12 Cf. FOUCAULT, Michel, Prefácio, In: As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. São Paulo: Martins Fontes, 1966. O senhor poderia falar um pouco mais sobre essa diferença entre os laudos antigos da Funai e os laudos e relatórios de hoje? Não creio que possa acrescentar alguma coisa. Os laudos da Funai tinham um modus operandi que funcionava bem para fins burocráticos. Por isso que qualquer um podia ser um “antropólogo”, de tão manualizado que era. Quem é que compunha os GTs de identificação? Às vezes era um “prático” 46 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 que elaborava o relatório. Mas havia um manual para isso. Começava com referências históricas, utilizando certos autores clássicos, utilizando fontes documentais e arquivísticas etc. E agora não é bem assim. Como é que você vai demonstrar que esse quilombo era quilombo desde o século XVIII? Você não tem o documento, você tem que relativizar o documento. Você tem que dar uma ênfase à memória oral. Você tem que relativizar o estatuto jurídico: mostrar que o sistema jurídico do período colonial é distinto do período republicano e é distinto do período monárquico. E muitos interpretam monárquico como colonial. Então, você tem que produzir inúmeras rupturas e, às vezes, as nossas pernas são curtas para as tantas rupturas que esse tipo de empreendimento exige. Agora, seria importante o senhor falar um pouco sobre a Amazônia. Como o senhor vê as recentes incursões do governo federal no sentido de criar um novo corpo de políticas específicas voltadas para a região amazônica, dentre elas a regularização fundiária das ocupações e posses? Eu fiquei muito admirado com as reações oficiais, nessa altura do campeonato. Você imagina: quando nós fomos discutir só quilombo, que seria uma coisa mais “simples”, o argumento prevalecente entre todos os que estavam interessados foi retirar a questão da regularização dos quilombos da Fundação Palmares, porque não havia condições de criar um órgão para tratar especificamente desse tipo de regularização fundiária. E transferir tudo para o Incra, porque o Incra seria o lugar ideal da operacionalidade. Agora, na hora de discutir operacionalidades de ações fundiárias, estão falando em tirar tudo do Incra e colocar num novo instituto de terras para a Amazônia13. Ora, num curto espaço de tempo, de 2003, quando foi essa discussão que gerou o decreto no 4.887, para 2008, ou seja, em cinco anos, nós saímos de uma posição em que o Incra podia tudo para aquela de agora, 13 Na época da entrevista, estava em discussão no Poder Executivo a criação do Instituto de Regularização Fundiária da Amazônia (Irfan), que seria encarregado da regularização de terras na Amazônia legal. Apesar de esse instituto não ter sido efetivamente criado, as discussões em torno de sua implementação resultaram na medida provisória no 458, de 10/2/2009, que dispõe sobre a regularização fundiária das ocupações incidentes em terras situadas em áreas da União, no âmbito da Amazônia legal. As concepções para a regularização fundiária na Amazônia discutidas no âmbito do Irfam estão presentes atualmente no programa Terra Legal do governo federal. 47 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 em que o Incra não pode nada. São muito rápidas as oscilações entre extremos e isso nem sempre significa eficácia ou vontade política de fazer. Eu não concordei em 2003, levantei muitos senões. Agora, após a Adin do PFL, estou defendendo o decreto no 4.887 com unhas e dentes. A minha posição está mudando diante das alterações nas posições conservadoras. Minha posição mudou diante do novo contexto. E, nessa nova discussão, me vejo defendendo algo que antes era indefensável. Tenho vivido os absurdos desses deslocamentos extremos! Porque, de certa maneira, esse Instituto de Regularização Fundiária da Amazônia, o Irfam, ele seria pré-decreto no 4.887/2003 dos quilombos, seria reconhecer tudo sem Incra. É a situação que existia antes da questão dos quilombos ser passada para o Incra. E me vem as indagações: Se havia essa disposição e essa vontade política institucional, por que não foi feito? Antes, a crítica incidia sobre um ritmo lento. Tudo foi passado para o Incra sob o imperativo da agilização e, como sabemos, morreu pela boca. E agora? Temos que reproduzir todas as perguntas de 2003. Porque em 2003 o Incra tinha sinal positivo e hoje, aparentemente, tem sinal negativo do poder central. Acho que nós temos que colocar isso no tempo e pensar nos efeitos das variações. Isso é essencial para se ter uma visão crítica. Senão estamos fadados a só acompanhar as nuances burocráticas e as cisões dentro dos aparatos dominantes. Assim, o trabalho científico sistemático vai a reboque desses que estão refletindo pelas contingências. Nosso procedimento tem mais fôlego porque há muitos anos que estamos trabalhando sistematicamente com essas questões agrárias. Não temos, pois, que ficar prisioneiros das circunstâncias ou reféns dos deslocamentos políticoadministrativos e das repetidas mudanças de competências orientadas pela imaginação burocrática. Temos que ter outra visão e acho que aí está nossa dificuldade, até em termos da nossa associação, de fomentar e fazer esse debate de maneira 48 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 aberta, pública. Isso não está sendo feito. Temos sido impelidos a discutir caso a caso, situação por situação. O que ressalta nessa situação de agora é grilagem. Vamos todos discutir grilagem! Ninguém está discutindo terra de quilombo, ninguém está discutindo regularização fundiária de Resex. Agora, toda discussão feita é em torno da grilagem. No fundo, o que se procura hoje é acelerar a titulação de terras. Nesse sentido, não é muito diferente de 1984, embora tenha, entre 1984 e agora, o Consenso de Washington e a inspiração neoliberal. Sim, o problema concerne à reestruturação do mercado de terras. Por isso, estão voltados para transformar tudo rapidamente em mercadoria, neutralizando fatores étnicos e obrigações sociais. Se você for consultar o número de grupos norte-americanos e europeus que estão atuando na corretagem imobiliária no Brasil, irá verificar que se trata de um número elevado. Posso te enumerar esses grupos como vinculados à Brazil Iowa Farms LLC, à Ag. Brazil Inc. (que tem sede no Missouri), à Sotheby’s – casa de leilões britânica. O mercado de terras encontra-se aquecido. A pressão sobre terras indígenas e quilombolas tem aumentado. Há uma tensão social que força a uma flexibilização dos direitos territoriais e questiona os direitos étnicos. Essa ordem de fatos coloca para nós a relevância de uma discussão na ABA e um tema de discussão dentro do Incra e dentro da Procuradoria da República, com os antropólogos. Nesse contexto internacional, nós temos vários discursos em jogo. Ao mesmo tempo em que o saber tradicional é apresentado como “moeda de troca” no contexto da geopolítica mundial, o posicionamento recente de alguns integrantes do governo brasileiro é considerar a atividade das comunidades tradicionais como uma “eficácia relativa” no sentido de preservação da natureza etc. Não parece haver aí um descompasso entre a postura do Estado brasileiro e as perspectivas internacionais sobre o tema? 49 R UR I S 14 Cf. Por dia, estrangeiro compra seis Mônacos de terra no país, Folha de S.Paulo, 7/7/2008, Caderno Brasil. | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 O que está em jogo hoje – e eu vejo isso de forma clara, é uma nova reestruturação formal do mercado de terras. A demanda tem aumentado, sobretudo no cerrado e na Amazônia. Inclusive, porque um dos setores norte-americanos que mais sofreu com a atual crise econômica foi o setor imobiliário. Parece existir uma tendência de realocação de ativos. As empresas americanas de corretagem têm interesse efetivo no mercado de terras. São eles que estão comprando terras aqui e as terras viraram um fator de atração desse capital volátil. Ilustra bem isso o dado de uma reportagem que saiu recentemente: de agosto do ano passado até agora, “Brasil vende seis Mônacos por dia para estrangeiros”14. Isso teria sido levantado a partir do cadastro de dados do Incra. Hoje, tem-se também a divulgação de uma avaliação da floresta amazônica estimada em mais ou menos 50 bilhões de dólares, a partir de compra de lotes na região. Essa realidade de “investimentos robustos” é que estaria orientando as iniciativas sobre o mercado de terras na Amazônia. E, diante disso, a ação fundiária oficial parece pálida em demasia. Agora, por outro lado, muitas vezes, são os organismos multilaterais os canais de pressão dos movimentos sociais diante do governo brasileiro. Por exemplo, recentemente, lideranças de dez organizações quilombolas encaminharam à sede da OIT, em Genebra, uma comunicação na qual afirmam que o governo federal não tem respeitado os termos da Convenção 169. O senhor acha que as agências multilaterais podem ajudar a pressionar o governo na efetivação dos direitos sociais e territoriais das comunidades tradicionais? Os organismos multilaterais podem exercer uma pressão relativa, mas isso não é suficiente. E nem é o principal da discussão. É um fator de pressão, mas essa discussão tem que ser travada dentro do Executivo. Caso contrário, vai perdurar 50 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 essa situação que Boaventura de Souza Santos está chamando de “judicialização da política”. Tudo vai para o STF, quando os outros poderes se mantêm inibidos. Mas não é exatamente tudo que tem que ir para o STF! Se o Executivo estivesse demarcando e titulando a contento, se as demarcações e titulações fossem feitas, o quadro poderia ser outro. Agora, se o Incra não demarca, não titula e os conflitos perduram, tem-se o risco de mais e mais ações avolumarem-se no STF. Imagine: não titula e vai para o STF. Que fosse, então, para o STF depois da titulação. Como está, parece-me insustentável a médio prazo. E tudo sugere procrastinação, porque o instrumento está sendo questionado. Ora, questionar o resultado do instrumento é uma coisa, outra bem diferente é questionar o instrumento. E como é difícil defender um instrumento que demarcou praticamente nada. Essa responsabilidade é do Executivo. E as discussões têm que ser travadas no âmbito do Executivo. Agora, acho que poderíamos encerrar falando um pouco do projeto. Queria que o senhor nos contasse mais detalhadamente das realizações do Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia e também seus planos para o futuro do projeto... A partir de 2000, nós começamos a fazer algumas reflexões sobre o esforço cada vez maior dessas identidades coletivas objetivadas em movimentos sociais – para manter a independência e autonomia dos grupos. É justamente quando começam a se formar as representações. Formam-se as organizações das quebradeiras de coco babaçu. A Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais) se forma um pouco depois e, ainda, um pouco depois o MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens). Inicia a ganhar corpo tudo aquilo que tinha sido conquistado em 1989, 1991 e 1992, enfim, nos períodos anteriores. Então, fomos percebendo que essas identidades emergentes estavam ganhando muita 51 R UR I S 15 Peconheiros: denominação utilizada por comunidades que utilizam a peconha – um anel de tiras de envira – na coleta de cachos de açaí. 52 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 força e as formas organizativas objetivadas nesses movimentos começaram a fazer outro tipo de esforço que as tornaram mais visíveis. E, ao notar isso, percebemos que alguma coisa de novo estava ocorrendo. E fizemos uma primeira experiência com as quebradeiras que se revelou bastante profícua. Nós fizemos um mapeamento social com as quebradeiras, percorrendo as áreas e vendo que elas estavam com grande dificuldade para se impor. Elas foram se impondo pela via de uma lei estadual, de uso comum dos babaçuais, que nem estava previsto na Constituição, mas reforçava um pleito legal. E começamos a perceber isso também de uma maneira mais dilatada: ciganos, piaçabeiros, peconheiros15, enfim, várias mobilizações que não estavam passando por partido político, que não estavam passando por agremiações políticas conhecidas, mas eram o reforço de formas identitárias. E começamos a achar que poderíamos criar um projeto científico para traduzir isso. Entre 1999 e 2000, quando produzimos os mapas da cidade de Belém, elaborei o projeto e fiquei até 2003 tentando viabilizá-lo. Em 2004, Joaquim Shiraishi, Cynthia Carvalho Martins e eu iniciamos esse trabalho com as quebradeiras e, em 2005, já conseguimos um aporte maior por parte da Fundação Ford e pudemos iniciar esse trabalho em uma escala maior. Começamos essas cartografias antropológicas pela Amazônia. No fim de 2005, já estávamos com solicitações diversas. Muitos grupos emergentes estavam se colocando na cena política como os faxinais, do Paraná, e as comunidades de fundos de pasto, da Bahia. E começamos a perceber que havia outras realidades em jogo. E o Projeto Nova Cartografia Social começou a tentar dar conta do mapeamento social e da diversidade que estava em jogo e das formas organizativas que lhes eram correspondentes. Os instrumentos colocados nessa demanda era que “nós queremos ter nosso mapa” e “nós queremos uma forma de nos anunciar”. Utilizamos o pressuposto da autodefinição e R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 daquilo que é relevante para o grupo e nos afirmamos nesses exercícios que poderão levar a uma síntese. De uma maneira breve, a história do projeto é mais ou menos essa. A diversidade social confronta a ênfase desmedida na biodiversidade. Quilombolas, seringueiros, quebradeiras de coco babaçu, piaçabeiros, peconheiros, artesãos, pescadores, castanheiros, seringueiros, ribeirinhos e moradores de lagos passaram a se colocar publicamente. Estamos também percebendo que tais identidades não são exclusivas. Um quilombola pode ser um ribeirinho. Isso não é excludente! A quebradeira pode ser ribeirinha, pode ser quilombola. O ribeirinho pode ser pescador. O pescador pode ser quilombola. Estamos, assim, acompanhando as combinações tal como os agentes sociais e as realidades localizadas se nos apresentam. O fazemos sem ficarmos tentados por um exercício de enquadrálos em algum esquema de oposições simétricas e de articulações perfeitas. Não, nós estamos a trabalhar as designações tal qual se nos apresentam nos trabalhos de campo. O projeto trabalha sempre com autodefinição, recusa a personificação do coletivo e trabalha com o que os próprios agentes sociais consideram relevantes. Assim, cartografamos o que é relevante para eles! E não só cartografamos, mas ensinamos a eles as técnicas de cartografar aquilo que é relevante para eles. E nos colocamos como uma equipe que só interfere incidentalmente, e em último caso. Diferenciamo-nos, nesse sentido, de organizações e instituições de ações aplicadas. Nós não fazemos antropologia aplicada. Nós estamos propiciando elementos para uma reflexão sobre etnicidade, sobre os novos padrões de relação política e sobre os processos diferenciados de territorialização que se caracterizam hoje na sociedade brasileira. Nós temos elaborados, nessa ordem, os fascículos – evitamos o termo “cartilha” para evitar justamente qualquer alusão à noção de manual – e cada grupo pode fazer, inclusive, mais de um fascículo. Afinal, os mapas são situacionais. Um 53 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 pode mesmo desdizer o outro. As quebradeiras, por exemplo, produziram seis fascículos. A situacionalidade impõe uma certa dinâmica. E também começamos a trabalhar com vários grupos que nem sequer eram cogitados, mas também estavam sendo colocados à margem. E começamos a inovar e ampliar essas formas. Movimentos sociais que agrupam deficientes físicos, movimentos de orientação sexual, de catadores, tudo isso passou a fazer parte do escopo do projeto. Nós não estamos preocupados em colocar um limite, em ter uma rigidez metodológica, confundindo rigor com rigidez. Nós estamos apostando nas diferentes formas organizativas que a emergência tem assumido e que levam à multiplicidade de identidades coletivas organizadas em movimento. ___________ ALFREDO WAGNER BERNO DE ALMEIDA – Mestre (1978) e doutor (1993) em antropologia social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1993), atualmente é professor colaborador da Universidade Federal do Amazonas e coordena o Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia (Fundação Ford/PPGSCA/Ufam). A entrevista foi realizada na sede do projeto, na cidade de Manaus, no dia 18 de setembro de 2008. 54 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 DE INDÍGENAS A CAMPESINOS MIRADAS ANTROPOLÓGICAS DE UN QUIEBRE PARADIGMÁTICO MARIANO BÁEZ LANDA R E S U M E N Este artículo busca exponer y discutir los cambios paradigmáticos que experimentó la antropología mexicana en su enfoque sobre los pueblos indios y sus miembros, específicamente las transformaciones en los cuerpos teóricos y los discursos de antropólogas y antropólogos en México respecto a los sujetos del mundo rural, especialmente el gran viraje experimentado durante las décadas 1970-1980, donde el corpus teórico y práctico de Gonzalo Aguirre Beltrán fue sustituido por los paradigmas marxista y del dependentismo marginalista, tanto en los espacios de la academia como en las políticas públicas. El concepto antropológico de indio o indígena fue sustituido por el económico-sociológico de campesino habitante de áreas deprimidas y marginadas, reflejando poderosamente la influencia de paradigmas provenientes de la sociología, la economía agrícola y la salud pública sanitarista que intervinieron en el diseño y aplicación de acciones asistenciales hacia el medio indígena a partir de los años setenta. Los indios mexicanos renunciaron en muchos casos a, o les fue negada, su condición etnológica de población étnica y culturalmente diferenciada, teniendo que adoptar la condición sociológica de campesinos pobres y marginados, como una estrategia de interlocución con el poder gubernamental y sus agencias de asistencia, para intentar recuperar la tierra o alcanzar beneficios que ofrecían las políticas de compensación social. Será la rebelión zapatista, protagonizada por indios mayas en el estado de Chiapas en el sureste mexicano, lo que logre reposicionar a los pueblos indios en su condición étnica y cultural frente al Estado y a la propia antropología. P A L A B R A S - C L A V E México; indios; campesinos; indigenismo. ABSTRACT This article seeks to expose and to discuss the paradigmatic changes that Mexican anthropology experienced in its approach to Indian peoples and their members, and specifically the transformations in the theoretical corpus and discourses of anthropologists in Mexico with regard to rural world subjects. We particularly focus on the great turn experienced during the decades 1970-1980, when Gonzalo Aguirre Beltrán’s theoretical and practical corpus was replaced with the paradigms of marxism and of marginality and dependence theory, both in the academic space and in public policy. The anthropologic concept of Indian or aborigine was replaced by the economic - sociological one of rural inhabitant of depressed and isolated areas, reflecting powerfully the influence of paradigms from 55 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 sociology, agricultural economics and public health that intervened in the design and application of welfare actions directed towards the indigenous people since the seventies. The Mexican Indians resigned in many cases to their ethnological condition of ethnically and culturally differentiated populations, or this condition was denied to them. They were led to assume the sociological condition of poor and isolated peasants, as a strategy of dialogue with the governmental and its welfare agencies, in order to try to recover their land or to reach benefits that were offered by the policies of social compensation. Only the zapatista rebellion, led by Mayan Indians in the Chiapas province, in the south-eastern Mexico, will manage to reposition the Mexican Indian peoples into their ethnic and cultural condition vis-àvis the State and anthropology itself. K E Y W O R D S México; indigenous people; peasants; indigenismo. MIRADAS Y PARADIGMAS En la Revolución Mexicana, Emiliano Zapata encabezó un proyecto indio y campesino que luchó por la recuperación de la tierra, concebida como un territorio histórico‑cultural, que permitiera a las comunidades indígenas mantener, conservar y desarrollar su propia cultura. Por el contrario, el constitucionalismo encabezado por Venustiano Carranza y Alvaro Obregón, al cabo el proyecto triunfante, contempló a la tierra, y no a los indios, como un mecanismo productivo que permitiría desarrollar el nuevo país. La concepción ideológica del México mestizo, revolucionario y nacionalista del siglo XX, se apropió de la existencia de un pasado indio glorioso y con valores positivos. En cambio, la existencia de los indios contemporáneos demandaba ser transformada e incorporada a la nueva vida nacional, que los requería en calidad de trabajadores. Manuel Gamio (1883-1960), fue el primer encargado de la Dirección de Estudios Arqueológicos y Etnográficos del nuevo gobierno mexicano en 1917, que dependió del Ministerio de Agricultura. Gamio fue precursor indiscutible de la antropología aplicada en México, y de los estudios regionales con perspectiva interdisciplinar referidos a áreas culturales. Al fundarse la citada Dirección, subrayó la necesidad de contar con personal 56 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 especializado en investigaciones sociológicas, antropológicas y etnológicas, que desarrollaran estudios integrales, etnografías actualizadas y profundas, así como conocimientos amplios de las relaciones interétnicas (1918). El proyecto Teotihuacan, que durante ocho años (1916-1924) dirigió y desarrolló en el área del Altiplano Central, muy cerca de la ciudad de México, combinó arqueología, etnografía, antropología y desarrollo de la comunidad, configurando así el primer formato de investigación social regional de las áreas rurales mexicanas (cfr. GAMIO, 1922). El proyecto de Gamio era un programa oficial de cambio cultural inducido, que utilizaba la educación elemental en idioma castellano, y la acción asistencial en los terrenos de la salud, la alimentación y la capacitación técnica como principales armas, pero al mismo tiempo reconocía que la modernización rural, no podía imponerse llanamente, sino que requería ser adaptada a las condiciones reales y específicas de cada región y cultura indígena. El objetivo central de este proyecto era aculturar, asimilar al indio a un modo moderno de vida y la clasificación cultural tenía por objeto, determinar el grado y forma que adquiría el mestizaje frente a la certeza de que las comunidades indias vivían etapas evolutivas inferiores a las sociedades mestizas y occidentales. El México revolucionario, para ser moderno y eficiente, requería por lo tanto de la convergencia y fusión de razas y manifestaciones culturales, de unificación lingüística, y de un equilibrio económico de los elementos sociales (1922). Las aplicaciones del aparato conceptual indigenista, surgido del involucramiento de la antropología y de la sociología rural, como herramientas de apoyo a las tareas de integración nacional, definieron una disciplina que obligadamente buscaba un sentido práctico y de aplicación inmediata al medio indígena pero que, por otro lado, trataba de organizar su campo disciplinar a través de estudios integrales, dotados de una dimensión histórica, apoyada primordialmente por la arqueología; de perfiles etnográficos amplios y detallados, así como de un método 57 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 estadístico sólido, que permitiera acceder a grandes conjuntos de datos y visualizar tendencias. Manuel Gamio (1916, 1972, 1979) apoyaba la integración socioeconómica y cultural de los grupos indios en la vida nacional mientras que Moisés Sáenz (1936, 1939) prefería impulsar el cambio socioeconómico, reforzando la conciencia rural y la autodeterminación india. Lombardo (1976) como ideólogo de un socialismo a la mexicana estaba por un rápido desarrollo económico, que fomentara organización y conciencia proletaria en el campo, sin abandonar la necesidad de reconocer una cierta autonomía regional para los pueblos indios. Los antropólogos mexicanos hasta la década de 1970, fueron profundamente influenciados tanto por el particularismo histórico de la escuela boasiana, como por la antropología norteamericana funcionalista de mediados del siglo XX. Buscaron la delimitación de áreas culturales, y promovieron la elaboración de cientos de monografías etnográficas de los grupos indios del país, para obtener los datos empíricos que les permitiera desarrollar la comparación de rasgos culturales, de procesos de intercambio y difusión cultural. Sin embargo, el estudio antropológico no podía ignorar que en una gran parte del agro mexicano, el mestizaje de las tradiciones culturales india y europea, había generado pueblos que ya no eran indios puros, pero que tampoco podían ser clasificados como occidentales. Esta es quizá, una de las aportaciones más importantes de los proyectos de investigación auspiciados por la Carnegie Foundation, que se hicieron en México y Centroamérica bajo la coordinación de Robert Redfield y Sol Tax, entre las décadas de 1930 y 1940, así como los que posteriormente financió la Smithsonian Institution en Michoacán y Chiapas (HEWITT, 1988). Para Redfield por ejemplo, las llamadas comunidades folk representaban el tránsito entre los mundos rural y urbano, entre un mundo estructurado y regido por fuertes tradiciones 58 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 culturales, y otro que tendía a disolverlas e integrarlas a la modernización. Estos pueblos pasaron a ser estudiados como conjuntos funcionales con una lógica propia, donde el todo y sus partes debían estudiarse en sí mismos, en un momento y lugar determinados. Desde esta perspectiva, el estudio histórico era improcedente, no solo por el enfoque sincrónico que adoptaban, sino por la afirmación de que no existían fuentes escritas, que registraran a esos pueblos sin historia. El funcionalismo privilegió los llamados estudios de comunidad, como el nivel que explicaba la funcionalidad de los elementos culturales locales. Por aculturación entonces, los funcionalistas entendieron la adaptación de elementos externos a la cultura local, dentro de una lógica funcional (REDFIELD, 1930). En alguna forma, estos estudios sobre el continnum folk-urbano son precursores de aquellos que se orientaron al análisis de los procesos de modernización. Quizá uno de los aspectos más vulnerables de este paradigma fue su incapacidad para proporcionar herramientas de análisis a la antropología aplicada, para poder entender y explicar los aspectos políticos del cambio social y cultural. El cambio, desde este enfoque, era el proceso de adaptar la modernización al funcionamiento de la cultura, satisfaciendo necesidades originales o creando nuevas para ser satisfechas. En diálogo con el particularismo histórico y el funcionalismo es que surge el paradigma del indigenismo moderno en México encabezado por Alfonso Caso (1896-1970) y Gonzalo Aguirre Beltrán (1908-1996). Alfonso Caso asumió que este indigenismo de post-guerra, tenía que convertirse en una política de Estado, que tuviera como meta, una vez más, la integración nacional. Tal política la resumió como un proceso de aculturación planificada, para introducir y/o conservar valores positivos en la comunidad india, y desterrar los negativos que se opusieran al desarrollo. La orientación positiva de las metas del indigenismo se refrendaba en la búsqueda de la igualdad entre indios y mestizos. Caso 59 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 formuló catorce puntos desde la dirección del Instituto Nacional Indigenista (INI), que identificó como las bases de acción indigenista, donde rechazó de principio, siguiendo a Gamio, que la cuestión india fuera un problema racial, ya que reconocía que a mediados del siglo XX la mayoría de la población mexicana ya era mestiza. Manifestó también su apego al principio de unidad psíquico-biológica de la humanidad, reconociendo que existía igualdad en estos campos entre indios y mestizos. Señaló a la comunidad y no al individuo, como el actor central del campo indigenista, y a la aculturación, como el vehículo que lograse un nivel de igualdad con los trabajadores rurales y urbanos, para buscar juntos una emancipación económica. La acción indigenista debía ser planeada a nivel regional, y basada en un relativismo cultural y democrático, que implicaba el respeto y conservación de tradiciones y costumbres, que favorecieran el etnodesarrollo, ya que se buscaba la participación de los indios en todas las acciones indigenistas, rechazando la tutela y el paternalismo de cualquier institución. No obstante, este indigenismo tenía como uno de sus objetivos centrales transformar al indio en campesino, es decir, transformar a la comunidad indígena en una comunidad rural más del país impidiendo su segregación y aislamiento. El proceso de aculturación pretendía, en principio, dar un trato diferencial a los indios pero, orientado a lograr un status standard para toda la población rural (CASO, 1962). Con los conceptos de región de refugio, región intercultural, proceso dominical, Aguirre Beltrán pasa a definir al indio ya no como el superviviente de una cultura en declinio, sino como un habitante rural que es explotado como casta en medio de un sistema capitalista (1953, 1957, 1965). Su teoría de la integración fue entendida como homogeneización étnica, cultural, social, económica y política, que podía ser alcanzada a través de instrumentos como el mestizaje, el bilingüismo, la aculturación y la redistribución de dignidad, riqueza y poder. La teoría de las regiones de refugio concibió originalmente la existencia de 60 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 espacios de contacto cultural y de explotación colonial, de la sociedad ladina (mestiza) sobre los grupos indios. Estos espacios se encontraban regidos por un centro urbano ladino, que dominaba a comunidades indias que le circundaban. La teoría de la investigación-acción asumió la perspectiva de la ciencia aplicada, donde la investigación debía conducir la aplicación concreta de medidas de redención para el indio. A pesar de las permanentes reticencias en el campo académico, respecto a la obra y a la trayectoria de Gonzalo Aguirre Beltrán, la antropología mexicana logró superar, gracias a él, al funcionalismo clásico al desarrollar su teoría respecto a la naturaleza de las relaciones interétnicas en las regiones de contacto entre las comunidades indias y las poblaciones mestizas, lo que denominó regiones de refugio (1965). Incorporó el análisis del proceso histórico, para explicar tales relaciones, en unidades de observación acotadas por la perspectiva regional, y contribuyó sustancialmente a diseñar los instrumentos mismos de la moderna acción indigenista. A partir de una breve estancia en los Altos de Chiapas, Aguirre Beltrán llegó a la conclusión de que la territorialidad de las comunidades indias se encontraba referenciada al espacio municipal, y que sus procesos de identidad se concretaban por oposición y cierta hostilidad entre ellas. Era la presencia de una o varias ciudadesmercado, lo que regulaba y enlazaba las relaciones entre indios y mestizos y, por lo tanto, el sitio obligado para instalar los nuevos centros coordinadores de la acción indigenista (1988, p. 18). Los problemas comenzaron a manifestarse cuando este análisis se mostró insuficiente para ligar los estudios de las llamadas regiones de refugio en conexión con el sistema nacional e incluso mundial. El propio Aguirre Beltrán intentó explicar esta limitante, señalando el complejo y sensible relacionamiento del indigenismo con el poder estatal, y por el peso de conflictos mayores como la cuestión agraria, y la existencia y operación de estructuras de poder que sustentaban al propio estado y al partido oficial. 61 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Todo indica que la acción indigenista que partió de los primeros centros coordinadores del INI, no logró quebrar las estructuras de dominio sobre las etnoregiones, ni desarrollar procesos de autogestión, autonomía y desarrollo social. Una gran interrogante para esta época, es por qué las fundaciones extranjeras ignoraron estas cuestiones, y continuaron financiando los estudios monográficos de comunidad y de recolección de datos culturales. Probablemente, parte de la respuesta se encuentre en que la teoría de Aguirre Beltrán que aún estaba procesándose, y en los paradigmas de la cultura y la función, en el mundo antropológico tanto de los Estados Unidos como México que conservaban vigencia. Fue el estructuralismo histórico el paradigma que transformó en México la visión etnológica del indio por la sociológica de campesino; abandonó el estudio de regiones indígenas, exclusivamente limitadas por criterios culturales y consideradas aisladas de la sociedad mayor, para desarrollar estudios regionales que analizaran la relación entre el campo y la ciudad. Abandonó también el criterio de considerar a los elementos mentales como principal obstáculo al cambio sociocultural, y concedió mucho más atención a la relación entre medio ambiente, tenencia de la tierra, tecnología productiva y organización social. Quizá el autor mexicano que mejor reflejó esta influencia fue Pablo González Casanova (1965), quien partiendo del concepto de colonialismo interno aseveró que el problema indígena era esencialmente la relación de dominio y explotación cultural de la sociedad nacional sobre los indios, a través de una red de relaciones sociales asimétricas, derivadas de una situación colonial. De esta forma las comunidades indias pasaron a ser enfocadas como colonias internas, como sociedades colonizadas, dentro de los límites de un Estado nacional, que se encontraba igualmente sujeto a procesos de colonización y dominio de mayor escala (GONZÁLEZ CASANOVA, 1965, p. 103-108). Junto con las aportaciones de González Casanova, las regiones de refugio 62 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 de Aguirre Beltrán, caracterizadas básicamente como áreas de contacto intercultural, donde una ciudad-mercado mestiza gobierna una constelación de comunidades indias, pasaron a ser identificadas por Cardoso de Oliveira (1964) como espacios de fricción interétnica, donde se materializa un proceso de dominio global. Cardoso de Oliveira asume la responsabilidad de estudiar a fondo las relaciones interétnicas, y las orientaciones que toma el proceso de aculturación entre el mundo indio y el mundo de los blancos, y concluye que el sistema interétnico está compuesto por subsistemas societales, con la misma lógica de relación que tienen entre sí las clases sociales y la sociedad global. De esta forma la llamada fricción interétnica se encuentra ubicada en el terreno de la lucha de clases, y por tanto sus relaciones se encuentran caracterizadas fundamentalmente por la presencia del conflicto (1978, p. 83-131). Rodolfo Stavenhagen (1969) vió en la revolución mexicana de 1910‑1917, el origen de una gran diferenciación social en el campo, donde se distinguían dos géneros de agricultura, dos modos de vida. Desde esta perspectiva, en el mundo campesino se desarrollan relaciones de producción semicapitalistas, ya que no es dominante su carácter asalariado y la carencia de medios de producción, sino su articulación a un mercado dominado por la usura o la renta. En el mundo de la agricultura capitalista, las relaciones de trabajo son dominantemente asalariadas, y la producción se orienta al mercado de exportación. Las comunidades campesinas no se encuentran aisladas, sino que mantienen una relación con los centros urbanos. La población campesina presenta una diferenciación social en clases, las que se establecen a partir de analizar la estructura de la tenencia de la tierra (propiedad y extensión). La sociedad agraria, según Stavenhagen, está compuesta básicamente por una clase campesina numerosa de jornaleros sin tierra (incluidos aquí los indios), que representan un potencial de demandas sociales y económicas, y que constituyen un foco rojo en los países en vías de desarrollo. 63 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Ricardo e Isabel de Pozas (1971), con un enfoque marxista ortodoxo, definieron claramente que el mundo indio constituía una intraestructura dentro de la estructura capitalista mexicana, pero que el lugar que ocupaban los indios en las clases sociales de México, era indiscutiblemente en las filas del proletariado. No obstante, anotaron que las relaciones sociales del mundo indio constituían una contradicción secundaria frente a las que privaban en la sociedad capitalista, y que el cambio social al interior de las comunidades indias dependería del éxito que tuviera ésta para incorporarlas plenamente a su dominio económico. De esta manera, para los Pozas, la participación del indio en la producción económica capitalista determinaba su capacidad de cambio. Roger Bartra (1974) sostuvo que los campesinos pertenecían a un modo de producción distinto al capitalismo, una forma económica mercantil simple. Ambos modos de producción se encontraban articulados en la esfera de la circulación, bajo la hegemonía capitalista. Esto era porque la producción campesina es resultado de unidades familiares, donde no existe el salario y por ende explotación. Finalmente el campesino es explotado, pero en su condición pequeñoburguesa. Los campesinos integran una sola clase al interior del modo de producción mercantil simple; mientras el capitalista tiene dos clases fundamentales: burguesía y proletariado. Los campesinos integran una formación económica subcapitalista, tienden a desaparecer en el capitalismo y devenir en proletarios rurales, como resultado del propio desarrollo capitalista. Luisa Paré (1977) interpretó el campo mexicano como una articulación de formas de producción no capitalistas con el modo de producción capitalista. El capitalismo descampesiniza paulatinamente a los campesinos transformándolos en proletarios. Para esa época, la autora sostenía que la tendencia descampesinizadora había generado un tipo de campesino que podía definirse como semiproletario, por su carácter de 64 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 productor independiente y por su condición de asalariado en determinadas épocas del año. Las clases sociales en el campo son definidas entonces a partir de la tenencia de la tierra y el monto y procedencia del ingreso. Por su lado, los autores identificados como campesinistas durante la década de 1980 presentaron por lo menos dos grandes vertientes: – la del análisis del campesinado a través de sus movimientos, de su actitud hacia el cambio social y de su relación con la propiedad (BARTRA, 1976); – la que sostenía la existencia de una economía campesina, que puede convertirse en opción transformadora de la agricultura mexicana, si recibe el apoyo del Estado y se capitaliza (ESTEVA, 1980; GORDILLO, 1988). Para la primera corriente, los campesinos practican formas precapitalistas de producción, que han sido penetradas parcialmente por el capitalismo. Así que son explotados, mediante la transferencia del valor de su producción a los sectores dominantes de la sociedad, o bien como asalariados rurales. Se destaca el potencial revolucionario de los campesinos, no obstante su relación de propiedad con la tierra. Se construye un esquema de clases sociales para el campo mexicano, que toma en cuenta la producción anual, extensión de la propiedad, uso de tecnología, destino principal de la producción, empleo de fuerza de trabajo, actitud ante el cambio social. Aquí los campesinos no desaparecen, sino que pueden ser los protagonistas del cambio social en los países del Tercer Mundo. La otra corriente sostiene que el sector comunero-ejidal constituye potencialmente una opción económica diferente a la agricultura comercial de exportación. Este sector integra una economía campesina, que requiere de capital y tecnología, para regenerar una economía capitalista con marcado dominio 65 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 estatal. Aquí los campesinos no desaparecen o simplemente se proletarizan, sino que pueden ser un factor de reorganización económica (cfr. FEDER, 1977, 1978). Fueron así las décadas de los años setenta y ochenta, donde los antropólogos mexicanos debatimos más en torno a la persistencia o desaparición de los indios y campesinos en la sociedad capitalista. Se privilegiaron los aspectos económicos y políticos de las sociedades y grupos rurales, quedando en segundo plano lo cultural. La explicación radicaba en que se tenía la certeza de que había que cambiar la estructura productiva, para después cambiar valores, ideas, mentes. El abanico de la llamada nueva antropología se desplegó entonces entre los estudios que reconocían la inevitable expansión capitalista, y el surgimiento consecuente de condiciones de crisis y revolución (BARTRA, 1974; DÍAZ POLANCO, 1977, 1985; PARÉ, 1977), donde los campesinos serían exterminados; hasta los que, por el contrario, reconocían a la comunidad campesina como la fuente de procesos de resistencia, adaptación y refuncionalización de tradiciones culturales en el ámbito capitalista (WARMAN, 1980; ESTEVA, 1980; GORDILLO, 1988). Más adelante se dejó de hablar de refuncionalización, y en su lugar la antropología se ocupó del etnodesarrollo, la organización autogestiva y la sustentabilidad de la agricultura tradicional, como referencias alternativas al desarrollo industrial (STAVENHAGEN, 1988; TOLEDO, 1981). Al extrapolar los estudios antropológicos al análisis exclusivo de las dimensiones económica y política del mundo rural, nuestro campo disciplinar se desindianizó para campesinizarse, es decir, la antropología mexicana, atravesada por las tradiciones del particularismo histórico-cultural y del funcionalismo en un primer momento, fue sustituida por una antropología desarrollista, que se vio influida por los paradigmas de la sociología rural, el marginalismo y la economía agrícola, que comenzaban a impulsar fuertemente los llamados estudios 66 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 rurales. El paradigma marginalista, que había surgido de los teóricos dependentistas de la Cepal, donde participaron economistas y sociólogos como Raúl Prebish (1971) y Fernando Henrique Cardoso (1969), tuvo una especial influencia dentro de las agencias gubernamentales de desarrollo durante la administración de los presidentes Echeverría (1970-1976) y José López Portillo (1976-1982) donde logró desplazar la teoría de Aguirre Beltrán, que había sido construida expresamente para las condiciones nacionales. Las experiencias de la Coordina ción General del Plan Nacional de Zonas Deprimidas y Grupos Marginados (Coplamar) y del Programa Nacional de Solidaridad (Pronasol), entre 1977 y 1994, mostraron hasta donde aquel nuevo indigenismo de mediados de siglo había sido engullido por la descentralización de la administración pública federal, que trasladaba a manos de los gobiernos de los estados, dinero, personal, equipo e instalaciones para encargarse ahora de los marginados, concepto que englobaba sin distinciones a la población que carecía de los más elementales servicios, no tenía empleo seguro y poblaba la geografía de la pobreza extrema donde se encontraban también los pueblos indios. DEL INDIGENISMO AL ZAPATISMO Ó EL RETORNO A LA CULTURA Con el levantamiento zapatista de 1994, muchos antropólogos y sociólogos que habían vaticinado la transformación de indios y campesinos en proletarios rurales, mudaron de opinión. Algunos autores (MEJÍA y SARMIENTO, 1987) consideran que las luchas indígenas reflejan las demandas que la población nacional expresa, pero que en algunos casos se tiñen con un punto de vista étnico-cultural. Otros como Bonfil Batalla (1987) sostienen que la lucha india es el resultado de un renovado esfuerzo de los grupos indios por llevar adelante todo un proyecto civilizatorio que sirva como alternativa sociocultural a las sociedades 67 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 mestizas. Otras voces expresan (LÓPEZ Y RIVAS, 1995, 1996; GONZÁLEZ CASANOVA, 1996) que las luchas indias están generando un movimiento que enfrenta al neoliberalismo y abre cauces a procesos profundos de democratización y cambio social para las sociedades en su conjunto. De la imagen quasi-socialista, que diera la política agraria del sexenio cardenista en el período 1934-1940, las administraciones de Salinas y Zedillo mostraron un viraje de 180 grados. Partiendo de que México, para insertarse en la reconfiguración de la economía mundial, como economía global sustentada en el libre cambio, debía incrementar la producción y la productividad, para lograr niveles de eficiencia y calidad, que le permitieran competir en los mercados internacionales. El Estado mexicano de los años noventa proclamó el fin del reparto agrario, de las empresas estatales y paraestatales, del control sobre las áreas estratégicas de la economía, de la soberanía sobre los recursos naturales como el petróleo, para convertir a México en el país modelo del proyecto neoliberal. Sin embargo, este sueño celosamente alimentado y cuidado por casi cinco años, que culminaría con la puesta en marcha del TLC ó Nafta (Tratado de Libre Comercio para la región de Norteamérica) el primer día de 1994, despertó en medio del levantamiento de un ejército de indios mayas, en una de las regiones de México, económica y socialmente más carente y, paradójicamente, más rica y diversa, en materia de recursos biológicos, herencia cultural y grupos étnicos. La imagen del México mestizo y cosmopolita, pronto a ocupar un sitio en la sala de la modernidad, fue eclipsada por la del México indio y rural, que continuaba protagonizando procesos de resistencia, adaptación y cambios de larga duración; ayer con la primera revolución social del siglo XX; ahora con la lucha del Ejército Zapatista de Liberación Nacional (EZLN), que amenazaba convertirse en la primera revolución posmoderna del siglo XXI. Una vez más, la reforma agraria y el trato a los indios se convirtió en un binomio altamente explosivo, para 68 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 las actuales condiciones políticas y económicas de México, como resultado de la aplicación de un esquema foráneo de integración regional y global, que amenaza a las tradiciones culturales, que provienen de su mundo rural e indígena. La guerra de Chiapas es un ejemplo reciente de la vitalidad de ese México que responde, desde la dimensión local-regional, a los embates de un capitalismo salvaje de dimensión global. Resultó extremadamente revelador, que las negociaciones entre el Ejército Zapatista de Liberación Nacional y el Gobierno Federal Mexicano hayan iniciado con una mesa de discusión sobre cultura y autonomía indígenas (lamentablemente hasta hoy inconclusa), cuyo contenido reflejaba los mismos términos de la polémica que vio nacer a la antropología mexicana a principios del siglo XX: aculturación o pluralismo. La mesa reunió a viejos y nuevos actores del indigenismo, en una interfase inédita para la historia de las relaciones entre el Estado mexicano y los indioscampesinos, una mesa de negociaciones para pactar una paz justa y digna, con un sector tradicional de la sociedad mexicana, que aparentemente había sido derrotado por el sector modernizador, que ha hegemonizado los gobiernos postrevolucionarios. El alcance de las acciones de los indios zapatistas rebasó el contexto regional y étnico, para impactar a toda la estructura de gestión y dominio del Estado mexicano. Pero además, de forma particular, desafió el desempeño de las ciencias sociales y especialmente a la antropología en su papel de intérprete de la realidad social y de su capacidad aplicativa para asegurar un desarrollo con equidad. En medio de la peor crisis de la sociedad y el Estado mexicano en su historia contemporánea, comunidades de indios se levantaron en armas contra el gobierno y propusieron, como mecanismo para obtener la paz, un diálogo donde participaron múltiples actores de la sociedad mexicana entre ellos los antropólogos de siempre. Paradójicamente, fueron los indios esta vez, pero no los indios de siempre, quienes ganaron un combate a favor de la antropología. 