CESO 2009 - CCHLA/UFRN
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CESO 2009 - CCHLA/UFRN
2 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DE NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTE DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS GRUPO DE PESQUISA CULTURA, POLÍTICA E EDUCAÇÃO RELATÓRIO DO III CICLO DE ESTUDOS EM CIÊNCIAS SOCIAIS (CESO 2009) NATAL / 2009 3 EXPEDIENTE Reitor José Ivonildo do Rêgo Vice-Reitora Ângela Maria de Paiva Cruz Pró-Reitoria de Pesquisa Maria Bernardete Cordeiro de Sousa Pró-Reitoria de Pós-Graduação Edna Maria da Silva Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes Márcio Moraes Valença Departamento de Ciências Sociais Irene Alves de Paiva Realização Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais Orivaldo Pimentel Lopes Júnior Coordenador Alexsandro Galeno Araújo Dantas Vice-coordenador Apoio e Organização Grupo de Pesquisa Cultura, Política e Educação José Willington Germano Coordenador Vânia de Vasconcelos Gico Vice-coordenadora Comissão Organizadora do III CESO Adriana Aparecida de Souza Anderson Cristopher dos Santos Dalcy da Silva Cruz (Coordenação) Ana Maria Morais Costa José Gllauco Smith Avelino de Lima Gilcerlândia Pinheiro Almeida Nunes Lenina Lopes Soares Silva Mércia Maria de Santi Estácio Simone Cabral Marinho dos Santos Dalliva Stephani Eloi Paiva Joicy Suely Galvão da Costa 4 (HOMENAGEM A CLADUDE LÉVI-STRAUSS) RELATÓRIO DO III CICLO DE ESTUDOS EM CIÊNCIAS SOCIAIS Relatório apresentado à Coordenação do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais como comprovante e prestação de contas da realização do evento de 7 a 9 de outubro de 2009. Natal/2009 5 A universidade no século XXI será certamente menos hegemônica, mas não menos necessária que o foi nos séculos anteriores. A sua especificidade enquanto bem público reside em ser ela a instituição que liga o presente ao médio e longo prazo pelos conhecimentos e pela formação que produz e pelo espaço público privilegiado de discussão aberta e crítica que constitui. Boaventura de Sousa Santos 6 PROGRAMAÇÃO III CESO 2009 – HOMENAGEM A CLAUDE LÉVI-STRAUSS Abertura: LÉVI-STRAUSS: UM PENSADOR DO SÉCULO XX Dia 07/10 (quarta-feira) 19h Auditório Consequinho CCHLA Mesa-Redonda: Professor doutor Vanderlan Francisco da Silva (UERN) Professora doutora Wani Pereira Grecom/UFRN Mediadora: Professora doutora: Dalcy da Silva Cruz - Dia 08/10 (quinta-feira) – MiniCursos – 14 às 18h MC1 - Avaliação e formação no ensino de Ciências Sociais e Humanas - Auditório C - CCHLA Lenina Lopes Soares Silva José Gllauco Smith Avelino de Lima [email protected] MC2 - Propriedade Intelectual e Ciências - Auditório de Geografia CCHLA WELLINGTON FONTES MENEZES (Mestrando em Economia pela Universidade Estadual Paulista FCL-Ar/UNESP) [email protected] MC3 – Biodanza: as razões do corpo na dança da vida - Auditório A - CCHLA Kenia Almeida Nunes (Graduanda em Ciências Sociais e bolsista do Programa de Educação Tutorial (PET) pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte) [email protected] Denise Salgado (Graduanda em educação Física pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte e praticante de Biodanza) MC4 – Exclusão digital na era da Internet - Sala C6 – Setor II MARIA APARECIDA RAMOS DA SILVA – MESTRANDA PPGCS Carga horária 4 horas MC5 – Avaliação de Políticas Públicas - Auditório de Psicologia CCHLA Lincoln Moraes de Souza [email protected] 7 Dia 09/10 (sexta-feira) Grupos de Trabalho – 14/18h Salas do Setor II: GT1 – História Oral, Memória e Identidades - Sala D2 – Setor II JOSÉ ANCHIETA BEZERRA DE MELO (Mestrando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFPB). JOSÉ MÁRCIO DA SILVA VIEIRA (Mestrando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da UFCG). [email protected] GT2 – Subjetividades, práticas sociais e contemporaneidade - Sala E2 – Setor II Julimar Gonçalves (UFRN); Rejane Guedes (UFRN); Vergas Vitória Andrade (UFRN) [email protected] GT3 – Momento de reflexão: pesquisas realizadas ou em andamento - Sala F2 - Setor II Gilcerlândia Pinheiro Almeida Nunes – Mestranda do PPGCS-UFRN Maria Lúcia Bastos Alves – Profª Drª. Docente PPGCS-UFRN Rainolenes Melo Silva – Mestrando do PPGCS-UFRN [email