69 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 CONCLUSIÓN Los cambios paradigmáticos que experimentó la antropología mexicana entre 1950 y 1980 parecieran no corresponder a la necesidad de obtener nuevas informaciones y de aplicar nuevas metodologías a problemas concretos. Durante muchos años, la base empírica fue la misma que había generado el particularismo cultural y el funcionalismo, de la que otras posturas o filiaciones paradigmáticas pretendieron extraer nuevas interpretaciones. El desplazamiento del tema indigenista, como eje de la formación antropológica, desplegó un amplio abanico temático que no solo incluyó a los estudios de las sociedades agrarias, sino que incursionó en una enorme diversidad de fenómenos como la migración, los asentamientos periféricos de las ciudades, los procesos políticos, la condición de la mujer, el proceso saludenfermedad, antropología jurídica, economía informal y las relaciones medio ambiente, ecología y desarrollo entre otros, experimentando paulatinamente un retorno a la utilización del concepto de cultura, como piedra angular del análisis específicamente antropológico. Durante los años noventa el debate sobre la cuestión agraria en México abandonó la pretensión de formular una teoría general, que desentrañara el destino histórico de los indios y campesinos en el capitalismo periférico, para asumir la tarea de explorar metodologías de acercamiento a un mundo rural que presenta fuertes cambios, vive profundos desequilibrios y contradicciones, pero que interactúa con la economía global a través de admirables estrategias de adaptación y resistencia. La insurrección zapatista de 1994 rompe con ese desplazamiento teórico-conceptual que la academia de alguna manera había impuesto a los indios, y logra reposicionar su condición étnica para adjetivar sus demandas sociales, políticas y culturales. De hecho también logró con esta hazaña reposicionar el concepto de cultura dentro del campo disciplinar 70 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 de la antropología mexicana y reinsertar en el debate político las demandas de los pueblos indios. Justamente hoy los estudios rurales en México reflejan en muchos casos esa preocupación por los aspectos étnicos y culturales estableciendo interfases con la propia etnología indígena. En el campo de la política y los derechos las reivindicaciones indígenas también han tomado fuerza, pese al desinterés de partidos políticos y legisladores, las propias organizaciones indígenas mantienen presentes demandas en los terrenos de educación, salud, justicia, medio ambiente, diversidad sexual, lo que podríamos identificar como los prolegómenos de una lucha por una ciudadanía étnica y culturalmente diferenciada que, por otro lado, estaría buscando desplazar aquel viejo proyecto nacionalista que soñó con un país de una sola lengua, historia y cultura, y enfrentando la debacle provocada por los fracasos del neoliberalismo. Los indios mexicanos no desaparecieron, han estado en constante transformación y permanente tránsito entre un mundo rural anclado a tradiciones milenarias y los nuevos escenarios planteados por varios ensayos de modernización en la historia, hoy muchos han dejado de ser campesinos para ir habitar en mayor número las ciudades y protagonizar el mayor movimiento migratorio de que tengamos memoria en México: la búsqueda del sueño americano. Finalmente, ese quiebre paradigmático que este artículo pretende analizar tenga hoy una continuación en las estrategias utilizadas por los indios mexicanos para abandonar ese término colonial al que fueron reducidos por los conquistadores y se conviertan en ciudadanos globales. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGUIRRE BELTRÁN, Gonzalo. Formas de gobierno indígena. México: Unam, 1953. ____. El proceso de aculturación y el cambio sociocultural. México: Unam, 1957. 71 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 ____. Regiones de refugio. México: INI, 1965. ____. Panorama de la antropología social y aplicada. In: GAMIO MARTÍNEZ, Manuel. Arqueología e indigenismo. México: SepSetentas, 1968. ____. Formación de una teoría y una práctica indigenista. In: INI 40 años. México: INI, 1988. BARTRA, Armando. Sobre las clases sociales en el campo mexicano. Cuadernos Agrarios, México, n. 1, 1976. BARTRA, Roger et al. Estructura agraria y clases sociales en el campo mexicano. México: ERA, 1974. BASSOLS, Narciso. Obras. México: FCE, 1979. BONFIL BATALLA, Guillermo. México profundo: una civilización negada. México: SEP–Ciesas,1987. ____. Obras escogidas. México: INI–Ciesas–INAH–DGCP– SRA, 1995. CARDOSO, Fernando Henrique. Dependencia y desarrollo en América Latina: ensayo de interpretación sociológica. México: Siglo XXI, 1969. CARDOSO DE OLIVEIRA, Roberto. O índio e o mundo dos brancos. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1964. ____. A sociologia do Brasil indígena. Río de Janeiro: Tempo Brasileiro, UnB, 1978. CASO, Alfonso. Los centros coordinadores indigenistas. México: INI, 1962. DÍAZ POLANCO, Héctor. Teoría marxista de la economía campesina. México: Juan Pablos, 1977. ____. Indigenismo, etnopopulismo y marxismo. México: Línea, 1985. ESTEVA, Gustavo. La batalla por el México rural. México: Siglo XXI, 1980. FEDER, Ernest. Campesinistas y descampesinistas. Comercio Exterior, México, n. 2 y 12, diciembre 1977, enero 1978. 72 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 GAMIO MARTÍNEZ, Manuel. Forjando patria: pronacionalismo. México: Porrúa Hnos, 1916. ____. Programa de la Dirección de Estudios Arqueológicos y Etnográficos. México: Secretaría de Hacienda, 1918. ____. La población del Valle de Teotihuacan. México: SEP, 1922. ____. La investigación de los grupos indígenas mexicanos (1935). In: Arqueología e indigenismo. México: SepSetentas, 1972. ____. Calificación de características culturales de los grupos indígenas (1942). In: Arqueología e indigenismo. México: SepSetentas, 1972. ____. Nuestra estructura social, el nacionalismo y la educación (1935). In: Arqueología e indigenismo. México: SepSetentas, 1972. ____. Algunas consideraciones sobre niveles culturales de los grupos indios y mestizos (1940). In: Arqueología e indigenismo. México: SepSetentas, 1972. ____. La población del Valle de Teotihuacan. México: INI, 1979. GONZÁLEZ CASANOVA, Pablo. La democracia en México. México: ERA, 1965. ____. Democracia y Estado multiétnico en América Latina. México: Pablo González Casanova, Marcos Roitman Rosenmann (Eds.), La Jornada, 1996. GORDILLO, Gustavo. Campesinos al asalto del cielo. México: Siglo XXI, 1988. HEWITT DE ALCÁNTARA, Cynthia. Imágenes del campo. In: La interpretación antropológica rural. México: Colmex, 1988. LOMBARDO TOLEDANO, Vicente. El problema del indio. México: SepSetentas, 1976. LÓPEZ Y RIVAS, Gilberto. Nación y pueblos indios en el neoliberalismo. México: UIA, Plaza y Valdés, 1995. ____. Nación y pueblos indios en el neoliberalismo, 2. ed. 73 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 corregida y aumentada. México: UIA, Plaza y Valdés, 1996. ____. Los retos del movimiento indígena mexicano. México: PRD/LVII Legislatura del Congreso de la Unión, 2000. MEJÍA PIÑEROS, Ma. Consuelo; SARMIENTO, Sergio. La lucha indígena: un reto a la ortodoxia. México: Siglo XXI, 1987. PARÉ, Luisa. El proletariado agrícola en México. México: Siglo XXI, 1977. ____. El debate sobre el problema agrario en los setenta y ochenta. Revista Nueva Antropología, México, CONACyT–Uami, n. 39, p. 9‑26, 1991. POZAS, Ricardo de; POZAS, Isabel H. de. Los indios en las clases sociales de México. México: Siglo XXI, 1971. PREBISCH, Raúl. Hacia una dinámica del desarrollo latinoamericano. México: FCE, 1971. REDFIELD, Robert. Tepoztlan: a mexican village. Chicago: Chicago University Press, 1930. SÁENZ GARZA, Moisés. Carapan: bosquejo de una experiencia. Lima: Gil S. A., 1936. ____. México íntegro. Lima: Torres Aguirre (Imp.), 1939. STAVENHAGEN, Rodolfo. Las clases sociales en las sociedades agrarias. México: Siglo XXI, 1969. ____. Etnocidio o etnodesarrollo, el nuevo desafío. Mundo: Problemas y Confrontaciones, México, año II, n. 1, 1988. TAX, Sol. Ethnic relations in Guatemala. América Indígena, México, Instituto Indigenista Interamericano, v. II, n. 4, 1942. TOLEDO, Víctor Manuel. Ecología, desarrollo y producción campesina. México: [S.N.], 1981. WARMAN, Arturo. Ensayos sobre el campesinado en México. México: Nueva Imagen, 1980. MARIANO BÁEZ LANDA – Professor e pesquisador do Ciesas no México, coordenador do Taller Miradas Antropológicas, <[email protected]>. 74 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 ALGUNOS PROBLEMAS CON LAS CATEGORÍAS “INDÍGENA” Y “MESTIZO” EN EL MÉXICO CONTEMPORÁNEO* ROGER MAGAZINE R E S U M E N En este artículo, señalo algunos problemas con las categorías “indígena” y “no-indígena” o “mestizo” para el estudio del México rural. Planteo la importancia de no confundir la castellanización y otros cambios socioculturales asociados con la modernización con una transformación completa de indígena a mestizo. Cito ejemplos de comunidades rurales que ya no se clasifican como indígenas, pero que se consideran distintas a la población urbana. Además, sugiero que si nos acercamos a estas comunidades sin las suposiciones teóricas que están estrechamente ligadas a las categorías “indígena” y “mestizo”, surgen varias temáticas que han sido ignoradas en las investigaciones sobre el México rural. P A L A B R A S - C L A V E México; etnicidad; indianidad; cambio sociocultural. * Este artículo presenta algunos resultados preliminares del proyecto de investigación Continuidad y Cambio Sociocultural en el México Pos-Indígena, generosamente financiado por la Universidad Iberoamericana. A B S T R A C T In this article, I discuss some problems with the categories “indigenous” and “not-indigenous” or “mestizo” for the study of rural Mexico. I argue that it is important not confuse Hispanicization and other socio-cultural changes associated with modernization with a complete transformation from indigenous to mestizo. I give examples of rural communities that are no longer classified as indigenous, but whose members consider themselves distinct from the urban population. Further, I suggest that if we approach these communities without the theoretical assumptions closely linked to the categories “indigenous” and “mestizo”, a number of topics emerge that have been ignored in current research on rural Mexico. K E Y W O R D S Mexico; ethnicity; indigenousness; socio-cultural change. UN PROBLEMA DE LA CATEGORIZACIÓN1 A primera vista, la cuestión de la composición étnica de la población mexicana parece no presentar mayores problemas. En la imaginación popular tanto como en la visión dominante de las ciencias sociales, la población claramente se divide 1 Algunas de los argumentos e ideas de esta sección fueron desarrollados anteriormente en Robichaux y Magazine (2007). 75 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 entre una mayoría no-indígena o “mestiza” y una minoría indígena. Además, se imagina que esta primera categoría crece constantemente a costa de la segunda por consecuencia de los supuestamente inevitables e irreversibles procesos de modernización y urbanización. Sin embargo, con casi cualquier intento de confirmar o precisar esta categorización empiezan a surgir dudas y ambigüedades. Por ejemplo, el Instituto Nacional de Estadística, Geografía e Informática – Inegi, que lleva a cabo el censo nacional, se refiere a la “población indígena”, pero reniega a contarla o definirla de forma precisa. Presenta datos porcentuales de la población que habla lenguas indígenas (7.1% en 2000) o que se auto-adscribe como tal (6.1% en 2000), pero evita dar una definición o un conteo decisivo (INEGI, 2004), situación que vuelve más confusa la categoría si consideramos que es algo arbitrario tomar en cuenta sólo la lengua y no otras prácticas socioculturales. Además, la cuestión de la autoadscripción y adscripción impuesto por otros se complica cuando consideramos que “ser indio” para una gran parte de la población mexicana se refiere más a la pobreza y al atraso (FRIEDLANDER, 2006), a la condición de colonizado o dominado (BONFIL BATALLA, 1972) que al contenido cultural que los científicos sociales usualmente asociamos con la etnicidad. En este artículo me enfocaré en primera instancia a estas confusiones clasificatorias: a la categorización como “no-indígena” o “mestiza” de una población significativa de mexicanos quienes no hablan una lengua indígena y tampoco se auto-adscriben como tal, pero que parecen social y culturalmente a la población usualmente clasificada como indígena. Es importante precisar que no me interesa re-categorizar a esta primera población como indígena. Más bien, quiero demostrar las ventajas para el análisis sociocultural cuando se mantiene una distancia crítica de estas clasificaciones étnicas. La tendencia dominante de categorizar a este tipo de población como no-indígena o mestiza está estrechamente 76 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 ligada la aspiración del Estado de modernizar el país e incluir a los indígenas en este proyecto, convirtiéndolos en ciudadanos mexicanos. El esfuerzo por lograr estas metas comenzó con la implementación de la Reforma en 1857, cuando las transformaciones liberales incluyeron la eliminación de la propiedad comunal de los pueblos indígenas y su supuesta conversión en propiedad privada. Posteriormente, la Revolución Mexicana (1910-1917) buscó una modernización incluyente y, al dirigir su mirada hacia los pueblos indígenas, adoptó una serie de políticas que han sido calificadas como de “modernización” y “aculturación”. Éstas duraron una buena parte del siglo XX y se inspiraban en las ideas de los antropólogos Manuel Gamio y Gonzalo Aguirre Beltrán, quienes se hallaban influidos a su vez por figuras importantes de la antropología norteamericana como Robert Redfield. Mientras originalmente el término “mestizo” se empleó para describir la población producto de la mezcla de indígena y europea, después de la Revolución llegó a referirse al mexicano plenamente aculturado y modernizado, quien se distingue del europeo por su pasado indígena. Desde entonces, en muchos pueblos rurales se han registrado procesos de escolarización y castellanización, los índices de salud han mejorado y se han implementado servicios urbanos como escuelas, luz eléctrica, agua potable, transportes, entre otros. Desde luego, las medidas gubernamentales no explican por completo estos cambios, pues también son relevantes otros factores como la migración a las urbes y a Estados Unidos, además de los procesos locales de industrialización que han desplazado a la agricultura como actividad económica principal. Como consecuencia de estos procesos, y en particular de la castellanización, muchas comunidades del centro y sur del país que otrora eran clasificadas en el censo como “indígenas” ahora no son categorizadas así. La población en general, incluyendo a los antropólogos, tiende a considerar a estas comunidades castellanizadas como “mestizos” o, en el 77 R UR I S 2 La región de Texcoco se ubica en la esquina noreste del Valle de México, aproximadamente a 40 km del centro de la Ciudad de México. 78 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Sur del país, como “ladinos”. Más aún, muchos de los mismos habitantes de estas comunidades, conscientes de los cambios que han experimentando y de los perjuicios contra lo indígena, se consideran a sí mismos “civilizados”, “modernos” o “mexicanos”. Reconocen en ocasiones que sus “abuelos” eran “inditos”, pero que ellos ya no lo son. En regiones como la de Texcoco,2 que es el enfoque del presente trabajo y que ha experimentado estos procesos, es posible oír que algunas personas distinguen a sus vecinos que “han avanzado menos” que ellos en tales procesos, y los señalan o estigmatizan como “cerrados” o todavía “indios”, debido a sus formas de vestir, hablar o por sus costumbres. Si supuestamente el término “mestizo” se refiere al indígena plenamente modernizado, en realidad solo es aplicado a personas de habla castellana independientemente de sus demás características socioculturales. Sin embargo, se han registrado notables cambios reflejados en indicadores comunes como los mencionados, existen otros indicios que sugieren que el cambio lingüístico y la modernización de la infraestructura no han traído consigo una transformación completa de la organización social. Por ejemplo, hay evidencia sobre la persistencia de un derecho consuetudinario contrario al derecho nacional y sobre la vigencia de organizaciones comunitarias y grupos sociales. A su vez, manifiestan la importancia de los conceptos locales de propiedad y de control de los recursos pero ninguna de ellas está contemplada en la ley ni en las teorías de modernización y aculturación. Es decir que estas comunidades supuestamente “mestizas” cuentan con formas culturales y de organización social similares a las categorizadas como “indígenas”. Desde la década de 1930 hay esfuerzos por encontrar categorías para distinguir este tipo de grupos de los demás referidos con el mismo término mestizo. Entre los primeros esfuerzos se encuentran las descripciones de Robert Redfield (1970) de comunidades en proceso de “transición” del folk al R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 urbano en Yucatán. En la década de 1940, Ralph Beals, Robert Redfield y Sol Tax (1943), al referirse a México y los países centroamericanos, contrastan el término “ladino-ización” con su concepto de “pseudo-ladino-ización” para poner en tela de juicio la profundidad del proceso de aculturación entre campesinos que siguen siendo indígenas en todo excepto en la lengua. Posteriormente, Manuel Gamio (1952) propone la categoría “indo-mestizo”, y Richard Adams (1956, 1962), con base en datos de Guatemala y otros países centroamericanos, utiliza términos como “indios tradicionales”, “indios transicionales” o “comunidades indígenas modificadas” para distinguir los diferentes procesos de “ladino-ización”, es decir, el proceso de aculturación “de indios” que se convirtieron supuestamente en “mestizos”. Para dar cuenta de este tipo de casos, a partir de recorridos de área y de un estudio de comunidad en profundidad en la década de 1950 y 1960, Nutini e Isaac (1974) toman elementos del modelo folk-urbano de Redfield y postulan el “continuo indio-mestizo” en Tlaxcala. Para estos autores, el proceso de transformación implicaba la escolarización, la adopción del consumo de mercancías industriales y el paso de una economía agrícola a una basada en el trabajo asalariado, entre otros factores. Esta transformación por efecto acumulativo producía la secularización, la cual en Tlaxcala se expresaba como la separación de lo civil de lo religioso en el sistema de cargos. Guillermo Bonfil (1973) analizó la ciudad de Cholula como un problema de este tipo de categorización puesto que es urbana, industrial, habla español y es indígena a la vez. Este autor dio un paso importante hacia el replanteamiento de estas categorías reificadas cuando propuso que Cholula no representaba un momento de transición en lo indígena y mestizo sino un estado sociocultural relativamente estable. En un libro posterior, México profundo (1987), Bonfil plantea que este estado describe la vida sociocultural en gran parte del México contemporáneo. 79 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Por su parte, Eileen Mulhare (2003) ha empleado el término “post-nahua” para describir este estado entre los habitantes de una comunidad cercana a la ciudad de Puebla donde se perdió dicha lengua en el siglo XX, pero que aun conservan formas organizativas similares a pueblos calificados como “indígenas”. Otro problema con esta categorización surge por el uso de los pares dicotómicos como tradicional/moderno, rural/mestizo e indígena/mestizo, los cuales no son simplemente categorías científicas objetivas sino que forman parte de una ideología político-temporal. Las premisas de esta ideología estaban en la base tanto del capitalismo como del marxismo y subyacen en los proyectos de desarrollo y en la gran teoría sociológica de los siglos XIX y XX. En el imaginario nacional y sus mitos fundadores, la categoría “indígena” sirve para imaginar una cultura pura y completamente distinta a la europea que distingue a la nación mexicana de los poderes coloniales. Este papel dado a la categoría indígena implica expectativas en torno a la gente indígena contemporánea: que ayude a recordar e imaginar este estado original al mismo tiempo que siempre desilusionará y aparecerá como contaminada e inauténtica (POVINELLI, 2002). Así, cada vez que un actor se categoriza como indígena o un investigador emplea esta categoría, surge la duda si realmente lo es o si es un caso de la política de la identidad o de romanticismo. Es interesante notar, por ejemplo, que el libro de Judith Friedlander (2006), reeditado recientemente, lleva esta actitud de sospecha al extremo y plantea que no existe lo indígena en México. Por otro lado, obras como as de Bonfil Batalla (1973, 1987), donde se atreve a encontrar lo indígena incluso entre hispanohablantes, han sido ignoradas o fuertemente criticadas (véase, por ejemplo, LOMNITZ, 1992, p. 247-252, 2001, p. 263-286) como un trabajo político y no empírico. No es sorprendente entonces, que muchos investigadores hayan empezado a evitar por completo la categoría “indígena” y, junto con ella, toda la cuestión de la diferencia étnica y sociocultural, salvo en el caso de los estudios 80 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 de una minoría en zonas aisladas que es lo suficientemente exótica como para ser denominada “indígena” sin discusión. Propongo reabrir la discusión sobre la etnicidad y la diferencia sociocultural pero alejándola de los abordajes que se preocupan por la pureza y la autenticidad. Para hacer esto es necesario un acercamiento a la población rural mexicana mirando más allá de la mezcla superficial de características socioculturales prehispánicas, coloniales y modernas. Esto es necesario para tomar en cuenta cómo la gente que estudiamos entiende y practica lo que más le importa en su vida y cómo define lo que les distingue de otros sectores de la población. NUEVOS TEMAS Y ACERCAMIENTOS Aunque esta cuestión de la categorización de las poblaciones es importante en sí misma, también tiene otras ramificaciones para la investigación antropológica. Al categorizar a una población como indígena o mestiza, los investigadores han supuesto una serie de temas de estudio a costa de otros temas posibles. Por ejemplo, los estudios sobre la gente clasificada como indígena tratan generalmente temas como la comunidad, el sistema de cargos, los rituales y el chamanismo/nagualismo, por mencionar algunos. Planteamos que estos temas han llamado la atención por ser exóticos y diferentes de la vida moderna urbana. Incluso, la “desaparición” de estos aspectos de la vida indígena ha sido usada como un medidor de la conversión de una población en mestiza (véase, por ejemplo, CANCIAN, 1992). Al mismo tiempo, las investigaciones sobre la población rural mestiza se enfocan en la economía campesina, la familia y la política, por considerar que éstas son los únicos aspectos que sobreviven después de la desaparición de la cultura indígena. En años recientes se ha visto una mayor flexibilización en la ubicación de estos temas como considerar los sistemas de cargos entre hispanohablantes como un vestigio de la cultura indígena y la política en- 81 R UR I S 3 Me refiero a lo que los antropólogos llaman “personhood” en inglés. | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 tre la población indígena como un emergente indicador de su inautenticidad. Pero, aún así, la lista total de posibles temas no ha variado mucho. Estos temas son ejemplos de lo que Arjun Appadurai (1986) ha llamado “gatekeeping concepts” (guardianes o porteros) en el sentido de que delimitan lo que se considera temas apropiados de estudio para poblaciones particulares – en este caso la población indígena o mestiza. Así, el problema de reconocimiento ligado a las deficiencias de las categorías indígena y mestizo se traduce en un problema de entendimiento a través de estos conceptos “guardianes”. Quisiera sugerir aquí que, al dejar de esperar lo más obviamente exótico y auténticamente “indígena”, surgen distintos objetos de estudio en la investigación de campo que están estrechamente relacionados con las maneras en que las poblaciones locales entienden sus vidas y su diferencia en relación a la gente moderna-urbana. Este abandono de los conceptos “guardianes” resulta en nuevos temas de estudio como la persona3 o el intercambio entre ellas, que también tienen potencial para contribuir al entendimiento de la vida sociocultural entre la población fácilmente reconocible como indígena. EL CASO DE LA REGIÓN DE TEXCOCO Esta región, ubicada a dos horas de la Ciudad de México, se encuentra en la parte noreste del Valle de México y se extiende desde la orilla del lago seco de Texcoco, en el piso del Valle en el occidente, hasta la sierra de Tlaloc que divide el Valle del estado de Tlaxcala hacia el oriente. Esta ubicación de la región sobre el declive de la sierra es esencial para entender su consolidación e integración como región y estado en los tiempos prehispánicos. La cohesión política del estado texcocano fue lograda en el siglo XV a través de la construcción de un sistema de riego que dirigió el agua proveniente de los manantiales en la sierra a varios pueblos de la región (PALERM y WOLF, 1972). Partes de este siste- 82 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 ma de riego siguen en uso y todavía conectan algunos pueblos. Sin embargo, el sistema de riego está descentralizado hoy en día, de manera que sólo provee a algunos poblados, y por lo tanto es menos importante para la definición e integración de la región. Los investigadores que han trabajado sobre la región generalmente lo han conceptualizado a través de unas divisiones topográficas. Ángel Palerm y Eric Wolf (1972) y luego Marisol Pérez Lizaur (1977), por ejemplo, dividieron la región en tres subzonas geográficas pobladas: la llanura, el somontano y la sierra, y una franja erosionada no poblada entre el somontano y la sierra. En la llanura, los pueblos presentan un patrón de asentamiento más denso y parecido a lo urbano y tienen poca agua para riego. Mientras se sube al somontano y luego a la sierra, es fácil encontrar cada vez más un patrón de asentamiento disperso, más agua de riego y más agricultura (PÉREZ LIZAUR, 1977). Esta división aún es útil en algunos sentidos. Aunque la agricultura está disminuyendo en importancia en toda la región, hay más en el somontano que en la llanura y todavía más en la sierra donde hay un mayor acceso a tierra y al agua para riego. Hoy en día, se puede observar cómo las personas de toda la región migran diariamente a la Ciudad de México, aunque esta práctica es un poco más frecuente en la llanura y el somontano debido a su cercanía. Además, debido a que estas sub-zonas tienen un mejor acceso a la ciudad, se han vuelto atractivas para las personas que llegan de las afueras buscando una vivienda económica que les de la posibilidad de viajar diariamente a la ciudad para trabajar. Esta división entre llanura, somontano y sierra parece reflejar una descripción cultural de la región similar al continuum folk-urbano de Redfield (1970). Los pueblos de la sierra, por ejemplo, aparentemente por estar más lejos de la Ciudad de México están perdiendo de manera más lenta las prácticas asociadas con el mundo campesino-indígena como la lengua náhuatl y la agricultura; mientras que los pueblos de la llanura tienen una fachada más urbana, reflejada en el patrón de 83 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 asentamiento más denso y en la presencia de hispano-hablantes monolingües. Sin embargo, nuestras investigaciones sugieren que estos indicadores más obvios y comunes de la urbanización o modernización, como las actividades económicas y el idioma, no representan adecuadamente la situación global de cambio y continuidad en la región. Se ha observado que el entendimiento y práctica de la vida indígena-campesina parece estar tan viva en los pueblos de la llanura como en los de la sierra, aunque estos primeros han incorporado más de la vida urbana, de manera que su apariencia tiende más a ser de este estilo. Por ejemplo, el aspecto urbano del pueblo de San Salvador Atenco, ubicado en la llanura de la región, puede explicar en parte la errónea suposición del gobierno acerca de que los miembros de esta comunidad iban a actuar como individuos que tratarían a sus tierras como mercancías, vendiéndolas para la construcción de un nuevo aeropuerto en 2001. Con el levantamiento del pueblo de Atenco en contra del proyecto del aeropuerto, las autoridades pronto descubrieron una cultura campesina-indígena detrás de esta apariencia urbana. Otro ejemplo del contraste entre una apariencia urbana y una realidad más compleja en la llanura es Chiconcuac. Este pueblo del mismo estado es un gran centro industrial, que además de tener un mercado de ropa que atrae compradores desde Centroamérica, cuenta con sucursales de los bancos más importantes del país. Sin embargo, continúa resaltando el hecho de que los residentes emplean gran parte de sus ganancias en la expansión de su sistema ritual de fiestas (PÉREZ LIZAUR y ZAMORA WASSERMAN, 2010). Además, el acerccamiento para hacer trabajo de campo en los diferentes pueblos de la región nos ha reflejado en muchos casos cómo los pueblos de la llanura son más “cerrados” a los extraños, en el sentido de desconfianza o sospecha (San Salvador Atenco es un buen ejemplo de este caso), en comparación con los del somontano y la sierra. Mientras, generalmente suponemos que los pueblos más aislados son los más cerrados, en este caso 84 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 parece que el hecho de estar más cerca de la ciudad y por lo tanto tener más contacto con extraños ha aumentado el sentido de desconfianza en estos pueblos de la llanura texcocana. Si se realiza una comparación con otras regiones rurales del país, se podrá observar que es principalmente por este contacto con la capital, de manera directa o indirecta, que muchas de las señas típicas de la vida campesina o indígena están ausentes, particularmente en la llanura y el somontano pero también en la sierra. Por ejemplo, como ya se mencionó, hay cada vez menos producción agrícola para consumo o venta, y cada vez más empleo en actividades asociadas con lo urbano, como el trabajo asalariado y el comercio. Incluso cuando las viejas actividades agrícolas de la región han sobrevivido toman una forma nueva y menos ligada al campo. Por ejemplo, el cultivo de la flor fue una actividad importante de algunos pueblos hasta hace 20 o 30 años, mientras que en la actualidad estos agricultores o sus descendientes se han convertido en comerciantes o, más específicamente, en floristas que compran su flor en la ciudad para arreglarla y venderla para fiestas en la región. Por otra parte, a mediados del siglo XX la ganadería en ranchos era una actividad importante para la zona, pero los hombres que allí trabajaron en su niñez hoy en día se dedican a practicar la engorda de ganado, una actividad realizada en establos cerrados y que poco tienen que ver con el espacio abierto asociado con el campo. Además de la desaparición de la agricultura, el indicador más común de lo indígena – el idioma – ha casi desaparecido de la región; sólo las generaciones mayores en los pueblos de la sierra siguen hablando náhuatl. Este cambio se debe en parte a que las oportunidades de trabajo en la cercana ciudad son una motivación para aprender el español y adoptar una apariencia urbana. Sin duda, la oferta laboral es también una motivación para proveer a los niños de una educación formal y en español; asimismo los recursos provenientes de la ciudad han facilitado la construcción de una infraestructura escolar, la cual continúa 85 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 estando ausente en los pueblos más aislados y pobres de otras regiones. Al mismo tiempo que la vida en la región parece altamente urbanizada en muchos sentidos, es posible decir también que ha quedado relativamente despoblada y des-urbanizada. En comparación con las zonas peri-urbanas que eran más accesibles durante el momento de mayor crecimiento de la Ciudad de México entre 1950 y 1980 (como Ecatepec, Chalco o Ciudad Netzahuacoyotl), la región de Texcoco estuvo relativamente aislada por el lago seco antes de la apertura de la autopista. Sólo empezó a recibir migración desde la ciudad en un momento histórico en el que el crecimiento se dio de una forma más pausada. Por lo tanto, las comunidades de la región, al menos hasta el momento, no han sido inundadas con migrantes como algunas otras zonas peri-urbanas. Además, podemos agregar que la región ha quedado relativamente des-urbanizada en el sentido de su importancia como centro político, económico y cultural frente a ciudades como Toluca o Puebla, que eran menos importantes o noexistentes como centros urbanos en tiempos prehispánicos. Pareciera que esta des-urbanización se pudiera explicar de la misma manera que Bonfil Batalla (1973) explica la situación de la ciudad de Cholula. Por la cercanía de Cholula al gran centro urbano de Puebla, se obvió la necesidad de desarrollarse tanto en el sentido político, económico y cultural ya que las funciones y servicios eran disponibles en esta otra ciudad. De igual forma, la cercanía de Texcoco a la Ciudad de México ha significado su des-urbanización, de manera que no se ha desarrollado como un centro urbano importante. Palerm y Wolf plantean un argumento similar, al decir que la des-urbanización o marginalización de la región no se puede explicar en términos de influencia cultural tal como propone Redfield, sino mediante un patrón de integración social que trajo la conquista, la cual “se basaba en funciones estratégicas que el viejo señorío Acolhua no 86 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 podría suministrar” (PALERM y WOLF, 1972, p. 148). En otras palabras, la producción agrícola intensiva que convirtió a la región en un área clave en el siglo XV, la marginalizó después de la conquista. Las actividades que últimamente han reemplazado a la agricultura son más urbanas pues no requieren el espacio del campo, pero siguen ocupando un lugar marginal en la sociedad. Una implicación de esta des-urbanización es que mientras para la gente de la región la ciudad forma parte de sus vidas, al mismo tiempo la falta de desarrollo de instituciones políticas, económicas y culturales significa en términos generales que las personas no han perdido el control de sus vidas y su futuro bajo la presión directa de poderes externos. Esta situación, que se puede llamar urbanización limitada (en la cual lo urbano es presente y accesible pero al mismo tiempo no inunda), significa que la gente de la región ha podido en muchos casos incorporar nuevas prácticas desde la ciudad a sus vidas y no al revés. En otras palabras, ven lo urbano o lo moderno no como una amenaza ni tampoco como la salvación, sino como una fuente de nuevas formas de mejorar sus vidas a los niveles de la comunidad, la familia y el individuo (véase KUROMIYA, 2010; MAFFIE, 2003; MAGAZINE, en prensa). Esta manera de entender la relación entre lo campesino-indígena y lo urbano, contrasta con la conceptualización usual del vínculo que hay entre éstas. En la mayoría de las representaciones históricas y antropológicas, la cultura urbana o moderna se representa como una fuerza que se impone sobre la vida campesina-indígena. Así, se imagina la existencia de dos procesos antagónicos: 1) los pueblos campesinos-indígenas se urbanizan y se modernizan; y 2) resisten esta fuerza externa para mantenerse como tradicionales. 87 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Asimismo, estos dos polos corresponden a las comunidades campesinas “abiertas” y “cerradas” en la tipología del antropólogo norteamericano Eric Wolf (1955), que ha tenido una gran influencia en el pensamiento antropológico sobre el México rural. Sin embargo, ninguna de estas dos categorías describe muy bien a los pueblos en la región de Texcoco, que parecen presentar una paradoja interesante: son claramente urbanizados o modernizados, pero al mismo tiempo tienen maneras de vivir y entender la vida que son muy distintas a lo que esperamos del contexto urbano. Sin embargo, podemos dejar de ver esta combinación como una paradoja si consideramos que la gente de la región ve la modernidad en muchos casos no como una alternativa, sino como otra posibilidad entre varias; es decir, como algo que pueden incorporar y que no necesariamente domina y reemplaza. Vemos entonces que hay una incorporación selectiva de lo ajeno que no necesariamente contradice la continuidad de creencias y prácticas locales. LA INCORPORACIÓN SELECTIVA DE LO AJENO Aún antes de encontrarse con algo relativo a las “fiestas” en la región de Texcoco, inevitablemente se pueden observar características del mundo moderno; incluso en una visita ordinaria: escuelas, tecnología (estructuras de concreto, calles pavimentadas, redes de agua, electricidad, etc.), negocios, industria y autoexpresión a través del consumo como en el caso de las culturas juveniles. Me imagino que es esta “modernización” aparente, combinada con la carencia de una jerarquía estructurada de lo religioso y lo civil (ver ENCARNACIÓN RUÍZ, 2004), lo que provoca que algunos antropólogos digan que los pueblos de la región se han modernizado completamente. Principalmente aquellos que piensan en el tipo de comunidades indígenas “reales” al que están acostumbrados a estudiar. Aunque casi siempre los residentes de la región consideran importantes muchas de estas 88 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 adaptaciones modernas, no debemos confundir este interés que tienen en ciertos aspectos del mundo moderno con un deseo de modernización completa o absoluta. Por ejemplo, si se mira más de cerca a las redes de agua entubada y a las escuelas de los pueblos, se puede ver que los pobladores se esfuerzan por mantener el control de tales tecnologías modernas y han prevenido que éstas caigan en manos privadas o gubernamentales. Este control les permite tomar ciertos aspectos de lo moderno y dejar otros, como lo es aceptar la conveniencia y el beneficio que representa el agua entubada, pero se oponen a su conversión en un recurso “nacional” o en un bien de consumo. Los pobladores de la región ven al agua como una propiedad de la comunidad, porque ésta se extrae de su subsuelo. Y ven a los sistemas de bombas y tuberías que se usan para su distribución en ese mismo sentido, porque ellos o sus ancestros las construyeron. Esta posición está en contraposición a la ley federal, que establece que todos los recursos del subsuelo, incluyendo el agua, son propiedad de la nación. En el poblado de Tepetlaoxtoc, por ejemplo, ubicado en el borde entre la llanura y el somontano de la región, encontré que los miembros electos del comité de aguas ocupan una oficina en el edificio municipal, pero ellos insisten que son completamente independientes del gobierno del municipio. Dicen que esto es mejor, ya que pueden estar seguros que las cuotas que paga la gente para el agua serán usadas para el funcionamiento y mantenimiento del sistema, mientras que los proveedores privados o gubernamentales les quitarían algo de esos pagos (ver también ENNIS-MCMILLAN, 2001). Guillermo Torres, en su investigación de las bandas juveniles en San Jerónimo Amanalco, en la sierra de Texcoco, muestra otro ejemplo de este interés mesurado por el mundo moderno (comunicación personal).4 Una primera mirada nos haría pensar que un gran porcentaje de los hombres jóvenes del pueblo se están rebelando contra la cultura local, y que en 4 La investigación de Guillermo Torres sobre este tema no ha sido publicado hasta el momento. 89 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 su lugar están adoptando estilos urbanos y modernos. Pasan mucho de su tiempo libre con grupos de otros jóvenes a los cuales llaman bandas. Las bandas utilizan nombres de grupos de las subculturas juveniles urbanas, comúnmente ligados a los estilos musicales como los Ska, los Punks o los Metaleros, y sus integrantes usan ropa y peinados ad hoc a dichos estilos. Cada banda tiene enemigos y aliados, y en algunas fiestas y bailes llegan a enfrentarse. Sin embargo, si hacemos una observación más cercana, como lo demuestra Torres, estos jóvenes parece que están empleando dichos estilos urbanos para darle un giro a algunas viejas prácticas. La pertenencia a la banda se basa sobre lazos patrilineales de parentesco: los miembros son primos por el lado paterno que viven cerca y en tierras que sus abuelos les han heredado. En San Jerónimo, jóvenes de generaciones anteriores se agruparon de maneras similares, aunque no se refirieron a sí mismos como bandas y en algunas ocasiones pelearon contra grupos vecinos. Hoy, cada banda tiene su santo patrono y organizan la fiesta en su honor, actúan como mayordomos y promueven la participación de forma similar en la que dichas celebraciones se organizan en los ámbitos del barrio o del pueblo. Con este ejemplo, no quiero señalar que estos jóvenes están interesados sólo en reproducir prácticas tradicionales. Esta no es su preocupación y no pienso que lo sea para las prácticas que desarrollan como las fiestas. Más bien, considero que el ejemplo sugiere que los jóvenes varones están interesados en cosas nuevas como los estilos urbanos juveniles – que les son útiles para distinguirse de las generaciones previas y de grupos similares – al mismo tiempo que no hay un objetivo general de la modernización o la urbanización. Aki Kuromiya (2006, 2010) encontró en su estudio sobre Santo Tomás Apipihuisaco, otro pueblo de la región, que los pobladores están bastante interesados en lo que ellos llaman “progreso” o “salir adelante”, pero que evitan la tendencia del mundo moderno que equipara “mejoramiento” con “moderno” 90 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 o “urbano”. En el contexto del pueblo, “progreso” se refiere a todo aquello que incrementa la comodidad y puede incluir la tecnología moderna (como los autos o la medicina), por ejemplo. Sin embargo, los pobladores rechazan con presteza la tecnología moderna que ven como desfavorable o amenazante para su bienestar y no tienen problema para referirse como “progreso” (si ven que les acarrean bienestar) aquello que usualmente llamarían prácticas tradicionales, tales como el autogobierno comunitario o las fiestas patronales. A través de la descripción de un debate entre los pobladores acerca de la ampliación de una carretera que atraviesa el poblado, Kuromiya (2006) ejemplifica cómo de ciertas maneras, el progreso y el mejoramiento pueden significar ser más urbanos o modernos. Este proyecto de aparente “modernización” fue aclamado por algunos como progreso, mientras que otros se opusieron a él. Lo interesante de su oposición es que la enmarcaron en los términos de “salir adelante” y no en los de la tradición y su preservación. La gente que vive cerca de la carretera simplemente vio la ampliación como algo que disminuiría y no aumentaría su confort y bienestar. En el pueblo de Tepetlaoxtoc, durante una fiesta presencié una discusión entre dos jóvenes acerca de cómo deberían gastar el dinero los pobladores para el bien de la comunidad. Uno de ellos argumentó que en vez de “quemar” todo el dinero en fuegos artificiales deberían utilizarlo para la construcción de un hospital. El otro insistió que sería mejor para ellos gastarlo en “el patrón” (el jefe, refiriéndose a San Sebastián), dando a entender que la furia del santo causaría más problemas que los que el hospital podría resolver. Añadió que cuando alguien da dinero para la fiesta sabe dónde acabará, insinuando el hecho de que el santo castigaría a quien le robase, mientras que los proyectos públicos, especialmente aquellos que están fuera del control de los pobladores, son buenas oportunidades para la corrupción y el robo. La mayoría de las personas que escuchaban parecían estar de acuerdo con este último argumento, que, quiero señalar, fue 91 R UR I S 5 El hecho de que la resistencia al plan del aeropuerto fue llevado a cabo por los residentes de Atenco se debe, por un lado, a que éstos serían los mayores afectados directos en relación a la gente de otros pueblos. Por otro lado, desde tiempo atrás los residentes de Atenco han tomado el papel de llevar a cabo las resistencias organizadas en la región – dentro de una división de trabajo. 6 Este conflicto inició cuando los pobladores de Atenco respondieron a la solicitud de unos floreros de Santa Catarina del Monte, un pueblo de la sierra de la región, que pedían su ayuda frente a los esfuerzos del gobierno del municipio de Texcoco de re-ubicar sus puestos de flores. El gobierno del Estado de México mandó una fuerza policiaca militarizada que golpeó, arrestó y violó a mucha gente del pueblo, incluyendo a algunos que ni participaron en la manifestación. Esta respuesta exageradamente agresiva parece ser un acto de venganza por el éxito que tuvo la gente de Atenco en su esfuerzo por bloquear la construcción del aeropuerto en 2001-2002. 92 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 construido, tanto como el primero, en términos del “bienestar”. Debo aclarar que si lo urbano, en el sentido cultural, no está visto localmente como un problema, sí está visto como una amenaza para los residentes cuando llega en forma de actores externos tratando de imponerse en la región. De esta manera, hay una amplia evidencia en la zona de esfuerzos para bloquear la llegada de personas de afuera o de controlarlas una vez que están ahí, por ejemplo obligándolos a contribuir a las fiestas comunitarias bajo la amenaza de cortar su agua entubada (ENNIS-MCMILLAN, 2001). La resistencia por parte de la gente de San Salvador Atenco hacia la construcción del nuevo aeropuerto es otro ejemplo de cuando lo urbano o lo moderno es visto como una imposición de actores externos. Aunque pocos miembros de otras comunidades participaron activamente con los de Atenco en la resistencia, se encontró que la gran mayoría de los pobladores de la región estaban preocupados porque la construcción del aeropuerto les inundaría con la expansión urbana, quitándoles control de sus terrenos, sus fuentes de agua y sus formas de vida.5 El conflicto altamente violento que estalló en 2006 entre los pobladores de Atenco y las autoridades estatales6 y la existencia de un segundo plan para construir un aeropuerto en el lago seco de Texcoco, pero ahora en terrenos federales en lugar de los de Atenco, sugieren que la gente de la región seguirá viviendo y probablemente resistiendo más imposiciones. Hasta el momento en que las autoridades empiezan a tomar en cuenta a la población local y sus intereses en sus planes de desarrollo para la región, el conflicto parece ser inevitable. CONCLUSIÓN He argumentado aquí que las categorías “indígena” y “mestizo” presentan un número de problemas para el estudio de la etnicidad y de otros temas en el México contemporáneo. El país cuenta R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 con una gran población, incluyendo, por ejemplo, la mayoría de los habitantes de la región de Texcoco, que se considera que ha sido transformado de indígena a mestiza por su castellanización y su modernización. Sin embargo, la investigación etnográfica cuidadosa muestra que esta población tiene más en común social y culturalmente con la gente categorizada como “indígena” que con muchos otros “mestizos” del país. Como consecuencia del problema generado por estas categorizaciones y aunado a que se ha asumido que la clasificación “mestizo” es equivalente a una completa modernización sociocultural, muchos investigadores han ignorado algunas de las especificidades socioculturales de las comunidades que antes eran consideradas indígenas y hoy son hispano-parlantes. Uno de mis objetivos ha sido sugerir que si nos acercamos a estas comunidades sin categorizarlas como indígena o mestiza, un número de temáticas que han sido tradicionalmente inadvertidas emergerían con fuerza en la antropología rural mexicana como una manera culturalmente específica de concebir la persona y el intercambio. Más aun, la suposición que la cultura indígena y la cultura mestiza, urbana o moderna constituyen fuerzas opuestas, nos ha llevado a percibir todas las instancias de los aspectos modernos en las comunidades rurales como modernización o aculturación, y todos los ejemplos de la indianidad como resultado de la resistencia cultural. En contraste, he sugerido que la aparente modernización en Texcoco, tanto como el tradicionalismo que se observa en otros contextos en la misma región, puede ser mejor entendido como un producto de los esfuerzos de la gente para alcanzar el bienestar en sus vidas. En términos formales, esto puede ser llamado un híbrido cultural, pero pienso que es más importante que reconozcamos que estamos hablando de gente que no está particularmente preocupada en ningún sentido con la categorización cultural o étnica, sino más bien con la vida como un proceso de innovación. 93 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADAMS, Richard N. Cultural components of Central America. American Anthropologist, Washington, AAA, v. 58, p. 881-899, 1956. ____. Reseña de Guatemala: the land and the people de Nathan Whetten. American Anthropologist, Washington, AAA, v. 64, p. 1.104-1.105, 1962. APPADURAI, Arjun. Theory in anthropology: center and periphery. Comparative Studies in Society and History, Ann Arbor, University of Michigan, v. 2, n. 28, p. 356-367, 1986. BEALS, Ralph; REDFIELD, Robert; TAX, Sol. Anthropological research problems with reference to the contemporary peoples of Mexico and Guatemala. American Anthropologist, Washington, AAA, v. 45, p. 1-21, 1943. BONFIL Batalla, Guillermo. El concepto de indio en América: una categoría de la situación colonial. Anales de Antropología, México, Unam, v. VII, p. 105-124, 1972. ____. Cholula: la ciudad sagrada en la era industrial. México: Unam, Instituto de Investigaciones Históricas, 1973. ____. México profundo: una civilización negada. México: Grijalbo, 1987. CANCIAN, Frank. The decline of community in Zinacantan: economy, public life, and social stratification. Stanford: Stanford University Press, 1992. ENCARNACIÓN Ruiz, Junior Enrique. La lucha entre dos Méxicos: la organización política y los conflictos con el Estado de un pueblo situado en los límites de la expansiva zona metropolitana de la Ciudad de México. 2004. Tesis (Maestría en antropología social) – Universidad Iberoamericana, Ciudad de México. ENNIS-MCMILLAN, Michael. La purificación Tepetitla: agua 94 potable y cambio social en el somontano. México: Universidad Iberoamericana, 2001. FRIEDLANDER, Judith. Being Indian in Hueyapan: a revised and updated edition. New York: Palgrave McMillan, 2006. GAMIO, Manuel. Población indo-mestiza. In: TAX, S. (Ed.). Aculturation in the Americas. Selected papers of the XXIXth International Congress of Americanists. Chicago: University of Chicago Press, 1952, p. 267-270. INEGI. La población indígena en México. Aguascalientes: Instituto Nacional de Estadística, Geografía e Informática, 2004. KUROMIYA, Aki. Salir adelante: conflicto, armonía, y la práctica local del progreso en Santo Tomás Apipilhuasco, Estado de México. 2006. Tesis (Maestría en antropología social) – Universidad Iberoamericana, Ciudad de México. ____. Las diferentes perspectivas y formas de progreso en Santo Tomás Apipilhuasco. In: MAGAZINE, R.; MARTÍNEZ, T. (Eds.). Texcoco en el nuevo milenio: cambio y continuidad en una región periurbana del Valle de México. México: Universidad Iberoamericana, 2010, p. 273-294. LOMNITZ, Claudio. Exits from the labyrinth: culture y ideology in the Mexican national space. Berkeley: University of California Press, 1992. ____. Deep Mexico, silent Mexico: an anthropology of nationalism. Minneapolis: University of Minnesota Press, 2001. MAFFIE, James. To walk in balance: an encounter between contemporary western science and conquest-era Nahua philosophy. In: FIGUEROA, R; HARDING, S. (Eds.). Science and other cultures: issues in philosophies of science and technology. New York: Routledge, 2003, p. 70-90. MAGAZINE, Roger. El otro como sujeto, la modernidad como conducto: la producción de subjetividades en un pueblo 95 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 mesoamericano. In: PITARCH, Pedro (Ed.). Modernidades indígenas. Madrid, Berlín: Iberoamericana Vervuert, en prensa. MULHARE, Eileen M. Respetar y confiar: ideología de género versus comportamiento en una sociedad post nahua. In: ROBICHAUX, D. (Ed.). El matrimonio en Mesoamérica ayer y hoy: unas miradas antropológicas. México: Universidad Iberoamericana, 2003, p. 267-290. NUTINI, Hugo G.; ISAAC, Barry. Los pueblos de habla náhuatl de la región de Puebla y Tlaxcala. México: Instituto Nacional Indigenista, 1974. PALERM, Ángel; WOLF, Eric. Sistemas agrícolas y desarrollo del área clave del imperio texcocano. In: PALERM, Ángel; WOLF, Eric. Agricultura y civilización en Mesoamérica. México: Secretaría de Educación Pública, 1972. PÉREZ LIZAUR, Marisol. Población y sociedad: cuatro comunidades del Acolhuacán. México: Centro de Investigación Superior, Instituto Nacional de Antropología e Historia, 1977. PÉREZ LIZAUR, Marisol; ZAMORA WASSERMAN, Scarlett. El mercado de ropa de Chiconcuac como detonador del desarrollo regional. In: MAGAZINE, R.; MARTÍNEZ, T. (Eds.). Texcoco en el nuevo milenio: cambio y continuidad en una región periurbana del Valle de México. México: Universidad Iberoamericana, 2010, p. 55-82. POVINELLI, Elizabeth A. The cunning of recognition: indigenous alterities and the making of Australian multiculturalism. Durham: Duke University Press, 2002. REDFIELD, Robert. The folk culture of the Yucatan. Chicago: University of Chicago Press, 1970. ROBICHAUX, David; MAGAZINE, Roger. Las limitaciones de las categorías de “indígena” y “mestizo” en los estudios rurales de México. In: SESIA, P.; SARMIENTO, S. (Eds.). El cambio en la sociedad rural mexicana: ¿se valoran los recursos estratégos? 96 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 México: AMER/Casa Juan Pablos/UAM/CONACyT/UAEM/ Universidad Michoacana de San Nicolás de Hidalgo, 2007, v. II – Pueblos indígenas, territorios y género en el México rural contemporáneo, p. 190-209. WOLF, Eric R. The types of Latin American peasantry. American Anthropologist, Washington, AAA, v. 57, n. 3, p. 452-471, 1955. ___________ ROGER MAGAZINE – Doctor en antropología por la Universidad de Johns Hopkins, profesor e investigador del Programa de Posgrado en Antropología Social de la Universidad Iberoamericana, Ciudad de México, <[email protected]>. 97 R UR I S 98 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 LOS MAPUCHE DE CHILE SIGNIFICADOS A PARTIR DE SU DISCURSO ELBA SOTO R E S U M E N Los mapuche de Chile son considerados “ciudadanos nacionales” y la historia muestra que el Estado ha buscado “integrarlos”, en la lógica de la igualdad. El objetivo de este artículo es comprender la forma en que los mapuche se significan con relación al Estado y a la sociedad chilena. Nuestra análisis de los discursos de los mapuche mostró que, pese a los intentos de asimilación, ellos se identifican como “un otro”, no como un chileno más. Esta tesis fue realizada en la Facultad de Educación de la Universidad Estadual de Campinas (Unicamp), con beca de la Fundación de Apoyo a la Pesquisa del Estado de São Paulo (Fapesp) y en colaboración con los mapuche del Área de Desarrollo Indígena del Lago Lleu-Lleu, VIII Región de Chile. P A L A B R A S - C L A V E Discurso indígena; identidad; cambio social; mapuche. A B S T R A C T The Mapuche of Chile are considered to be “national citizens”, and history shows that the State has sought to “integrate” them based on the logic of equality. The purpose of this article is to understan the form in which the Mapuche signify themselves in relation to the State and Chilean society -- the subject of our doctoral thesis. Our analysis of Mapuche discourse showed that, despite the intentions of assimilation, they identify themselves as “others” and not as ordinary Chilean citizens. This thesis was written in the Faculty of Education of the State University of Campinas (Unicamp), with a scholarship of the Foundation for Research Support of the State of Sao Paulo (Fapesp) and the collaboration of the Mapuche of the Area of Indigenous Development of Lake Lleu-Lleu, in the 8th Region of Chile. K E Y W O R D S Indigenous discourse; identity; social change; Mapuche. CONTEXTUALIZANDO Uno de los grandes temas de este momento es la globalización, estudiada desde los más diversos enfoques, globalización que se realiza como proceso determinado por circunstancias históricas. 99 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 El mundo se globaliza y de ese proceso emergen cuestiones fundamentales, tales como las consecuencias del modelo hegemónico de tipo capitalista progresista, validado para todo tipo de realidades versus la defensa de las múltiples diferencias y con ella, la propuesta de paradigmas sociales alternativos en un mundo que, a pesar de la globalización, permanece rico en las singularidades de cada pueblo. El llamado modelo de ‘desarrollo’ social actual, regulado por una lógica economicista, está en crisis. Por otro lado, el paradigma de la ciencia clásica también es rediscutido. Consecuentemente, se buscan nuevas formas de explicación de la realidad social y, a partir de ahí, también se buscan nuevos modelos, en la actualidad entendidos como modelos de ‘desarrollo’. Se trata de encontrar paradigmas sociales alternativos y la cuestión de las diferencias culturales asume la mayor importancia en los procesos sociales de los diferentes pueblos. Así, el conocimiento de las características de cada población se torna un paso trascendente, cuando se intenta definir nuevos caminos y metas. Ese es el contexto en el cual surgió nuestra tesis de doctorado, realizada en la Facultad de Educación de la Universidad Estadual de Campinas (Unicamp) – financiada por la Fundación de Apoyo a la Pesquisa del Estado de São Paulo (Fapesp), publicada con el nombre Sueños y luchas de los mapuche de Chile, que discutimos en este artículo, cuyo objetivo fue estudiar al pueblo mapuche y sus procesos sociales, como procesos históricos y de significación de ese pueblo, en las condiciones en que ellos viven y frente al arsenal cultural que los define. Buscamos nuevas comprensiones frente a lo que el estado de Chile y los empresarios agrícolas y forestales denominan “conflicto mapuche” – aún no resuelto – y a los fracasos en los intentos de cambio social cuando se trata del pueblo mapuche. 100 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 FILIACIONES TEÓRICAS, UNIVERSO DISLOCAMIENTOS CONCEPTUALES | A G O DE 0 9-F E V ESTUDIO 10 Y En Chile existe una relación desigual entre los mapuche y los winka o los no mapuche y sin duda el menosprecio a los mapuche tiene muchas explicaciones y/o justificaciones. Una larga historia de diferencias, primero con los españoles y luego con los chilenos. Mucho se ha escrito sobre los episodios de esa historia. Muchas son las versiones, especialmente disímiles cuando se confronta la visión de los mapuche y la de los winka. Por otro lado, no existe una sola actitud de los winka hacia los mapuche y viceversa y tampoco existe homogeneidad en la forma en que los mapuche se movilizan por sus reivindicaciones. Se trata de un pueblo y, como ocurre en todos los grupos humanos, hay posturas diversas. Otra cuestión fundamental para comprender las relaciones de contacto mapuche-winka es considerar que, a pesar de la aparente visibilidad del tema mapuche en el Chile de hoy y de los estudios realizados en la academia, que han permitido nuevas comprensiones del pueblo mapuche, existe un gran desconocimiento respecto a este pueblo y su realidad; especialmente de las versiones que las comunidades mapuche rurales tienen sobre el estilo de relación que se da entre esas comunidades, los empresarios agrícolas y forestales y el Estado chileno. Es decir, en la actualidad existen numerosos estudios académicos, algunos de los cuales tienen autoría mapuche; también existe bastante literatura respecto a los mapuche, y además, para quien esté interesado en el tema, es posible encontrar información en una serie de páginas en la Internet, donde eventualmente es posible leer los relatos de los mapuche con relación a los enfrentamientos ocurridos entre las comunidades y los citados empresarios y/o representantes del Estado. También existen trabajos de intelectuales mapuche circulando en espacios restringidos a los cuales la mayoría de la población chilena tiene poco acceso. Sin embargo, lo que en general se vehicula en Chile 101 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 a través de los medios de comunicación masivos – y que marca la manera en que los mapuche son significados en ese país – es el discurso hegemónico, es el discurso sobre los mapuche; la versión del Estado o el discurso oficial y la versión de aquellos que tienen el poder económico en el país y su interpretación frente a hechos relacionados al contacto entre las comunidades mapuche, los winka – en general empresarios – y el Estado. De ese modo, en nuestra tesis la cuestión vital fue dar la palabra a los mapuche. Ese era mi compromiso con mi pueblo pues, según mi percepción de investigadora, en Chile había una necesidad no resuelta: pensar en cómo viabilizar el cambio social en una relación de enfrentamiento entre los mapuche y los winka o no mapuche. Una falta aparentemente no visualizada por las entidades que tratan de entender y solucionar los “problemas indígenas”, en este caso los “problemas de los mapuche”. Pues, la sociedad chilena estabilizó los sentidos de una nación, un pueblo homogéneo, una lengua, espacio discursivo en el cual los indígenas fueron negados como la posibilidad de ser otros; por lo que nuestra tesis buscó dar voz a los mapuche e interpretar sus discursos, procurando espacios de re-significación de los mapuche y de los procesos sociales que ellos viven. Buscamos nuevas comprensiones en el Análisis de Discurso francés, una perspectiva de análisis que permite superar la lógica de las interpretaciones basadas en el contenido de lo dicho y entender esas expresiones como discursos que producen sentidos y que por tanto pueden ser analizados procurando los funcionamientos discursivos que sustenten las evidencias de las interpretaciones. Así, las entrevistas obtenidas en el trabajo de campo, aquí entendidas como discursos, fueron interpretadas en la óptica discursiva; pues, de acuerdo a lo señalado por Pêcheux, todo enunciado, toda secuencia de enunciados es lingüísticamente descriptible, como una serie (léxico-sintácticamente determinada) de puntos de deriva posibles, ofreciendo la 102 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 posibilidad de ser interpretados. La clave de las disciplinas de interpretación está en ese punto: porque existe lo otro en las sociedades y en la historia, correspondiente a ese otro modo de usar la lengua discursivamente, es que ahí puede haber nexo, identificación o transferencia, o sea, la existencia de una relación abriendo la posibilidad a interpretar. Y es porque existe ese nexo que las filiaciones históricas pueden organizarse en memorias y las relaciones sociales en redes de significantes (PÊCHEUX, 1990, p. 54). En el discurso es posible observar la relación entre lengua e ideología, comprendiéndose como la lengua produce sentidos por/para los sujetos. Mas, para el Análisis de Discurso francés, ideología, según Orlandi, no se define como un conjunto de representaciones, ni mucho menos como forma de ocultar la realidad. Es una práctica significativa. Necesidad de interpretación, la ideología no es consciente: es efecto de la relación del sujeto con la lengua y con la historia, en su relación necesaria para que se signifique (ORLANDI, 1996, p. 48). Es productivo enfatizar que el Análisis de Discurso no trabaja con la lengua encerrada en sí misma, sino con el discurso como un objeto socio-histórico en que lo lingüístico interviene como presupuesto. Ni trabaja, por otro lado, con la historia y la sociedad como si ellas fuesen independientes del hecho de que ellas significan. “Partiendo de la idea de que la materialidad específica de la ideología es el discurso y la materialidad especifica del discurso es la lengua, trabaja la relación lenguadiscurso-ideología” (ORLANDI, 1990, p. 16-17). Es decir, el Análisis de Discurso se propone comprender cómo un objeto simbólico produce sentidos, cómo él está investido o provisto de significancia para y por sujetos (ORLANDI, 1999, p. 26). Para eso, una noción fundamental es la de funcionamiento del lenguaje. Del punto de vista del Análisis de Discurso, lo que importa es destacar el modo de funcionamiento del lenguaje, sin olvidar que él no es integralmente lingüístico, dado que de él también 103 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 forman parte las condiciones de producción, que representan el mecanismo de situar a los protagonistas del discurso (ORLANDI, 1987, p. 117). Concomitantemente, buscamos la interlocución entre el análisis de discurso y la antropología, más específicamente en la mirada antropológica que se orienta a procurar otras interpretaciones de la historia y la cultura indígena, superando así los sentidos estabilizados, basándose en las propias visiones indígenas de las historias del contacto indio-blanco (WRIGHT, 1992, p. 191), siendo que en la actualidad el cierne de la antropología sea el estudio de las diferencias y de las relaciones de alteridad que de ahí emanan. Los resultados de la investigación nos mostraron esa interlocución como extremadamente productiva para avanzar en la discusión sobre los mapuche y la manera en que éstos se identifican y significan. Ese fue nuestro punto de partida, buscando superar la forma en que los mapuche son significados en Chile, pues, como ya señalamos, lo que en ese país es vehiculado por los medios de comunicación masivos, son los discursos sobre los mapuche, o sea, las interpretaciones sobre ellos y su realidad, interpretaciones hechas por sujetos que están en posiciones discursivas muy distintas a las posiciones ocupadas por los mapuche. Por otro lado, estamos conscientes que las denominaciones utilizadas en esta discusión: mapuche, pueblo mapuche, winka, no mapuche, sociedad chilena, pueden producir el sentido de homogeneidad, de aparente unidad incapaz de distinguir la diversidad presente en las agrupaciones mapuche, en las comunidades mapuche y en la sociedad chilena – como en todas las sociedades. Sin embargo, esa aparente generalización – que no dio condiciones para discutir la complejidad que constituye tanto a la sociedad mapuche como a la chilena – fue necesaria para definir las posiciones discursivas en disputa, a saber, la posición-sujeto mapuche y la posición-sujeto chileno trabajadas en nuestra tesis. 104 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 En ese contexto, consideramos necesario mencionar un concepto que en América Latina se considera fundamental en la discusión de los procesos sociales indígenas, a saber, el etnodesarrollo. Según Muñoz, La formulación de la Teoría del Etnodesarrollo en Latinoamérica se desarrolla en base a un debate que se inicia con un rechazo entre sectores antropológicos de los diferentes enfoques paternalistas del indigenismo tradicional, sean estos de la corriente integracionista o de la tutelar tradicionalista. Pronto es tomado y elaborado por los movimientos indígenas mismos, que asumen un fuerte protagonismo […] Se desarrolla cierto consenso entre especialistas y líderes indígenas que es denominado en diferentes momentos como “el neo indigenismo” e “indianismo” (términos creados para subrayar la distinción entre esta corriente de pensamiento de los propios pueblos “indios” y aquel indigenismo de los antropólogos clásicos no indígenas). (1996, p. 4). Con relación a su origen, el concepto fue formulado por el antropólogo mexicano Rodolfo Stavenhagen. En las palabras del autor, el etnodesarrollo es concebido como un proceso dinámico y creativo que, más que limitarlas, puede liberar energías colectivas para su desarrollo. Al final de cuentas la corriente cultural principal no pasa de una confluencia de múltiples corrientes separadas. Y si éstas corrientes separadas no pudiesen crecer, la corriente principal se secará (STAVENHAGEN, 1985, p. 43). Haciendo una reflexión sobre ese concepto, Cardoso de Oliveira señala que el etnodesarrollo no era sólo un desdoblamiento del concepto desarrollo, corriente en la literatura económica y política producida en Europa y en las Américas, sino casi un contra-concepto, pues implicaba una crítica sustantiva a las teorías de desarrollo, bastante en voga en los países de nuestro hemisferio. Con ese concepto se proponía un tipo de desarrollo ‘alternativo’ que respetase los intereses de 105 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 los pueblos o de las poblaciones étnicas, a quienes se destinan los llamados ‘programas de desarrollo’ (CARDOSO DE OLIVEIRA, 2000, p. 47). Sin duda, esa re-valoración de la diferencia y esa demostración del deseo de escuchar la voz del otro son grandes avances en la comprensión de los procesos de cambio social de los pueblos originarios de este continente; mas, es necesario señalar que después de varias décadas de esa discusión, aún las propuestas llamadas de desarrollo e incluso de etnodesarrollo de los diversos gobiernos de América Latina, orientadas a los indígenas, continúan siendo generadas y administradas por entidades exógenas y no por los propios pueblos a quienes son dirigidos esos esfuerzos. En nuestra perspectiva, pese a que reconocemos un avance en esa discusión, percibimos que el etnodesarrollo continúa basándose en el discurso del mundo occidental y en la búsqueda de soluciones para los problemas indígenas enmarcados en la óptica progresista. Por tanto, en la construcción teórica de nuestra investigación trabajamos con la idea de cambio social, en lugar de desarrollo social o etnodesarrollo, rechazando el paradigma hegemónico de tipo capitalista. Pues concebimos el cambio social como la posibilidad de que nuevos procesos sociales tengan sentido para los sujetos y re-configuren el orden social. En la reflexión y el análisis de la investigación, asumimos como universo de estudio el Área de Desarrollo Indígena (ADI) del Lago Lleu-Lleu, VIII Región de Chile, específicamente las comunidades Ranquilhue, Miquihue, El Malo y Choque. Aunque pueda parecer tautológico, es necesario insistir en que – como ocurre en todos los pueblos – entre los mapuche existen diferencias y trabajar con comunidades mapuche que se reconocen como tal, exigió entender los espacios de sobrevivencia de ese pueblo, buscando comprender porqué y cómo esos grupos concretan sus vidas, como la realizan; buscando conocer parte de la memoria y del pensamiento de ese pueblo con relación 106 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 a los cambios sociales que desean y aquellos que de hecho experimentan. El aspecto central de la investigación fueron los mapuche que estaban participando en los proyectos de cambio social en implantación en el Área de Desarrollo Indígena del Lago Lleu-Lleu durante nuestra permanencia en Ranquilhue el año 2002, época en que realizamos una parte significativa del trabajo de campo. Es importante destacar que nuestro foco de atención fueron los procesos locales de resistencia mapuche, considerando la memoria y la cosmovisión como aspectos necesarios para hacer el contrapunto a las formulaciones oficiales de las llamadas políticas de desarrollo para esa área geográfica. CONDICIONES DE PRODUCCIÓN DE LOS DISCURSOS La VIII Región del Bío-Bío, región donde se ubican las comunidades que formaron parte de este estudio, se sitúa en el territorio de Chile continental, en la zona centro sur del país, entre los paralelos 36o 00’ y 38o 20’ de latitud sur y desde 71o 00’ de longitud oeste hasta el Océano Pacífico, con una superficie de 36.929,3 km² (CENTRO ITATA, 1992, p. 35). Según datos censales del año 2002, la población regional en la época que realizamos la investigación era de 1.859.546 habitantes, siendo que el 13,4% eran habitantes rurales. Es interesante enfatizar que según el Censo anterior, de 1992, el porcentaje de población rural era de 21,3%. Con relación a la presencia mapuche, en la región viven núcleos importantes de este pueblo, ubicados principalmente en la Provincia de Arauco, sector de la Cordillera de Nahuelbuta y sector de Alto Bío-Bío. Respecto a la población, es necesario recordar que, según el Censo de 1992, el total de la población de la Región del Bío-Bío era de 1.241.856 personas y la población mapuche era de 125.180 personas, o sea 10,08% de los habitantes de esa región eran mapuche. Mas, ya en el Censo de 2002, la población mapuche fue reducida a 54.078 personas, en otras palabras, menos de 107 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 la mitad de los mapuche de diez años antes, representando ahora sólo 2,91% de la población regional, dada la aparente disminución de los indígenas y el aumento de habitantes en la región. Sin embargo, esos cambios drásticos referentes a la población indígena registrados en ese censo provocaron dudas sobre su confiabilidad pudiendo ser explicados como una necesidad del Estado nacional de borrar la presencia mapuche. Esa necesidad de ocultar, de distorsionar la realidad mapuche, estaría motivada por la tensión política vivida durante los últimos gobiernos, debido a los fuertes movimientos de reivindicación de los mapuche, especialmente aquellos orientados a la recuperación de las tierras ancestrales. Según las informaciones entregadas por el Centro Itata, en la década de los 90 del siglo XX, la VIII Región presentaba altos porcentajes de población en condiciones de pobreza, apareciendo como la segunda región más pobre de Chile, con una distribución territorial y étnica distintiva: municipios rurales y concentración de población campesina y mapuche formando verdaderos espacios de miseria, situación verificada por diversos estudios de organismos nacionales, internacionales y por instituciones regionales (CENTRO ITATA, 1992, p. 37-39). No obstante, según datos estadísticos presentados en el último censo de población, como mencionamos anteriormente, la región habría perdido las características étnica y de ruralidad. Las categorías de pobreza, ruralidad y etnicidad antes mencionadas, aquí son presentadas como una forma de dar a conocer la manera en que la región es comprendida por el Estado y por las instituciones existentes en la misma región, elementos que – aunque aquí sólo podamos entregar de forma somera – también contribuyen para situar nuestro universo de estudio y para mostrar las interpretaciones polémicas de la realidad mapuche, cuando se enfrentan las visiones de este pueblo con las visiones de la sociedad chilena y del Estado, enmarcadas en la lógica capitalista, economicista-progresista. 108 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Nuestro conocimiento de la región del Bío-Bío nos permite afirmar que la mayor parte de los mapuche que vive allí, lo hace en condiciones de precariedad, inseguridad y discriminación. Sin embargo, a pesar de eso, los mapuche de la región tienen bastante visibilidad frente a la opinión pública, en la costa los lafkenche (gente del mar) y en la cordillera los pewenche (gente de la araucaria), ambos grupos envueltos en movimientos de lucha que defienden los derechos de los mapuche, la recuperación del territorio y el derecho de autodeterminación, cuestiones relacionadas al concepto de nación indígena. Ellos tienen bastante visibilidad en los medios de comunicación de cobertura nacional, no obstante, una notoriedad muchas veces asociada a la violencia especialmente en lo referido a los actos a favor de la recuperación de la tierra por la represión hacia esos actos reivindicativos, tanto de los empresarios agrícolas y forestales como del Estado. En Chile, es de conocimiento público que la represión policial ha significado la muerte de personas mapuche y el encarcelamiento de líderes mapuche. Es productivo comentar que en la región existen diversas organizaciones locales, que representan comunidades o bien a un conjunto de comunidades mapuche, las cuales no cuentan con apoyo externo o por el contrario, lo reciben de entidades no gubernamentales chilenas o extranjeras. En el mismo sentido, es importante destacar que en la actualidad la organización regional mapuche de mayor relevancia es la Coordinadora Arauco – Malleco (CAM), creada en 1997, donde también participan mapuche de las provincias de Malleco y Cautín, de la IX Región, organización que muchos medios de comunicación denominan Coordinadora de Comunidades en Conflicto Arauco Malleco. En la actualidad, en el sur de Chile se observan enfrentamientos o ‘conflictos’ entre empresas madereras y comunidades indígenas mapuche por la propiedad de la tierra. El efecto de esos enfrentamientos y el deterioro creciente en las relaciones entre el Estado y las comunidades que sufren 109 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 esos ‘conflictos’ ha sido uno de los elementos de presión que condujeron al Estado a dictar la Ley no 19.253, pues la violencia desatada en esos ‘conflictos’ ha generado una gran presencia pública del tema mapuche y un debate sobre el carácter de las presentes y futuras relaciones interétnicas existentes en el país. Según Muñoz, la visibilidad de los mapuche provocada por esos procesos de recuperación de territorio ha dejado ver el nivel de pobreza que presentan esas comunidades indígenas, producto de las pocas tierras que poseen y su falta de capacidad productiva, a partir de la baja calidad de los suelos y de la falta de políticas adecuadas para un tratamiento integral del problema (MUÑOZ, 1999, p. 9). Es consenso que esa presencia mapuche ha sido uno de los factores fundamentales en la promulgación de la Ley no 19.253, o Ley Indígena, de 1993. En teoría, esa Ley estaría orientada a proteger a los indígenas y a colaborar en el proceso denominado ‘desarrollo indígena’. Mas, según lo constatado en las comunidades de la ADI del Lago Lleu-Lleu, esa Ley es fuertemente criticada por los mapuche. Con relación al trabajo de campo y la definición de nuestros interlocutores, antes de visitar las diferentes comunidades durante el desarrollo de la investigación, participamos en una reunión de la ADI del Lago Lleu-Lleu – Área de Desarrollo Indígena creada en función de la Ley no 19.253 –, donde informamos sobre la investigación y solicitamos el apoyo de los mapuches del sector. En esa ocasión y luego al visitar a las diversas familias expresamos que el objetivo de este trabajo sería contribuir en la lucha de los mapuche de Chile para que sean escuchados y reconocidos y que ese material discursivo sería llevado a la universidad en Brasil. De ese modo, en el momento de la interlocución con los mapuche que colaboraron en la investigación, ellos estaban conscientes que sus dichos serían llevados al espacio discursivo de la academia, de los winka. Las entrevistas fueron extremadamente productivas y la interlocución con los mapuche del Lago Lleu-Lleu trajo asuntos 110 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 relacionados a procesos sociales de cambio y resistencia, vividos por los mapuche al interior de la sociedad chilena. Así, durante el trabajo de campo, conversé con personas afectuosas y otras desconfiadas. Supe de los conflictos de las comunidades con los winka y de los conflictos en las propias comunidades. Mis interlocutores me hablaron de los muchos proyectos winka que han llegado a sus comunidades. Muchos problemas por disputas entre miembros de una misma comunidad podrían explicarse como una consecuencia por la presencia de esos proyectos. Mis interlocutores también se quejaron de las fallas de los líderes mapuche, que no responden adecuadamente al movimiento de lucha por sus demandas. Realicé muchas entrevistas a los mapuche, buscando vencer la desconfianza, especialmente presente cuando usé la grabadora. El hecho de que yo también fuera mapuche no me liberó de esa desconfianza, pues para mis entrevistados yo también representaba el poder de los winka, representaba a la universidad y ellos desconfiaban del destino de esas entrevistas y del uso que ellas podrían tener. Es importante relevar que muchas veces fue necesario más de un contacto con los entrevistados, para realizar las entrevistas grabadas. Es importante mencionar que durante los años 2001 y 2002, época en que realicé la investigación de campo y colecté los discursos de los mapuche del Lago Lleu-Lleu, el espectro político relacionado al pueblo mapuche era muy complicado, fuertemente marcado por la violencia. Durante mi trabajo de campo, pude vivenciar e informarme de hechos graves y dolorosos, hasta de muerte, que envolvieron al pueblo mapuche y su lucha por la reivindicación de los derechos mapuche. Actualmente continúan ocurriendo acontecimientos que muestran la gravedad de las relaciones entre el pueblo mapuche y el estado chileno y la falta de soluciones a las reivindicaciones de este pueblo. A pesar de ese clima violento, evalúo esa etapa de la investigación como muy productiva, pues visité familias y escuelas; participé en 111 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 diversas actividades de la comunidad; en diversas reuniones, de las comunidades y con entidades externas; y entrevisté mujeres y hombres de diversas edades, niñas y niños, líderes mujeres y hombres y una machi (chamán) del sector. RE-CONOCIENDO A LOS MAPUCHE En primer lugar, buscamos percibir como el mapuche se coloca en ese objeto simbólico, su discurso, cuando nos habla de su vida en relación al resto de los chilenos. Entonces, escogimos trechos o recortes de los discursos que muestran la regularidad discursiva en lo dicho por los mapuche entrevistados, cuando tocaron diversos temas. Observemos uno de los recortes discursivos analizados: Y como mapuche nosotros, las tradiciones que Dios nos ha dejado a nosotros, esa es nuestra religión, que [Dios] le dejó al mapuche y el winka tiene aparte su [Dios]... siempre yo he dicho eso, que lo tienen aparte ¡puh! Porque si ellos quieren orar, oran y nosotros oramos en la tierra, en grupo, a nuestro Chaw (Padre) Dios. En ese trecho pudimos ver que el locutor está ocupando la posición discursiva del mapuche, él es el sujeto en su discurso, que se contrapone a la presencia de otro, que él denomina winka. Siendo así, es productivo recordar el posible origen del concepto winka, pues ese concepto en la cultura mapuche tiene una larga historia. Mayoritariamente asociado a la palabra winküfe, ladrón o asaltante, estaría siendo utilizado por los mapuche desde el contacto con los invasores, los españoles, los conquistadores y posterior a ese contacto se habría generalizado para nombrar a los extranjeros y hoy a los chilenos. Como pudimos observar, las marcas: nosotros, mapuche, los winka, ellos, aparecen diseñando figuras contrarias, dos identificaciones o dos identidades diversas que insinúan una frontera. 