protected] GT4 – Segurança Pública com enfoque no sistema penitenciário brasileiro – Sala F3 – Setor II Profª. Ms. Hilderline Câmara de Oliveira – UFRN/FACEX Ms. Eduardo Franco C. Cruz – UFRN/PMRN Profª. Ms. Joseneide S. Pessoa dos Santos – UFRN/FACEXGT [email protected] GT5 – Balcão TCC REUNI: práticas e experiências na elaboração da monografia em Ciências Sociais – Sala G1 – Setor II (CANCELADO) [email protected] GT6 – Educação e Diversidade – Sala H7 – Setor II Simone Cabral Marinho dos Santos (Mestre em Sociologia UFRN/UERN) Ana Maria Morais Costa- Especialista em Antropologia UFRN/UERN [email protected] [email protected] GT7 – Imagem, Cultura e Sociedade – Sala H8 – Setor II 8 Prof. Dr. Itamar de Morais Nobre [email protected] GT8 – Desenvolvimento, Políticas Públicas e Terceiro Setor – Sala A4 – Setor II Prof. Dr. João Bosco Araújo da Costa (UFRN) Profª. Drª. Maria Ivonete Soares Coelho (UERN/UFRN) [email protected] GT9 – Tecendo e vivenciando histórias de violência – Sala H10 – Setor II Drª. Teresa de Lisieux Lopes Frota (IBRAPESUVA)[email protected] Ms. Adriana Aparecida de Souza (UFRN) GT 10 – Sociedade, Memória e Educação no Brasil - Auditório A CCHLA Prof. Dr. José Willington Germano (UFRN) Profa. Dra. Dalcy da Silva Cruz (UFRN) [email protected] Encerramento: LÉVI-STRAUS: NATUREZA E CULTURA Dia 09/10 (sexta-feira)19h – Auditório Consequinho CCHLA Mesa-Redonda: Professora doutora Dalcy da Silva Cruz (UFRN) e Professor doutor Ailton Siqueira Fonseca (UERN) Mediação: Professora: Simone Cabral Marinho dos Santos (UERN/UFRN) CESO EM SOCIEDADE (Atividade desenvolvida fora da UFRN Coordenada pelo Grupo de Pesquisa Cultura Política e Educação) 9 SUMÁRIO 1 APRESENTAÇÃO 10 2 ATIVIDADES REALIZADAS DURANTE O III CESO 12 2.1 ABERTURA DO EVENTO 14 2.2 MINICURSOS 22 2.3 GRUPOS DE TRABALHO 27 2.4 ENCERRAMENTO DO EVENTO 336 2.5 CESO EM SOCIEDADE 357 3 RESULTADOS III CESO/2008 358 3.1 COMPARATIVO DE PRODUÇÃO ENTRE O I, O II CESO E DO 359 III CESO 4 III CESO: PERSPECTIVAS DE PRODUÇÃO 360 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 361 REFERÊNCIAS 362 ANEXOS 363 ANEXO 1 PROJETO DO CESO ANEXO 2 MODELO DE CERTIFICADO ANEXO 3 LISTA DE PARTICIPANTES ANEXO 4 CD ROOM CÓPIA DO SITE III CESO ANEXO 5 CD ROOM ANAIS III CESO 10 1 APRESENTAÇÃO Este Relatório Geral do III Ciclo de Estudos em Ciências Sociais (III CESO)1 encerra a participação do Grupo de Pesquisa Cultura, Política e Educação como organizador deste evento. Em sua terceira edição o CESO trouxe mais uma vez a preocupação do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (PPGCS) com o compartilhamento e a discussão do conhecimento produzido por professores, pesquisadores e alunos do Mestrado e do Doutorado. De igual modo, de professores e alunos do Curso de Graduação em Ciências Sociais (bacharelado e licenciatura) e dos diversos Grupos de Pesquisa do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Ressaltamos nesta edição, a participação direta de professores do PPGCS/UFRN, bem como de professores da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. No ano de 2009, o antropólogo Claude Lévi-Strauss foi o homenageado. Nascido no ano de 1908, o autor completou 100 anos, em 2008. É autor de uma obra direcionada para compreender o homem, a natureza e a cultura de forma indissociada da construção de saberes. No III CESO, Lévi-Strauss e seu legado, foram discutidos com o intuito de reafirmá-los como partes indissociáveis de uma ciência humana e social mais voltada para as questões transdisciplinares que envolvem a ciência e a produção de conhecimentos em um mundo globalizado. O III CESO ocorreu em Natal/RN, nas dependências do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes (CCHLA), do Campus Central da UFRN, nos dias 07, 08 e 09 de outubro de 2009 e também em espaços selecionados para as atividades do Projeto de Extensão CESO em Sociedade sob a coordenação do Grupo de Pesquisa Cultura, Política e Educação. O evento é uma promoção anual do Programa de PósGraduação em Ciências Sociais, com o objetivo de compartilhar os conhecimentos produzidos pelos estudantes do PPGCS e da Graduação em Ciências Sociais (Bacharelado e Licenciatura) da UFRN, possibilitando 1 Relatório elaborado/organizado, a partir do site do III CESO, www.ccha.ufrn.br/ceso . 