112 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Podemos decir que en los discursos de los mapuche prevaleció la posición-sujeto mapuche, prácticamente en todas sus elocuciones. Y las marcas discursivas: nosotros, ellos, nosotros mapuche, los winka y sus paráfrasis chileno y extranjero, organizando el discurso de los mapuche prácticamente en todo el material discursivo analizado. La voz del ‘indígena’ que se identifica como mapuche, como “un otro” en la medida que también identifica a ese “otro” como distinto, en una relación de contacto que se muestra tensa, peligrosa, violenta. También es interesante trabajar con la relación formacontenido del discurso. Así, en la interpretación, junto con las marcas, observamos atentamente el contenido de los trechos discursivos analizados. Veamos: Ah! sí pues, yo cuando fui, aquí, ya fui niña ya, pequeñita, ya me fui dando cuenta, aquí donde vivíamos nosotros, de la pobreza toda [...] a patita pelá andábamos, no teníamos zapato nada, con una telita de vestido que nos ponía mi mamá, no más ¡puh!, nosotros fuimos sumamente pobre, pobre y fuimos muy engañados por los winka, fuimos muy... siempre el winka a nosotros, los ía humillando [...] los mapuche no teníamos valor [para los winka], los mapuche que somos éramos pobres. Nos miraban [a los mapuche] como igual que mirasen un bicho, más bien dicho, [cuando] íamos por ahí, en los winka, en los inquilinos. Yo como ya fui niñita, después ya entré a trabajar en los inquilinos, yo ahí, siempre me acuerdo, llegaban los mapuche [donde los winka]. ¡Ahí viene la china! esa era la palabra que nos tenían. ¡Ahí viene la china! ¡Ya vendrá muerta de hambre la china! ¡Por eso viene! Y a mí me dolía eso. ¿Por qué estaba yo ahí mismo trabajando? Decía yo. ¡Ver lo que es, decía yo! ¡Estos winka porque tienen le tratan como perro a uno, le tratan así! ¡Y me sentía mal yo! Llegaban las señoras así, claro, muertas de hambre, más bien dicho. Sí, antes éramos pobres ¡puh! No hallábamos con que trabajar, no habían bueyes, ¡no había nada! Vivíamos por ahí, casi de limosna en los winka no más, ¡puh! ¡Siempre humillados de los chilenos y 113 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 no le tenían respeto al mapuche! Sí, el mapuche, éramos, les miraban igual como ver, mirar un bicho, no más. Así que de por ahí ya nos criamos y como antes salían hartas, hartas machas íamos al mar, ahí en la playa de Quidico, pa’ bajo, hasta Lleu-Lleu abajo. Sí, estaban las gentes enrranchados ¡puh!, sacando machas [...] nos llevaban por ahí, por Purén a venderlo [...] ya después fuimos niñas, salíamos a trabajar, llevábamos el hacha al hombro por ahí, cortando chocho nosotros trabajábamos igual como un hombre, yo le sabía más trabajo de hombre antes de la cocina ¡puh!, sufrimos mucho nosotros, sumamente. Y tenía mi abuelita [...] me quitaron la tierra, hija, me decía, los winka me engañaron, mi tierra lo dejé botado, en Quidico, me decía. Ahí tengo tierra, pero yo no vendí mi terreno, decía. Me lo quitaron los winka, por un almud de trigo. ¡Le quitaron la tierra a mi abuelita! Eso [...] Reclamen la tierra, decía. ¡Que, ahora nosotros vamos a reclamar esa tierra! Si el winka ya lo tomó ya, ¡puh! Así que ahí quedó esa tierra toda, esa fue la pobreza más grande que tuvimos nosotros. En lo dicho, percibimos que cuando en el discurso de los mapuche se menciona a los winka o chilenos se habla de engaño, de la desvalorización o menosprecio del winka, de la humillación y la falta de respeto con que los winka tratan a los mapuche y también de los robos de la tierra mapuche cometidos por los winka, lo que muestra sentidos de polarización de fuerzas, de agresión, de dos grupos en disputa. De ese modo, podemos decir que en el discurso de los mapuche se muestran dos lados y una frontera. El sujeto mapuche no se visualiza como un chileno más, por el hecho de haber nacido en ese territorio nacional y haberse registrado bajo esa nacionalidad. Como vemos en los discursos de los mapuche, existe una barrera intransponible, el mapuche no es winka y el winka no es mapuche, es decir, el mapuche no es chileno y el chileno no es mapuche, lo cual coloca en suspenso los sentidos estabilizados en la sociedad chilena, para la cual el mapuche forma parte de la nación y por lo tanto es también chileno. 114 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Por otro lado, entre los mapuche entrevistados, aproximadamente un 50% de las personas, eran hablantes nativos y dominaban la lengua mapuche, mapudungun o chedungun completamente. Entre los mapuche que no hablaban la lengua, había muchos que conseguían entender y hablar un poco, hasta el extremo opuesto de aquellos que sólo conocían palabras sueltas. En ese último grupo se encontraban especialmente los jóvenes y niños. Con relación a ese asunto, los discursos de los mapuche evidenciaron los procesos de silenciamiento del mapudungun, que los mapuche de Chile vivieron y viven hasta los días de hoy. Examinemos un trecho discursivo referido a este asunto: El profesor [...] nos quitó la lengua, que nosotros hablábamos como nos enseñaba el padre. ¡La lengua mapuche! ¡Lo prohibió! [...] como en el segundo año estaba yo, ahí hablábamos todavía. Ya después no seguí [hablando]. Vino una ley, parece, ningún profesor admitía [a los niños] hablar en lengua mapuche. Nos decía [el profesor], porque a veces me dijeron ellos [los profesores], que nosotros los engañábamos [...] podíamos trampearlo, una cuestión así, y otro porque no pueden leer bien. Ya, y quien hablaba a lo mapuche [...] lo hincaban de rodillas con arvejitas, triguito, por ahí, en las rodillas, con las rodillas pelás. El que hacía alguna cosa, desobedecía eso, algo así... Y ¿que vamos a hacer? Y nosotros, el miedo... que veíamos hincao otro compañero. ¡Tampoco! ¡Pronto! [...] Tenemos que hablar en castellano, no en mapuche. Prohibido. El profesor era Luciano Mora Lagos [...] después no pudimos hablar más, porque prohibió ¡puh! Llegaban, nos guasqueaban y nosotros ¡puh! después obligados a aprender, aprender, aprender en castellano [...] [...] ahí me acuerdo yo del colegio, cuando el profesor nos dijo: ¡no queremos lengua mapuche! [en la escuela, ellos]. Entonces ahí es donde me molesta a mí. Digo [...] ¡nos cortaron y, en lo más nuestro, nos cortaron! [ellos]. Entonces, ahí donde teníamos que aprender para hablar bien, igual como el castellano. Pero no nos dejaron, ahí es que me siento molesto yo ¡puh! 115 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Estamos de acuerdo con Payer (1999, p. 16), cuando, hablando de los procesos de silenciamiento de otras lenguas distintas de la lengua nacional, en los países latinoamericanos, destaca que el hecho menos importante es el lingüístico en sí, no obstante, lo más importante sea el hecho – político, discursivo, simbólico – de haber habido y haber un silenciamiento en el orden del discurso sobre la forma consistente de la presencia de las lenguas de otros pueblos en el desarrollo de los hechos sociohistóricos que edifican los países latinoamericanos como naciones consideradas homogéneas lingüísticamente. En el mismo sentido, la autora agrega que la interdicción o prohibición de una lengua no deja de funcionar como la interdicción de un cierto modo de constitución del sujeto en esa lengua. Consecuentemente, esa prohibición funciona como silenciamiento de la memoria histórico-discursiva presente en ella. El silenciamiento de una lengua y de la memoria en ella inscrita borran, de ese modo, elementos que no son apenas del dominio de lo formulable – en el sentido de que una lengua es pronunciable, decible –, mas que son del orden de lo que es fundamentalmente constitutivo de un sujeto, de una sociedad, como memoria histórica (PAYER, 1999, p. 161). La memoria mapuche, objeto de este trabajo, aquí es entendida como la memoria de las relaciones de contacto con una cultura diferente. No obstante, sabemos que entre las diversas memorias discursivas que constituyen la formación social chilena, la memoria del pueblo mapuche de Chile no consta entre los temas considerados políticamente correctos. Se trata de un pueblo que durante siglos ha sido negado como alteridad. Así, en el imaginario del chileno – prácticamente – no hay discursos que muestren a la población mapuche como un sector que soportó tres siglos de guerra, primero con los españoles y posteriormente con los chilenos; tampoco hay discursos referentes a los procesos destructivos que no acabaron con su derrota militar de fines del siglo XIX, cuando Chile declaró su extinción ‘legal’ como 116 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 sociedad. Por eso, cuando se habla de la formación de Chile como un país, los mapuche aparecen conformándolo, evidentemente destituidos de su identidad, su lengua, su cultura, etc., por lo que ellos también van a transitar en el espacio discursivo de los chilenos, aunque contrario a su propia identidad mapuche. Veamos: El winka se hizo dueño [de la tierra] corretiándolos, corretiando a los mapuche y quien no salía, lo mataban, le quemaban su ruka (casa), se hacían dueños de los animales que tenían los mapuche. ¿Y nosotros como mapuche, a que winka hemos matao cuando hacemos conflicto? Cuando tratamos de recuperación, hablamos muchas veces, dicen: ¡Los mapuche están metíos en un fundo! ¡Se tomaron la tierra! No ¡puh! No es tomaura de tierra, es recuperación. En el inicio de este recorte podemos observar que al hablar de la violencia que ha caracterizado el contacto, el mapuche no lo hace desde la posición-sujeto mapuche, él se disloca a la posición-sujeto winka diciendo “corretiándolos, corretiando a los mapuche”, lo que podemos ver nuevamente cuando habla de la recuperación del territorio diciendo “¡los mapuche […] metíos en un fundo! ¡Se tomaron la tierra!”, que como dijimos es una posición discursiva contraria a su propia identidad. Después, como en los trechos de los discursos analizados anteriormente, aquí también la presencia de los mapuche es marcada por el pronombre nosotros, ‘nosotros mapuche’ relacionados a los winka, los no-mapuche, los otros, que no forman parte de ese nosotros. Así, en principio estaría la marca de la presencia de esos dos grupos con identidades o identificaciones diversas, los mapuche y los winka y el tránsito del mapuche por esas dos posiciones discursivas. Además, si reparamos en el contenido de ese discurso, que recuerda la historia de los mapuche y la relaciona con el presente, percibimos que para el mapuche que habla en ese discurso, la historia es dolorosa y asustadora y en ella están presentes la pérdida de su tierra, el robo, el asesinato y 117 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 el abuso perpetrado por los winka, sentidos siempre presentes en el discurso de los mapuche. Mas, cuál es el sentido que se pasa cuando el mapuche dice: “¿Y nosotros como mapuche, a que winka hemos matao?” ¿Porqué motivo sería necesario preguntar si los mapuche han muerto a algún winka? ¿Cuál es el funcionamiento discursivo de esa pregunta? Consideramos productivo prestar atención a la conjunción “y” que inicia la pregunta. ¿Qué sentido tiene que esa pregunta se inicie diciendo “y”, para luego inquirir, “¿nosotros como mapuche, a que winka hemos matao?” En primer lugar, la conjunción “y” estaría agregando algo a lo que fue dicho en la primera parte de ese recorte “el winka se hizo dueño corretiándolos, corretiando a los mapuche y quien no salía, lo mataban, le quemaban su ruka, se hacían dueños de los animales que tenían los mapuche”. Al re-colocar la primera parte del recorte, vemos que la conjunción estaría dando más visibilidad a uno de los sentidos más fuertes en ese trecho, aquel que apunta hacia la idea de que los winka han asesinado a los mapuche, a lo que se agrega,… “¿y nosotros como mapuche, a que winka hemos matao...?” Así, ese discurso estaría dando visibilidad a un gran problema no resuelto, la violencia con que la sociedad chilena y el Estado han tratado y actualmente continúan tratando a los mapuche, los cuales, según ese discurso, no habrían reaccionado con el mismo tipo de violencia, durante los años de contacto, los mapuche no habrían asesinado a ningún winka. No obstante, el asunto de la violencia con que el mapuche ha sido tratado durante siglos, ha sido borrado y/o justificado a través de los más diversos mecanismos y, por lo tanto, durante siglos, simplemente, ese tema no circuló en los espacios discursivos de la sociedad nacional y del Estado chileno. En ese sentido es productivo enfatizar nuevamente que, en el siglo XXI, continúan muriendo mapuche como consecuencia de la política de negación del mapuche y control del Estado chileno; mas, en la actualidad, 118 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 ese asunto por momentos circula en discursos vehiculados por los medios de comunicación masivos y sensibiliza a la sociedad chilena. Volviendo al recorte que está siendo analizado, es importante detenernos nuevamente en la pregunta seleccionada, para ahora buscar entender lo que ocurre con ese discurso cuando se dice: “¿a que winka hemos matao cuando hacemos conflicto?” Aquí, fundamentalmente, nos interesa registrar en que posición discursiva está el locutor cuando dice hacemos conflicto. ¿Conflicto, en la perspectiva de quién? Para comprender ese movimiento discursivo es necesario recordar que en la sociedad chilena, los winka – periódicamente – están hablando de los mapuche; pues, cuando el mapuche reivindica sus derechos con fuerza, incomoda, y, en la perspectiva del winka, él altera el orden nacional, él atenta contra ese orden, él desestabiliza, él crea conflicto. Son esos los sentidos que hablan más alto, los sentidos estabilizados en la sociedad chilena. De ese modo, el mapuche en su discurso por momentos también es preso, es tomado por esos sentidos y la represión del Estado y de la sociedad nacional marcan así su discurso. Por tanto, hay ocasiones en que quien habla en ‘su discurso’ es el otro, el sujeto winka, el chileno, el dominador, que se instala en el discurso del mapuche imponiendo los sentidos ya puestos, ya cristalizados en el habla de los chilenos. Por último, el análisis anterior nos permite percibir que en ese trecho estarían presentes dos memorias o dos interdiscursos: la memoria del sujeto discursivo mapuche y la del winka. O sea, el locutor de ese discurso estaría transitando por las posiciones discursivas del mapuche y del winka. Reconociendo la complejidad del asunto, tomo las palabras de Pêcheux, que pienso contribuyen para insistir en como la cuestión de la memoria es un tema complicado y trascendente que debe ser tratado con un cuidado extremo. Él nos dice: 119 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Una memoria no podría ser concebida como una esfera plena, cuyos bordes serían trascendentales históricos y cuyo contenido tendría un sentido homogéneo, acumulado de la forma en que lo haría un reservorio: es necesariamente un espacio móvil, de divisiones, de disyunciones, de dislocaciones y de retomadas, de conflictos de regularización. Un espacio de desdoblamientos, réplicas, polémicas y contra-discursos (PÊCHEUX, 1999, p. 56). En los discursos de los mapuche buscamos entender como ellos se significan ante la sociedad nacional chilena, para luego procurar comprender cuales son los efectos de sentido de los ‘programas y proyectos de desarrollo’ originados por el Estado, que llegan a las comunidades mapuche. Como ya señalamos, los análisis dieron visibilidad a dos identificaciones que no se cruzan, el mapuche y el winka o chileno. Dos pueblos en el mismo territorio y sometidos a las mismas leyes, las leyes de los chilenos; pues, en Chile la identificación del mapuche como “un otro” no es un lugar posible de identificación, ya que no da espacio para que la alteridad se realice. Consecuentemente, los discursos de los mapuche nos mostraron que para ellos los programas de ‘desarrollo’ del Estado chileno no tienen los sentidos esperados. Veamos: No le voy a agradecer jamás al proyecto, porque en este Estado, en este régimen que estamos viviendo, el proyecto o los proyectos, no sólo del Área de Desarrollo del Lleu-Lleu, sino de los proyectos que nos están dando a nivel, como mapuche, de mantener nada más al mapuche tranquilo, conforme y que esté muy a la espera de los proyectos y con eso pasar un proceso político, seis años más, seis años más, seis años más, [...] se va reduciendo [al mapuche], muy tranquilo [...] con una gran tranquilidad y [...] no le sirve los proyectos a los mapuche [...] una mala intención, no es una buena intención para el pueblo mapuche. 120 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Podemos percibir que en el trecho citado hay una desestabilización de los sentidos dominantes acerca de la condición de los mapuche en la sociedad chilena y en la forma en que son significados los ‘proyectos y programas de desarrollo’ – que desde la óptica del Estado y de los chilenos son algo positivo, un aporte al ‘desarrollo’ de los mapuche – y que, sin embargo, en este discurso tienen un sentido completamente contradictorio: de control, de dependencia, de peligro para los mapuche. Observemos un último recorte discursivo: Yo diría que hasta el momento, sigo culpando al Estado, […] en este momento, porque le digo esto, porque los proyectos, estamos en un mundo de proyectos aquí en este país, para el pueblo mapuche. Ahora, ¿se ha visto? Sin proyecto no se puede hacer ngüillatun (rogativa mapuche) [...] en enero va a haber un evento de un torneo de chueca [palin], una competencia, pero esta competencia, si no me equivoco, viene financiada por trescientos mil pesos que se le dan al presidente del Área de Desarrollo, que se compra un par de vaquillas para que se haga esto. Entonces, no es lo que el mapuche debe hacer. Incluso, han habido ngüillatunes que se invitaba de comunidad en comunidad y eso se usaba mucho antes que las municipalidades, o sino la Conadi (Corporación Nacional de Desarrollo Indígena) tuviese que aportar con plata para comprar esas vaquillas y que los mapuche se la coman, o sea que nosotros comamos esas vaquillas entre esas comunidades, para poder hacer ngüillatun. Entonces, no es lo que, no somos mapuche en este momento, sino de que aquí nos están utilizando y más que utilizando, para poder decir... se dice ¡no! que no somos mapuche, sino de que estamos tipo unos tonis ante un circo, nada más y eso lo saben todos aquí. Como vemos, en los discursos de los mapuche las antiguas comprensiones sobre los programas y proyectos de ‘desarrollo’ son de-significadas, dándose lugar a nuevos sentidos, ahora de control, dependencia, humillación, degradación, negación, muerte de los mapuche, indignación, vergüenza, resistencia, 121 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 sentidos diferentes a los cristalizados en el discurso de los winka, lo que muestra que la interlocución entre los mapuche y los chilenos se bloquea en la inter-incomprensión. A MANERA DE CONCLUSIÓN El análisis de nuestra investigación, que en este artículo no pudimos profundizar, nos mostró que hay una frontera entre los mapuche y los winka. Sin embargo, esa comprensión se contrapone al sentido sedimentado en Chile y que domina los procesos de significación, cual es el sentido cristalizado a partir de la constitución de la República de Chile, en el cual todos los ciudadanos chilenos son pertenecientes a una única nación y son todos iguales en lo que respecta a sus deberes y derechos ciudadanos. A partir de ahí, en este análisis los sentidos son desestabilizados y de los discursos emergen otros significados que visibilizan la inter-incomprensión entre los mapuche y los winka. Los mapuche no son chilenos y los chilenos no son mapuche. Los mapuche son un pueblo con otra historia y otra lengua, negándose así la homogeneidad de los ciudadanos chilenos que en el discurso nacional oficial, hablarían la misma lengua y tendrían los mismos derechos. El efecto de sentidos de los discursos, de ese proceso discursivo como un todo, es la presencia de dos identidades, dos naciones, donde nación tiene sentido para el mapuche mientras lo identifica con su pueblo y no con la nación chilena, al tiempo que para los chilenos tanto ellos como los mapuche forman parte de la misma nación, Chile, y por tanto son todos chilenos. Como resultado, el efecto de sentido es una inter-incomprensión constitutiva entre los discursos de los mapuche y los chilenos, que aparece negando la posibilidad de interlocución y por tanto la posibilidad concreta de que los proyectos de cambio social oriundos del Estado chileno tengan sentido para los mapuche y/o que los proyectos que tienen sentido para el pueblo mapuche sean elaborados por los chilenos. 122 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 En fin, una “otra” forma de comprender – discursivamente – la relación mapuche-winka, donde los sentidos de los discursos de los mapuche relevan la existencia de este pueblo en condiciones de inseguridad y violencia y donde su forma de significar y significar-se los muestra en contradicción con los winka y el estado chileno; lo que estaría dando visibilidad a la urgencia de que en Chile los mapuche sean re-significados como una cuestión fundamental para crear espacios de negociación mapuche-winka y, consecuentemente, viabilizar los procesos de cambio social del pueblo mapuche. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARDOSO DE OLIVEIRA, Roberto. O trabalho do antropólogo. Brasília: Paralelo 15; São Paulo: Editora Unesp, 2000. CENTRO ITATA – CENTRO INTERDISCIPLINARIO DE ESTUDIOS DE DESARROLLO REGIONAL. El desarrollo regional desde el mundo social. Concepción-Chile: Aníbal Pinto, 1992. MUÑOZ, Bernardo. El etnodesarrollo y los pueblos indígenas, sus proyectos sociales y su identidad étnica. Serie Documentos de Trabajo Corporación de Promoción Universitaria, Santiago de Chile: Corporación de Promoción Universitaria, Documento de Trabajo n. 5, 1996. MUÑOZ, Bernardo. Derechos de propiedad y pueblos indígenas en Chile. Cepal: Serie Desarrollo Productivo. Santiago de Chile: Naciones Unidas, septiembre 1999. ORLANDI, Eni. A linguagem e seu funcionamento: as formas do discurso. Campinas: Pontes, 1987. ____. Terra à vista: discurso do confronto, velho e novo mundo. São Paulo. Cortez; Campinas: Editora da Unicamp, 1990. ____. Interpretação: autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólico. Petrópolis: Vozes, 1996. 123 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 ____. Análise de Discurso: princípios e procedimentos. Campinas: Pontes, 1999. PAYER, Maria Onice. Memória da língua: imigração e nacionalidade. 1999. Tese (Doutorado em Lingüística) – Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual Campinas – Unicamp, Campinas. PÊCHEUX, Michel. O discurso: estrutura ou acontecimento. Campinas: Pontes, 1990. ____. Papel da memória. In: ACHARD, Pierre et al. Papel da memória. Campinas: Pontes, 1999, p. 49-57. SOTO, Elba. Sonhos e lutas dos mapuche do Chile. Campinas: CMU Publicações & Arte Escrita. 2007. STAVENHAGEN, Rodolfo. Etnodesenvolvimento: uma dimensão ignorada no pensamento desenvolvimentista. Anuário Antropológico, Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, n. 84, p. 11-44, 1985. WRIGHT, Robin. Uma conspiração contra os civilizados: história, política e ideologias dos movimentos milenaristas dos Arawak e Tukano do noroeste da Amazonia. Anuário Antropológico, Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, n. 89, p. 191-231, 1992. ___________ ELBA SOTO – Postdoctorado en lingüística, Instituto de Estudos da Linguagem – IEL, Unicamp, Brasil; doctora en educación, Universidade Estadual de Campinas – Unicamp, Brasil; magíster en desarrollo rural, Universidade Federal de Santa Maria – UFSM, Brasil; ingeniero agrónomo, Universidad de Chile. He trabajado en programas y proyectos sociales y como investigadora y profesora universitaria; actualmente, imparto cursos, doy charlas y conferencias y publico mis trabajos en Chile, Brasil y México; teléfono celular: 56-9-76203714; <[email protected]>. 124 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 MIRADAS SOBRE LA INTEGRACIÓN EL TEQUIO Y LA GESTIÓN DE TIERRAS EN LA CHINANTLA MEDIA, OAXACA, MÉXICO 1928-1950* PATRICIA LEGARRETA R E S U M E N El artículo se enfoca en mostrar cómo se dio la conformación de comunidades agrarias en la región de la Chinantla media, Oaxaca en el contexto post-revolucionario y de la reforma agraria en México. Durante este periodo, la Chinantla media tenía fuertes vínculos intercomunitarios, a la vez que la visión hegemónica de los proyectos de desarrollo estatal así como en las teorías antropológicas tenían una perspectiva en la que los pueblos eran vistos como aislados. El artículo muestra que las comunidades no estaban aisladas entre sí y nunca lo han estado puesto que el intercambio de bienes, ideas y personas es fundamental para la reproducción biológica y social. P A L A B R A S - C L A V E Organización comunitaria; conflictos agrarios; desarrollo; intercambios regionales. * El siguiente artículo es parte de mi tesis de maestría titulada Modelos de gestión y cambio generacional en la dinámica regional de la Chinantla media, Oaxaca (2009) y se enmarca dentro del proyecto de investigación dirigido por la doctora Ana Paula de Teresa: Desarrollo Regional y Resistencia en la Cuenca del Papaloapan, UAM– Iztapalapa/Conacyt. A B S T R A C T The goal of this paper is to show how the agrarian communities were formed in the Middle Chinantla region in Oaxaca during the post-revolutionary, agrarian reform period in Mexico. At that time the Middle Chinantla had strong intercommunitary bonds, even as the hegemonic vision of State development projects as well as of anthropological theories shared a perspective in which pueblos where seen as isolated. We show that pueblos or local communities were not isolated among themselves and have never been so, since the interchange of goods, ideas and relationships are fundamental to their biologic and social reproduction. K E Y W O R D S Community organization; agrarian conflicts; development; regional interchanges. LA CHINANTLA MEDIA Y LA CONFORMACIÓN DE SUS FRONTERAS A FINES DEL PORFIRIATO La región de la Chinantla se ubica al norte del estado de Oaxaca, en el límite con el estado de Veracruz en México. Es la tercera selva del país, seguida de la Lacandona, en Chiapas y los Chimalapas en el sur de Oaxaca, en el límite con Chiapas. Se ha subdividido la región en diversas formas de categorización: la ecogeográfica, 125 R UR I S 1 “La primera se ubica en la cuenca del Papaloapan a menos de 400 m de altitud, e incluye los municipios de San Lucas Ojitlán, San José Chiltepec, Santa María Jacatepec, Ayotzintepec, San Juan Lalana y Santiago Jocotepec. Por su parte, la Chinantla media (situada entre los 400 y los 1.000 m de altitud) abarca los municipios de San Juan Bautista Valle Nacional, San Felipe Usila, San Juan Bautista Tlacoatzintepec, San Pedro Sochiapam y el municipio de San Juan Petlapa. Finalmente, los municipios de San Pedro Yolox, Santiago Comaltepec y San Juan Quiotepec conforman la Chinantla alta. Esta zona se localiza en la Sierra de Juárez a partir de altitudes mayores a los 1.000 m” (DE TERESA, 1999, p. 128). 2 “Dentro de la Chinantla existen barreras que dividen a la tribu en cuatro grupos, pero ninguna de ellas es tan elevada o tan difícil de alcanzar como las existentes entre los chinantecos y otras tribus. Los cuatro grupos de chinantecos así divididos son los siguientes: 1) los que viven en el área del Valle Nacional (por su lingüística definidos como los hu-me); 2) los que viven en el distrito de Choapam (por su lingüísitica definidos como los wah-mi); 3) los que habitan las áreas norte y oeste, con excepción de 4) quienes viven en aldeas o caceríos cercanos y que incluyen a Yolox” (BEVAN, 1987, p. 29). 126 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 que divide la Chinantla baja, media y alta (DE TERESA y HERNÁNDEZ, 1999);1� la etno-lingüística determinada por fronteras interiores (BEVAN, 1987);2� y la que se ha llamado “clasificación regional por municipio”, dividida en exdistrito de Choapam, región central, región sierra chinanteca y zona norte y occidente.3� Cada una de estas formas de subdividir la región está asociada a un modo de mirarla y estudiarla. El caso que nos interesa observar, la gestión de tierras en el Cerro Armadillo se ubica en la frontera de los municipios de Usila y Valle Nacional (ver Mapa 1). En este sentido, nos ubicamos en lo que se conoce como la Chinantla media, de acuerdo con sus características ecogeográficas. A estas se suman otras de tipo histórico y social que asisten en la observación de los cambios socioculturales. Si bien se considera que los municipios de Valle Nacional y Usila forman parte de la Chinantla media, una importante parte de los mismos se ubica en la zona baja de la región: ambos comprenden extensos valles atravesados por caudalosos ríos. Es en las vegas de dichos valles donde entre 1870 y 1910 se asentaron personas provenientes, principalmente, del estado mexicano de Veracruz, y de paises como Cuba, Alemania, Inglaterra, España y Estados Unidos para establecer las plantaciones de tabaco, caña, algodón y para abrir campos de pastura para ganado con sistemas de producción intensiva y capitalista, diferente del que se utiliza comúnmente en la región: el sistema de roza, tumba y quema (BRAVO, 2007, p. 7).4� R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Mapa 1 La Chinantla, subregiones ecogeográficas y municipios Fuente: Elaboración propia a partir de De Teresa (1999), Inegi/Unam (2002). El Mapa 2 presenta una concepción de la época del espacio geográfico: se puede observar una mayor comunicación y facilidad de acceso en la zona baja, a lo largo del río que comunica Tuxtepec con Valle Nacional, al igual que el que va de Tuxtepec a Usila. Asimismo, existe un camino que va de Valle Nacional, pasando por Usila hacia Cuicatlán. Este camino, como aparece en el mapa, comunica todas las localidades de la región. En México, a estos caminos se les llama camino real por ser de origen prehispánico y/o colonial. En el distrito de Cuicatlán, al poniente de la Chinantla media, se asentaron fincas cafetaleras: la Unión Francesa y Cafetal Moctezuma, principalmente. Estas escogieron terrenos cerriles ya que son estos los que posibilitan la alta calidad del grano. Como señala Bartra, “no basta con sembrar y cosechar” además es preciso “movilizar el producto, y la pobreza de 3 La región central está conformada por los municipios de Ayotzintepec, Chiltepec, Jacatepec y Valle Nacional; la región exdistrito de Choapam está conformada por Jocotepec, Lalana y Petlapa; la región sierra chinanteca abarca Comaltepec, Yolox y Quiotepec; finalmente, la zona norte y occidente está conformada por Ojitlán, Sochiapam, Usila y Tlacoatzintepec. 4 Bevan explica que a principios del Porfiriato “algunas partes de la Chinantla eran famosas por su café y su tabaco”, en particular, Valle Nacional, Ojitlán y Usila. Asimismo se cultivaba “la vainilla, el algodón y el cacao” para exportación también en Valle Nacional, Ojitlán y cerca de Soyaltepec. Concluye el autor que “en aquella época toda la región era floreciente” (BEVAN, 1987, p. 69). En otra perspectiva este florecimiento de la región se debió principalmente a la invasión de terrenos comunales de la población de la región que estaban en descanso (BARTRA, 1996). 127 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 las vías de comunicación” es, sin duda, “un primer cuello de botella para la expansión cafetalera” (1996, p. 91). Por ello, en un principio la producción se acarreaba en mulas o incluso en el lomo de los mozos de las fincas por veredas hacia Cuicatlán y de ahí se transportaba en tren hasta Veracruz. Del mismo modo, Valle Nacional y Usila eran valles encerrados por montañas e inaccesibles, pero que estaban comunicadas por la vía fluvial, a través de río Papaloapan, con el Puerto de Veracruz para su exportación. Mapa 2 La Chinantla media vista por un arqueólogo de la región en 1910 5 Bevan explica que para llegar de Usila a Tuxtepec hacía falta andar dos días a caballo, pasando por Santa Rosa, “pero – don Beto le cuenta a Bevan – mucha gente prefiere ir por el río en balsa” que compran en Usila a “tres pesos y la venden en Tuxtepec por 20 reales”; de este modo “acarrean tabaco y algodón río abajo” (1987, p. 81-82). 128 Fuente: Tomado de Weitlaner y Castro (1954). Estas zonas fronterizas están ubicadas entre centros comerciales comunicados por vía fluvial o por el ferrocarril.5 Los dos enormes valles de Usila y Valle Nacional, junto con las R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 fincas de la serranía aún impenetrable que llamamos Chinantla media, eran – a fines del siglo XIX y principios del XX – lo que Armando Bartra define como “ámbitos económicos que guardan más estrechas relaciones con la metrópoli imperialista de donde viene su capital y va su producción que con el país cuyos recursos humanos y naturales saquean” (1996, p. 14). Son el marco que rodea la serranía que ubicamos en lo que ecogeográficamente se ha definido como Chinantla media y que ahora se le suman elementos sociales y temporales. Es decir que la región se define en un contexto histórico-geográfico. Mapa 3 La Chinantla media, población, ríos y accesos en la actualidad ## # # ## # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # Zautla # # # # # Tlacoatzintepec Quetzalapa Sochiapam # # # # # # Usila # # # # # # # # # # # Santiago Tlatepusco # # # ## # # # # # # # # # # # # San Felipe de León # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # Nopalera # # # # # # # # Tepetotutla Vega del Sol # # Nacional Valle # # # # # # # # # # ## # # # # # # # # # # # # # # # # # # San Pedro Tlatepusco # # # Jacatepec # Cerro Armadillo Arroyo Palomo San Isidro Arroyo Laguna # de Banco # # # # # # # # # # # # # # Ozumacín # # # Ayotzintepec # # # # # # # # # # # # # # # Analco # # Texas # # BRECHA CARRETERA FED. CARRETERA PAV. TERRACERIA 0 # # ## # # # 0.09 # # # # # # # # # # # # Cerro Agua Mirador Pescadito # # # # Número de habitates 1 - 250 251 - 750 # 751 - 1500 1501 y más # # # # # # # # # # # # # # El Retumbadero # Zapotitlán # # # # # # # # # # # # # # # # # # # Chiltepec # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # Teotilalpam # # # # # # # # # # # # # ## # # # # # ## # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # # 0.09 # # # # # 0.18Meters # # Fuente: Elaboración propia a partir de Inegi (2000), Inegi/ Unam (2002), CAO (2004), Inegi (2005). Al sur de la Chinantla media se eleva otra frontera, esta vez natural. Las altas montañas y las bajas temperaturas separan a la región de la sierra Juárez, habitada, principalmente, por chinantecos serranos, zapotecos y mixes. Eran más los zapotecos que se aventuraban a descender las montañas para comerciar 129 R UR I S 6 Weitlaner y Castro registran un ejemplo muy claro de ello en Tlacoatzintepec: “don Gregorio López. Mixteco, casado con ojiteca, llegó a Tlacoatzintepec y dejó la enseñanza para dedicarse a asuntos agrícolas. Desde el comienzo se le dio una situación prominente y fue secretario municipal. Debido a que sabe leer consiguió hacerse de extraordinaria importancia (además habla cuatro idiomas: español, ojiteco, mixteco y el dialecto de Tlacoatzintepec) […] se está gestionando un movimiento para llevarlo a la presidencia municipal. En este caso no se conoce la reacción de los ancianos quienes, por otra parte, y aunque altamente influyentes, parecen estar comenzando a perder su poder” (1954, p. 165-166). 7 Karla Montes (2009) distingue entre dos tipos de comerciantes en la zona del Rincón, de la sierra Juárez: 1) los que son campesinos y salen a vender o intercambiar los productos de su propio trabajo y 2) los que son meramente comerciantes, intermediarios. 8 El barbasco es una raíz que se escarba en el monte virgen. Es un producto que sirve para la elaboración de la píldora anticonceptiva. V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 en los pueblos como ambulantes, o bien que se establecían temporalmente como maestros municipales o permanentemente a través de alianzas matrimoniales y se convertían rápidamente en secretarios del agente municipal o de los comités agrarios por su manejo del español y su conocimiento de las rutas de comercio (BEVAN, 1987). Muchos zapotecos también llegaron a trabajar temporalmente en la zona como jornaleros, en su paso a “los bajos de Tuxtepec” (MONTES, 2009) y, algunos, luego establecieron comercios en la cabecera de Valle Nacional. Además, cabe señalar que muchos de estos comerciantes zapotecos aprendían la variante de chinanteco y asimilaban la identidad que los adscribe al lugar y sus hijos se consideran nativos del pueblo donde vivían.6� Otra posibilidad para los zapotecos itinerantes es que eventualmente se iban en busca de otro lugar donde asentarse o regresaban a su tierra.7� La Chinantla media no permanecía aislada, sino que estaba sujeta a otros modos de producción. En la serranía predominaba una economía de subsistencia, a través del sistema de roza, tumba y quema, caza, pesca y recolección, aunado a la venta ocasional de barbasco8� y cerdos a comerciantes que llegaban a las comunidades, o bien, que se intercambiaba en los centros comerciales por productos como petróleo, sal y jabón o por dinero destinado al pago de impuestos. Además, privaba la circulación intercomunitaria de productos que se daban en una localidad y no en otra, en especial durante las fiestas patronales que son durante la época de menos precipitaciones – enero y febrero – o la estación seca – de marzo a junio. Es en esta época cuando había condiciones para construir (o reconstruir) los puentes-hamaca (ver Foto 1) y los caminos transitables. El sistema de roza, tumba y quema obliga a las poblaciones que habitan en las regiones tropicales y que utilizan esa forma de cultivo a realizar periódicos movimientos demográficos: 130 | R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 escisiones en los pueblos por el crecimiento de la población y por la lejanía de las tierras de cultivo; abandono de un sitio de asentamiento por causa de desastres naturales, epidemias, agotamiento de los manantiales que proveen de agua, agotamiento de las tierras de cultivo o conflictos agrarios o de poder, entre otros. Estos movimientos poblacionales no se dan en periodos de tiempo cortos, como sucede con las poblaciones nómadas de cazadores y recolectores. En cambio, se dan en periodos largos, generalmente después de dos, tres o más generaciones, por lo que una zona de selva virgen, aparentemente despoblada, es en realidad un lugar potencial para la fundación o refundación de un poblado (DE TERESA, 1999; SERRANO, 2008). Es en este sentido que Bartra afirma que los dueños de fincas y plantaciones invadieron terrenos comunales que se consideraban como baldíos para los extranjeros y también considerada de esa manera en la legislación vigente del porfiriato. Foto 1: Puente-hamaca Fuente: Tomado de Bevan (1936). 131 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Un ejemplo se dio en el corazón de la Chinantla media, cuando se inundó San Pedro Tlatepusco: a partir de este hecho se pobló una zona de la Chinantla media que había estado aparentemente deshabitada por los chinantecos. En el Cerro Armadillo, en su zona sur se encontraban las tierras que habían estado en posesión del Arzobispo de Oaxaca, Eulogio Gillow: el Cafetal Tejas (donde se va a situar el poblado de Santo Tomás Texas) y las fincas La Providencia y San Eulogio, que pasarán a ser parte de los ejidos de San Isidro Lagunas, y sus anexos y San Lucas Arroyo Palomo y San Eulogio Arroyo de Banco. Los habitantes que salieron de San Pedro se refugiaron, primero, en San Felipe de León y en San Juan Palantla engrosando su población y, posteriormente, siguieron fundando nuevos poblados (ver Gráfico 1). Cabe señalar que no fueron únicamente habitantes de San Pedro los que fundaron las nuevas comunidades, sino que el hecho de la inundación es emblemático. Teniendo en cuenta el avance de la frontera agrícola del bajo Papaloapan que se dio en el Porfiriato, consideraremos este un nuevo avance de la frontera, esta vez de dentro hacia fuera y de la Chinantla media hacia el exterior. 132 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Gráfico 1: Población de algunas localidades de Valle Nacional y Usila (1900-1980) 900 800 771 700 600 500 584 545 400 300 531 368 333 593 351 330 333 230 200 173 183 212 529 343 316 307 281 393 379 273 270 290 254 238 251 234 217 153 309 286 291 218 212 182 158 105 100 512 150 125 56 0 1900 1910 Arroyo Palomo San Isidro Laguna San Antonio el Barrio 1921 Cerro de Pita Palantla Analco 1930 1940 Ocote Texas Zapotitlán 0 1950 1960 Otate San Pedro Tlatepusco 1970 1980 San Felipe de León Santiago Tlatepusco Fuente: Inegi, Archivo Histórico de Localidades. Como antecedente contextual tenemos el establecimiento de las fronteras arriba exhibidas, asimismo, la rebelión de Ojitlán en 1911 encabezada por Sebastián Ortiz quien promovió el asalto a los municipios de Ojitlán, Usila, Soyaltepec, Jalapa de Díaz e Ixcatlán y el boicot al pago de impuestos en toda la región, sobre todo en las zonas serranas de la Chinantla y Cuicatlán y que culminó con el control estratégico del Ferrocarril Mexicano del Sur (AGEO, Porfiriato, exp. 10, leg. 38). Otro factor es la migración de mixtecos y zapotecos a la finca Unión Francesa que se quedaban allí a trabajar en su camino a “los bajos de Tuxtepec” donde los jornales eran del doble. Pero muchos, en el camino se establecían en la Chinantla media o baja por la abundancia de tierras. Estos migrantes, como mencionamos arriba, se establecieron como campesinos, comerciantes, secretarios, maestros municipales, líderes o caciques. Tenemos como antecedente que el principal agravio que sentía la población en la región en vísperas de la revolución 133 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 era el pago de impuestos a los municipios y el pago de piso a los terratenientes. Otro factor que hemos encontrado era la contribución con trabajo colectivo - en las cabeceras municipales o pueblos a los que eran sujetos durante las fiestas patronales - como policías y para la construcción y reconstrucción de obras públicas. El tequio se volvió un elemento de disputa al incrementarse las necesidades del trabajo colectivo y la manera en que influyó en la búsqueda de autonomía por parte de las recién fundadas comunidades agrarias. Es decir que el control sobre el trabajo colectivo se volvió una herramienta en la lucha agraria y en la disputa por el territorio. Antes de entrar en ello presentamos de manera muy breve el pensamiento social de la época que se aglutinaba en indigenismo. PENSAMIENTO SOCIAL Y LA PREGUNTA SOBRE LA INTEGRACIÓN DE MÉXICO: EDUCACIÓN Y REPARTO AGRARIO Durante gran parte del periodo que comprende entre 1920 y 1950, el lema con el que se firmaban los documentos oficiales era “carreteras y escuelas”, es decir que se buscaba la promoción de dichas obras públicas para mejorar las condiciones de vida de los habitantes. En el Cerro Armadillo, en la Chinantla la labor educativa se inició con mayor empuje que la labor de construcción de caminos, pues los caminos siguieron siendo las veredas y caminos reales que la población mantenía. José Vasconcelos dio origen a las misiones culturales cuando fue director de la Secretaría de Educación Pública (1921-1924). Además, se fundaron las escuelas rurales y los internados indígenas (propuestos por Moisés Sáenz, secretario de Educación durante el año de 1928), que buscaban la integración de la población indígena a la vida nacional. Dentro del gobierno de la revolución existían al menos dos corrientes que se han identificado en cuanto al modo de educar. Por un lado, José Vasconcelos y Rafael Ramírez pugnaban por 134 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 una educación para civilizar a los indígenas, con una continuidad con el pensamiento positivista del porfiriato. Por otro lado, Sáenz y Gamio buscaban romper con estas posturas para encontrar formas integrales de incorporación que eliminaran el racismo en la educación, la cuestión agraria, etc.: su expresión más conocida fue la de mestizaje (COMAS, 1964; NAHMAD y WEAVER, 1990). Esto no implica una continuidad con el pensamiento racista, como se ha planteado en discusiones contemporáneas sobre el indigenismo revolucionario (WARMAN, 1971, p. 27), y no se trata de una fórmula teórica y práctica para eliminar a los indígenas, que se ha aglutinado en el término de etnocidio (BARTOLOMÉ y BARABÁS, 1990). La idea de mestizaje mostraba la igualdad de condiciones de los indios con el resto de la población, desde el punto de vista científico y pugnaba por una propuesta para combatir la desigualdad social del país que considerara la integración de toda la población (COMAS, 1974, p. 871). Estas, a grandes rasgos, eran las ideas que se debatían en el entorno nacional y que se cristalizaron en políticas públicas específicas. Las primeras acciones del indigenismo de la revolución, como vemos, estaban íntimamente relacionadas con el ámbito educativo. La escuela y los maestros rurales eran los vehículos por los que se promovía el reparto de tierras. Así, Miguel Othón de Mendizábal sostenía que la labor más importante de los indigenistas debía ser la de auxiliar a los pueblos con las gestiones de sus necesidades: tierras, caminos, escuelas y servicios de salud. Los intelectuales de la época parecían coincidir en que “las oficinas públicas dedicadas a la resolución de los problemas indígenas no deberán ser institutos de investigaciones científicas […] sino organismos de acción intensa, decidida y certera” (1946, p. 331). Y la principal idea que promovía este pensamiento era que los grupos indígenas “se han mantenido al margen de la vida nacional”, es decir su aislamiento (MENDIZÁBAL, 1946, p. 332). Esto implicaba que las soluciones eran llevar el español 135 R UR I S 9 La idea de comunidad o de tenencia comunal de la tierra no viene de una concepción preconcebida o prehispánica sino que se da en la modernidad a partir de la Constitución de 1917, en su artículo 27. Los pobladores se enteraban de ello por los maestros rurales, por la Liga de Comunidades Agrarias y por otros actores que llegaban a la región para promover la lucha contra la propiedad privada y las grandes extensiones de tierra. Un primer motivo en la región por el que las comunidades se juntan en caseríos era para defenderse de los carrancistas y el bandidaje en la zona durante la revolución y que, según cuentan los habitantes, robaban a los pueblos sus cosechas y sus mujeres. 