11 também o intercâmbio de conhecimento com pesquisadores de distintas áreas e de outras instituições. Destacamos que o ISSN do CESO é 1982 7210. Informamos que o evento ainda não tem Qualis e que para isto, dentre outras exigências, terá que ser informado no Relatório DATACAPES do PPGCS. Deste modo, o CESO mais uma vez promoveu a integração no espaço acadêmico de estudiosos das mais diferentes temáticas e, destes, com a comunidade externa. A realização do evento compõe a agenda de atividades do Programa de Pós-Graduação em ciências sociais e organização teve o efetivo apoio do Grupo de Pesquisa Cultura, Política e Educação, do Departamento de Ciências Sociais com a colaboração de professores e alunos da PósGraduação e da Graduação em Ciências Sociais da UFRN, e de professores da UERN. A coordenação da comissão organizadora foi feita pelos professores Dalcy da Silva Cruz e José Willington Germano. 12 2 ATIVIDADES REALIZADAS DURANTE O III CESO/2009 A abertura do III Ciclo de Estudos em Ciências Sociais realizou-se no dia 07 de outubro de 2008, às19 horas, no Auditório de Ciências Sociais do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da UFRN, com a presença de professores e alunos da Graduação e da Pós-Graduação em Ciências Sociais. Nesta ocasião, aconteceu uma homenagem dos organizadores à professora Dalcy da Silva Cruz por sua dedicação ao CESO desde sua primeira edição em 2007. Na abertura foi realizada uma mesa-redonda intitulada LÉVISTRAUSS: UM PENSADOR DO SÉCULO XX que teve como debatedores os professores: Vanderlan Francisco da Silva (UERN) e Wani Pereira (Grecom/UFRN) com a mediação da professora Dalcy da Silva Cruz (UFRN). Os dois professores fizeram suas apresentações2 sobre a obra de Claude Lévi-Strauss e em seguida foi feito um debate que durou aproximadamente 50 minutos e contou com a participação de professores e alunos da UFRN que levantaram questões sobre a atualidade do pensamento de Claude Lévi-Strauss. Para encerrar a mediadora apontou as diferenças de estilo de leitura das duas apresentações, quais sejam uma mais imagética, informativa, pontual e outra mais voltada ao estilo de produção de Lévi-Strauss. No encerramento, no dia 09 de outubro de 2009, no já referido auditório, foi também realizada uma mesa-redonda intitulada: LÉVISTRAUS: NATUREZA E CULTURA que teve como apresentadores a Professora doutora Dalcy da Silva Cruz (UFRN) e o Professor doutor Ailton Siqueira Fonseca (UERN), sob a coordenação da professora da UERN e doutoranda em Ciências Sociais da UFRN, Simone Cabral Marinho dos Santos e com a colaboração do professor do PPGCS Homero Costa. 2 Na Revista Inter-legere edição 6 será publicada na íntegra a comunicação feita pelo professor Vanderlan Francisco da Silva (UERN): www.cchla.ufrn.br/interlegere e nos Anais do III CESO: www.cchla.ufrn.br/ppgcs 13 No encerramento destacamos as apresentações culturais a cargo do Grupo Octo Voice da Escola de Música da UFRN e do poeta Antônio Francisco, historiador e cordelista da Academia Brasileira de Cordel, ocupante da cadeira de Patativa do Assaré. As demais atividades foram realizadas nos dias 08 e 09 de outubro nos espaços dos Auditórios do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes (CCHLA) e em algumas salas de aulas do Setor II, do Campus Central da UFRN. Constaram da programação minicursos e Grupos de Trabalho. Também foram realizadas atividades extensionistas por alunos de graduação e de Pós-Graduação em Ciências Sociais/UFRN, denominadas de CESO em sociedade, realizadas em vários espaços educativos em Natal e em outras cidades do Rio Grande do Norte. A estrutura de organização contou com a participação ativa de 08 alunos do PPGCS/UFRN, 2 professores da UFRN e 3 da UERN (sendo 2 alunos do PPGCS) e 2 alunos da Graduação em Ciências Sociais, que planejaram a programação do evento, criaram o site, fizeram as inscrições, organizaram os anais, expediram certificados e cuidaram do atendimento aos participantes durante o evento. Os equipamentos técnicos, tecnológicos e de expediente disponibilizados para o evento foram os do Grupo de Pesquisa Cultura, Política e Educação, do PPGCS e alguns dos próprios