10 El surgimiento y papel de los líderes agrarios en la región se puede consultar en Serrano (2008). 136 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 a las regiones indígenas y repartir la tierra para la gran masa de población cuyo medio de subsistencia era la agricultura. Pero las buenas intenciones no eran suficientes. En la Chinantla media, privó la autogestión y una diversidad de alianzas y conflictos políticos que exceden este trabajo pero que permiten dar cuenta de que los proyectos indigenistas no tuvieron el alcance que los intelectuales de la época hubieran deseado. TEQUIO Y RELACIONES DE PODER EN LA DISPUTA POR LA TIERRA La lucha por la conformación del ejido o de los bienes comunales fomentó un primer momento de agrupación en comunidades que querían cumplir con los requisitos institucionales para obtener los títulos de sus tierras.9� A los líderes locales se les pagaba con trabajo en sus tierras y con dinero o alimento para los viajes administrativos.10 Era costumbre que para los viajes largos a través de la serranía se hacía una bola de masa cocida de maíz nixtamalizado de alrededor de 20 cm de diámetro que tenía la característica de aguantar mucho sin echarse a perder y era fácil de transportar. Otras formas de trabajo colectivo eran el tequio y la mano vuelta. El tequio se ocupaba en la construcción de puentes-hamaca, el mantenimiento de los caminos y la construcción de otros edificios públicos. Durante este periodo todos los pueblos invirtieron gran cantidad de su tiempo y esfuerzo en la construcción de las escuelas para lograr un maestro rural federal y así aprender el español, herramienta fundamental para la gestión de las tierras. La mano vuelta se utilizaba para los rozos y la construcción de las viviendas (ver Foto 2). R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Foto 2: Mano vuelta en la construcción de viviendas Fuente: Tomada de Weitlaner y Olivera (1969). Los pobladores depositaron el poder en los líderes que manejaban el español y conocían la ruta a Oaxaca. Cabe señalar que la centralización del poder no implica un aislamiento o una tendencia a una comunidad cerrada. Si bien los líderes se ocupaban de las gestiones, el resto de la población realizaba periódicos viajes al Santuario de Teotilalpam y a las fiestas patronales de los pueblos donde tenían relaciones de amistad, compadrazgo, filiación y/o alianza e intercambiaban productos y se enteraban de los acontecimientos en torno a las gestiones de tierra, las relaciones con el municipio, en fin, políticos u otras coyunturas, como epidemias, desastres naturales, etc.11� 137 R UR I S 11 En su texto sobre geopolítica indígena, Daniéle Déhouve plantea que existe una competencia entre localidades que tiene que ver con el control del territorio, los recursos naturales y los apoyos económicos del Estado (2001). Teniendo esto en cuenta, se podría decir, sin caer en un determinismo en el que las relaciones sociales se definen como políticas, que en estos encuentros de amistad o parentesco se formulan los principios para esta competencia, o bien se alimentan. | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V Además, aunque existía la figura de los líderes que se ocupaban de mantener relaciones públicas hacia el exterior y que tenían mucho peso en las decisiones que se tomaban en la asamblea, había también una organización colectiva del trabajo (tequio o fatiga), en la que participaban todos los miembros del comité agrario. Don Teodoro fue secretario del comisariado ejidal en San Juan Palantla y me explicaba que “no todos pueden contar. Todos hacen pero no todos saben cómo se hace” (San Juan Palantla, 9 de agosto de 2008). Cuando Bevan visitó la zona en 1935 y 1936 quedó impactado por las obras de infraestructura más complejas de los chinantecos: los puentes-hamaca cuya construcción era imprescindible para no permanecer aislados (ver Foto 1). El tequio es el trabajo que deben realizar todos los ciudadanos de un pueblo para el mantenimiento de las vías de comunicación, los edificios públicos, los potreros comunales, etc. Tenemos que en la etapa de la reforma agraria se intensifican las necesidades de este tipo de trabajos. Así, el mantenimiento de los caminos y puentes-hamaca era algo que permaneció desde la etapa anterior. A ello se sumó la necesidad de construir escuelas, promovidas de manera local por maestros y líderes para enseñar español a toda la población. Además, había que mantener los cultivos de los líderes que no tenían tiempo para ocuparse de sus medios de subsistencia. Bevan explica que, “aunque los arroyos no lleven mucho agua, después o durante la lluvia, son siempre muy rápidos y por lo general peligrosos, forman una gran barrera para la comunicación” (1987, p. 24). Y posteriormente describe las hamacas: Los puentes están hechos de bejuco, una enredadera larga que se encuentra en esta selva y muy fuerte – mientras dura. El paso por estos puentes, que nunca tienen más de seis pulgadas de ancho, está construido con atados de esas 138 10 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 enredaderas, doce aproximadamente, colocadas a cada lado y amarradas a cortos intervalos. Esta gran soga se extiende entre árboles de ambas orillas, o bien desde palos clavados en el piso y atados a árboles vecinos para mayor seguridad. Se tienen otras dos sogas de bejuco adicionales, que atraviesan el río, para formar una especie de pasamanos encima de la huella, dichas sogas están sujetas con intrincadas redes de enredaderas más pequeñas. Los árboles de los extremos sostienen el puente y sirven para estabilizarlo. Sin embargo, a pesar de su aspecto frágil son muy fuertes, se sabe uno que soportó el peso de 20 personas al mismo tiempo. Por desgracia el bejuco no dura. Cuando se seca o envejece, la enredadera se desprende y el puente cae al río, casi por lo general en la noche (BEVAN, 1987, p. 28-29). Bevan señala la desigualdad entre diversas subregiones de la Chinantla a través de los materiales con que se construyen los puentes, identificando como “progresistas” y “accesibles” a los puntos donde con el fin de “evitar la reconstrucción constante […] los chinantecos disponen de otros materiales”. Cita como ejemplos a Tepinapa, donde encuentra un puente colgante hecho con alambre y “cerca de San Cristóbal en Valle Nacional, hay otros dos puentes de alambre, pero con planchas de madera por donde se camina” (BEVAN, 1987, p. 28-29). La debilidad de los puentes hamaca, debido a su material, obligan a que no puedan transitarse con pesadas cargas y, dado que “los ríos son a menudo difíciles de vadear por su lecho de piedra y por el torrente que corre formando remolinos, no es ninguna ventaja poseer caballos, mulas o asnos” (BEVAN, 1987, p. 28-29). Entre 1935 y 1938 se fundaron la mayor parte de las escuelas federales en las localidades del municipio de Valle Nacional pero no había suficiente personal disponible para enviar un maestro a la mayoría de las comunidades. Además, los pobladores explican que los maestros no permanecían en la comunidad por las condiciones climáticas y por la falta de infraestructura. Por ello, en la década de 1940 los pobladores se organizaron para construir 139 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 la escuela de material con techo de lámina que hoy le llaman su “museo”. Todas las comunidades del Cerro Armadillo cuentan con este tipo de construcción: un enorme esfuerzo colectivo en cada localidad (ver Foto 3). Cuando hicieron las escuelas, hicieron la capilla católica, tenía que cooperar la gente la cal, porque aquí la gente no compraba cal antes, para hacer muro. La escuela vieja que tenemos que es un museo para nosotros, ¿no? Es casa hecha con pura piedra, arena y cal. Se iba a coser la piedra de cal tres días y tres noches par poder convertir en cal antes. Y ellos se acordaban maquilas de cal para levantar ese casa: la escuela viejita pues, que ahora es museo (don Lucas Ramírez Juan). 12 Es decir que ya creció la vegetación. Se hacían unos hoyos en la tierra de unos dos metros de profundidad y se echaban las piedras y se le prendía lumbre en otro hoyo que se escarbaba abajo. Eso tenía que quemar todo un día y descansar toda la noche para que se enfríe. Al sacarlo se le echaba poquita agua y quedaba la cal. Para construir la escuela tuvieron que hacer 15 maquilas cada uno (de 40 kilos cada una). Todavía están los hornos que se hicieron para eso aunque montados.12� Esa escuela se hizo hace 60 años. El papá de doña Lucía lo recordaba (don Dionicio Felipe, Arroyo Palomo, 27 de agosto de 2008). Don Aniceto, de San Juan Palantla, cuenta que o había escuela, tuvieron la misma gente de acá de organizar también y hacer una casa que ocupaba en aquel entonces una casa de jonote y así comenzaron. Ya después, en el transcurso de eso hicieron la escuela que está allá arriba, la de lámina. Allí empezó la primaria pero eso fue una construcción, la cosa del mismo pueblo. El mismo pueblo hizo, sacaron cal de acá. Así me cuentan la gente. Por ahí por 1940. Ellos mismos hicieron la cal porque no había, había pero no hay con qué. Aquí hubo personas que pueden pues 140 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 hacer eso. Las personas que ya sabían como coser la piedra, una piedra blanca que hay. De ahí sacaron la cal. Porque también costó mucho trabajo porque necesitaban bastante leña. Hacer un horno grande para hacer bastante leña (San Juan Palantla, 21 de agosto de 2008). Foto 3: Las primeras escuelas en la Chinantla media Pero parece que todos los esfuerzos eran inútiles por lo que en las comunidades seguían enseñando el español los pocos que lo hablaban. El 29 de marzo de 1947, Miguel Mauro de la Cruz, originario de San Lucas Arroyo Palomo, se dirige al secretario de Educación Pública para informarle que me hize cargo de la Escuela Federal “Cuauhtemoc” fundada desde hace tres años, dicho nombramiento me recayó por la voluntad unánime de este lugar cuyo sueldo que disfrutaré será como cuota que el pueblo se impuso para cubrirme y he aceptado con agrado tal nombramiento por consideración que tengo por mi pueblo natal ya que la niñez de este lugar se están creando analfabetas y además no ha sido hasta horita posible que el C. Inspector de la 29a Zona 141 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Escolar designe personal docente para esta ranchería que tantas veces lo han solicitado. Como verá que el pueblo ha hecho ya esfuerzo nombrar su maestro Particular ahora espero de esa Superioridad tenga la bondad de obsequiarme 2 metros de tela apizarrada gises, una docena de bancas y otra de mesas libros de texto de 1o y 2o año todos estos objetos necesita este plantel (AHSEP, caja 32, exp. 8, foja 6-7). Cuadro 1: Gastos ejercidos para la construcción de una nueva escuela en Cerro Armadillo Grande Producto 13 Tómese en cuenta que no se incluyen datos de costo de mano de obra. Si bien no contamos con datos precisos sobre el valor de un jornal para poder contextualizar el valor de todos los materiales incluimos datos tomados del Censo Agrario de Valle Nacional (solamente la cabecera) en 1936 (cuatro años antes de la construcción de la escuela de Armadillo) para entender la dimensión del costo de la construcción para la comunidad. El costo anual de una familia campesina desglosado de la siguiente manera: gasto diario para tres adultos y tres chicos: $1.20; gasto de ropa necesario para tres meses por adulto $15; gasto de ropa y accesorios para un niño teniendo en cuenta útiles escolares: $15; total de gasto anual para familia tipo: $600. 142 8 atados de láminas acanalada de 6 pies 8 láminas caballeteo 10 kilos clavos para láminas 4 kilos clavo americana 12 kilos punta parís 5 pulgadas 2 martillos Cargo carreo de comercio a embarcación a orilla del río Trahida de Tuxtepec a voca el rio de Valle Nacional Compra muy después otro 3 atados de la misma láminas Suma total Costo unitario $ 54.00 Costo total $ 432.00 3.00 2.00 2.00 2.00 3.00 24.00 20.00 8.00 24.00 6.00 1.30 15.65 65.55 195.55 726.5013 Fuente: AHSEP, caja 43, exp. 3, Escuela Rural Federal, Cerro Armadillo, Valle Nacional, Oaxaca. Asimismo, el pueblo tuvo que comprar la lámina para techar y otros productos necesarios para la construcción de la escuela. Los pobladores de Cerro Armadillo Grande enviaron al director de Educación Federal en el estado de Oaxaca una hoja con los “gastos ejercidos para la construcción de una nueva escuela en el lugar”, el 15 de abril de 1940 (ver Cuadro 1). Esto fue como una manera de mostrar al gobierno su interés por obtener un maestro, pues habían invertido una gran cantidad de tiempo y R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 dinero para lograr las condiciones propicias para que el maestro permaneciera en la comunidad. El trabajo de mano vuelta es el intercambio de fuerza de trabajo entre unidades domésticas. Gerardo Mora Flores explica que el jefe de familia envía a su esposa o hijo o algún amigo a las casas en las que se tiene un vínculo amistoso “avisando que solicitan de su ayuda para construir una casa”. Por lo general, todos acceden a “prestar ayuda” (MORA FLORES, 1994, p. 43). Al finalizar la actividad, después de varias jornadas se sirve pollo con mole. De este modo, la ayuda se paga con trabajo cuando quienes echaron mano lo requieran. Las casas construidas con materiales de la región tomaban un día para la base y techado, que era para lo que ocupaban ayuda de los demás. La casa la terminaba el dueño de la misma, poniendo las paredes poco a poco (MORA FLORES, 1994, p. 44). Es similar el trabajo para los rozos: rozar, tumbar y quemar son trabajos muy duros para los que se requiere ayuda, sobre todo de los hombres. Es decir que se ocupaba la mano vuelta para preparar el terreno. La división del trabajo se daba de la siguiente manera: los hombres se ocupaban del trabajo en la construcción o preparación del terreno, mientras que las mujeres preparaban comida en conjunto. Esto se diferencia del tequio, en que solamente los hombres participan. Estas formas de trabajo colectivo no deben ser consideradas como tradiciones por herencia prehispánica o vestigios precapitalistas, sino formas de trabajo modernas que han perdurado por su eficacia para resolver asuntos de carácter público y privado en torno a la reproducción social. Y, por supuesto, han sufrido transformaciones teniendo en cuenta la necesidad de adaptarse a su contexto histórico. Además, representa un mecanismo que posibilita la vida de los pueblos en las condiciones adversas de la topografía, el clima y la vegetación de la Chinantla,14 y es también un medio a través del cual se puede observar la búsqueda de los pobladores por elevar sus condiciones de vida. 14 “En esta gran chinamitl ceñida por montañas, el clima y la vegetación han ejercido su efecto más predominante en la vida de los nativos de lo que puede afirmarse acerca de cualquier otra tribu de México. El chinanteco está ligado a su medio ambiente: lucha por su existencia. Esta batalla no se libra con algún adversario humano, sino contra un bosque salvaje cuya fuerza es fortificada por las lluvias casi incesantes. Esto determina el crecimiento de hermosos árboles y flores, pero también de una vegetación fuerzas que se extiende inmisericorde sobre árboles y tierra, y contra la cual el infortunado chinanteco debe pelear de manera constante, librando una guerra continua para poder cultivar las plantas que le sirven de alimento” (BEVAN, 1987, p. 24). 143 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Así, el trabajo colectivo en los pueblos es una institución contemporánea y en constante cambio, que, además, absorbe las necesidades que surgen en cada contexto histórico específico. Los líderes pedían algo a cambio al pueblo y, en ocasiones, lo explotaban. Esta era la herramienta discursiva más poderosa que tenían las elites del plan en contra de los líderes: para ellos “eran unos ladinos que se aprovechaban de la ignorancia de los indígenas”. Era común que se trabajara las tierras del líder, quien se ocupaba de las gestiones en Oaxaca, además, se organizaban cooperaciones para pagar los viáticos en los largos viajes. En ese tiempo tomaba al menos cuatro días llegar a la ciudad de Oaxaca. Imaginemos a Villar (un importante líder del Cerro Armadillo que promovió la lucha agraria) yendo a tocar las puertas de una oficina gubernamental y por vestir de manta y huarache se le haría esperar largas horas o días para elevar la solicitud, queja o lo que fuera y luego emprender el camino de regreso. Cómo trazar el límite: el líder explotaba a su pueblo, o sin el líder el pueblo no podía llevar a cabo las acciones necesarias. Ante la escasez de recursos es fundamental para entender la centralización del poder, la aglutinación en grupos porque de otro modo era económicamente inviable. Tenemos dos situaciones adversas para la población: Porque pues siempre, el indígena chinanteco se siente incapaz en primer lugar por no poder expresarse y en segundo lugar porque la situación económica no les permite salir, a Tuxtepec, a Oaxaca. Ese es el motivo poderoso de esta situación (entrevista Ana Paula de Teresa a Mauro Martínez Uriarte). Generalmente, el cargo de lider además de ser una carga económica para el pueblo lo es también para quienes ejecutan el cargo y eso les lleva a la pobreza por no poder atender sus medios de subsistencia, salvo en los casos de líderes corruptos que se enriquecen a costa del pueblo. Así, don Pablo Velasco 144 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 cuenta que encontró a Villar en ruinas en Palantla, que sólo tenía para ofrecerle unos plátanos, contrario a lo que opinaba Mateo Acevedo, el presidente municipal de Valle Nacional, que sostenía que se estaba enriqueciendo con dinero del pueblo para las gestiones.15 El tequio es también un mecanismo de control a través del cual los grupos se disputan el poder. Además, cuando un pueblo hace tequio en otro y busca ya no hacerlo está pugnando por su autonomía y porque considera que debe invertir su fuerza de trabajo en su propio pueblo. En 1926 los pobladores de Analco se dirigen al gobernador de Oaxaca para explicarle que se niegan a hacer tequio en su cabecera, Usila. Analco está en el extremo occidental de Usila, colinda con Tlacoatzintepec y San Juan Zapotitlán, Sochiapam, al este y al sur con San Antonio el Barrio. Al oeste con Santiago y al sur con Usila. Sabemos que San Antonio Analco es un pueblo que está enclavado en las montañas y cuyo acceso es muy difícil desde su actual cabecera, Usila. Analco tenía fuertes vínculos con las localidades de Zapotitlán y Tlacoatzintepec a través de la arriería, la venta de maíz y frijol y por ser la ruta más fácil para ir a la ciudad de Oaxaca.16 Cuando se negó a participar en los tequios de Usila fue porque estaba en proceso de construir su propia escuela y porque, según escribieron en un oficio al gobierno del estado, estaban sembrando sus tierras y no podían ocuparse en otros trabajos (AGEO, Elecciones municipales, exp. 21, leg. 211). Todo esto significa que al intensificarse los procesos de gestión se dio un aumento en las necesidades locales para la mano de obra colectiva que se ocupaba en las nuevas actividades, fundamentalmente la construcción de las escuelas, el mantenimiento de las vías de comunicación, la agricultura de subsistencia, etc., y cuyo objetivo principal era obtener la titulación de las tierras para su autonomía. Esto estaba en franca oposición con el hecho de que también en las cabeceras 15 Un líder de San Juan Lalana se expresa de este modo “Yo hace más de 15 o 20 años que dejé de participar completamente porque vi que, me di cuenta que ya había perdido mucho tiempo. Yo tengo familia y como no hay ningún sueldo en ese cargo y sí se lleva bastante tiempo, casi todo el tiempo era para formular quejas, venían los campesinos de todos los pueblos a pedirme que […] a plantearme sus problemas y yo tenía que decirles esto y esto vamos a hacer, haciendo un escrito. Y así se me iba el tiempo. Entonces resolví ya no participar” (entrevista Ana Paula de Teresa a Mauro Martínez Uriarte). 16 “En esta tierra se sembraba maíz temporalero y cultivos asociados como el frijol, el ejote y la guía de calabaza. Los analqueños acostumbraban sembrar entre 2 y 3 has de maíz, destinadas al autoabasto familiar, a la venta ocasional en San Juan Zapotitlán y a la cría de cerdos, actividad sumamente importante por los ingresos que reportaban a estas unidades domésticas. Para los primeros meses de 1954, el problema territorial se reflejaba en una constante tensión entre los dos pueblos. Ésta fue la razón por la cual la comunidad de San Antonio Analco decidió emprender la lucha legal para dar solución a ese problema” (MONTIEL PÉREZ, 1993, p. 29). 145 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 se intensificaba la necesidad de tequio por lo que no se podían cubrir todas las cuotas. En este contexto y dada la necesidad de obtener autonomía respecto del municipio se dio una intensa lucha por el control del territorio de la Chinantla media y, de manera muy particular, el estratégico Cerro Armadillo, que era el paso para Cuicatlán, Teotilalpam y toda la zona que abastecía de cerdo y pollo y, en ocasiones, maíz, frijol y quelites a los valles ocupados en monocultivos. Es importante tener en cuenta que la búsqueda de autonomía está directamente ligada con la necesidad de controlar el territorio propio, que es lo que asegura la subsistencia y la reproducción de las comunidades. Pero además, confluyen otros factores en eso que llamamos autonomía: la necesidad de la intervención de actores externos, con una jurisdicción más amplia, como puede ser un partido político, organización, facciones del gobierno u otros. En Valle Nacional se dieron complejas relaciones de alianzas entre actores que aparentemente representan intereses antagónicos o bien, conflictos entre grupos que parecen 17 No hay espacio para su desarrollo pero es paradójico cómo los comités agrarios de las partes altas del municipio se alían estratégicamente a los terratenientes, y no a los agraristas del plan. 18 Por citar un ejemplo, Karla Montes ha identificado en la zona del Rincón en la sierra Juárez, que diversos núcleos agrarios, hasta la fecha (2009) nunca vieron la necesidad de recurrir al reconocimiento de bienes comunales o a la dotación del ejido debido a la eficacia de los acuerdos intercomunitarios. 146 compartir intereses.17 Esto es una constante en la manera en que se dan las alianzas y conflictos políticos. Los pueblos o actores que sostienen una disputa buscan establecer puntos de acuerdo entre ellos como un primer intento de resolución de un conflicto.18 Cuando esto no es posible, necesariamente se dirigen a instancias externas que van a interceder y esto debe ser visto como parte del proyecto de autonomía, pero también el de control sobre otros. Se puede decir que las facciones, grupos, instituciones, ese conjunto complejo y diverso que llamamos Estado e incluso grupos e individuos no son entes monolíticos sino que actúan de manera estratégica según la coyuntura. Por ello, al igual que la región, los conflictos y alianzas deben entenderse en su contexto temporal y espacial. Entendemos que las comunidades mantenían estrechas relaciones que se visualizan en las vías de comunicación, las rutas de comercio y peregrinación. Esto representaba lo que Karla R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Montes (2009) ha llamado una economía de autoabasto regional, es decir que no había una dependencia económica centrada en las cabeceras por parte de las agencias. Tampoco las cabeceras dependían de las localidades del cerro y esto no implica que no hubiera relaciones comerciales, laborales o de otro tipo entre el cerro y el plan – que, por supuesto, eran desiguales: en Valle Nacional y Usila se compraba machete, petróleo, jabón y sal; mientras que los comerciantes de dichos pueblos iban a los cerros a comprar cerdo y pollo de rancho. Lo que intentamos decir es que había una autonomía de hecho en la zona y que buscaba reforzarse con las solicitudes de tierra y la no participación en los tequios de las cabeceras municipales. CONSIDERACIONES FINALES Es útil mirar estos procesos en su complejidad: desde el punto de vista de los medios de subsistencia. En la Chinantla media, en la época que nos ocupa, encontramos campesinos con un particular sistema de producción que se adapta a su medio. Si miramos la Chinantla desde dentro: los chinantecos tenían una intensa dinámica que se observa en los caminos vecinales y reales que interconectan la región y esto implica también relaciones políticas y económicas, que en este artículo hemos desarrollado a través de las diversas formas de trabajo colectivo y su configuración. Además, las migraciones itinerantes para la gestión de las tierras, las peregrinaciones al santuario de San Andrés Teotilalpam y las diversas rutas de comercio ambulante muestran que en la Chinantla no existían las comunidades aisladas. En la perspectiva de los antropólogos de la época, cuyo principal motor era la integración de México, las comunidades de la Chinantla eran entes aislados. La integración, para los antropólogos, implicaba una integración económica en que, además de la enseñanza del español y de que los pueblos fueran dueños de sus tierras, debía darse un intercambio económico 147 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 hacia fuera de la región. Es decir que esto tiene que ver con una concepción de la época sobre un modo de producción particular – el de roza, tumba y quema, caza y recolección, y de autoabasto regional – que no satisfacía las necesidades de un México postrevolucionario que buscaba insertarse en la modernidad. En esta perspectiva, se dieron las políticas públicas a partir de la década de 1950 y en que la dinámica de la región se transformó de manera que los caminos y rutas de comercio, peregrinación y gestión se debilitaron en su vínculo hacia el interior y se fortalecieron en su vínculo externo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARTOLOMÉ, Miguel Alberto; BARABÁS, Alicia. La presa cerro de oro y el ingeniero el gran dios: relocalización y etnocidio chinanteco en México. México: INI, 1990. BARTRA, Armando. El México bárbaro: plantaciones y monterías del sureste durante el Porfiriato. México: El Atajo, 1996. BEVAN, Bernard. Diario de campo: segunda exploración a la Chinantla. Archivo particular de Ana Paula de Teresa, 1936. ____. Los chinantecos y su hábitat. México: INI, 1987. BRAVO, Luz María. Configuración político-económica en Valle Nacional, Oaxaca: anterior al proyecto modernizador. 2007. Avances preliminares de la Tesis de Doctorado del Posgrado en Antropología, FFyL/Unam. COMAS, Juan. La antropología social aplicada en México: trayectoria y antología. México: Instituto Indigenista Interamericano, 1964. ____. Manuel Gamio en la antropología mexicana. América Indígena, México, Instituto Indigenista Interamericano, v. 34, n. 4, octubre-diciembre, 1974. DÉHOUVE, Daniéle. Ensayo de geopolítica indígena: los municipios tlapanecos. México: Ciesas/Porrúa/Cemca, 2001. 148 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 DE TERESA, Ana Paula. Población y recursos en la región chinanteca de Oaxaca. Desacatos, México, Ciesas, n. 1, p. 125151, 1999. ____. La reforma agraria y la consolidación de fronteras interiores. Ponencia presentada en la mesa Historia y Organización Social en el Papaloapan, en el Congreso de la Asociación Mexicana de Estudios Rurales. Veracruz, 26 de octubre, 2007. LEGARRETA, Patricia. Modelos de gestión y cambio generacional en la dinámica regional de la Chinantla media, Oaxaca. 2009. Tesis (Maestría) – Ciesas–Pacífico Sur, México. MENDIZÁBAL, Miguel Othón de. Obras completas. México: Cooperativa de los Talleres Gráficos de la Nación, 1946, tomo 4. MONTES, Karla. Crisis agrícola: cambio y continuidad de la organización rural en la zona del Rincón. El caso de Otatitlán de Morelos, Talea de Castro, Oaxaca (1960-2008). Ponencia presentada en Simposio Welte de Estudios Oaxaqueños. Oaxaca, 24-26 de septiembre, 2009. MONTIEL PÉREZ, Rosendo. El conflicto agrario: génesis de la organización comunitaria en San Antonio Analco. Cuadernos de Antropología, México, UAM–Iztapalapa, serie I, v. 5, 1994. MORA FLORES, Gerardo. Santo Tomás Tejas. Un pueblo dividido. Ordenamiento territorial, conflicto interno y aprovechamiento de los recursos en Santo Tomás Tejas. Cuadernos de Antropología, México, UAM–Iztapalapa, serie I, v. 6, 1994. NAHMAD, Salomon; WEAVER, Thomas. Manuel Gamio, el primer antropólogo aplicado y su relación con la antropología norteamericana. América Indígena, México, Instituto Indigenista Interamericano, v. 50, n. 4, 1990. SERRANO, Tania. Demografía y política en la sierra de Valle Nacional, Oaxaca. 2008. Tesis (Licenciatura) – Departamento de Antropología, UAM–Iztapalapa, México. WARMAN, Arturo. Todos santos y todos difuntos. In: Varios 149 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 autores. De eso que llaman antropología mexicana. México: CPAENAH, 1971. WEITLANER, Roberto; CASTRO, Carlo Antonio. Papeles de la Chinantla I: Mayultianguis y Tlacoatzintepec. México: Inah, 1954. WEITLANER, Roberto; OLIVERA, Mercedes. Los grupos indígenas del norte de Oaxaca. México: Inah, 1969. ARCHIVOS CONSULTADOS AGEO – ARCHIVO GENERAL DEL ESTADO DE OAXACA. Archivo particular de Ana Paula de Teresa. AHSEP – ARCHIVO HISTÓRICO DE LA SECRETARÍA DE EDUCACIÓN PÚBLICA. Dirección General de Educación Primaria en Estados y Territorios, Escuela Rural Federal San Lucas Arroyo Palomo, Valle Nacional. Oaxaca, caja 32, exp. 8, foja. 6-7. BASES DE DATOS PARA LA ELABORACIÓN DE MAPAS CAO – CAMINOS Y AEROPISTAS DE OAXACA. Carreteras, brechas, caminos de terracería y caminos de herradura. México: Gobierno del Estado de Oaxaca, 2004. INEGI. Ríos y accesos. México: Inegi, 2000. ____. Conteo nacional de población y vivienda. México: Inegi, 2005. INEGI/UNAM. Regiones, distritos y municipios del estado de Oaxaca. México: Inegi/Unam, 2002. ___________ PATRICIA LEGARRETA – Maestra en antropología social, [email protected] 150 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 MERCADO DE TIERRAS, HERENCIA Y CAMBIO GENERACIONAL EN UN EJIDO ZOQUE-POPOLUCA DEL ESTADO DE VERACRUZ, MÉXICO JOSÉ MANUEL FLORES LÓPEZ R E S U M E N En el presente trabajo se describe un mercado de tierras surgido en el ejido indígena Piedra Labrada, en donde después de las reformas liberales de 1992 que culminaron en la expedición de una nueva Ley Agraria, casi la mitad de las tierras ejidales fueron vendidas a personas externas por la segunda generación de ejidatarios justo después de haberlas recibido como herencia por parte de sus padres o abuelos. Se analizan las implicaciones esto ha tenido para la continuidad socioeconómica y cultural del ejido, en particular para la organización de la unidad doméstica y las reglas de la herencia. P A L A B R A S - C L A V E Mercado de tierras; ejido; cambio generacional; herencia. A B S T R A C T This paper describes a local land market which has emerged in a mexican ejido called Piedra Labrada. Since the liberal reforms in the 1990s, which ended with the institution of a new Agrarian Law, half of the ejido lands were sold by the younger generation to external buyers soon after they inherited the lands from his fathers and grandparents. The socioeconomic and cultural implications of this land market, particularly for the organization of household and the rules of inheritance, are analyzed. K E Y W O R D S land market, ejido, generational change, inheritance. El presente artículo estudia los factores sociales y económicos que posibilitan el vínculo entre estructura y cambio, entre la persistencia y reproducción de una estructura ejidal y las modificaciones en la composición sociocultural de una comunidad indígena mexicana, a través del análisis de la dinámica de un mercado local de tierras ejidales. En México, el problema agrario en torno a la tierra ha desaparecido de las grandes pasiones nacionales y académicas. Así se entiende, por ejemplo, la escasa reacción a la intención gubernamental de desaparecer la Secretaria de la Reforma Agraria.1 Disciplinas como la antropología social y la sociología 1 La Secretaría de la Reforma Agraria fue creada en 1974 para sustituir a la Comisión Nacional Agraria, fundada en 1911 y al Cuerpo Consultivo Agrario, creado en 1935 – el cual se integró a la nueva secretaría –, con la finalidad de darle continuidad al reparto agrario. Sin embargo, para la fecha de creación de la SRA ya se habían asignado 8 de cada 10 hectáreas de la superficie dotada hasta hoy, por lo que la existencia de la SRA no implicó el reparto superficies considerables de tierra. En un contexto marcado por la decreciente asignación de recursos económicos y por una ambigüedad referente a sus atribuciones legales después de las reformas constitucionales de 1992, en 2009 se anunció la desaparición de la SRA, cuyas funciones fueron distribuidas entre distintas secretarías. 151 R UR I S 2 Desde al inicio del proceso de reforma agraria en 1917 hasta su conclusión con las reformas constitucionales de 1992 se repartieron 103 millones de hectáreas, poco más de la mitad de la superfie territorial del país. En este proceso se crearon más de 30,000 núcleos agrarios, de los cuáles, hasta 2008, el 92.5% son ejidos y el 7.5% comunidades agrarias, y que en conjunto conforman la propiedad social de la tierra. Aunque tiene antecedentes coloniales, el ejido se refiere a las tierras sujetas a un régimen de propiedad social surgido después de la Revolución Mexicana; a través de un decreto presidencial la tierra era asignada o “dotada” a un sujeto colectivo, una localidad o un asentamiento, al cuál se le reconoció personalidad jurídica y una organización con autoridades. La tierra permaneció hasta 1992 como una propiedad del Estado y el ejido tenía derecho sólo a su usufructo, y acciones como la ausencia del ejidatario de su comunidad, el arrendamiento o algunas formas se aparcería podían dar pie a la cancelación de sus derechos agrarios. Las comunidades agrarias, al igual que el ejido, conforman una forma particular de organización y de tenencia de la tierra con personalidad jurídica; a diferencia del ejido, a una comunidad agraria las tierras no le fueron “dotadas” sino reconocidas con base en acciones de restitución, de confirmación o de titulación. Así, en su origen el proceso de reforma agraria en México fue restitutorio, su objetivo fue devolver a los pue- 152 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 también se han alejado del debate sobre la propiedad de tierra y los campesinos, manteniendo un interés general, no obstante, sobre un mundo rural vagamente definido. Lo rural se ha convertido en una categoría difusa que no evoca ni define ya los procesos coherentes, delimitados y fácilmente reconocibles del pasado, a la vez que no se ha realizado un esfuerzo por crear una perspectiva que permita aprehender los actuales, más allá de una igualmente vaga “nueva ruralidad”. Es por ello que este trabajo se limitará a realizar un examen básicamente empírico sobre la dinámica de un mercado de tierras local y su relación con la reproducción de la organización ejidal y las transformaciones socioculturales de una comunidad particular, en especial de la organización familiar y de las reglas de la herencia de la tierra. Aunque el material presentado se refiere a un pequeño ejido ubicado en el sur del estado mexicano de Veracruz bien puede decirnos algo sobre el sector social en su conjunto, en particular sobre la manera en que las comunidades ejidales están modificando sus concepciones sobre la tierra y sus formas de organización socioeconómica, sobre todo en el contexto del cambio generacional que está en puerta (WARMAN, 2001; ROBLES, 2009, 2003). REFORMAS CONSTITUCIONALES DE 1992 En México, el reparto agrario fue, por una parte, producto de la lucha revolucionaria de 1910, una reivindicación social de las masas de campesinos desposeídos. A la vez, fue también un instrumento que permitió la legitimación del Estado mexicano y los valores que fomentó. Por otra parte, funcionó como un medio que permitió la estabilidad social y la consolidación política de un grupo en el poder así como su permanencia en él durante décadas. De esta manera, y dado el estatus legal del ejido como propiedad estatal, frenando la intervención del capital privado, permitió la reproducción de las unidades familiares campesinas así como sus formas de subsistencia.2 Las R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 modificaciones al artículo 27 constitucional y la aprobación de la nueva Ley Agraria en 1992 pusieron fin a la redistribución de la tierra y suprimieron el carácter inalienable, inembargable e imprescriptible de la propiedad social.3 En términos generales dos aspectos son centrales a estas reformas. En primer lugar, los ejidos y comunidades agrarias ahora son dueños de las tierras que en el pasado pertenecieron al Estado. La creación de ejidos sigue siendo posible, pero ahora aquellos productores que quieran hacerlo deberán aportar las tierras para ello. En segundo lugar, se establecieron mecanismos que posibilitarían el mejoramiento productivo. Por ejemplo, las trabas legales para el arrendamiento y la compra fueron suprimidas y ahora cualquier ejidatario puede recurrir a estos mecanismos libremente, aunque con algunas restricciones para el caso de la venta de tierras. Así, las parcelas ejidales solamente pueden ser enajenadas una vez que hayan sido deslindadas y certificadas, y podrán ser adquiridas únicamente por otros ejidatarios o avecindados del mismo núcleo ejidal.4 Los cambios constitucionales y la Ley Agraria establecen también que las tierras ejidales pueden ser objeto de cualquier contrato de asociación o aprovechamiento, desde la aparcería hasta la conformación de sociedades mercantiles o civiles o asociaciones rurales de carácter colectivo. Asimismo, puede otorgarse en garantía el usufructo de las tierras de uso común y de las tierras parceladas a favor de instituciones de crédito o de aquellas personas con las que tengan relaciones de asociación o comerciales. A diferencia de las tierras parceladas, la propiedad de las tierras de uso común sigue siendo inalienable, imprescriptible e inembargable, salvo en los casos de “manifiesta utilidad para el núcleo de población ejidal”, en los que es posible trasmitir su dominio a sociedades mercantiles o civiles en las que participen el ejido o los ejidatarios. Para hacer posible estas disposiciones legales, se creó como instrumento de avanzada el Programa de Certificación de Derechos Ejidales y Titulación de Solares Urbanos – Procede, cuyo objetivo, de acuerdo a la versión oficial, es dar “certidumbre blos las tierras de las que habían sido despojados en etapas históricas anteriores; sin embargo, para superar los enredados trámites de restitución la dotación se tornó más importante. Asimismo a diferencia del ejido, con las reformas constitucionales de 1992, la comunidad agraria mantuvo la protección estatal de sus bienes y recursos y las tierras comunales permanecen como inembargables e imprescriptibles (TELLO, 2008; PROCURADURÍA AGRARIA, 2005; WARMAN, 2001). 3 Para una revisión hemerográfica sobre las reformas, véase Reyes et al. (1996). Los argumentos de los diferentes actores que participaron en el proceso de dictaminación de la Iniciativa de Ley Federal Agraria son recogidos en García Corpus (2006). También véase Ibarra Mendívil (1999) para un breve y buen análisis de los cambios constitucionales al artículo 27. Un estudio legal más extenso sobre las mismas lo realiza Pérez Castañeda (2002). 4 En realidad, puesto que las tierras son ejidales, en estricto sentido lo que se enajena son los derechos parcelarios. Para la validez de la enajenación basta la conformidad por escrito de las partes y su notificación al Registro Agrario Nacional. Para poder ser adquiridas por un comprador externo, el vendedor primero tiene que adoptar, si la asamblea ejidal así lo dispone, el régimen de dominio 153 R UR I S pleno sobre su parcela y convertirla así en propiedad privada. De acuerdo con la nueva legislación ningún ejidatario podrá ser titular de derechos parcelarios sobre una extensión mayor que la equivalente al 5% de las tierras ejidales. 