alunos que participaram da Comissão Organizadora. Os espaços físicos solicitados para a realização do evento foram e são adequados para tal. A capacidade instalada, de maneira geral, excedeu a demanda, dada a baixa participação de alunos da Graduação e particularmente do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, organizador do evento. Compreendemos que se deve a partir desta constatação se buscar aumentar tal participação tendo em vista o objetivo do evento e a quem e a quê se destina. Quanto às despesas financeiras a de maior valor referia-se a passagens e hospedagem dos participantes externos para abertura e encerramento do evento e estas foram cobertas pelo PPGCS/UFRN. 14 A Comissão Organizadora nesta edição optou por não arcar com as despesas de divulgação, que foi feita apenas em mídia eletrônica e impressa, através de cartazes e de um banner reaproveitados. As inscrições e os certificados foram exclusivamente feitos em meio eletrônico, visando diminuir os custos do evento, tendo em vista que não são cobradas inscrições. 2.1 ABERTURA DO III CESO: LÉVI-STRAUSS: O PENSADOR DO SÉCULO XX Dia 07/10 (quarta-feira) 19h – Auditório Consequinho - CCHLA Mesa-Redonda: Professor doutor Vanderlan Francisco da Silva (UERN) Professora doutora Wani Pereira (GRECOM/UFRN) 2.1.1 Comunicação Professor Doutor Vanderlan Francisco da Silva LÉVI-STRAUSS, UM PENSADOR ENTRE TRÊS SÉCULOS Dr. Vanderlan Silva Este texto procura discutir as principais idéias DE Claude Lévi-Strauss, antropólogo francês, cuja influência se faz notar nos mais variados campos de estudos das Ciências Humanas. Lévi-Strauss produziu uma obra vasta e densa, partindo das contribuições de autores clássicos da Filosofia, da Sociologia, Antropologia, Linguistica, Geologia, Psicanálise, entre outros, às quais incorporou também contribuições de estudiosos contemporâneos de um vasto leque de disciplinas. Foi a partir dessa junção de várias influências intelectuais que ele elaborou uma nova perspectiva no campo dos estudos da cultura, tendo como preocupação sempre entender as singularidades sociais, ao mesmo tempo em que pautava suas pesquisas pela busca de elementos universais presentes na configuração dos significados sociais. A densidade e a influência de sua obra alcançaram patamares que poucos estudiosos das Ciências Humanas conseguiram ao longo do último século. Isso certamente se deu graças à força de suas idéias e à originalidade da perspectiva teórica que ele defendeu. O Estruturalismo teve grande força durante o século XX, entretanto, poucos foram os autores estruturalistas que galgaram o patamar atingido por Lévi-Strauss ao longo de sua extensa trajetória intelectual e existencial, o que demonstra como este é um autor singular. O que faz com que alguém possa ser considerado um gênio? O que leva um pesquisador e escritor a ocupar um lugar de relevância em um meio de tanta competição e desafios como o meio acadêmico europeu? Lévi-Strauss é um dos mais admiráveis, produtivos e influentes pensadores do século XX. A disciplina que escolheu e a teoria que ajudou a construir, 15 não pareciam, inicialmente, ajudar-lhe muito a se transformar em um grande pensador do século XX. Todavia, aquilo que parecia obstáculo, foi enfrentado com muito esforço, disciplina e ousadia. No início da carreira acadêmica, quando manifestava o desejo de estudar os indígenas brasileiros, foi desaconselhado por um diplomata brasileiro residente em Paris, que lhe dissera, na década de trinta do século passado, que ele não iria encontrar índios no Brasil, pois esses tinham desaparecido. Esse conselho representava uma percepção etnocêntrica da elite brasileira em relação aos indígenas. Mesmo vindo de um brasileiro, tal ''conselho'' não chegou a influenciar Claude Lévi-Strauss, que sendo professor na USP naquela década, fez-se também etnógrafo, mergulhando na floresta amazônica. Lévi-Strauss buscava não uma humanidade perdida nos mais longínquos recantos do mundo, situada à margem da sociedade ocidental. Ao contrário, quem já leu Tristes Trópicos, bem pôde ver que esse jovem etnógrafo, até então uma promessa da antropologia, encontrava ali vários povos originais, que construíam e seguiam outros modelos de existência, sem