154 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 jurídica a la tenencia de la tierra a través de la entrega de certificados parcelarios y/o certificados de derechos de uso común según sea el caso, así como de los títulos de solares a favor de los individuos que integran los núcleos agrarios que así lo aprueben y soliciten”. La implementación del Procede ha sido responsabilidad de la Procuraduría Agraria (creada, al igual que los tribunales agrarios, a partir de las reformas institucionales), cuyo papel ha sido informar a los ejidatarios sobre el proceso a seguir para la obtención de los certificados y títulos, aunque también le ha dado seguimiento a la ejecución del parcelamiento en los ejidos que lo han requerido; y del Registro Agrario Nacional (que pasó de dirección general a órgano desconcentrado de la Secretaría de la Reforma Agraria), cuya tarea ha sido la expedición, registro y control de los certificados de derechos parcelarios y comunales. La medición de las tierras ejidales estuvo a cargo del Instituto Nacional de Estadística y Geografía – Inegi. Con la eliminación de la restricción legal al arrendamiento y la venta de la propiedad social, según se dijo, el campo quedaba abierto a la libre expansión del capital. Esta situación, se ha especulado, podría permitir que los ejidatarios más competitivos terminaran acaparando una buena parte de la antigua propiedad ejidal, promoviendo aún más la concentración de las mejores tierras en pocas manos, estabilizando y legalizando la irregular situación de los latifundios y acelerando el proceso de diferenciación interna del propio campesinado, procesos que fueron detectados aún antes de las reformas, pero que eran permanentemente frenados por las restricciones legales que suponía el antiguo artículo 27 (LINK, 1994; BRETÓN SOLO DE ZALDÍVAR, 2000). Sin embargo, en cuanto a la distribución territorial del país en términos de las diferentes formas de propiedad que existen, la propiedad social de la tierra sigue manteniendo casi idénticas proporciones. En 1992, el 43% del territorio nacional estaba constituido por ejidos; el 9% por comunidades agrarias; R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 el 2% por colonias; el 3% por terrenos nacionales; y el 37% por propiedad privada. Para 1999, el 43% del territorio nacional seguía estando ocupado por ejidos; 8.4% por comunidades; 1.9% colonias agrícolas y ganaderas; 9.1% terrenos federales; 5 37.6% propiedad privada (SRA en Internet, Instituto Nacional de Estadística y Geografía – Inegi). En realidad, la compra– venta de tierras ejidales ha afectado a una mínima parte de la propiedad social. El arrendamiento, por otro lado, es la práctica más recurrente de trato agrario en el país y genera una moderada movilidad de tierras ejidales aunque sin modificar los derechos de propiedad. Por su parte, la extensión de tierras ejidales sobre las que se ha adoptado el régimen de dominio pleno es también sólo una fracción – el 1.6% – del total de la propiedad social (SRA en Internet, Procuraduría Agraria, www.pa.gob.mx). El escaso interés por la compra y la venta de la tierra, al menos por parte de los grandes capitales, tiene varias explicaciones. La tierra no se vende debido a que, junto a su trabajo, es la única fuente relativamente segura de ingreso para la familia campesina; tampoco se vende debido a la especial relación que los campesinos establecen con la tierra; la tierra es un elemento central en las historias locales y en los imaginarios colectivos, en la solidaridad y organización comunitaria. Es probablemente debido a estos factores que una buena parte de las ventas registradas hasta el año de 1998 haya tenido como objeto la transferencia no de parcelas completas sino sólo fracciones de ellas (un tercio del total) (PROCURADURÍA AGRARIA, 1998). En estas condiciones, si la venta de tierras aumenta, probablemente lo hará afectando a una proporción menor del conjunto de la propiedad social, pues una parte significativa de las tierras ejidales y comunales, cerca del 70% de ellas, no son aptas para la actividad productiva (GRAMMONT, 1996). Así, y como de hecho ha sucedido hasta ahora, la venta de tierras se daría con mayor dinamismo sobre aquellas tierras altamente rentables y sobre todo en aquellas pertenecientes a 5 Las colonias y agrícolas y ganaderas son un régimen de propiedad rural establecido por distintas legislaciones anteriores con la finalidad de colonizar tierras y favorecer el poblamiento y el incremento de la producción agrícola y ganadera. Los terrenos nacionales corresponden a los terrenos que son propiedad de la nación. Sobre ejido y comunidad agraria véase a nota 2. 155 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 ejidos localizados cerca de las ciudades en expansión, en donde se ha desatado la especulación inmobiliaria en torno a ellas. El temor a la expansión del capital privado sobre el sector ejidal en términos de compras generalizadas de tierras, por otro lado, ha quedado en gran medida disipado debido a la poca rentabilidad de la actividad agropecuaria y a diferentes formas de generación de riqueza, que no necesariamente implican la propiedad y la explotación directa de la tierra (ZEPEDA, 2000). Puede considerarse también que la acumulación generalizada de tierras por parte de la iniciativa privada ha sido y es frenada por las restricciones que para ello existen en la legislación; por ejemplo, los bancos no pueden ser dueños de tierras ejidales y sólo pueden recibir en garantía su usufructo, lo que hace muy improbable que los bancos se conviertan en acaparadores de tierra y que de paso otorguen créditos masivos al sector ejidal. En conjunto, la serie de reformas económicas y políticas emprendidas en las últimas dos décadas y que implicaron cambios significativos en la estructura de incentivos del sector agrícola y en el marco legal que regula el sector de la propiedad social no ha sido la panacea que se esperaba para dar solución a los graves y profundos problemas económicos del país, en particular del campo. Las reformas fueron consideradas como esenciales para mejorar los mercados rurales, incentivar la inversión y fomentar la gobernabilidad (BANCO MUNDIAL, apud GORDILLO, 2005, p. 23). Los resultados, sin embargo, no han sido los esperados. La pobreza de los sectores rurales permanece e incluso se ha acentuado, el sector agrícola no muestra signos de crecimiento y ha disminuido su participación en la economía del país (GORDILLO, 2005). Tampoco se han activado dinámicos mercados de tierras que permitan superar la pobreza de los habitantes en los núcleos agrarios. Sin embargo, más allá de las expectativas puestas sobre los posibles beneficios que a corto o largo plazo pudieran esperarse con los cambios realizados, lo cierto es que existen condiciones diferentes dentro 156 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 de las cuales los campesinos y los demás habitantes del medio rural piensan, toman decisiones e interactúan, adaptándose a las nuevas circunstancias y modificando continuamente, no sin contradicciones y conflictos, los entornos sociopolíticos y legales. La persistencia de las proporciones no significa, sin embargo, inmovilidad. Con seguridad, algunos campesinos han cedido sus tierras a vecinos ricos o a las ciudades en crecimiento, como se ha confirmado para algunos ejidos en diferentes partes del país (CONCHEIRO y QUINTANA, 2003), pero la mayoría la mantiene de diversas maneras ya sea vendiendo parcialmente sus tierras u otorgando solamente su usufructo sin modificar los derechos de propiedad. Dentro de la aparente estabilidad y permanencia de la estructura de la propiedad, la certificación de derechos ejidales ha modificado – y en algunos casos mantenido – rasgos y elementos de las organizaciones sociales y económicas de los ejidos del país, generando nuevas pero también manteniendo o acentuando viejas dinámicas. La propiedad social se mantiene, pero en un contexto socioeconómico y político fundamentalmente diferente con respecto al pasado. DINÁMICA DEL MERCADO DE TIERRAS EJIDALES EN PIEDRA LABRADA, 1993-20076 Piedra Labrada es una pequeña comunidad indígena zoque-popoluca ubicada en el municipio de Tatahuicapan, perteneciente al estado de Veracruz. Este municipio se encuentra en una región más amplia llamada Sierra de Santa Marta.7 Esta región conforma actualmente un espacio interétnico en el que se relacionan nahuas, zoques-popolucas, mestizos de otras partes del estado y del país y rancheros que habitan La Perla del Golfo, una colonia ganadera establecida en la costa en los años cincuenta. Piedra Labrada fue establecida en el lugar a principios del siglo XX con población que huyó a los hechos violentos registrados en 1906 como producto del levantamiento armado 6 La información presentada aquí es producto de una investigación de campo realizada entre los meses de enero y abril de 2007. 7 La Sierra de Santa Marta, conformada por dos grandes macizos volcánicos que llevan los nombres de Santa Marta y San Martín Pajapan. En 1988 esta quedó integrada al proyecto de la Reserva de la Biosfera Los Tuxtlas que se extendió sobre 155,122 has. Los Tuxtlas es la selva más septentrional del continente. Más allá no existen ecosistemas con las características propias de la selva húmeda americana. Del inmenso más verde que una vez fue hoy sólo quedan pocos remanentes, menos del 15% de la cubierta forestal original (véase GUEVARA, 2004; RAMÍREZ, 1999; PARÉ et al., 1997; BARRERA-BASSOLS Y RODRÍGUEZ, 1993) y en su mayor parte, la sierra es ahora un inmenso potrero para la cría de ganado vacuno. 157 R UR I S 8 El proceso de expansión de la ganadería en la sierra comenzó en los años cuarenta en el municipio de Pajapan – al sureste de la sierra – (CHEVALIER, 1995; CHEVALIER y BUCKLES, 1993); paulatinamente pastos y potreros alcanzaron a los ejidos del interior, provocando con ello una intensa deforestación que ha terminado casi por completo con la cubierta selvática original (véase VELÁZQUEZ, 1992, 2000, 2006,; LAZOS, 1996, 2001; LAZOS y GODINEZ GUEVARA, 1996). Este proceso solamente tocó superficialmente a Piedra Labrada y no fue sino hasta comienzos de los ochenta, con la apertura del camino que une a las comunidades del oriente de la sierra con su actual cabecera municipal, Tatahuicapan, que la población comenzó a involucrarse cada vez más con en esta actividad. 158 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 dirigido por líderes magonistas radicados en las ciudades de Coatzacoalcos, Minatitlán y Acayucan y en la que los zoquespopolucas del municipio de Soteapan jugaron un papel protagónico (BÁEZ-JORGE, 1990; VELÁZQUEZ, 2006). Desde entonces y hasta principios de los años ochenta, cuando comenzó un proceso de ganaderización basado en convenios de aparcería,8 Piedra Labrada se mantuvo como un pueblo de agricultores relativamente autosuficientes en medio de la selva. Hasta los años cincuenta, también fue una de las pocas comunidades asentadas en la región; además de Piedra Labrada solamente existían las localidades nahuas de Los Arrecifes y Sochapan, al norte, y la comunidad popoluca de Mirador Pilapa, al sur. A partir de la década de 1950 y sobretodo de la de 1960 cuando inicia en este lugar el proceso de dotación de tierras ejidales, el espacio selvático de esta parte de la sierra fue poblándose paulatinamente con nahuas del municipio de Mecayapan, popolucas de Soteapan, así como con gente proveniente de otros lugares del estado (VELÁZQUEZ, 2006). En la década de los 80’s la construcción de la carretera a Tatahuicapan trastocó los circuitos comerciales habituales hasta entonces y facilitó el arribo de programas gubernamentales y servicios hasta entonces inexistentes; también permitió la introducción de nuevas formas de trabajo y ocupación del espacio en torno a la actividad ganadera y el desarrollo de la aparcería. Ya en las décadas de 1990 y 2000, los pobladores de Piedra Labrada han tenido que enfrentar otros eventos de gran envergadura: la migración y la venta de una proporción considerable de la superficie ejidal. Actualmente Piedra Labrada tiene 393 habitantes. La actividad económica predominante, como en casi toda la región, es la ganadería de doble propósito, aunque el cultivo del maíz sigue practicándose sobre todo en el ciclo primavera verano. Gran parte de los productores locales están vinculados con ganaderos de otros lugares en tratos conocidos como “ganado a medias”, el cual ha posibilitado la obtención de unas cuantas R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 cabezas de ganado así como la leche que comercializan todos los días con dueños de pequeñas queserías ubicadas en otros poblados. La migración temporal, principalmente de jóvenes, ha cobrado importancia en los últimos diez años. Los destinos principales son Oaxaca, en donde asisten al corte de limón; los campos de tomate de Sinaloa; y las fábricas y maquilas de las ciudades norteñas de Ciudad Juárez, Chihuahua, y Ciudad Acuña, en el estado de Coahuila. Una característica sociocultural de los pueblos de esta parte la sierra es que en su mayoría no son católicos. Gran parte de la población se convirtió al protestantismo hace más de cincuenta años. Úrsulo Galván, comunidad habitada por mestizos provenientes de Los Tuxtlas, es una de las pocas comunidades habitadas por católicos. Con la excepción del lenguaje, los signos más evidentes que vinculan a un individuo con cierto grupo cultural, como el vestido, han desaparecido o se han transformado. Figura 1: Las sierras de Los Tuxtlas y Santa Marta Fuente: Elaboración propia a partir de cartas topográficas 1: 250 000, Inegi, 2005. 159 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 EL PROCEDE Y MERCADO DE TIERRAS En Piedra Labrada el mercado de tierras, entendido éste como un sistema de intercambios onerosos que se realiza entre compradores y vendedores, ha estado estrechamente ligado a la ejecución del Programa de Regularización y Certificación de Derechos Ejidales – Procede, instrumento de avanzada de las reformas al artículo 27 constitucional realizadas en 1992, y desde entonces ha sido la manera más importante de acceder a una porción de tierra, ya sea a una parcela completa o a una fracción de ella. Aunque se conoce que en otros lugares la venta de tierras fue una transacción común antes de las reformas constitucionales y la aplicación del Procede, en Piedra Labrada dicha práctica fue extraña y ocasional. No es sino un par de años antes del inicio de los trabajos que llevaron a la certificación de las parcelas ejidales cuando las transacciones de compra–venta comenzaron a tener lugar. Desde entonces una considerable porción de las tierras ejidales han cambiado de dueño, pasando casi siempre a manos externas a la comunidad. A diferencia de lo que ha sucedido en otras partes de la sierra, como en el sur maicero (véase LÉONARD y VELÁZQUEZ, s/f), en donde la mayoría de las transacciones de compra–venta de tierras ejidales han implicado solamente el intercambio de fracciones de parcelas, en Piedra Labrada, y en menor medida en los pueblos cercanos, se han vendido parcelas completas, lo cual tiene que ver, desde luego, con el hecho de que en Piedra Labrada la actividad preponderante es la ganadería y no la agricultura. Además, y también a diferencia de lo que ha sucedido en Piedra Labrada, en el sur maicero el mercado de tierras tuvo un efímero auge que culminó en su “involución”, ya que las fracciones de parcelas que habían sido vendidas después del Procede, al no haber quedado amparadas por certificados parcelarios, comenzaron a ser recuperadas por sus dueños originales. 160 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 El proceso de compra–venta de tierras ejidales en Piedra Labrada puede dividirse claramente en tres momentos o etapas. El primero entre 1993 y 1995, periodo anterior a la ejecución del Procede y en el que se realizan las primeras transacciones de tierra. El segundo de 1996 a 2002, lapso en el que se registra un considerable aumento de transacciones. El tercero es de 2002 a la fecha, periodo en el que la intensidad de las ventas disminuyó realizándose solamente una pequeña parte del total de las transacciones. Una precisión resulta aquí pertinente. En sentido estricto, de acuerdo a la legislación agraria, lo que es puesto en venta son los derechos parcelarios y no las parcelas – éstas siguen siendo ejidales –, aunque en la práctica se trate y se vea como lo último y a fin de cuentas es lo que en realidad importa. Aquí me seguiré refiriendo a las diferentes transacciones de venta de derechos parcelarios como “venta de parcelas” o “venta de tierras”, aunque se trate de lo primero. Los actores, desde luego, tienen muy presente esta distinción legal y así la refieren en los contratos escritos que se realizan con la finalidad de certificar una venta, especificando en ellos que se trata del intercambio de un derecho parcelario de una persona en particular por una cantidad especifica de dinero de otra. Hecha esta aclaración, a continuación se describirán las tres etapas del mercado de tierras en la comunidad de Piedra Labrada. En ellas no solamente existieron tratos de compra–venta; también hubo, aunque fueron de menor importancia, otros mecanismos mediante los cuales personas pudieron hacerse de parcelas o fracciones de ellas, principalmente durante la primera etapa en la cual el Procede tiene lugar. De esta manera, aunque la intención de las siguientes descripciones enfatizan los tratos de compra–venta, también se describirán las otras formas de acceso a la tierra. 161 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 TRES ETAPAS DEL MERCADO LOCAL DE TIERRAS EJIDALES EN PIEDRA LABRADA 9 Archivo de la Comisaría Ejidal de Piedra Labrada. 10 La palabra “avecindado” es un término jurídico que se refiere a una persona mayor de edad que ha residido por un año o más en las tierras del ejido y que ha sido reconocido como tal por la asamblea del núcleo; los avecindados pueden participar de la asignación y de la compra de derechos sobre tierras ejidales. Generalmente las personas que son conocidas como avecindades en los nucleos ejidales son los hijos de los ejidatarios. Por otro lado, la palabra “posesionario”, que será citada más adelante, se refiere a la persona que posee tierras ejidales y que ha sido reconocido como tal por la asamblea ejidal y por los tribunales agrarios. Así, un avecindado que haya adquirido tierras ejidales puede ser reconocido como posesionario; los posesionarios así como los avecindados carecen de voto en las asambleas ejidales y por lo tanto no pueden participar de las decisiones que son tomadas por la asamblea. 162 Primera etapa, 1993-1995. En la Asamblea de Delimitación, Destino y Asignación de Tierras Ejidales, llevada a cabo en 1995 después de los trabajos de medición, se reconocieron los derechos de 31 ejidatarios sobre las parcelas de 20 hectáreas que habían venido trabajando desde que el ejido fue parcelado en los años sesenta.9 Se reconocieron, además, los derechos de 23 nuevos ejidatarios que habían adquirido tierras mediante la compra de parcelas completas y pequeñas fracciones en los dos o tres años anteriores, o bien mediante la adjudicación de “agostaderos” a algunos pocos avecindados.10 Estos “agostaderos” son minúsculas parcelas que resultaron de la parcelación de las tierras comunes reservadas en el ejido. Nunca habían tenido un uso pecuario, simplemente fueron tierras que se habían dejado como una reserva de bosque y cuyo fin principal era la extracción de leña a la cual los avecindados, hasta la llegada del Procede, tenían acceso. Con el Procede esta tierra fue dividida en docenas (30) de parcelas que fueron asignadas tanto a algunos ejidatarios a manera de compensación en el caso de haber recibido menos de las 20 hectáreas que todo ejidatario original debía poseer como a algunos avecindados. Algunos de estos avecindados recibieron su “agostadero” por una decisión de la asamblea cuyo sentido fue el de restituir, aunque fuera en una pequeñísima parte, el patrimonio perdido en los dos o tres años anteriores por medio de la venta. Por ejemplo, un avecindado recibió dos hectáreas mediante la decisión de la asamblea porque su padre, alcohólico, terminó “mal vendiendo” su parcela; otro le fue entregado a una mujer cuyo hermano había hecho lo mismo; otra fue asignada a un avecindado porque su hermano vendió su parcela casi inmediatamente después de haberla heredado de su padre. Como se muestra en el Cuadro 1, el camino más común y recurrido para acceder a tierras ejidales por parte de otros avecindados, o bien por parte de personas originarias R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 de otros lugares, fue la compra de parcelas. Se compraron parcelas completas, fracciones considerables y porciones que se reducían a un par de hectáreas. La distinción entre la compra de parcelas completas y de fracciones corresponde con los orígenes, intenciones y, sobre todo, a las posibilidades económicas de los compradores. Mientras que la totalidad de las parcelas completas vendidas fueron adquiridas por medianos ganaderos dedicados a una ganadería especializada en torno a la engorda de reses, originarios del centro de Veracruz y avecindados en localidades de la sierra, como San Francisco Agua Fría y Los Laureles, los que compraron solamente un pedazo de tierra fueron en general campesinos locales dedicados en su mayoría a la ganadería al partido (Cuadro 2).11 En esta polaridad hay dos excepciones. Por un lado, una persona de la localidad compró una parcela de 20 hectáreas. Por el otro, dos externos compraron fracciones mayores a 10 hectáreas. En total fueron 16 personas que mediante la compra de tierras accedieron al estatus de ejidatarios. La mitad de ellos compraron parcelas completas; los antiguos dueños fueron dados de baja en la Asamblea de Delimitación Destino y Asignación. Cuadro 1: Acceso a la tierra en la primera etapa del mercado de tierras 1993-1995 Compras de parcelas completas Compras de fracciones de parcelas Obtención de parcela por cesión familiar Obtención de parcela por decisión de asamblea Total de nuevos ejidatarios 8 8 1 6 23 Fuente: Trabajo de campo (2007). Cuadro 2: Procedencia de compradores en la primera etapa del mercado de tierras Procedencia de los compradores de parcelas completas Procedencia de compradores de fracciones de parcelas Locales Externos Locales Externos 1 7 6 2 Fuente: Trabajo de campo (2007). 11 La ganadería al partido o “ganado a medias” es un convenio productivo bastante difundido en la región para la reproducción y multiplicación de ganado vacuno. El convenio se entabla oralmente, sin documentos escritos y sin un compromiso temporal definido, entre un ganadero, generalmente privado, y un ejidatario que posee la cantidad suficiente de pasto. La principal característica del trato es la repartición, en igual número para cada uno de ellos, de las crías de ganado producto del convenio. 163 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Cuadro 3: Acceso a la tierra por género Compradores de parcelas completas Compradores de fracciones de parcelas Hombres Mujeres Hombres Mujeres 7 1 7 1 Fuente: Trabajo de campo (2007). Así, los tratos de compra–venta y el reparto de tierras de agostadero durante este periodo modificaron significativamente la composición interna de ejido: llegaron actores provenientes de otros lugares, con diferentes tradiciones culturales y productivas; campesinos locales accedieron a tierras de trabajo mediante la compra de fracciones; algunos avecindados se convirtieron en ejidatarios mediante un reparto local mínimo, pero con marcado sentido justiciero. Con ello se incrementó en una proporción considerable el número de ejidatarios al pasar de 31 a 54, en su mayoría hombres, aunque por primera vez hay 4 mujeres ejidatarias. Las relaciones de parentesco en las acciones mediante las cuales se tuvo acceso a la tierra no tuvieron importancia significativa salvo en cuatro casos, tres de venta y uno de cesión. Se modificó también la composición territorial del área productiva. En conjunto, las acciones anteriores, incluyendo el reparto local de tierras de agostadero, tuvieron lugar sobre aproximadamente 220 hectáreas que representan cerca de la cuarta parte de la superficie ejidal (870 has). Segunda etapa, 1996-2002. Durante los siguientes siete años que abarca el segundo periodo, el mercado local de tierras ejidales tuvo su momento más dinámico. Se hicieron más frecuentes y aumentó considerablemente la cantidad de tratos de compra–venta; y una mayor extensión de tierra fue transferida a nuevos dueños. Durante este segundo periodo se realizaron poco más del doble de transacciones que en el periodo anterior (33): 16 correspondieron a acciones de compra–venta de parcelas completas, la mayoría de 20 hectáreas aunque también se 164 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 vendieron tres parcelas de 10 y otra más de 2 hectáreas; así como cinco fracciones y 12 pequeñas parcelas llamadas “agostaderos”. La extensión de tierra transferida mediante las 34 transacciones llegaron a un total de 257 hectáreas, 47 mas que en la etapa anterior. Cuadro 4: Ventas de tierras. Segunda etapa 1996-2002 Parcelas completas Fracciones Agostaderos Total Ejidatarios con derechos en 1995 (31) 10 4 8 22 Posesionarios reconocidos como ejidatarios en 1995 (23) 6 1 4 11 Total 16 5 12 33 Fuente: Trabajo de campo (2007). En los siete años trascurridos entre 1996 y 2002, la compra de tierras fue el camino más importante, por no decir el único, a través del cual se tuvo acceso a la tierra. Doce personas compraron tierras en Piedra Labrada por primera vez. Igualmente que en el periodo anterior, quienes lograron acceder a este recurso fueron principalmente personas venidas de otros lugares, algunos de ellos con vínculos familiares con aquellos que en la primera etapa habían comprado parcelas en el ejido. Ocho compradores fueron personas externas a la comunidad; éstas adquirieron diez parcelas completas, incluyendo tres de 10 hectáreas y una de sólo 2; además, compraron tres agostaderos y una fracción de 5 hectáreas. Por otra parte, cuatro compradores fueron originarios de la localidad y se hicieron de tres agostaderos y solamente una parcela completa. El origen de los compradores tanto de parcelas completas, fracciones y agostaderos se muestra en el siguiente cuadro: 165 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Cuadro 5: Total de parcelas completas, fracciones y agostaderos vendidos y origen de los compradores Total de parcelas completas vendidas 16 Procedencia de los compradores Externos Locales 11 2 Total de fracciones vendidas 5 Procedencia de los compradores Externos Locales 1 4 Total de agostaderos vendidos 12 Procedencia de los compradores Externos Locales 4 8 Fuente: Trabajo de campo (2007). Casi todas las parcelas que se adquirieron en este segundo periodo fueron puestas en venta por primera vez; sólo tres parcelas fueron adquiridas en segunda vuelta, es decir, ya habían sido vendidas por primera ocasión en el periodo 19931995. De esta manera, de las 257 hectáreas totales, en realidad 230 fueron puestas en venta por primera vez en este segundo periodo. Como es de esperarse, puede hacerse la siguiente afirmación, por supuesto, con un par de excepciones: mientras los compradores externos siempre compraron a vendedores originarios de la comunidad, los compradores locales siempre recurrieron a vendedores también locales. Las excepciones para la primera afirmación son dos casos; en ambos se transfirieron parcelas completas entre personas no originarias del pueblo; para la segunda, un ejidatario local compró una hectárea a otro no originario de Piedra Labrada. Tercera etapa, 2003-2007. En este periodo se realiza el menor número de transacciones. Después de una intensa actividad en la movilidad de tierras ejidales vía la compra–venta, en los cuatro años que van de 2003 al año 2007, hay un repentino descenso en la dinámica del mercado de tierras. En este lapso de tiempo no se registran ventas de fracciones ni de “agostaderos”; sin embargo, ocho parcelas completas son traspasadas mediante esta vía. La cantidad de tierra que circula mediante la compra–venta es menor que la movilizada en los años previos, sólo 105 hectáreas, que representan la mitad de las transferidas en cualquiera de las dos etapas anteriores. Es de destacar que ningún comprador 166 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 es originario de Piedra Labrada. Todas las parcelas fueron adquiridas por gente que vino de fuera de la localidad, ya sea por aquellos que en las dos etapas anteriores ya habían comprado tierras en el lugar o bien por personas de recién arribo. De las ocho personas que vendieron, seis son originarios de la comunidad y con la venta perdieron, al no mantener pedazo de tierra alguno, los derechos ejidales que poseían. Los dos vendedores restantes fueron personas externas. Al final de los tres periodos observamos que las parcelas que fueron adquiridas por personas no originarias de Piedra Labrada abarcan aproximadamente 370 hectáreas, que representan el 42% del total de las tierras ejidales. Tales parcelas se extienden por todo el ejido, pero se aprecia cierta concentración en la parte central (ver Figura 2), a partir de la cual se extienden hacia el norte encadenadas entre sí, abriéndose hacia las orillas, dejando varios espacios sin afectar, a los que casi rodean. Otro brazo se extiende del mismo centro primero hacia el sur para dar la vuelta y dirigirse luego hacia noreste, hasta llegar al lindero con el ejido de San Francisco Agua Fría. En medio de éstos se encuentran algunas de las mejores tierras y por ello son codiciadas por las personas que han llegado a comprar tierras. Las han intentado comprar sin éxito. Incluso, la insistencia de algunos de ellos ha sido tal que ha sido considerada como coacción. Dos son los casos en los que se han presentado ciertos conflictos y tensiones derivadas de tal coacción, sobre todo con los hijos de los titulares quienes son los que ahora trabajan las tierras pues sus padres por su edad se las han cedido de hecho. 167 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Figura 2: Distribución de las parcelas compradas por personas externas entre 1993 y 2007 Fuente: Elaboración propia a partir de imágen obtenida en Google Earth, 2007. CARACTERÍSTICAS DE LOS TRATOS DE COMPRA–VENTA Registro escrito, certidumbre y reconocimiento de autoridades locales. La gran parte de los tratos agrarios que se realizan en México, el 80%, según lo muestra la estadística, son orales (ROBLES, 2003, p. 150). Las personas generalmente no dejan por escrito el convenio por el cual se intercambian los recursos. La única certeza y garantía de que será respetado el acuerdo que se entabla se encuentra en el conocimiento mutuo entre quienes lo sustentan. Pero hay excepciones. En Piedra Labrada, la gran parte de los tratos de compra–venta, sea por una parcela o una fracción de ella, han dejado huella escrita. La elaboración de un contrato local por la transacción cobra mayor importancia en el caso de las fracciones que en el de parcelas completas. Las ventan de parcelas completas, aunque quedan registradas localmente, 168 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 generalmente concluyen en la obtención de los cerificados expedidos por la RAN. Por el contrario, la venta de una fracción está prohibida por la ley y no existe la posibilidad de obtener una certificación. Así surge la necesidad de darle alguna garantía al trato, otorgada. El contrato local cobra la misma importancia cuando la venta es por una parcela completa pero pequeña, como los llamados “agostaderos”, que casi siempre son adquiridas por ejidatarios locales quienes encuentran demasiado caro seguir los trámites legales para obtener el certificado parcelario. Se hace un pequeño contrato, un contrato digamos entre usted y yo, nada más. Mucha gente [dice]: pues yo me voy a asegurar bien para que no tenga problema: está el comisariado ejidal, el consejo de vigilancia, [es decir] los principales de la comunidad, para que realicen un documento, un pequeño contrato que dice: yo estoy vendiendo y tú estás comprando… y que se respete, que se respete porque [puede haber un] problema [si alguien] dice: no pues ya me arrepiento de haber vendido; sabe qué, no te la doy, mi terreno es mi terreno porque yo tengo mis papeles (Daniel Ramírez, ejidatario). Es un dato interesante ya que en la legislación agraria se establece que, para que una acción de enajenación de derechos parcelarios tenga validez, sólo basta la conformidad por escrito de las partes ante dos testigos y su posterior notificación al Registro Agrario Nacional. Sin embargo, como lo indica la cita anterior, localmente se sigue reconociendo a las autoridades ejidales como instancias que pueden dar validez “legal” a un trato. El hecho de que cada vez más los ejidatarios se inclinen por la elaboración de un contrato escrito o crean conveniente hacerlo, no necesariamente implica la desestructuración de un sistema de intercambio basado en la reciprocidad, del debilitamiento de las redes de confianza locales o que la relación de intercambio se ha vuelto más individualista y personal. A mi parecer es lo 169 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 contrario. La relación que le otorga certeza a un contrato y lo que garantiza que será respetado no es la que entablan dos personas, sino la que se entabla con la comunidad. La asamblea no puede prohibir una transacción, pero sí la reconoce. Las personas que convienen la venta o la compra de una fracción, ven en la realización del contrato escrito y su reconocimiento ante otros y por la comunidad en general, una forma más segura de llevarlo a cabo. Aun cuando de antemano saben que el documento carece de validez jurídica, piensan que sería adecuado realizarlo porque al suscribirlo ante las autoridades ejidales y testigos se garantiza su cumplimiento y lo dota de “legalidad”. Los documentos escritos para validar la venta de una fracción básicamente siguen el mismo esquema formal que aquellos que se realizan cuando se trata de una parcela. Se indica la fecha, la hora, el lugar, los nombres de las autoridades ejidales, el de los que suscriben el trato y el de los testigos. Se indica claramente de que se trata de un acuerdo de cesión – es decir una venta– de derechos parcelarios, aunque en realidad sólo sea sobre una fracción. Se enlistan enseguida una serie de cláusulas en las que se desarrolla la negociación. Se comienza indicando los nombres de los involucrados y sus domicilios; las características y la ubicación de la parcela sobre la cual se hará la venta; la cantidad de tierra que será fraccionada y el monto a pagar. Se precisa también que el vendedor “está en pleno uso de sus facultades mentales” y que el trato lo realiza “de su propia voluntad” y “sin presión de persona alguna”. El documento concluye de la siguiente manera: “las autoridades internas del núcleo ejidal exhortan y recomiendan a los comparecientes que a partir de esta fecha se comprometan a respetar el presente acuerdo”. Finalmente, firman el documento todas las personas que “intervinieron para su debida constancia y legalidad”: el comprador, el vendedor, cuatro testigos y las autoridades ejidales. Fines de los tratos. Las ventas de fracciones, por otro lado, tienen motivaciones diferentes e intentan resolver otro tipo de 170 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 cuestiones. En la decisión de vender una fracción también se considera, a diferencia de los casos anteriores, la situación del que compra. Es decir, con frecuencia en este tipo de tratos la reciprocidad entra en juego como un elemento importante. En la mayoría de los casos registrados es así: se venden unas cuantas hectáreas para que otra persona acceda a la tierra, para que tenga un lugar donde producir o bien para solucionarle algunos problemas de corte productivo. En un par de casos se trató de familiares, como una señora que adquirió de su hermano 2 hectáreas o un avecindado que le compró a un tío 5 hectáreas. Pero aunque en la mayoría de los casos no se vende a familiares sí se vende a gente de la comunidad. Así, en dos casos ejidatarios vendieron unas pocas hectáreas para que las parcelas de “otros compañeros” tuvieran acceso a una fuente de agua; otro vendió un par de hectáreas para que el caballo de un conocido tuviera donde pastar; uno más, le vendió un par de hectáreas a otro ejidatario que “tenía muy poca tierra” y a la vez para pagar una pequeña deuda; así como otro intercambió un caballo por una hectárea. Así, en el caso de Piedra Labrada, la venta de fracciones se ha realizado, en la mayoría de los casos, con vistas a solucionar pequeños problemas productivos con criterios en los que no solamente lo económico determina su sentido. DESPUÉS DE LA VENTA: REORGANIZACIÓN FAMILIAR Y HERENCIA La herencia La herencia es el conjunto de bienes o derechos que son transmitidos a una o a varias personas después de la muerte de quien las poseía. En materia agraria, la palabra técnica que es utilizada en el sistema ejidal para denominar la herencia es sucesión de derechos ejidales (o comunales). A la persona que hereda se le conoce como sucesor. Puede ser común que a la cesión 171 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 de derechos, el acto por el cual una persona titular de derechos los transfiere a otro, también se le conozca como herencia; es por esto que autores como Warman (2001, p. 85) le llaman “herencia en vida”, para distinguirla de la “herencia póstuma”. En el área cultural mesoamericana es frecuente que se le otorgue un papel preponderante al hijo menor de sexo masculino en el cuidado de los padres ancianos y en la herencia de la casa paterna; además, la tierra se transmite igualitariamente a todos los herederos varones, aunque en muchos casos no se excluye a la mujer, que recibe partes menores que el varón (ROBICHAUX, 2005). En efecto, de acuerdo con Warman (2001), en la mayoría de las regiones rurales en México la tradición hereditaria más común es aquella que incluye a todos los hijos, fragmentando las parcelas para repartirlas entre ellos. Es por ello, afirma este último autor, que la norma legal de sucesión violentaba la tradicional, y la sigue violentando. Actualmente, el 26.2% de los ejidatarios que hay en el país accedieron a la tierra a través de la herencia y por cesión el 24.6%. Es decir, la mitad de los ejidatarios accedieron a la tierra por relaciones de parentesco (WARMAN, 2001). El sistema de herencia de los zoque-popolucas no ha sido detallado y sólo se encuentran referencias aisladas al respecto. Foster, en la década de los cuarenta, dejó asentado en una breve referencia que “la disposición de la propiedad a la muerte de un hombre depende de las circunstancias particulares que le rodean” (1942, p. 90). Describe que, si hay hijos, dependiendo de factores como la edad o su condición general de vida, dividen el dinero, los árboles y el derecho sobre la milpa. Si los hijos son mayores, se han casado y han recibido un lugar en donde vivir independientemente, no hay razón que justifique el recibir parte de la herencia. Es decir, en un tiempo en el que todavía no existían ejidos, Foster nos describió que eran principalmente los hijos varones los que recibían en herencia la propiedad del padre y el derecho sobre la milpa en partes iguales. Báez-Jorge, tres décadas después, confirmó lo anterior, diciendo que si hay 172 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 hijos solteros “en edad de trabajar”, éstos obtienen el total de la herencia, aunque tiene prioridad el mayor de ellos. Las hijas, al igual que los hijos casados, no obtienen herencia alguna “en vista de que al contraer matrimonio recibieron su dote”, aunque no especifica sobre las hijas solteras. Si los descendientes masculinos son menores de edad a la muerte del padre, la propiedad queda a cargo de la esposa hasta que el hijo mayor tenga edad suficiente para ocuparse de la dirección económica de la familia. Si la descendencia es únicamente femenina, entonces la herencia es dividida entre la madre y las hijas en el momento en que éstas se casan. Una vez casadas, las hijas transfieren sus herencias al esposo (BÁEZ-JORGE, 1990, p. 116). Por otro lado, y de manera más reciente, se han hecho menciones esporádicas sobre la frecuencia de la trasmisión de la tierra exclusivamente al hijo menor entre los zoque-popolucas. Lo anterior es confirmado para el caso de la comunidad de Piedra Labrada. La gran mayoría de las herencias se han depositado en el hijo menor y con frecuencia éstos también son los que reciben la casa y el solar. El papel asignado al utimogénito varón en la recepción de los derechos parcelarios del padre desde luego no es una norma que se cumpla en todos los casos. La variación a la norma ha tenido diversas causas. Por ejemplo, ha habido quien no ha querido continuar con la posesión de la tierra y las actividades que ello implican; en este caso la parcela se heredó al hijo mayor. Si el hijo menor por alguna razón ha estado ausente, ha sucedido lo mismo. También ha habido casos en los que no hay herederos varones y, como lo describió Báez-Jorge hace 35 años, la parcela pasó a manos de una hija, quien la cedió a su esposo y éste la vendió. Tal y como lo describe también este autor, hubo un caso en que la viuda de un ejidatario fallecido recibió en encargo la parcela hasta que el hijo mayor creció, aunque en este caso, también el hijo la vendió. Así pues, no hay un patrón inamovible de herencia sino que, como lo afirmó Foster en 1942, la herencia depende de las “múltiples circunstancias que rodean 173 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 a la muerte del padre”. Pero en general, la regla que le otorga al ultimogénito un papel preponderante en la herencia del padre se ha acatado, aunque es probable que ello cambie. Desde que la comunidad de Piedra Labrada fue dotada con tierras ejidales en los años sesenta (1961) hasta un par de años antes del Procede, el número de ejidatarios fue notablemente estable. Comenzó con 39 “capacitados” y terminó en 1993 con 39 ejidatarios, lo cual indica que en la mayoría de los casos se acató la ley de transmitir la parcela a un único heredero, generalmente al ultimogénito, como ya se verá enseguida. De los 39 ejidatarios con derechos reconocidos poco antes del Procede, dispongo de información sobre 34 de ellos acerca de la manera en la que accedieron a sus tierras. La mayoría de ellos lo hizo principalmente a través de la herencia o por cesión. Algunos más lo hicieron por decisión de la asamblea y otros, los ejidatarios más antiguos, por dotación. Comenzaré por estos últimos. Hacia 1993 había ocho ejidatarios de la primera generación, es decir, de aquellos que recibieron tierras por dotación a comienzos de los años sesenta. Después de ese año, dos de ellos vendieron sus tierras a personas de fuera de la comunidad. Uno de estos decidió no heredar a sus hijos y otro la vendió para reunirse con sus familiares en otro lugar. Cuatro más siguen trabajando sus parcelas con sus hijos o nietos; y los otros dos han cedido sus derechos parcelarios a sus hijos. De estos dos últimos, un ejidatario cedió la tierra a sus dos hijos menores, fraccionando su parcela en dos mitades; el segundo no la ha cedido formalmente, pero la trabaja su hijo menor, lo cual es señal de que en este caso se seguirá la norma de heredar al ultimogénito. Por otro lado, siete ejidatarios accedieron a sus parcelas por decisión de la asamblea. Dos de ellos ocuparon las parcelas dejadas por personas que por un grave conflicto causaron baja. Las circunstancias del conflicto son bien conocidas en la comunidad, pues se trató de un homicidio que tuvo lugar en los años ochenta. Las personas que ocuparon las parcelas vacantes 174 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 pagaron alguna suma de dinero. De hecho, no fueron éstos sino sus padres quienes “pagaron los derechos que se pagaban por las parcelas”, como dijo uno de ellos, con el propósito de otorgárselas a sus hijos. Estos últimos casos fueron los únicos en los que a cambio de una cantidad de dinero específica se transfirió una parcela en años anteriores a 1993, año en el que inicia el proceso de compra–venta de derechos parcelarios. Un ejidatario más accedió a su parcela por cesión de su esposa, operación que fue ratificada en la asamblea. La mujer la había recibido de su padre como herencia y al momento de contraer matrimonio la cedió al esposo, quien después de un tiempo la vendió (después del Procede); es necesario subrayar que en este caso la mujer fue la menor de su familia y que no había un heredero hombre. Otro caso fue semejante, aunque esta vez quien cedió la parcela no fue la esposa sino la suegra. Esta mujer había perdido a su marido y solamente tenía hijos pequeños cuando una de sus hijas contrajo matrimonio. Al casarse ésta, la mujer decidió cederla a su yerno, decisión que fue ratificada por la asamblea. Al crecer uno de los hijos de la viuda, éste reclamó la parcela que había sido de su padre, e incluso hubo una serie de rencillas entre éste y el esposo de su hermana aunque sin que los problemas se hayan tornado muy difíciles. Después de un tiempo el joven desistió y se fue a vivir a otro lugar. En los ochenta, tres personas dejaron el pueblo por razones que no he podido establecer, y sus parcelas fueron ocupadas por otros tres ejidatarios de nuevo ingreso. Del resto de los ejidatarios con derechos reconocidos hacia 1993, con la excepción de los seis para los cuales no se cuenta con información, 19 