que nada ficassem a dever a outras populações, inclusive às sempre autocelebradas sociedades de modelo europeu. Muitos foram os pesquisadores que antes e depois de Lévi-Strauss tiveram experiências semelhantes, sem que possamos lhes atribuir a mesma capacidade de compreensão. As várias expressões de humanidade que Lévi-Strauss nos revela, em parte se deve a fineza do seu olhar, à generosidade do seu espírito. Se a experiência etnográfica tida no Brasil permaneceu como sendo a mais expressiva de sua vida, foi sobretudo com sua ida para os Estados Unidos, por ocasião da Segunda Guerra mundial, fugindo da França recém invadida pelos nazistas, que a perspectiva estruturalista por ele abraçada e construída ganharia corpo. Uma das grandes virtudes de Lévi-Strauss foi a de ser um grande leitor. Em sua obra, é sempre possível cruzarmos com os grandes clássicos da Antropologia, a exemplo de Lewis Morgan, James Frazer, Marcel Mauss, Malinowski e Racliffe-Brown; da Sociologia: Durkheim, Spencer, Robert Hertz e da Economia e Filosofia, tal como Karl Marx, da Psicanálise, da Linguistica etc. Antes de ser um grande autor, Lévi-Strauss é um grande leitor, desses atentos e dispostos a sempre encontrar contribuições que façam suas reflexões progredirem. A sua obra ―As estruturas Elementares do Parentesco'', originalmente sua tese de doutorado, é uma prova concreta desse legado de leitura e de diálogo com autores fundadores da Antropologia e da Sociologia, mas também com os autores contemporâneos dessas e de outras disciplinas. Nesta obra, Lévi-Strauss apresenta uma interpretação inovadora e surpreendente à questão da relação entre natureza e cultura. Ao contrário de muitos que o precederam, ele não procurou pensar o homem como um ser afastado da natureza, como se esta restasse tal qual uma herança da qual o homem não podia fugir, embora fizesse de tudo um pouco para diminuir sua influência. Para Lévi-Strauss, o homem é uma bela construção, nascida deste entrecruzamento entre a natureza e a cultura. Para ele não há um homem no sentido antropológico que seja apenas natural. A natureza, bem 16 disse o pai do Estruturalismo, oferece ao homem e as mulheres elementos dos quais eles não podem fugir, sob o risco de não poder se constituir enquanto ser cultural. Diferentemente de outros animais, no caso humano, a proposição da natureza não pode ser confundida com determinação, pois se os elementos naturais são universalmente dispostos, a configuração que eles assumirão dependerá dos valores que cada grupo social elabora para lhes atribuir sentidos, significados. Na natureza, há uma ordem que se apresenta regulando a vida dos animais, das plantas, das rochas etc. O homem não é alheio a isso, mas no seu caso, a natureza lhe dá a vida, mas não ordena a sua existência. A constância e a regularidade existem, a bem dizer, tanto na natureza quanto na cultura. Mas na primeira aparecem precisamente no domínio em que na segunda se manifestam mais fracamente, e vice-versa. Em um caso, é o domínio da herança biológica, em outro, o da tradição externa. Não se poderia pedir a uma ilusória continuidade entre as duas ordens que explicasse os pontos em que se opõem (LÉVI-STRAUSS, 1982, p. 46). No reino da cultura, ela é fruto do conjunto de valores classificatórios que são cultural e socialmente estabelecidos. Vejamos os eventos da proibição do incesto e da violência. Entre os animais, onde quer que se vá, observamos que esses, via de regra, jamais copulam e se reproduzem com os seus genitores. Algo semelhante ocorre com os conflitos entre animais de uma mesma espécie. Como observam Girard (1990) e Lorenz (2003), jamais um animal da mesma espécie mata o outro durante um conflito. No caso da cultura, ao contrário da natureza, não há uma espécie de freio que impeça o incesto, inversamente, como nota Lévi-Strauss, há mesmo um estímulo, um desejo natural para que isso ocorra. A mesma ausência de impedimento se mostra presente nos casos dos conflitos, da violência, cujas conseqüências mais graves dos embates relacionais podem conduzir à morte. Portanto, também aqui, inexiste um freio natural, mas não uma ordem que regule, pois a sociedade, a cultura, tomam para si tal responsabilidade, criando mecanismos que possibilitem a ordenação da existência. Assim, a proibição do incesto cria a necessidade da aliança entre grupos de indivíduos, na medida em que o sujeito A não podendo contrair uma esposa no seio do próprio grupo (a não ser que esteja disposto a enfrentar todo tipo de coerção social), ele é obrigado a buscar sua parceira em outro grupo. Como afirma Mauss, autor no qual Lévi-Strauss foi buscar a idéia de contrato a partir das trocas, ―Recusar-se a dar, deixar de convidar ou recursar-se a receber equivale a declarar guerra; é recusar a aliança e a comunhão‖ (1974: 57-8). Mais à frente, Mauss se refere à importância das trocas, afirmando: ―misturam-se as almas nas coisas; misturam-se as coisas nas almas; misturam-se as vidas, e é assim que as pessoas e as coisas misturadas saem cada qual de sua esfera e se misturam: o que é precisamente o contrato e a troca‖ (Idem: 1974:71). Assim, na medida em que um indivíduo é levado a participar de um circuito de trocas, ele não pode copular com sua irmã e recebe uma mulher de outro grupo, sendo obrigado a ofertar sua irmã nesse jogo de relações sociais e de trocas sexuais. E é sempre importante 17 lembrar, que no jogo das relações o mais importante não são os atores, mas as regras. Portanto, a proibição do incesto, tal como pensada por Lévi-Strauss, constitui uma intervenção da cultura na natureza e essa intervenção se faz a partir da construção de um edifício fundador da vida cultural, qual seja, o sistema de trocas que para o antropólogo francês se faz sempre a partir da troca de mulheres, de mensagens e de bens e serviços. Para ele, essa é uma regra cuja manifestação é universal, mesmo que assuma singularidades particulares nas mais variadas culturas. A obra de Levi-Strauss, numerosa e densa, expressa bem a virtude de um espírito curioso, que não se contentou em restar ''prisioneiro'' das fronteiras disciplinares. Mas do que um antropólogo, ele é um dos grande pensadores do Século XX, desses intelectuais raros, cuja influência se espraia muito além da disciplina que viu nascer suas reflexões. Em sua obra, encontramos influencias dos mais variados domínios científicos, desde as já citadas Antropologia e Sociologia, passando pela Economia, Psicanálise, Filosofia e Linguistica e chegando até à Geologia. Ler Lévi-Strauss é um desafio e um convite a percorrer caminhos nem sempre tão fáceis de serem traçados, mas certamente lê-lo e relê-lo, constitui um convite à reflexão provocante e ao crescimento intelectual. Não dá para ler suas obras e ficar indiferente às suas reflexões, aos seus questionamentos, à sua respeitosa, densa, sútil e por vezes corrosiva crítica aos tabus entrincheirados dos modelos ocidentais. A originalidade de um autor, muitas vezes consiste em oferecer ao público acadêmico uma nova leitura para velhas questões. No caso de Lévi-Strauss, ele foi muito além disso, não apenas apresentou novas interpretações às obras de Durkheim e Marcel Mauss, de Morgan, Frazer, entre outros, mas a partir delas criou uma nova leitura das cultura e das sociedade humanas. O prefácio que elaborou à coleção Sociologia e Antropologia, publicada em vários países, inclusive no Brasil, onde encontramos textos da magnitude de o Ensaio sobre a Dádiva, de Marcel Mauss é uma apresentação tão competente e refinada quanto à própria obra do sobrinho de Durkheim. Do mesmo modo, a entrevista que concedeu sobre a obra de Jean de Léry (Viagem à terra do Brasil) e publicada como prefácio à edição francesa de 1994, repleta de reflexões refinadas e de emoções que jorram enquanto fala do fato de ter percorrido, séculos depois, parte dos mesmos lugares trilhados pelo cronista do século XVI. Essas duas obras, entre tantas outras que ele produziu, acrescentam contornos singulares à sua produção, difíceis de serem encontrados em outros autores e obras. Paralelamente, são testemunhos do espírito vivo, da capacidade reflexiva e da paixão com os quais o pai do estruturalismo antropológico sempre fez Antropologia e pensou o outro. Linguagem e Sociedade: Foi na Linguística que Lévi-Strauss foi buscar uma das principais contribuições à Antropologia Estruturalista. Para ele, a Linguistica oferece um exemplo de ciência a ser seguido