accedieron a través de la herencia y en menor medida por cesión (solamente una persona). Así, la mitad de los ejidatarios registrados dos años antes de ejecutarse el Procede habían accedido a sus parcelas por lazos familiares de herencia o por cesión patrilineal. La mayoría de ellos la recibió del padre y éstos, también en su mayoría, eran los integrantes 175 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 varones de menor edad de sus familias. En algunos casos no se trató de una transmisión del padre sino del abuelo, o incluso el padrino, al ultimogénito. De los 20 ejidatarios que accedieron de esta manera a la tierra – sin contabilizar el caso ya descrito anteriormente en el que una mujer siendo la más chica de su familia recibió la parcela de su padre – 11 de ellos la recibieron de sus padres, siendo ellos los ultimogénitos. Otros 2 ejidatarios también la recibieron de sus padres, en un caso se transfirió al hijo mayor y el segundo no pudo determinarse. Cuatro ejidatarios más la recibieron de sus abuelos. De estos últimos, en dos casos similares hubo fuertes resentimientos de los hijos que se sintieron desplazados al no recibir nada de sus padres, al grado de que sintieron que no tenían responsabilidad alguna sobre la salud de sus ancianos padres, negando la ayuda que sus familiares les pudieran pedir. Un ejidatario decidió dejarla en manos de su ahijado y en otro caso una ejidataria al morir la heredó a un sobrino. Salvo tres excepciones en los años setenta, la gran mayoría de todas las transferencias a los hijos tuvieron lugar en los ochenta, particularmente hacia la segunda mitad de la década de los ochenta y principios de los noventa, años en los que una segunda generación de ejidatarios paulatinamente fue asumiendo la posesión de los recursos ejidales. Cuadro 6: Ejidatarios que tuvieron acceso a la tierra mediante la herencia o cesión Últimogénito No ultimogénito Recibidas de sus abuelos Recibidas de otras personas Cesión del padre Total Parcelas vendidas desde 1993 11 2 4 2 1 20 16 Fuente: Trabajo de campo (2007). El control de esa segunda generación sobre las tierras ejidales no duró mucho tiempo, pues justo antes de formalizarse el Procede tuvieron lugar las primeras ventas de derechos 176 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 parcelarios, como ya se ha mostrado. Quienes vendieron fueron precisamente estas personas que habían recibido las parcelas de sus padres o de sus abuelos. De los 8 que vendieron justo antes de la certificación, 7 fueron ejidatarios que habían recibido la tierra de sus padres (5), o de sus abuelos (2), en los años anteriores. El otro que vendió su tierra fue un ejidatario que la había recibido por dotación. Del resto de los ejidatarios de segunda generación que recibieron por herencia o cesión sus derechos ejidales, en el transcurso de los siguientes años (durante el segundo periodo del mercado de tierras) 8 más venderían sus tierras; es decir, 16 ejidatarios vendieron las tierras que habían recibido de sus padres o abuelos; solamente 4 ejidatarios no lo hicieron. De quienes la recibieron por la decisión de la asamblea, 2 también vendieron sus tierras. En un par de casos, los ejidatarios titulares ya han cedido de hecho a sus hijos, quienes ahora trabajan las parcelas, aunque es poco probable que las vendan y se muestran decididos a mantenerlas a como de lugar. Es justamente en estos dos casos en los que compradores externos han tratado de ejercer presión para convencer a los viejos de que vendan sus parcelas, a lo cual los hijos se han opuesto con firmeza y decisión. Tal vez para ellos es tiempo de aprender del pasado reciente. La continuidad en la posesión de la tierra ejidal ha sido fracturada y la mitad de ella ha pasado a manos externas. La unidad doméstica Algunos de los que han vendido sus tierras por completo no han permanecido en Piedra Labrada. Se han mudado a otros lugares, como Tatahuicapan, Chacalapa o San Andrés Tuxtla; otra persona se fue a Sinaloa y el destino de un par más se desconoce. En tres de los casos anteriores les acompañaron sus familiares y en uno más se trató de un ejidatario y su esposa que dejaron Piedra Labrada para unirse a sus hijos en otra parte. Otros han permanecido y tenido que adaptarse a las nuevas circunstancias, pero estas circunstancias no han sido las mismas 177 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 para todos; como ya lo afirmé, dos personas lograron comprar tierra y mantuvieron la calidad de ejidatarios y siguieron dedicándose a las mismas actividades en torno a la ganadería. En este apartado me interesa describir tres casos de aquellos que vendieron las parcelas que les fueron heredadas por sus padres y decidieron quedarse en la comunidad pero como campesinos sin tierra. Los casos son significativos ya que, a pesar de las diferencias con respecto a las actividades económicas que han adoptado, estructuralmente tienen ciertas similitudes que me permiten considerarlas como un conjunto o un tipo. En estos tres casos, se ha asumido una estrategia que podría considerarse como tradicional, en un sentido bastante específico. El trabajo del conjunto de la familia en tanto que unidad de producción vuelve a cobrar importancia. La actividad ganadera, por su propia dinámica y naturaleza, demanda el trabajo de muy pocas personas (véase LAZOS, 2001). Cuando los hijos varones son pequeños, es probable que la mayoría de ellos le ayuden al padre en las labores que le demanda la actividad ganadera. Pero cuando éstos son mayores, las cosas no son así. En estas circunstancias, la mayoría de los ejidatarios que se dedican a esta actividad solamente recurren al apoyo de uno de sus hijos, mientras que el resto encuentra trabajo en otros lugares. Al vender la parcela se encuentra con que ya no es posible obtener los recursos de los que le proveía la ganadería ya sea a través de la venta de ganado, la venta regular de leche o la renta de pastos. Ante esta situación, la opción es la de reorganizar las actividades de cada uno de sus integrantes en torno al trabajo productivo. Es decir, la meta de la autosuficiencia familiar se intenta alcanzar mediante la incorporación de un número mayor de trabajadores en la familia. Las actividades principales pueden seguir siendo el trabajo por jornal o la migración, pero dentro de esta lógica familiar. Primer caso. Fulgencio Gutiérrez vendió hace 13 años su parcela a un colono de La Perla del Golfo. Por ella recibió 30 mil 178 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 pesos y ocho cabezas de ganado. Después que vendió su parcela se dedicó a trabajar por jornal en la región: chapeando potreros, fumigando pastos, extendiendo alambrados, instalando postes. Esto no alcanzó para satisfacer las necesidades de una creciente familia. Más tarde consiguió varios trabajos tumbando acahuales y superficies de bosque para convertirlos a potrero en distintos lugares de la sierra. Entonces, debido a que sus hijos varones eran muy pequeños para esta clase de trabajo y a que uno de sus dos hijos mayores se encontraba en Ciudad Juárez y otro trabajaba como empleado en un rancho cercano, en el ejido de Sochapan, fue cuando comenzó a llamar a otros familiares suyos para que le ayudasen en el trabajo. Llamó primero a un sobrino suyo de una localidad llamada General Emiliano Zapata; un tiempo después el sobrino se mudó con su esposa al solar de Fulgencio. De la misma manera, tiempo después arribó otro sobrino suyo que se instaló en el mismo solar. Más tarde, y por último, su hija y su esposo, que vivían en Tatahuicapan, llegaron a establecerse al solar y su yerno fue incorporado al equipo. Juntos realizan los trabajos de tumba que les son ofrecidos y Fulgencio reparte las ganancias entre los que participan. También siembran y cosechan una sola milpa, que realizan en Sochapan, en las tierras del patrón del hijo de Fulgencio a cambio de “regar” semilla de pasto en la superficie utilizada. Segundo caso. Roberto Albino vendió su parcela de 17 hectáreas en 30 mil pesos aproximadamente hace 12 años. Casi inmediatamente después dejó la comunidad para viajar a Ciudad Juárez, en donde permaneció tres años. Al cabo de este tiempo regresó a Piedra Labrada y comenzó a trabajar por jornal. Poco tiempo después de haber regresado a casa, diversas circunstancias lo llevaron a Oaxaca para trabajar en una huerta en el corte de limón. El trabajo le convenció y comenzó a viajar con regularidad al lugar. Incorporó a la actividad a sus tres hijos varones y después a una de sus dos esposas. En Piedra Labrada quedaron dos hijas y una esposa más que se ocupa del cuidado 179 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 del hogar. A medida que sus hijos se fueron casando, las esposas de éstos también se incorporaron al trabajo en Oaxaca. El dinero que la familia ha ganado cortando limón se ha utilizado para mejorar su casa, sustituyendo su antigua casa de madera por una hecha con materiales industriales. En el mismo solar también se están construyendo las casas de sus hijos y sus familias. Con el tiempo, Roberto logró hacerse de la amistad del dueño de la huerta, quien le encomendó la tarea de contratar al personal que se ocupa en el lugar. Tercer caso. Ezequiel Albino vendió su parcela hace cinco años. La persona que le compró le permitió seguir trabajando en una pequeña fracción de su antigua parcela, en la cual tiene un par de cabezas de ganado y en la que en ocasiones cosecha menos de una hectárea de maíz. Después de que vendió la parcela, tres de sus hijos salieron de la comunidad para buscar trabajo en otros lugares; dos de ellos están en Estados Unidos y uno más en Sinaloa. De acuerdo con Ezequiel, sus hijos que están en Estados Unidos casi no le mandan dinero, aunque sí lo han hecho en un par de ocasiones. Ezequiel también tuvo la necesidad de ir a trabajar fuera, y lo hizo por primera vez apenas el año pasado cuando fue a Oaxaca al corte de limón por tan sólo un mes. Para poder salir al paso, cuenta con los recursos que envía su hijo que está en Sinaloa. Además, otros ingresos son aportados por su yerno quien junto con su esposa se mudó al solar de Ezequiel. Dos niños, uno de 13 y otro de 9, dejaron de asistir a la escuela para incorporarse al trabajo. Mientras Ezequiel se encontraba en Oaxaca, estos niños se ocupaban de ordeñar las vacas y entregar la leche diariamente. CONCLUSIÓN: PERMANENCIA DE LA ESTRUCTURA EJIDAL Y CAMBIO SOCIOCULTURAL La circulación de tierras a través de la compra–venta fue algo prácticamente desconocido en Piedra Labrada antes del Procede; 180 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 y desde la certificación, cerca de la mitad de la superficie ejidal ha sido vendida a personas venidas de otros lugares, a rancheros mestizos originarios del centro de Veracruz y dedicados a la ganadería, quienes, a pesar de que la mayoría de ellos no tienen su residencia en el pueblo – como lo indica la Ley Agraria –, han encontrado en las tierras ejidales de Piedra Labrada una extensión de su propiedad. En este sentido, el mercado de tierras local ha ensanchado más la brecha económica entre campesinos y ganaderos. Pero la percepción de las reformas y del Procede es más bien ambigua. Para quienes no han vendido sus parcelas han sido positivas porque les ha permitido obtener un documento que les garantiza derechos sobre una parcela, les permite continuar, ahora legalmente, con los tratos de aparcería que han venido realizando desde hace dos décadas o bien considerar la posibilidad de entablarlos, y para otros, aunque muy pocos, les ha permitido acceder a una fracción de tierra en la cual extender su producción. Pero por otro lado, principalmente para los viejos ejidatarios, también fue negativo porque permitió que una gran cantidad de personas vendieran sus parcelas, llegando a traspasar cerca de la mitad de la extensión del ejido. Las ventas, ellos consideran, cancelaron varias posibilidades, principalmente para los más jóvenes. Los jóvenes migrantes de Piedra Labrada ya no tienen la posibilidad de acceder a una parcela mediante la herencia; la alterativa de acceder a ella mediante la compra también es lejana debido al encarecimiento de las mismas. Optar por la renta de tierras agrícolas también es una posibilidad, pero se verá limitada y obstaculizada por el hecho de que las tierras ahora se dedican a una ganadería especializada, porque sus dueños no son de la comunidad y además no viven en ella. De esta manera, una de las opciones más viables seguirá siendo encontrar trabajo fuera de la comunidad y la región. Al final, la dinámica del mercado local de tierras ha llegado a crear una curiosa relación entre estructura y cambio, entre la persistencia y reproducción sociocultural. Retratada 181 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 estadísticamente, o acudiendo a los grandes agregados nacionales o estatales, nos mostraría una imagen en la que el ejido en tanto forma de organización colectiva aparece estable, sin modificaciones considerables. Indicaría solamente que el número de ejidatarios ha aumentado y disminuido, pero con una estructura permanente. Puesto que no han adoptado el pleno dominio sobre sus parcelas – y probablemente no lo harán – quienes aparecerían en la imagen serian ejidatarios y sólo ellos, y la cantidad de tierras ejidales permanecería inamovible. Evidentemente dicha imagen mentiría; lo haría por omisión, porque la permanencia de una estructura no significa, necesariamente, la permanencia del contenido, del conjunto de símbolos creados y transmitidos históricamente, las fuentes de la identidad colectiva y la continuidad cultural – como la tierra. Pero no solamente no mostraría cambios en estos elementos culturales sino que escondería también los estrictamente productivos, pues ahora las tierras ejidales son una extensión de propiedades sometidas a estrategias de producción distintas – la ganadería extensiva.12 En la actualidad son este tipo de imágenes en las que nos basamos para hablar con generalidad de los “impactos” de las reformas constitucionales de 1992 y del proceso de certificación ejidal. Resulta significativa la afirmación de Robles, después de hacer una cuidadosa revisión de las novedades que arroja el IX Censo Ejidal, levantado en 2007, acerca de que “no se tiene la certeza de quienes tienen la tierra actualmente” (2009, p. 18), debido a que gran parte de las transacciones son irregulares y no son inscritas, como lo marca la ley, en el Registro Agrario Nacional (y a pesar de que en su conjunto las transacciones han implicado una pequeña porción de la superficie ejidal del país, el 2.9%). Otra imagen a la que se recurre para lo mismo es aquella que nos es proporcionada por las propias leyes y reglamentos. Esto último con frecuencia ha llevado a considerar la realidad rural en blanco y negro; a ver un proceso histórico cercenado en 182 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 dos partes, en un antes y un después perfectamente distinguibles. Se propone, para antes de las reformas y el Procede, una organización ejidal perfectamente autocontenida y autónoma, capaz de garantizar el acceso a la tierra para todos y retener la migración de sus miembros más jóvenes, además de una dinámica familiar caracterizada por “una vida de alianzas y apoyos” entre padres e hijos (véase QUESNEL, 2003; LÉONARD, 2003; DEL REY, 2005) – propuestas ciertamente poco creíbles –; y para después, diferenciación, individualismo y “privatización” que han transformado las relaciones en el campo. Derivar los procesos sociales tangibles de una legislación, como si lo uno y lo otro fueran lo mismo, es incorrecto porque la abruman, la sobrepasan y desbordan. En el contexto actual de los estudios sobre el tema que nos preocupa e interesa es necesario demostrar las continuidades, las fracturas y nuevos arreglos antes de que puedan ser asumidos. Para los fines de este trabajo, el rasgo más importante del mercado de tierras local ha sido que los vendedores fueron principalmente aquellos que recibieron, en la segunda mitad de la década de los ochenta y a comienzos de los noventa, como herencia las parcelas de sus padres o abuelos; es decir, gran parte de la segunda generación de ejidatarios no retuvo sus tierras. Desde que el ejido fue dotado en los años sesenta hasta un par de años antes del Procede, el número de ejidatarios se mantuvo estable; siempre fueron 39 ejidatarios con parcelas de 20 hectáreas, acatando la norma legal de heredar solamente a una persona. También siguiendo la prescripción cultural que indica heredar la tierra al hijo hombre de menor edad, al ultimogénito, los ejidatarios dejaron en las manos de éstos las parcelas que habían venido usufructuando. Finalmente éstos decidieron venderlas y con ello rompieron con la continuidad en la posesión familiar de las parcelas ejidales. El hecho no es poco relevante a pesar de pertenecer a un pequeño pueblo si se considera que el país se encuentra en 12 Aunque no formó parte del presente trabajo referirse al respecto, habría que considerar las consecuencias de la conversión productiva hacia una ganadería más especializada, así como del fraccionamiento de las tierras llamadas de agostadero, sobre la ecología de la región pues ésta es una zona de protección ambiental desde hace tres décadas (en 1979 se decretó al volcán San Martín Tuxtla como Zona Protectora Forestal y de Refugio Faunístico; en 1980 a la Sierra de Santa Marta y el volcán San Martín Pajapan como Zona de Protección Forestal y Refugio de Fauna Silvestre, reclasificada en 1988 como Reserva Especial de la Biosfera). 183 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 el “umbral de una transformación generacional de la propiedad social” (WARMAN, 2001), algo que con frecuencia es pasado por alto. Actualmente el promedio de edad entre los poseedores de derechos agrarios es de más de 55 años (y en las mujeres este promedio se eleva a más de 60) por lo que se está cerca del relevo de los titulares por una nueva generación. Enmarcando el problema en este contexto nacional, pues las ventas de tierras por la nueva generación de ejidatarios en Piedra Labrada nos obliga a considerar el problema de la reproducción cultural y la distancia entre generaciones en el marco de una economía global; a pensar sobre los cambios en las ideas, valores y percepciones de las nuevas generaciones de sucesores sobre la propiedad social, cambios que debemos situarlos en el marco socioeconómico y cultural propiciado por un nuevo régimen de acumulación capitalista, antes que derivarlos de una reforma legal. También nos obliga a preguntarnos cómo responden los demás actores locales ante estos cambios. En Piedra Labrada, los ejidatarios que vendieron la parcela que heredaron tuvieron que reorganizar su familia corporativamente en torno al trabajo; otros se fueron del pueblo. Por otro lado, los actuales ejidatarios de la primera generación se muestran más cuidadosos y sospechan que si dejan la tierra en manos jóvenes e inexpertas seguirán las ventas de tierras. Por ello es que las esposas ahora son las personas que se considera que sí salvaguardarán el patrimonio familiar. Los tres ejidatarios que han fallecido en los últimos dos años dejaron en manos de sus esposas las parcelas aun cuando había hijos hombres y mujeres. Su papel anterior las limitaba a ser posesionarias transitorias – mientras uno de los hijos crecía – de los derechos ejidales de sus esposos. Ahora es muy probable que se conviertan en un factor esencial para la continuidad en la posesión de la parcela y del trabajo familiar y por ende, de las demás formas de organización colectiva. Es muy probable que esto sea la tendencia que se observará en los siguientes años. 184 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS BÁEZ-JORGE, Félix. Los zoque-popolucas. México: Instituto Nacional Indigenista, 1990. BARRERA-BASSOLS, Narciso; RODRIGUEZ, Rodríguez. Desarrollo y medio ambiente en Veracruz: impacto económico, ecológico de la ganadería en Veracruz. México: Fundación Frierich Ebert, Ciesas, Instituto de Ecología, 1993. BOUQUET, Emmanuel. Mercado de tierras ejidales en Tlaxcala: formalidad e informalidad del cambio institucional. Estudios Agrarios, México: Procuraduría Agraria, n. 11, p. 67-106, 1999. BRETÓN SOLO DE ZALDÍVAR, VÍCTOR. Reforma agraria, revolución verde y crisis en la sociedad rural en el México contemporáneo. In: Antropología del desarrollo: teorías y estudios etnográficos en América Latina. Coordinado por José Gutiérrez Vivó. España: Paidós, 2000. CALVA, José Luís. La economía mexicana en perspectiva. Economía Unam, México, n. 1, p. 63-85, 2004. ____. La reforma económica de México y sus impactos en el sector agropecuario. In: BOVIN, Philippe (Org.). El campo mexicano: una modernización a marchas forzadas. México: Centro Francés de Estudios Mexicanos y Centroamericanos, Institut Français de Reserche Scientifique pour le Development en Coopération, 1996, p. 31-76. Centro de Estudios para el Desarrollo Rural Sustentable y la Soberanía Alimentaria (CEDRSSA). Nueva ruralidad: enfoques y propuestas para América Latina. México: CEDRSSA, Cámara de Diputados, LX Legislatura, 2006. CHEVALIER, Jacques D. A land without gods: process theory, maldevelopment and the Mexican Nahuas. London, New Jersey: Zed Books, 1995. CHEVALIER, Jacques D.; BUCKLES, Daniel. El ejido versus 185 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 bienes comunales: historia política de Pajapan, Veracruz. In: BARRERA, Narciso; RODRÍGUEZ, Hipólito (Orgs.). Desarrollo y medio ambiente en Veracruz: impactos económicos, ecológicos de la ganadería en Veracruz. México: Fundación Frierich Ebert, Ciesas, Instituto de Ecología, 1993, p. 117-127. CONCHEIRO, Luciano; QUINTANA Roberto Diego. Una perspectiva campesina del mercado de tierras ejidales: siete estudios de caso. México: Casa Juan Pablos, UAM – Xochimilco, 2001. ____. Estructura y dinámica del mercado de tierras ejidales en 10 ejidos de la República Mexicana. In: LÉONARD Eric; QUESNEL, André; VELÁZQUEZ, Emilia. Políticas y regulaciones agrarias: dinámicas de poder y juegos de actores en torno a la tenencia de la tierra. México: Ciesas, IRD, Miguel Ángel Porrúa, 2003, p. 157-188. DEL REY, Luís Alberto. El nuevo marco de relaciones intergeneracionales en las familias ejidales: migración y herencia en el sur de Veracruz. Estudios Agrarios, México, Procuraduría Agraria, n. 28, p. 151-194, 2005. FAO. Mercado de tierras en México. Roma: FAO y UAM – Xochimilco, 1995. FOSTER, George M. A primitive Mexican economy: monographs of the American Ethnological Society. New York: J. J. Augustin Publisher, 1942. GARCÍA CORPUS, Manuel. El proceso legislativo y los grupos de presión: el caso de la Ley Federal Agraria. México: MC,2006. GORDILLO, Gustavo; BOENING Frank. El acceso a la tierra en América Latina en la década de los noventa. In: Reforma agraria y desarrollo rural en el siglo XXI. México: Procuraduría Agraria, Plaza y Valdés, 2000. GORDILLO, Gustavo; WAGNER Rodrigo. Las reformas titubeantes: el campo mexicano, 1975-2000. Economía Unam, 186 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 México, Unam, n. 5 p. 23-40, 2005. GRAMMONT, Hubert C. de. Política neoliberal, estructura productiva y organización social de los productores: una visión de conjunto. In: Los pequeños productores rurales en México: las reformas y opciones. Compilado por Antonio Yúñez – Naude. México: El Colegió de México, 1996, p. 73-100. ____. La nueva ruralidad en América Latina. Revista Mexicana de Sociología, México, Unam, número especial, p. 281-300, 2004. GUEVARA, Sergio; LABORDE Javier; SÁNCHEZ-RÍOs Graciela (Eds.). Los Tuxtlas: el paisaje de la sierra. México: Instituto de Ecología, A. C., 2004. IBARRA MENDÍVIL, Jorge L. Cambios recientes en la Constitución Mexicana y su impacto sobre la reforma agraria. In: RANDALL, Laura (Ed.). Reformando la reforma agraria mexicana. México: UAM – Xochimilco, 1999, p. 65-80. JANVRY, A. de; GORDILLO G.; SADOULET, E. Mexico’s second agrarian reform: household and community. San Diego, La Jolla: Center for US–Mexican Studies, Universidad de California, 1997. JURGEN, Popp; GASPERINI, Ma. Antonieta. El mercado de tierras en dos provincias de Argentina: la Rioja y Salta. Santiago: Cepal y Sociedad Alemana de Cooperación Técnica, 1999. LAZOS, Elena. La ganaderización de dos comunidades veracruzanas: condiciones de la difusión de un modelo agrario. In: PARÉ QUELLET, Luisa; SÁNCHEZ, Martha Judith (Orgs.). El ropaje de la tierra: naturaleza y cultura en cinco zonas rurales. México: Plaza y Valdés, Unam, 1996, p. 177-241. ____. Ciclos y rupturas: dinámica ecológica de la ganadería en el sur de Veracruz. In: HERNÁNDEZ, Lucina. Historia ambiental de la ganadería en México. México: Instituto de Ecología, A. C., 2001, p. 133-153. LAZOS, Elena; GODINEZ GUEVARA, Lourdes. Dinámica familiar y el inicio de la ganadería en tierras campesinas del sur 187 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 de Veracruz. In: PARÉ QUELLET, Luisa; SÁNCHEZ, Martha Judith (Orgs.). El ropaje de la tierra: naturaleza y cultura en cinco zonas rurales. México: Plaza y Valdés, Unam, 1996, p. 243353. LÉONARD, Eric. Titularización agraria y apropiación de nuevos espacios económicos por los actores rurales: el Procede en Los Tuxtlas, Veracruz. In: LÉONARD, Eric; QUESNEL, André; VELÁZQUEZ, Emilia (Orgs.). Políticas y regulaciones agrarias: dinámicas de poder y juegos de actores en torno a la tenencia de la tierra. México: Ciesas, IRD, Miguel Ángel Porrúa, 2003, p. 297-328. LÉONARD, Eric; VELÁZQUEZ, Emilia. La producción local de la regulación agraria – Del reparto agrario al Procede: autonomía local y resignificación del cambio legal en una microrregión indígena del istmo veracruzano. México (en prensa), (s/f). LINK, Thierry. Síntesis y comentarios: taller i estado de las políticas agrícolas, cambio técnico. In: Agricultores y campesinados de América Latina. Compilado por Thierry Link. México: Fondo de Cultura Económica, Institut Francais de Recherche Scientifique pour le Developpment et Coopération, 1994, p. 31-34. PARÉ, Luisa et al. La reserva especial de la biosfera Sierra de Santa Marta, Veracruz: diagnóstico y perspectiva. México: Unam, Semarnat, 1997. PÉREZ CASTAÑEDA, Juan Carlos. El nuevo sistema de propiedad agraria en México. México: Textos y Contextos, 2002. Procuraduría Agraria. Los tratos agrarios en ejidos certificados. México: Procuraduría Agraria, 1998. ____. Glosario de términos jurídicos-agrarios. México: Procuraduría Agraria, 2005. QUESNEL, André. Poblamiento, regulaciones agrarias y movilidad en el sur del estado de Veracruz. In: LÉONARD Eric; 188 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 QUESNEL, André; VELÁZQUEZ, Emilia (Orgs.). Políticas y regulaciones agrarias: dinámicas de poder y juegos de actores en torno a la tenencia de la tierra. México: Ciesas, IRD, Miguel Ángel Porrúa, 2003, p. 9-40. RAMÍREZ, Fernando. Flora y vegetatación de la Sierra de Santa Marta, Veracruz. 1999. Tesis (Licenciatura) – Facultad de Ciencias, Unam, México. REYES, Teófilo et al. Campesinos, artículo 27 y Estado mexicano. México: Inah, Plaza y Valdés, 1996. ROBICHAUX, David. El parentesco y su estudio entre los pueblos mesoamericanos contemporáneos. In: ARTÍS, Gloria (Org.). Encuentro de voces: la etnografía de México en el siglo XX. México: Inah, 2005, p. 373-437, Colección Etnografía de los Pueblos Indígenas de México, Serie Debates. ROBLES, Héctor. Tendencias en el campo mexicano a la luz del Programa de Certificación de los Derechos Ejidales (Procede). In: LÉONARD Eric; QUESNEL, André; VELÁZQUEZ, Emilia (Orgs.). Políticas y regulaciones agrarias: dinámicas de poder y juegos de actores en torno a la tenencia de la tierra. México: Ciesas, IRD, Miguel Ángel Porrúa, 2003, p. 31-156. ____. Los tratos agrarios – Vía campesina de acceso a la tierra: la experiencia de San Idelfonso Tultepec. México: Cámara de Diputados, LIX Legislatura, Secretaria de la Reforma Agraria, Centro de Estudios para el Desarrollo Sustentable y la Soberanía Alimentaria, 2005. ____. Los tratos agrarios: vía campesina de acceso a la tierra. In: BARRAGÁN LÓPEZ, Esteban (Ed.). Gente de campo: patrimonios y dinámicas rurales en México. México: El Colegio de Michoacán, 2005b, p. 79-94. ____. Saldos de las reformas de 1992 al artículo 27 constitucional. Estudios Agrarios, México, Procuraduría Agraria, n. 38, p. 131150, 2009. 189 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 TELLO, Armando. Cifras agrarias en ejidos certificados. Estudios Agrarios, México, Procuraduría Agraria, n. 38, p. 175-210, 2008. VELÁZQUEZ, Emilia. Política, ganadería y recursos naturales en el trópico húmedo veracruzano: el caso del municipio de Mecayapan. Relaciones, México, El Colegio de Michoacán, vol. XII, n. 50, p. 23-63, 1992. ____. Ganadería y poder político en la Sierra de Santa Marta. In: LÉONARD, Eric; VELÁQUEZ, Emilia (Orgs.). El Sotavento veracruzano: procesos sociales y dinámicas territoriales. México: Ciesas, IRD, 2000, p. 111-127. ____. Territorios fragmentados: estado y comunidad indígena en el istmo veracruzano. México: Publicaciones de la Casa Chata, Ciesas, 2006. WARMAN, Arturo. El campo mexicano en el siglo XX. México: Fondo de Cultura Económica, 2001. ZEPEDA, Guillermo. Transformación agraria: los derechos de propiedad en el campo mexicano bajo el nuevo marco institucional. México: Centro de Investigación para el Desarrollo, Miguel Ángel Porrúa, 2000. ___________ JOSÉ MANUEL FLORES LÓPEZ – Graduado en antropología social por la Universidad Autónoma de Yucatán, maestro en antropología social por el Centro de Investigaciones y Estudios Superiores en Antropología – Ciesas, actualmente estudiante del Programa de Doctorado en Antropología Social en Ciesas, México. 190 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 191 ARTIGOS R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 CAMPO E CIDADE, COMIDA E IMAGINÁRIO PERCEPÇÕES DO RURAL À MESA RENATA MENASCHE R E S U M O Em um contexto em que, por um lado, pode-se identificar uma ansiedade urbana contemporânea em relação à alimentação e que, por outro lado, percebe-se mais intensa a mobilidade, material e simbólica, entre campo e cidade, este trabalho busca discutir as percepções do rural de agricultores e citadinos, tendo como ponto de observação suas práticas alimentares. Os dados apresentados foram coletados em diferentes situações de pesquisa, ocorridas no período compreendido entre 2000 e 2007, em três distintas regiões rurais do Estado do Rio Grande do Sul (localizado no Brasil meridional) e em sua capital, Porto Alegre. Entre as questões apontadas a partir da análise desenvolvida, temos que, das classificações da alimentação operadas pelos moradores de Porto Alegre entrevistados, emerge um rural valorado positivamente, idealizado, que, ao demandar alimentos – mas também paisagens, costumes, festas, história, turismo –, age na conformação do rural vivenciado pelos que nele habitam, transformando percepções e identidades. P A L A V R A S - C H A V E Campo–cidade; consumo alimentar; cultura alimentar; campesinato. A B S T R A C T In a context where, on the one hand, a contemporary urban anxiety can be identified in relation to eating and on the other hand the material and symbolic mobility between the countryside and the city can be more intensely perceived, this study – which adopts analytical perspectives offered by the anthropology of food – aims to discuss the perceptions of the rural by farmers and by urban dwellers. The data presented were collected in different research projects carried out between 2000 and 2005 in three distinct rural regions in Rio Grande do Sul in southern Brazil and in Porto Alegre, the state capital. Among the questions we point out on the basis of the analysis of food classifications by the inhabitants of Porto Alegre, we highlight a positively valued, idealized rural space. This view, by demanding foodstuffs – but also landscapes, customs, festivities, history and tourism –, helps to shape the rural environment experienced by those who live in it. K E Y W O R D S Countryside–city; food consumption; food culture; peasantry. 195 R UR I S 1 Ao longo deste trabalho, serão trazidos à análise dados coletados em pesquisas de campo realizadas em distintas regiões rurais do Rio Grande do Sul e em sua capital, Porto Alegre. No que se refere a Porto Alegre – cidade em que moram todos os interlocutores aqui mencionados que não vivem no meio rural –, foram realizadas, no período compreendido entre 2001 e 2002, a partir da temática “hábitos alimentares”, 25 entrevistas semiestruturadas (MENASCHE, 2003a). As observações em famílias rurais deram-se especialmente em pesquisas etnográficas realizadas em 2000, em localidades situadas nas regiões norte e centro-sul do estado (MENASCHE, 2003a); no período compreendido entre 2004 e 2005, na região do Vale do Taquari (MENASCHE, 2007). Cabe ainda mencionar que os nomes dos interlocutores foram aqui substituídos por nomes fictícios. 2 A umbanda, segundo Prandi (2004), teve sua origem no Rio de Janeiro, no início do século XX, a partir da síntese de antigos cultos africanos tradicionais com o espiritismo kardecista, chegado da França no final do século XIX. Para que o leitor tenha um quadro da participação das principais religiões na população do país, vale mencionar que, em 2000, 73,7% dos brasileiros declaravam-se católicos; 15,4% evangélicos; 1,4% espíritas; 0,34% afro-brasileiros (destes, 0,26% umbandistas e os demais adeptos do candomblé); 1,8% outras 196 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 INTRODUÇÃO Para a reflexão aqui proposta, tomaremos como ponto de partida uma história escutada na cozinha de Luísa e Paulo, moradores de um bairro popular de Porto Alegre.1 À época da entrevista, o casal, pais de um rapaz e de duas moças adolescentes, encontrava-se na faixa dos 50 anos. Antes de dar a conhecer a história, faz-se necessário esclarecer alguns elementos que estarão presentes na narrativa. O primeiro diz respeito à religiosidade do casal. Paulo e Luísa definem-se como espiritualistas, sendo ele kardecista e ela praticante da umbanda.2 Como nos demais cultos de possessão, explica Magnani (2002, p. 6), na umbanda a comunicação entre a esfera do sobrenatural e o mundo dos homens dá-se “através da incorporação das entidades espirituais num grupo e no corpo dos iniciados”, os médiuns. Também conforme Magnani (2002), enquanto no espiritismo kardecista os espíritos que descem nas sessões são individualizados e reconhecidos pela história de suas vidas passadas, as entidades umbandistas constituem categorias mais genéricas, onde a referência à vida pessoal é substituída por representações como, por exemplo, caboclos e pretos-velhos. O segundo elemento que cabe esclarecer neste preâmbulo é referente ao processo de industrialização e comercialização de leite fluido, mais especificamente às características relacionadas às embalagens do produto. No Brasil, até o início dos anos 1990, o leite era predominantemente comercializado em embalagens plásticas: em 1990, 95% do leite fluido industrializado chegava aos consumidores acondicionado em sacos plásticos – esse leite é popularmente conhecido como leite de saquinho. Já a partir R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 de 2002, as embalagens Tetra Pak, tipo longa vida – leite de caixinha –, acondicionavam 3 em cada 4 litros de leite fluido 3 comercializado no país. A diferença entre os processos de fabricação de um e outro produto, segundo a Associação Brasileira do Leite Longa Vida (ABLV), estaria na temperatura a que o leite é exposto. Enquanto que o leite de saquinho é pasteurizado, o leite de caixinha é, no processo de ultrapasteurização, submetido a temperaturas mais elevadas, sendo por isso denominado leite UHT (Ultra High Temperature). A essa diferença são atribuídas as propriedades de conservação do leite longa vida, que dispensa a fervura prévia ao consumo e, antes de aberto, conserva-se fora da geladeira por até 120 dias. Isso posto, à história: há tempos Paulo e uma de suas filhas adolescentes, Júlia, sofriam com coceiras por todo o corpo. O problema de pele só desapareceria quando, seguindo a recomendação de Mãe Oxum – uma entidade espiritual –, interrompessem o consumo de leite de caixinha. O leite, nós compramos o de caixinha, apesar de que algumas vezes andamos evitando [...] porque estava dando problema de pele em nós, mais forte na menina e em mim. [Foi identificado que a causa era o leite?] Essa foi, na verdade, uma informação via mediúnica que nós recebemos, que seria através do leite [...], por causa de um produto conservante do leite. Porque, na verdade, esse leite de caixinha ele não azeda, não estraga, a gente deixa fora da geladeira e ele não estraga, então ele tem que ter conservantes fortes. [...] Nós sentimos uma alergia, todos nós, mais forte eu e a Júlia, e eu parei de tomar bastante leite de caixinha, tomei o leite em pó, solucionou o problema. A informação, eu já te disse, foi via espiritual que nós tivemos. E fizemos a experiência e eu comprovei que era aquilo ali (Paulo). Eu trabalho numa casa espírita,4 eu sou umbandista, e lá eu perguntei – que tem a parte dos médicos também, entra religiões; 7,3% sem religião (PIERUCCI, 2004). Cabe notar, como destaca Prandi (2004, p. 225), que, seja pelas religiões afro-brasileiras terem sido, até período recente, proibidas e perseguidas por órgãos oficiais, seja por serem alvo do mesmo preconceito que sofre a população negra, é comum, “mesmo atualmente, quando a liberdade de escolha religiosa já faz parte da vida brasileira, muitos seguidores das religiões afro-brasileiras ainda se declararem católicos”, o que teria como consequência a subestimação das religiões afro-brasileiras nos censos oficiais do Brasil. 3 Dados disponibilizados pela Associação Brasileira do Leite Longa Vida. Disponível em: <http:// www.ablv.org.br/>. Acesso em: 4 jul. 2003. Todas as informações referentes à ABLV mencionadas neste artigo foram extraídas desse site. 4 Quando referente à atuação em um centro espírita, o termo trabalhar significa desempenhar o papel de médium. 197 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 na parte kardecista –, mas eu perguntei não foi pra um médico, foi pra Mãe Oxum, uma entidade da umbanda. Aí eu perguntei pra ela, falei de umas coceiras, umas alergias, falei “não sei se vem dos cachorros, ou de alguma coisa que nós estamos comendo”. Eu até não estava sentindo coceira nenhuma, eu procurava pulga e não via, não via nada. Mas, como era muito seco, podia ser uma poeira, um cimento, nós estávamos mexendo com cimento. Aí ela disse que era do leite, que tinha um conservante que estava fazendo mal. O leite de caixinha, ele tem uns conservantes, umas coisas a mais ali, né? Então eles [o marido e a filha] observaram. Eu troquei de marca, mas não adiantou. Aí ele [o marido] comprovou, passou a tomar leite em pó, a Júlia também (Luísa). REPRESENTAÇÕES DA COMIDA INDUSTRIALIZADA Estudando a cura na Umbanda, Montero (1986, p. 40) pondera que esta “se efetiva numa sociedade em que a medicina científica detém a hegemonia da definição das doenças e dos meios de cura”. Ampliando essa perspectiva para algo como um paradigma sanitarista – entendido aqui como correspondente, na produção agroalimentar, à medicina científica –, faz-se interessante observar os argumentos da Associação Brasileira do Leite Longa Vida para, em seu site, explicar a durabilidade do produto que divulga: A ultrapasteurização e o envase asséptico permitem que o Leite Longa Vida tenha um prazo de validade maior, sem adição de qualquer agente conservativo. Contrariando falsa crença popular, o formol e os antibióticos não são utilizados na conservação dos alimentos, nem do Leite Longa Vida, nem de qualquer outro alimento. O estabilizante é o único aditivo alimentar permitido no Leite Longa Vida natural. Algumas marcas de Leite Longa Vida utilizam Citrato de Sódio no produto, como estabilizante. O estabilizante não é 198 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 conservante, e não faz mal à saúde. É um aditivo alimentar inócuo, que funciona como coadjuvante tecnológico na produção do Leite Longa Vida. Assim, a ABLV, ao dialogar com suposta “falsa crença popular” e ao fazê-lo em tom de deslegitimação, evidenciava não apenas a existência, no imaginário social, de suspeita de emprego de conservantes no leite longa vida, mas a inserção do discurso científico em um campo de disputas. A desconfiança com que se digladiava a ABLV seria encontrada entre alguns dos moradores de Porto Alegre entrevistados.5Quando indagados a respeito de seus hábitos de consumo alimentar, parcela significativa dos interlocutores declarou adesão ao leite longa vida, mencionando como vantagens a possibilidade de estocagem do produto – que viabiliza a inclusão do leite na compra semanal ou mensal, realizada em grandes supermercados – e, uma vez aberta a embalagem, sua maior durabilidade.6 Mas alguns manifestaram considerar o leite fluido oferecido em sacos plásticos mais natural e/ou saudável e, por isso, de melhor qualidade. Vejamos trechos de alguns depoimentos: Leite, eu prefiro o de saquinho. O de caixa a gente está comprando porque é desnatado. Hoje até a gente está com duas caixinhas de leite, por quê? Porque o leite de saquinho não tem mais em todo lugar. No [pequeno mercado do bairro] não tem, aqui perto. Eu tenho que ir no [grande supermercado] pra comprar leite de saquinho, então tem que pegar o carro pra comprar. Na padaria, lá embaixo, também não tem leite de saquinho. As padarias não vendem mais leite de saquinho. [E por que tu preferes o de saquinho?] Porque não tem nenhum aditivo dentro, né? O outro, dizem que não tem conservantes, mas tem. Imagina, como é que um leite dentro de um troço não vai ter? Porque o outro [de saquinho] é mais natural, é só pasteurizado. É o leite, praticamente, que está ali pra ti (Lourdes). 5 Cabe mencionar que, em outubro de 2007, a ocorrência de comprovação de denúncias (ver, por exemplo, <http:// www1.folha.uol.com. br/folha/cotidiano/ult95u339613.shtml>) de adulteração de leite tipo longa vida – a partir da adição de soda cáustica e água oxigenada ao leite, de modo a mascarar sinais indicadores da degradação do produto e, assim, conferir à bebida uma aparente maior durabilidade – demonstraria que as suspeitas dos consumidores não são tão despropositadas quanto afirmara a ABLV. 6 A propósito, esses foram os dois argumentos apresentados por Luísa para, quando indagada, explicar por que o marido e a filha haviam substituído o leite de caixinha pelo leite em pó e não pelo leite de saquinho – que estraga rápido e não pode ser estocado. . 