pela Antropologia, pois ela estuda fenômenos que em muito se assemelham às características dos fenômenos estudados pelas Ciências Sociais. Uma primeira semelhança é que os fenômenos linguisticos (fonemas) se situam a nível do inconsciente e segunda, se constituem como um objeto independente do observador (o 18 que faz lembrar os fatos sociais como coisas, tal como defendido por Durkheim). Ora, aquilo que é dado a pensar, e que independente do observado, aparece como um desafio, uma incitação à racionalidade humana, não a racionalidade em oposição à afetividade, mas enquanto refinamento da capacidade humana de criar o mundo enquanto representação simbólica. Pensar, desejar entender, construir, é querer classificar, e classificando, ordenamos o mundo que nos rodeia, mundo que ajudamos a formar a cada dia, como autores e atores, paradoxalmente silenciosos e barulhentos, herdeiros de tradições e criadores de inovações. Continuando a pensar o paralelo entre Linguistica e Antropologia, os fonemas, tal como os fatos sociais, ganham vida, sentido, a partir dos conjunto de relações que estabelecem entre si e da estrutura que os estruturam. Para Lévi-Strauss, ''As relações sociais são a matéria prima empregada para a construção dos modelos que tornam manifesta a própria estrutura social'' (1967:316). E nunca é de mais lembrar, que para ele, a estrutura não se reduz a algo empírico, tal como pensava Radcliffe-Bronw, para quem a estrutura social era o resultado do conjunto de relações sociais. Para Lévi-Strauss a estrutura é uma construção do espirito, não de um individuo, mas de uma coletividade, baseada em modelos conscientes e inconscientes. Os modelos conscientes, também chamados de pobres, de nativos, apontam para a reprodução imediata da vida social, para a manutenção das regras sociais. Ao contrário do que possa parecer num primeiro momento para um leitor desavisado, os modelos conscientes não devem ser rejeitados pelo pesquisador, pelo contrário, eles representam vias de acesso aos modelos inconscientes; são documentos, contribuições, portas de entradas para os níveis profundos e inconscientes de uma dada sociedade. Mesmo Clifford Geertz, crítico de Lévi-Strauss e do Estruturalismo, que, empregando a seu modo a idéia de interpretar os significados nativos, parece se aproximar das idéias francesas em algum momento. O truque é não se deixar envolver por nenhum tipo de empatia espiritual com os seus informantes. Como qualquer um de nós, eles também preferem suas almas como suas, e, de qualquer maneira, não vão estar muito interessados neste tipo de exercício. O que é importante é descobrir que diabos ele acham que estão fazendo (GEERTZ, 1997, p. 89). São os modelos que organizam, classificam e dão sentido às relações sociais. Por sua vez, eles estão diretamente relacionados à estrutura, essa espécie de espirito imanente da mente humana que organiza a existência e produz em cada um a sensação de que fazemos parte de uma grande ordem social. Certamente uma das afirmações mais cara à Antropologia Estruturalista é aquela que assevera ''a noção de estrutura não precisa de tempo'' (1967: 324), pois ela se situaria para além do tempo de cada geração ou sociedade. Esse grande ''espírito organizador'' se constitui para Lévi-Strauss como resultado do poder de classificar, de atribuir sentido à existência; poder esse que se encontra impregnado em toda e qualquer sociedade. Ora, perspectiva semelhante é defendida por Gibert Durand, em ''As Estruturas 19 Antropológicas do Imaginário'', quando chama atenção para a existência universal de imagens imperativas (ou imagens arquetípicas), fundadoras da psiquê humana, e que uma vez tomadas pelas cultura, ganhando assim significados particulares, formariam o que ele nomina de ''trajeto antropológico''. No fundo, as rejeições e críticas feitas à noção de estrutura defendida por Lévi-Strauss parecem repousar na não aceitação da existência de elementos não culturais, que de um modo ou de outro se fazem presentes na configuração das relações sociais. Uma outra afirmação polêmica é a de que os mitos independem dos homens. É claro que se os homens não existissem como espécie, os mitos também não estariam por aqui. Todavia, o mito