199 R UR I S 7 Provável referência à sigla UHT (correspondente a Ultra High Temperature), comumente impressa nas embalagens de leite tipo longa vida. | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 [Vocês compram de caixinha?] Não, o saquinho, que eu acho que é mais saudável, da vaquinha. [...] Eu acho que esses outros, de caixinha, têm mais conservantes. Sabe por que não entra caixinha em casa? Não é por ser mais caro. É porque eu sinto um gosto de leite de soja, que, eu não sei, eu acho que eles misturam. E porque a minha filha, ela tinha uns 4, 5 meses, quando ela começou [a tomar], eu amamentava. [...] Uma época que ia no [grande supermercado], eu comprava duas, três caixas. E daí a minha filha começou a ter diarreia. E o outro menino começou a não se adaptar, também, com o de caixinha, e eu nunca gostei. E ele azedava assim mais rápido, também. [O de caixinha?] O da caixinha. Quando eu fervia assim, eu sentia um gosto diferente, um gosto amargo, não gostei. Aí eu cheguei à conclusão [...]; na caixinha, tem aqueles negócios assim de H, V, não sei o quê,7 aqueles conservantes, assim, eu nem sei o que é isso aí. E eu procuro sempre pelo mais saudável, né, consumir o que eu acho mais seguro [...] pra saúde. Eu já nem consumo, já nem entra dentro de casa o leite de caixinha. Eu prefiro o outro, eu acho que é um leite mais fresco, mais saudável, não vai tanto conservante [Mesmo que tenha que a toda hora comprar?] Mesmo que tenha que toda hora, todo dia 2 litros de leite, sempre, sempre. [...] Então eu sempre busco assim as coisas mais saudáveis, menos conservante, mais natural possível (Cleomar). Dessa forma, o leite de saquinho, especialmente a partir da ausência presumida de aditivos suspeitos – e nisso diferenciado do leite de caixinha –, era considerado mais puro, daí natural e saudável. Cleomar chega a mencionar que esse seria o leite da vaquinha, como se o leite acondicionado em embalagem tipo longa vida tivesse alguma outra origem, que o privaria de autenticidade. Retomando a história narrada na cozinha de Luísa e Paulo, temos que, de acordo com o diagnóstico espiritual, a doença de pele de Paulo e Júlia tivera sua causa identificada em algo que, 200 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 com o objetivo de garantir a conservação do produto, teria sido acrescido no processo de industrialização do leite longa vida – “tinha um conservante que estava fazendo mal”. A eliminação do leite de caixinha da dieta dos doentes, recomendada por Mãe Oxum, resultaria na cura. Buscando interpretar tal episódio como imerso no embate em torno das representações da doença – entre as representações simbólicas que, por um lado, atribuem à entidade espiritual a capacidade de diagnóstico e cura ou, por outro, consideramna prerrogativa do conhecimento científico –, vale buscar refletir sobre o ocorrido a partir da abordagem proposta por Montero (1986). Dedicando-se a entender o surgimento das práticas mágico-religiosas umbandistas, essa autora aponta que tal gênese se dá em dois momentos. Em um primeiro, quando teriam sido eliminados os espaços tradicionais em que era exercida a medicina popular, observa-se uma separação entre medicina e magia. Daí as práticas mágico-religiosas umbandistas deslocarem-se ao domínio do simbólico, dirigindo-se ao campo das “doenças espirituais”. Posteriormente, explicando que os fenômenos patogênicos teriam sido “roubados” da esfera da competência médica, sendo desmedicalizados, Montero (1986, p. 43) evidencia que “a doença, quando reinterpretada no interior do sistema religioso, adquire o sentido metafórico de ‘desordem’”. Disso, a ideia que importa aqui reter é a que auxilia a entender os significados, para nossos interlocutores espiritualistas, da indicação de Mãe Oxum de que, no leite de caixinha, “tinha um conservante que estava fazendo mal”. O conservante teria sido – indevida e suspeitosamente, quem sabe magicamente – acrescido ao leite, constituindo-se, desse modo, em elemento desconhecido que passa a integrar o produto, algo que não pertence ao leite – “tem [...] umas coisas a mais ali, né?” –, é externo a ele e, portanto, encontra-se fora da ordem. Mas, como vimos – a partir do embate com a “falsa crença popular”, em que se coloca a ABLV, mas também a partir 201 R UR I S 8 O Levítico é o terceiro dentre os cinco primeiros livros do Velho Testamento – que compõem a Torá – atribuídos a Moisés: Gênese, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio. Para uma discussão um pouco mais detalhada sobre esse estudo de Douglas (1976), ver Menasche (2003b). | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 de trechos de depoimentos anteriormente reproduzidos –, a desconfiança com relação à presença do desconhecido no leite longa vida não deve ser considerada como específica aos adeptos de religiões afro-brasileiras. E, mais que isso, não apenas em relação ao leite a presença do desconhecido seria apontada como motivo de desconfiança pelos interlocutores diante da comida: “Às vezes tu nem sabe o que está comprando. Não sabe de onde vem, se tem agrotóxico, não sabe o que eles colocam pra produzir. Não sabe se é limpo, não sabe se é sujo” (Cleusa). Em uma perspectiva não divergente daquela proposta por Montero (1986), mas mais abrangente, a ideia de desordem associada à presença do desconhecido na comida pode ser pensada à luz de Douglas (1976), que, em sua interpretação das restrições alimentares prescritas no texto bíblico – as abominações do Levítico8 –, faz um percurso analítico que passa pela identificação do princípio de classificação dos animais ali implícito, mostrando que O princípio subjacente de pureza dos animais é que eles sejam totalmente conformes à sua classe. São impuras as espécies que são membros imperfeitos de suas classes ou cuja própria classe confunde o esquema geral do mundo. [...] No firmamento, aves de duas pernas voam com asas. Na água, peixes com escamas nadam com nadadeiras. Na terra, animais de quatro pernas pulam, saltam ou andam. Qualquer classe de criaturas que não esteja equipada para o tipo correto de locomoção no seu elemento é contrária à santidade. [...] Não há ordem neles (DOUGLAS, 1976, p. 72-73, grifo nosso). No mesmo sentido, a ideia da presença do desconhecido na comida é apontada como constitutiva de uma ansiedade urbana contemporânea em relação à alimentação. Tal argumento parte do princípio da incorporação, como proposto por Fischler (1993, p. 66, 69): 202 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 é o movimento através do qual fazemos o alimento transpor a fronteira entre o mundo e nosso corpo [...], incorporar um alimento é, em um plano real, como em um plano imaginário, incorporar todas ou parte de suas propriedades: tornamo-nos o que comemos. [...] É certo que a vida e a saúde da pessoa que se alimenta estão em questão cada vez que a decisão de incorporação é tomada. Mas também está em questão seu lugar no universo, sua essência e sua natureza, em uma palavra, sua própria identidade: o objeto incorporado intempestivamente a pode contaminar, transformar. Como comentado em outra parte (MENASCHE, 2004, p. 114), é a partir dessa construção que Fischler (1993) sugere que, se o alimento constrói a pessoa que o ingere, é compreensível que essa busque construir-se no ato alimentar. Daí a necessidade vital de identificação dos alimentos e, portanto, a ansiedade gerada a partir da presença do desconhecido na comida. Afinal: “Se não sabemos o que comemos, não se tornaria difícil saber não somente o que nos tornaremos, mas também o que somos?” (FISCHLER, 1993, p. 70). Voltando à reflexão a partir dos significados atribuídos à alimentação por nossos interlocutores, é a partir desse quadro que se torna possível entender que, no que se refere às frutas e verduras adquiridas em supermercados – dado que sua procedência e métodos de produção não são conhecidos –, alguns dos consumidores entrevistados as classifiquem como sujas – tal como evidenciado no trecho de depoimento de Cleusa, reproduzido anteriormente. Assim é que, para vários dos moradores de Porto Alegre entrevistados, lavar e descascar vegetais são práticas descritas quase que como modos de expurgar – física, mas também simbolicamente – impurezas de frutas e verduras, como medidas profiláticas capazes de transformá-las em alimentos limpos. 203 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Eu tenho assim um pouquinho de pavor de alface, o alface cresce assim livremente, não sei em que horta, então lavar bem alface. [...] eu como pepino, rabanete, isso tudo é lavado, isso tudo é descascado, então ali não tenho medo (Olga). O tomate me preocupa, que eles usam muito veneno, então a gente lava bem e, se eu faço molho de tomate, eu descasco, ponho na água quente, aí solta a casca, e tiro a casca (Jorge). As frutas que a gente compra no super, eu lavo tudo com sabão de glicerina. Pêssego, uva, essas coisas que a gente come assim. Banana eu não lavo, mas o resto, eu lavo tudo com sabão de glicerina (Dirce). 9 Vale mencionar a ausência, entre os interlocutores, de adeptos de dietas como vegetarianismo e macrobiótica, ou regidas pelo consumo de vegetais exclusivamente orgânicos, dietas que, como indicado por Ouédraogo (1998, p. 18-19) – em estudo a respeito de visões e práticas de consumidores parisienses adeptos de alimentação orgânica –, seriam parte integrante de um estilo de vida, regido por uma ética “que valoriza extremamente a vida simples, a natureza e o natural, o artesanal e o rústico [...] associados à saúde, à ecologia, à pureza, à solidariedade”. 204 Àquilo que se come cabe, desse modo, garantir a saúde do corpo. E, para isso, faz-se necessário assegurar a pureza do alimento, sua integridade, dada pela ausência de elementos estranhos à sua constituição, comumente adicionados na produção ou processamento industrial. Assim é que, retornando ao diagnóstico espiritual da doença de pele de Paulo e de sua filha, temos que, segundo Mãe Oxum, a doença teria sido causada pela presença de substâncias estranhas no leite de caixinha. Interrompido o consumo do leite impuro, a doença foi curada. DO CAMPO, A COMIDA DESEJADA Para muitos dos moradores de Porto Alegre entrevistados,9 a valorização do natural seria construída na contraposição à artificial, qualificativo atribuído aos alimentos industrializados. O molho, eu gosto de fazer, que daí faz do gosto. O molho pronto, geralmente tem uns gostos meio estranhos, eu não gosto. Gosto de pegar o tomate, cortar, fazer. [...] Não gosto muito de enlatados. [...] Gosto de sentir o gosto natural dos alimentos (Gilberto). R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Assim é que molhos e temperos prontos, pratos congelados, bolos e sopas pré-preparados, pães e massas industrializados, alimentos enlatados e refrigerantes seriam reiteradamente condenados pelos consumidores de Porto Alegre entrevistados. Em detrimento destes, as preferências declaradas pelos interlocutores indicariam molhos, iogurtes, doces, bolos, pães e massas caseiros; galinhas e ovos caipiras; água e sucos; milho em espiga, vegetais e temperos frescos; verduras orgânicas. O natural, fresco, caseiro, próximo, tradicional seria, dessa forma, afirmado em oposição ao artificial, processado, industrializado, distante, moderno. O alimento natural não seria apenas considerado o de melhor gosto. Em oposição ao alimento industrializado, seria apontado como puro e, dessa forma, saudável. Os adjetivos relacionados ao natural seriam atribuídos aos alimentos frescos, ou aos provenientes da feira (nunca dos supermercados), ou aos orgânicos, ou aos trazidos de fora. De fora são os alimentos que vêm do interior, do meio rural, cuja origem é associada diretamente ao produtor. De fora podem ser os alimentos trazidos pela própria pessoa ou por alguém de sua família, quando em visita à região natal, ou por algum conhecido ou parente que de lá vem. Podem, ainda, ser os alimentos produzidos em chácara de algum conhecido, perto da cidade. Ou os adquiridos em alguma viagem, de produtores que os ofertam, à beira da estrada. Ou os comercializados em feiras – de produtos orgânicos ou não –, supostamente pelos próprios produtores. Ou, ainda, aqueles que, de algum modo – como os ovos, trazidos de fora pelo “pessoal do estacionamento”, para vender –, vindos do campo, chegam à cidade por canais outros que os formalmente constituídos. Os alimentos que vêm de fora são considerados os melhores. Das verduras, é dito que “até a folha é mais macia”. A galinha, a carne e o leite, “não têm comparação”, “é outro gosto”, as do supermercado não chegam “nem a seus pés”. Os ovos “daquelas 205 R UR I S 10 Ainda enquanto elemento que remete à valorização dos sabores do campo, Álvarez e Pinotti (2000), assim como Eizner (1995), lembram a insipidez do gosto médio – excludente de sabores fortes – como característica da indústria agroalimentar. 11 Ratatouille é uma produção dos Estúdios Disney, tendo sido dirigido por Brad Bird e lançado, nos EUA, em 2007. Para mais informações, ver o site oficial do filme: <http://disney.go.com/ disneyvideos/animatedfilms/ratatouille/>. 206 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 galinhas criadas com milho, a gema é supervermelha, bem diferente”. Assim, do mesmo modo que sugerido por La Soudière (1995) para o caso francês, podemos indicar que, como reflexo da desconfiança ante o moderno, o natural e o rural são aqui identificados como autênticos.10 A ruralidade, mais que qualquer outro atributo, parece condensar as vantagens que distinguem o alimento desejável do alimento industrializado. Uma cena do desenho animado Ratatouille11 pode ser útil para ilustrar a ideia. A cena aqui lembrada tem início quando, no salão de um conhecido restaurante parisiense – que, após período de decadência, tem conseguido recuperar clientes e reconhecimento por ação de um novo chef de cuisine –, o mais temido crítico de gastronomia da França, Anton Ego, aguarda a refeição cuja avaliação deverá selar o destino do restaurante e de todos que fazem dele seu espaço de trabalho e criação. O prato é servido e, logo à primeira garfada, a empáfia, que até então era a única expressão a estampar-se na face do gourmet, é imediatamente substituída por traços de singelo contentamento, resultantes da confluência do puro prazer sensorial da experiência gustativa e do sentimento de aconchego em que Ego é envolvido ao sentir aquele sabor. Em recurso possibilitado pela linguagem fílmica, podemos observar a memória da personagem ativada pela comida: metamorfoseado em menino, Ego é transportado a uma cozinha do passado, em algum lugar do campo francês. A mãe lhe oferece, ao mesmo tempo, comida e afago. O prato servido na cálida cozinha campestre da meninice é o mesmo que lhe é apresentado no restaurante da metrópole conhecida como capital mundial da gastronomia. Tal como no trabalho de Assunção (2008, p. 250) – em estudo etnográfico realizado em famílias de camadas médias e populares de uma cidade do sul de Santa Catarina –, na cena observada a “comida da mãe” remete “a um pertencimento, a R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 uma memória, a um tempo e a um lugar”. A cena em análise pode, nessa perspectiva, ser iluminada por Mintz (2001, p. 3132), que ensina que Nossas atitudes em relação à comida são normalmente aprendidas cedo e bem e são, em geral, inculcadas por adultos afetivamente poderosos, o que confere ao nosso comportamento um poder sentimental duradouro. [...] Os hábitos alimentares podem mudar inteiramente quando crescemos, mas a memória e o peso do primeiro aprendizado alimentar e algumas das formas sociais aprendidas através dele permanecem, talvez para sempre, em nossa consciência. A relação entre comida e memória pode aqui ser entendida – do mesmo modo que em Amon e Menasche (2008, p. 15) – a partir da dimensão comunicativa da comida, isto é, a partir do entendimento de que, tal qual a fala, a comida pode contar histórias. Desse modo, tendo a memória como mediadora entre o mundo rural do passado vivido e o outro, do sofisticado presente cosmopolita, na tela criança e gourmet saboreiam o ratatouille,12 um prato camponês. Tendo em conta o percurso de reflexão proporcionado pela cena de desenho animado descrita, em regresso aos interlocutores da pesquisa realizada em Porto Alegre, podemos sugerir que, entre eles, a ruralidade é afirmada como atributo do alimento desejado a partir de percepções como as apontadas por Mathieu e Jollivet (1989), que – em estudo sobre representações da natureza realizado na França – evidenciaram que o senso comum urbano tende a associar ao campo, ao rural, os valores atribuídos à natureza e ao natural. Desse modo, o rural tenderia a ser qualificado como natural. Por isso rural idealizado,13 mas também porque podemos aí identificar – do mesmo modo que Eizner (1995), em referência ao caso francês –, no apelo que, a partir da memória, remete à comida de outros tempos e lugares, uma busca pelo consumo de “imagens de sabores perdidos”. 12 A receita do prato pode facilmente ser encontrada na Internet. 13 Do mesmo modo que apontado por Cristóvão (2002). 207 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 USOS E SIGNIFICADOS DA POLENTA: PERCEPÇÕES DO RURAL 14 O termo colono tem sua origem na administração colonial: “para o Estado, eram colonos todos aqueles que recebiam um lote de terras em áreas destinadas à colonização” (SEYFERTH, 1992, p. 80). A apropriação da categoria administrativa pelos agricultores de origem europeia como definidora de sua identidade se daria, explica a autora, com a exclusão daqueles chamados caboclos ou brasileiros – aí estariam inclusos aqueles de origem portuguesa, negra e/ou indígena. Assim, para Seyferth (1992, p. 80), “colono é a categoria designativa do camponês [...] e sua marca registrada é a posse de uma colônia [...], a pequena propriedade familiar”. Assim, no Sul do Brasil, reconhecem-se e são reconhecidos como colonos os agricultores descendentes de imigrantes europeus – excetuados os portugueses – que vivem e trabalham na terra em unidade de produção familiar. 208 Se entre os moradores de Porto Alegre ouvidos pudemos notar, a partir da afirmação da ruralidade enquanto atributo do alimento desejado, uma idealização do rural, cabe indagar como percebem o campo aqueles que nele vivem. Para isso, inicialmente é necessário ter presente que, nas diferentes situações de pesquisa tomadas em conta neste artigo, entre os agricultores os cultivos e criações que empregam intensivamente as ditas tecnologias modernas coexistem com técnicas tradicionais e uma expressiva produção de alimentos voltada ao autoconsumo das famílias – associada à garantia de sua segurança alimentar e, desse modo, às suas estratégias de reprodução social. Do mesmo modo, encontramos em suas mesas, lado a lado, o pão artesanal e a geleia industrializada, o salame feito em casa e o macarrão comprado pronto, o queijo colonial e a mistura pré-preparada para sopa, a salada colhida na horta e a sardinha retirada da lata, a polenta e a mortadela. Assim, a produção própria da unidade familiar, responsável por significativa parcela dos alimentos consumidos nas refeições cotidianas, divide espaço com produtos industrializados – que, aqui, diferentemente do que notamos ocorrer entre os moradores de Porto Alegre entrevistados, não são valorados negativamente. O cozimento no fogão a lenha, a utilização de banha de porco na preparação das refeições, assim como o pão de milho no caso de agricultores descendentes de imigrantes alemães, ou a polenta entre os descendentes de imigrantes italianos – modo de preparo, ingrediente e pratos – são alguns dos itens que, no que concerne à alimentação, poderiam, no Rio Grande do Sul, ser relacionados como emblemáticos de uma identidade colona,14 referente a algo que – para além de sua diversidade interna – talvez possamos tomar como uma cultura camponesa compartilhada (SEYFERTH, 1994). Assim é que a análise de seus significados pode bem se prestar a iluminar as percepções associadas a essa identidade. R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Tomemos, então, o caso da polenta, prato preparado a partir do cozimento de farinha de milho em água. Inicialmente, buscar-se-á apreender o processo de sua constituição enquanto prato marcador de identidade. Já a partir do início do século XVI, o milho, planta de origem americana, podia ser encontrado em várias regiões europeias, sendo sua ampla difusão atribuída, por um lado, à elevada produtividade obtida em seu cultivo – em comparação à de outros cereais há mais tempo semeados naquele continente, como centeio e trigo – e, por outro, à facilidade com que substituiu outros grãos no preparo de papas de cereais, comuns em toda a Europa desde tempos remotos (FLANDRIN e MONTANARI, 1998; CONTRERAS e GRACIA, 2004). Assim é que a polenta se constituiu em alimento de base dos camponeses da região do Vêneto, no Norte da Itália, região de origem de italianos que, a partir de 1875, migrariam para o Sul do Brasil. Conforme relatos – coletados nas regiões estudadas – de agricultores e agricultoras gaúchos descendentes de imigrantes italianos, antigamente – especialmente até a década de 1970, a partir de quando a agricultura brasileira, particularmente a do Sul do país, passou por intenso processo de modernização, simultâneo à redução do tamanho das famílias rurais –, era prática cotidiana o preparo da polenta para a refeição da noite. Era costume que, no final da tarde, a dona da casa voltasse da roça mais cedo que os demais membros da família, para preparar a polenta. Quando chegava à casa, a panela já estava no fogo, a água já fervera e a farinha já cozinhava: adiantar a preparação da polenta era serviço das crianças ou das nonas.15 Levaria horas, sempre mexendo, para que a polenta ficasse pronta. Seria então, ainda quente, despejada em um tabuleiro, para que, quando esfriasse um pouco, fosse cortada, sendo consumida com o molho que sobrara do almoço, ou com queijo, ou com salame. “Não tinha pão, o trigo era para vender”, conta uma agricultora, explicando que na manhã seguinte a polenta 15 Avós. 209 R UR I S 16 Como em Carneiro (1998), a categoria jovem não é aqui definida por uma faixa etária, por um critério biológico. Ela poderia ser entendida como correspondente a uma fase de transição – variável em contextos distintos – entre a subordinação à autoridade (na unidade familiar e na comunidade rural) e sua emancipação, comumente dada pelo casamento. 210 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 seria sapecada na chapa do fogão a lenha – polenta brustolada – e, então, consumida com café. Atualmente, embora já não com tanta regularidade, a polenta permanece presente à mesa dessas famílias rurais e de seus descendentes. Entretanto, se antes – ainda na Itália ou nos primeiros tempos de Brasil – a polenta era a comida que, mesmo em períodos de escassez, de algum modo assegurava o necessário à manutenção desses agricultores, talvez agora possamos perceber, entre aqueles que vivem e trabalham no campo, usos e significados diversos da polenta, associados a diferentes percepções do rural e a distintos processos de constituição de identidade. Para essa reflexão, vejamos o que apontam a respeito duas situações de pesquisa. Na primeira delas – trabalho de campo realizado entre famílias rurais, em 2001, na região norte do Rio Grande do Sul, descrito em Menasche (2003a) –, foi possível perceber, entre jovens16 ouvidos, a presença de significativa rejeição ao meio rural. Em conversas informais, pode-se notar que, naquele contexto, parece não causar espanto que a vergonha da condição de morador do meio rural faça com que um rapaz minta a respeito de seu endereço, fornecendo à moça recémconhecida um número de telefone que não é o de sua casa, mas da residência (urbana) de um amigo. Desse modo, o rapaz omite sua identificação rural, dando a entender que vive na cidade. Nessa mesma localidade e ocasião, outro episódio pode contribuir para ilustrar o que se quer evidenciar. Escutei de um rapaz, narrando uma briga entre duas irmãs, que uma dissera à outra com raiva: “tu há de casar com colono”. Naquele contexto, desejar a alguém que se case com um agricultor parece ser – seja por quem profere, seja por quem recebe – interpretado como praga. Para refletir a respeito da atitude do rapaz e da praga rogada por uma irmã à outra, vale remeter a discussão proposta por La Taille (2002) a um diálogo com um clássico dos estudos rurais, R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 resultado de pesquisas realizadas nos anos 1960 na região rural francesa do Béarn. Em artigo em que discute as injunções entre o sentimento de vergonha e a moralidade, La Taille (2002, p. 17-19) explica que a vergonha está associada a uma situação de exposição – real ou imaginada – da condição de inferioridade, o que implica estar vinculada ao juízo alheio. No entanto, o autor argumenta que o juízo negativo alheio apenas pode causar vergonha se for aceito como legítimo – e, desse modo, corresponder a um autojuízo negativo: “Na vergonha [...] o decair perante os olhos alheios deve corresponder a um decair perante os próprios olhos”. No estudo antes anunciado, Bourdieu (2006) detém o olhar na cena de um baile rural,17 analisando o comportamento diferenciado de rapazes e moças: enquanto elas parecem sentirse à vontade vestindo trajes modernos e dançando ritmos urbanos, os jovens camponeses, desajeitados, não são páreo para seus concorrentes da cidade. O autor evidencia que, a partir da imagem – estereotipada – que os outros fazem dele, o camponês passa a perceber seu próprio corpo como marcado por atributos que seriam tidos por característicos das atividades e atitudes associadas à vida rural – pesado, lento, malvestido, com dificuldades em expressar-se oralmente, entre outros. Assim, ao internalizar a imagem que outros fazem dele, o camponês perceberia seu próprio corpo como “encamponesado” (empeasanted). De volta à localidade rural estudada, no norte gaúcho, pode-se afirmar que, em seus modos de se apresentar, em suas vestimentas e gestual, os jovens que por ali são vistos pouco se assemelham aos descritos por Bourdieu. Como identificado por Carneiro (1998), a intensificação da comunicação entre campo e cidade tem resultado em uma maior mobilidade, material e simbólica, entre esses universos culturais distintos. Assim é que, hoje, no interior do Rio Grande do Sul, jovens rurais e urbanos frequentam as mesmas escolas e trabalham nas 17 É interessante lembrar a justificativa de Bourdieu (2006, p. 85), centrada no contexto de interação intercultural, para a opção metodológica desse seu estudo: “Esse pequeno baile do interior dá ocasião a um verdadeiro choque de civilizações. Nele é todo o mundo da cidade, com seus modelos culturais, sua música, suas danças, suas técnicas corporais, que irrompe na vida camponesa”. 211 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 mesmas fábricas, vestem-se do mesmo modo, escutam as mesmas músicas e frequentam os mesmos bailes. Mas isso não significa que se tenham tornado iguais. Em seus sistemas classificatórios, parecem permanecer percebendo-se e sendo percebidos como distintamente valorados, o que pode ser entendido à luz do dito por Wanderley (2000, p. 133), que aponta que as diferenças se dão não mais no nível do acesso aos bens materiais e sociais, que agora são, de uma certa forma, similarmente distribuídos entre os habitantes do campo ou da cidade, nem mesmo no que se refere ao modo de vida de uns e de outros. As diferenças vão se manifestar no plano das “identificações e das reivindicações na vida cotidiana”. 18 O fenômeno de masculinização do campo brasileiro tem sido apontado em estudos realizados há mais de uma década (ver, por exemplo, CAMARANO e ABRAMOVAY, 1999). 212 Nesse contexto, para buscar entender a atitude do rapaz “da roça” que informa como seu o número de telefone da casa do amigo que mora na cidade, podemos sugerir, a partir dos autores antes citados, que talvez haja algo como um movimento circular de valoração: o juízo negativo alheio é introjetado pelo jovem camponês, conformando seu comportamento, ao mesmo tempo em que esse age no fortalecimento de uma visão estigmatizada que têm dele os outros, retroalimentando-a. A vergonha em assumir-se colono, no caso do rapaz que tenta passar-se por citadino, está nos olhos de quem o vê, mas também – e especialmente – em sua própria autoimagem. No mesmo sentido, para as irmãs briguentas – duas jovens rurais –, a ideia de atar seus destinos ao meio rural parece ser percebida como prenúncio de desgraça. O desejo de deixar o campo pela cidade parece ser particularmente significativo entre as moças,18 e é narrando seus sonhos de percorrer esse caminho que uma delas franziu o nariz, fazendo cara de nojo, ao comentar a respeito do prato que a mãe preparava para nosso almoço: polenta. A comida, emblemática da condição de colono, aos olhos daquela jovem parecia compartilhar o estigma associado à condição de agricultor. R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Retomando o já anunciado, afirmou-se que distintos usos e significados da polenta podem ser associados a diferentes percepções do rural e processos de constituição de identidade. Vejamos o que se pode apreender a respeito a partir da observação de outra situação de pesquisa aqui lembrada, referente à região do Vale do Taquari – apresentada em Menasche (2007) –, mais especificamente a uma comunidade rural constituída por cerca de duas centenas de famílias, majoritariamente descendentes de imigrantes italianos. Entre as famílias daquela localidade – como ocorria, em geral, entre agricultores gaúchos descendentes de imigrantes italianos –, era frequente ocorrer, à noite, a visita “surpresa” de vizinhos e parentes, para comemorar um aniversário, ou para tomar um brodo,19 beber vinho, jogar cartas, conversar, cantar, rezar. Com o passar do tempo e as mudanças ocorridas na vida e no trabalho desses agricultores, os filós, antes prática corrente em que se realizava a sociabilidade entre as famílias, tornaramse raros. A partir de 2002, por iniciativa da diretoria da comunidade estudada, vem sendo organizado o Filó Comunitário. A festa é realizada anualmente, em data alusiva à imigração italiana. Em sua primeira edição, a festa restringiu-se praticamente às famílias da localidade, mas a cada ano seu público tem-se expandido, com a participação de centenas de pessoas de toda a região. Naquela noite, cada família traz alimentos e bebidas, que serão compartilhados com todos os participantes. As tradições italianas são também revividas na celebração do culto e a partir de cantos, danças, encenações, jogos, vestimentas e objetos que, em atmosfera de espetáculo, buscam resgatar os costumes da época em que os filós faziam parte do cotidiano daquela gente, do mesmo modo que a polenta era presente à mesa de cada dia. Naquela noite, a polenta brustolada, tostada em uma grande chapa que imita a dos fogões a lenha, é uma atração especial, oferecida aos visitantes. A polenta é, aqui, apreciada como 19 Caldo preparado à base de carne. Conta-se que os melhores eram feitos com galinhas roubadas. 213 R UR I S 20 E do mesmo modo que no estudo realizado por Ramos (2007) em famílias rurais de Maquiné, município situado no litoral norte do Rio Grande do Sul. 214 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 símbolo de um rural convertido em tradição, valorizado. Como visto,20 é possível identificar, entre os moradores do campo observados nas duas situações de pesquisa mencionadas, a existência de movimentos contraditórios no que se refere à valoração da polenta, associados a diferentes percepções do rural. Assim, na rejeição à polenta – destacamos aqui colonos italianos, mas muito possivelmente poderíamos, em referência a outros grupos étnicos, identificar movimento semelhante em relação a outros alimentos emblemáticos –, mas também na valorização de alimentos industrializados, notamos a manifestação – cotidiana e expressa mais enfaticamente por jovens – de uma depreciação do rural, movimento que não é novo, mas foi acentuado no processo de modernização da agricultura. E observamos, também, outro movimento, esse mais recente, que se manifesta particularmente em ocasiões festivas, quando os alimentos que remetem a uma identidade rural são positivamente valorados. Aí – e tal qual no estudo realizado por Champagne (1987) –, a afirmação dessa identidade parece constituir-se a partir do vínculo com um tempo e temporalidade passados, recriados, a partir de uma busca, urbana, por paisagens, costumes, festas, história, turismo, alimentos etc., inclusive polenta. Como antecipado, na análise aqui desenvolvida – em um contexto em que, por um lado, pode identificar-se uma ansiedade urbana contemporânea em relação à alimentação e, por outro, percebe-se mais intensa a mobilidade, material e simbólica, entre campo e cidade –, tendo como ponto de observação as práticas alimentares de agricultores e citadinos, buscou-se colocar em evidência suas percepções do rural. Podese notar que, das classificações da alimentação operadas pelos moradores de Porto Alegre entrevistados, emerge um rural valorado positivamente, idealizado. Ao expressar-se enquanto práticas de consumo – alimentar, mas não só –, tal imagem acaba por agir na conformação do rural vivenciado pelos que nele habitam, transformando percepções e identidades. R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ÁLVAREZ, Marcelo; PINOTTI, Luisa. A la mesa: ritos y retos de la alimentación argentina. Buenos Aires: Grijalbo, 2000. AMON, Denise; MENASCHE, Renata. Comida como narrativa da memória social. Sociedade e Cultura, Goiânia, v. 11, n. 1, p. 13-21, 2008. ASSUNÇÃO, Viviane Kraieski de. Comida de mãe: notas sobre alimentação, família e gênero. Caderno Espaço Feminino, Uberlândia, v. 19, n. 1, 2008. BOURDIEU, Pierre. O camponês e seu corpo. Revista de Sociologia Política, Curitiba, n. 26, p. 83-92, 2006. CAMARANO, Ana Amélia; ABRAMOVAY, Ricardo. Êxodo rural, envelhecimento e masculinização no Brasil: panorama dos últimos 50 anos. Texto para Discussão, Rio de Janeiro, Ipea, n. 621, 1999. CARNEIRO, Maria José. O ideal rurbano: campo e cidade no imaginário de jovens rurais. In: TEIXEIRA DA SILVA, Francisco Carlos; SANTOS, Raimundo; COSTA, Luis Flávio (Org.). Mundo rural e política. Rio de Janeiro: Campus, 1998. CHAMPAGNE, Patrick. La fête au village. Actes de la Recherche en Sciences Sociales, Paris, n. 17-18, p. 73-84, 1987. CONTRERAS HERNÁNDEZ, Jesús; GRACIA ARNAIZ, Mabel. Alimentación y cultura: perspectivas antropológicas. Barcelona: Ariel, 2004. CRISTÓVÃO, Artur. Mundo rural: entre as representações (dos urbanos) e os benefícios reais (para os rurais). In: RIEDL, Mário; ALMEIDA, Joaquim Anécio; BARBOSA, Andyara L. B. Viana (Org.). Turismo rural: tendências e sustentabilidade. Santa Cruz do Sul: Editora Unisc, 2002. DOUGLAS, Mary. Pureza e perigo. São Paulo: Perspectiva, 1976. 215 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 EIZNER, Nicole (Org.). Préface. In: Voyage en alimentation. Paris: ARF, 1995. FISCHLER, Claude. L’homnivore: le goût, la cuisine et le corps. Paris: Odile Jacob, 1993. FLANDRIN, Jean-Louis; MONTANARI, Massimo (Dir.). História da alimentação. São Paulo: Estação Liberdade, 1998. LA SOUDIÈRE, Martin de. Dis-moi où tu pousses: questions aux produits “locaux”, “régionaux”, de “terroir”, et à leurs consommateurs. In: EIZNER, Nicole (Org.). Voyage en alimentation. Paris: ARF, 1995. LA TAILLE, Yves de. O sentimento de vergonha e suas relações com a moralidade. Psicologia: Reflexão e Crítica, Porto Alegre, v. 15, n. 1, p. 13-25, 2002. MAGNANI, José Guilherme Cantor. Doença mental e cura na umbanda. Teoria e Pesquisa, São Carlos, v. 40-41, p. 5-23, 2002. MATHIEU, Nicole; JOLLIVET, Marcel (Dir.). De la “question de la nature” à la “question de l’environnement”: repères anciens pour des questions nouvelles. In: Du rural à l’environnement: la question de la nature aujourd’hui. Paris: ARF, 1989. MENASCHE, Renata. Os grãos da discórdia e o risco à mesa: um estudo antropológico das representações sociais sobre os cultivos e alimentos transgênicos no Rio Grande do Sul. 2003. Tese (Doutorado em antropologia social) – Programa de PósGraduação em Antropologia Social, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2003a. ____. Frankenfoods e representações sociais: percepções contemporâneas sobre biotecnologia, natureza e alimentação. Revista Theomai, Buenos Aires, n. especial, 2003b. ____. Risco à mesa: alimentos transgênicos, no meu prato não?. Campos, Curitiba, v. 5, p. 111-129, 2004. ____. Countryside and the city, food and the imaginary: perceptions of the rural at the table. Estudios del Hombre: Serie 216 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Antropología de la Alimentación, Guadalajara, n. 24, p. 255-268, 2009. MENASCHE, Renata (Org.). A agricultura familiar à mesa: saberes e práticas da alimentação no Vale do Taquari. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2007. MINTZ, Sidney W. Comida e antropologia: uma breve revisão. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 16, n. 47, p. 31-41, 2001. MONTERO, Paula. A cura mágica na umbanda. Comunicações Iser, Rio de Janeiro, n. 20, p. 39-47, 1986. OUÉDRAOGO, Arouna P. Manger “naturel”: les consommateurs des produits biologiques. Journal des Anthropologues, Paris, n. 74, p. 13-27, 1998. PIERUCCI, Antônio Flávio. “Bye bye, Brasil”: o declínio das religiões tradicionais no Censo 2000. Estududos Avançados, São Paulo, v. 18, n. 52, p. 17-28, 2004. PRANDI, Reginaldo. O Brasil com axé: candomblé e umbanda no mercado religioso. Estudos Avançados, São Paulo, v. 18, n. 52, p. 223-238, 2004. RAMOS, Mariana Oliveira. A “comida da roça” ontem e hoje: um estudo etnográfico dos saberes e práticas alimentares de agricultores de Maquiné (RS). 2007. Dissertação (Mestrado em desenvolvimento rural) – Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2007. SEYFERTH, Giralda. As contradições da liberdade: análise de representações sobre a identidade camponesa. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 7, n. 18, p. 78-95, 1992. ____. A identidade teuto-brasileira numa perspectiva histórica. In: MAUCH, Cláudia; VASCONCELLOS, Naira (Org.). Os alemães no Sul do Brasil. Canoas: Ulbra, 1994. WANDERLEY, Maria de Nazareth Baudel. A emergência de 217 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 uma nova ruralidade nas sociedades modernas avançadas – O “rural” como espaço singular e ator coletivo. Estudos Sociedade e Agricultura, Rio de Janeiro, n. 15, p. 87-145, 2000. ___________ RENATA MENASCHE – Doutora em antropologia social, professora adjunta do Instituto de Ciências Humanas da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), professora colaboradora do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PGDR/UFRGS), <renata.menasche@ pq.cnpq.br>. Uma versão anterior deste artigo foi publicada em inglês na Revista Estudios del Hombre (MENASCHE, 2009). 218 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 CONTENTS DOSSIER RURAL STUDIES AND ETHNOLOGY: DIALOGUES AND INTERSECTIONS PRESENTATION. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9 Emília Pietrafesa de Godoi e Nashieli Rangel Loera INTERVIEW WITH ALFREDO WAGNER BERNO DE ALMEIDA . . . 17 By Guilherme Mansur Dias FROM INDIANS TO PEASANTS. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55 ANTHROPOLOGICAL VIEWS OF A PARADIGM SHIFT Mariano Báez Landa A FEW PROBLEMS WITH THE CATEGORIES “INDIGENOUS” AND “MESTIZO” IN CONTEMPORARY MEXICO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75 Roger Magazine THE MAPUCHE OF CHILE. MEANINGS FROM THEIR DISCOURSE. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99 Elba Soto THE TEQUIO AND LAND MANAGEMENT IN MIDDLE CHINANTLA, OAXACA, MEXICO, 1928-1950. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125 Patricia Legarreta LAND MARKET, INHERITANCE AND GENERATIONAL CHANGE IN A ZOQUE-POPOLUCA EJIDO IN THE STATE OF VERACRUZ, MEXICO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 151 José Manuel Flores López ARTICLES COUNTRYSIDE AND THE CITY, FOOD AND THE IMAGINARY: . . . . 195 PERCEPTIONS OF THE RURAL AT THE TABLE Renata Menasche 219 R UR I S 220 | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 P R O CED I M E N TO S PA R A P UBL IC AÇ ÃO Serão publicados resenhas, traduções e artigos e/ou ensaios inéditos em língua portuguesa e espanhola que cumpram com os procedimentos aqui especificados. • Os artigos e/ou ensaios e as traduções não devem ultrapassar o limite de 25 (vinte e cinco) laudas (incluindo imagens e bibliografia) apresentando a seguinte formatação: fonte Arial; tamanho 12; entrelinha 1,5; margens: superior = 3.0 / inferior = 2.5 / laterais = 3.0. As traduções devem vir acompanhadas da respectiva autorização do autor do artigo e/ou do periódico. • As resenhas devem conter entre 3 (três) e 5 (cinco) laudas, e o livro resenhado deverá ter sido publicado (ou reeditado) no máximo até dois anos, no caso de edição nacional, e no máximo cinco anos, no caso de edição estrangeira. • Cada artigo e/ou ensaio deverá conter o título e resumo em português (ou, se for o caso, em espanhol) e inglês (abstract), com aproximadamente 100 (cem) palavras e título em inglês; e de, no máximo, 4 (quatro) palavras-chave em português (ou espanhol) e em inglês (key words). Os títulos deverão aparecer em caixa alta e os subtítulos sem numeração e com a primeira letra em maiúscula. • Na primeira página deverá constar informação sobre a formação, filiação acadêmico-institucional e endereço eletrônico do autor, em rodapé e indicação em asterisco. 221 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 • As notas devem vir em tamanho 10 (dez) ao final de cada página, não podendo consistir em simples referências bibliográficas. Estas devem aparecer no corpo do texto com o seguinte formato entre parênteses: sobrenome do autor em letras maiúsculas, ano de publicação, páginas, conforme o exemplo: (WEBER, 1977, p. 160-162). • A bibliografia deve aparecer no final do texto, em ordem alfabética de sobrenome e deve respeitar o formato da ISO (International Standart Organization) ou da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas – NBR 6023, 2002), tal como aparece nos exemplos seguintes: Livro WOLF, Eric. Figurar el poder. México: Ciesas, 2001. Coletânea GROSSI Miriam; MOTTA, Antonio; CAVIGNAC, Julie Antoinette (Org.). Antropologia francesa no século XX. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Editora Massangana, 2006. Capítulo de livro PONTES, Heloisa. Elias, renovador da ciência social. In: WAIZBORT, L. (Org.). Dossiê Norbert Elias. São Paulo: Edusp, 2001, p. 17-36. Artigo em periódico BERGAMASCO, Sonia. A realidade dos assentamentos por detrás dos números. Estudos Avançados, São Paulo, v. 11, n. 31, p. 37-50, set./dez. 1997. Monografias, dissertações e teses acadêmicas ROSA, Marcelo. O engenho dos movimentos: reforma agrária e significação social na zona canavieira de Pernambuco. 2004. Tese (Doutorado) – Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. 222 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 Documento eletrônico RIO 500 anos de Brasil: O Rio de Janeiro no século XVI. Rio de Janeiro: Prefeitura da Cidade/Secretaria Municipal de Cultura; Arquivo Geral da Cidade, 1994. 1 CD-ROM. Home page institucional INSTITUTO BRASILEIRO DE INFORMAÇÃO EM CIÊNCIA E TECNOLOGIA. ISSN: Número Nacional Normatizado para Publicações Seriadas. Brasília: IBICT/Ministério da Ciência e Tecnologia, maio 2002. Disponível em <http://www.ibict.br/>. Acesso em 3 fev. 2003. • Os anexos, gráficos, quadros e mapas devem ser encaminhados em folhas separadas numerados e titulados corretamente, com a devida referência (se reproduzidos de outra fonte) e com indicação do local de sua inserção no texto. Devem estar confeccionados de maneira a permitir sua reprodução direta. As imagens podem vir em mídia digital também, vertidas para o preto-e-branco, preferencialmente em formato TIF ou EPS, com resolução mínima de 260 dpi no seu tamanho final, fontes convertidas. As imagens, fotografias, gráficos, quadros, mapas etc. serão publicados em preto-e-branco. • O envio de textos implica a cessão de direitos autorais e de publicação à revista. Esta não se compromete a devolver as colaborações recebidas. • Cada autor de artigo, ensaio, tradução e resenha receberá dois exemplares da edição. • Os originais devem ser encaminhados em CD-ROM, programa Word for Windows com 2 (duas) cópias impressas, com endereço completo, telefone e e-mail. Também deverá ser enviada uma cópia em versão eletrônica para o e-mail: <[email protected]>. 223 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 • Os artigos que não se adequarem às normas de publicação da Ruris não serão encaminhados para pareceristas. • Os autores devem enviar seus textos para: Ruris – Revista do Centro de Estudos Rurais Instituto de Filosofia e Ciências Humanas–Unicamp Rua Cora Coralina s/no, CEP 13081-970 Caixa Postal 6110 Cidade Universitária Zeferino Vaz Barão Geraldo, Campinas (SP), Brasil Para maiores informações, consultar os editores no Centro de Estudos Rurais – IFCH – Unicamp www.ifch.unicamp.br/ceres Fone: 55-19-3521-1636 [email protected] • Aceita-se permuta. 224 R UR I S | V OLUME 3 , NÚME R O 2 | A G O 0 9-F E V 10 ESTE NÚMERO FOI FINANCIADO COM RECURSOS DO DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS DO IFCH/UNICAMP E DO PROJETO POLÍTICAS PÚBLICAS, RECONVERSÕES PRODUTIVAS E RECOMPOSIÇÕES IDENTITÁRIAS NO NORDESTE BRASILEIRO: UM OLHAR A PARTIR DO MUNDO RURAL – UFCG/UNICAMP, FINANCIADO PELO EDITAL CASADINHO DO CNPq*. 225