se insere nessa perspectiva de um fenômeno que num certo sentido independe do observador. Assim, não somos nós que damos vidas aos mitos, ao contrário, são os mitos que se servem dos acontecimentos históricos e culturais para ajudar a organizar a vida social, para reordenar configurações e indicar caminhos. Os mitos, tal como a estrutura, independem do tempo, e não por acaso, pois são expressões desse grande ''espírito organizador''. Para além das divergências entre asseclas e críticos do antropólogo francês centenário, existe uma ''quase unanimidade'' em reconhecer que LéviStrauss é um dos mais importantes antropólogos do século XX, e porque não dizer, um dos grandes pensadores dos últimos séculos. Nascido há cento e um anos, ele continua fisicamente presente entre nós e suas idéias permanecem como referências importantes no campo das Ciências Sociais e fontes de estudo para todos àqueles que procuram estudar as culturas. Na sua trajetória de etnógrafo, professor e escritor, Lévi-Strauss parece ter incorporado à sua trajetória uma marca tão singular aos pioneiros da Antropologia, pois foi com o espírito aventureiro e sempre trilhando caminhos que o ajudassem a entender a universalidade do espírito humano que construiu uma obra ''incontournable''. Pela dimensão da obra que ergueu e pelo impacto que suas idéias tiveram no cenário intelectual mundial ao longo das últimas décadas, é possível se afirmar, sem hesitações, que Claude Lévi-Strauss é um dos grandes pensadores do Século XX, e ele o é, certamente, com um espírito do Século XIX. Eis um autor, singular, desses cuja leitura da obra nos faz pensar profundamente, ajudando a quebrar paradigmas. As idéias do pai do estruturalismo tiveram e continuam tendo grande influência no campo de estudos antropológicos e de muitas outras disciplinas que procuram compreender, perceber e visualizar os segredos desse grande espírito organizador, que em uma palavra, pode ser dito: humano. Ao contrário de certos modismos comuns no mundo acadêmico, o Estruturalismo nunca se constituiu em uma ''religião científica'', fechada ao diálogo com outras disciplinas e formas de organizar e explicar a vida. Ao contrário, o Estruturalismo de Lévi-Strauss nasce nesse carrefour de encontros com outras ciências e com outros povos, para além daqueles do velho continente ou dos grandes centros urbanos. Lévi-Strauss não hierarquiza sociedades, nem formas de classificação; ele coloca lado a lado razão e sensibilidade, lógica e intuição. Para ele o homem 20 é o mesmo, onde que que tenha existido, onde quer que vá, embora se apresente sempre de formas singulares, em consonância com os valores particulares da cultura da qual participa. Somos todos membros de sociedades que formam um único clube. Caminhamos em muitas direções, cada grupo/povo/sociedade repleto de sentidos e de espíritos, razões e sensibilidades que nos ajudam a organizar a existência, a dar sentido à vida. Ao propor isso e pela força dos argumentos que expôs, além da erudição sempre presente em seus textos, Lévi-Strauss acabou por se constituir como um dos mais refinados representantes de uma disciplina cuja vocação principal, desde os seus primórdios, sempre foi tentar entender o humano em toda a sua plenitude, a partir de suas mais variadas formas de expressão e de ordenação do mundo. Há uma tocante passagem em Tristes Trópicos, essa obra, que como já disse alguém, ''condensa toda a beleza de uma obra magistral, inclassificável em sua grandeza humana'' e que vale a pena sempre retê-la, pela atualidade e profundidade com que se apresenta, exatamente por apontar para aquilo que funda a vida social a cada instante, aqui e alhures. Nenhuma sociedade é perfeita. Por natureza, todas comportam uma impureza incompatível com as normas que proclamam, e que se traduz de modo concreto numa certa dose de injustiça, de insensibilidade, de crueldade. Descobre-se então que nenhuma sociedade é fundamentalmente boa; mas nenhuma é inteiramente má. Todas oferecem certas vantagens a seus membros, tendo-se em conta um resíduo de iniquidade cuja importância parece relativamente constante e que corresponde talvez a uma inércia específica que se contrapõe, no plano da vida social, aos esforços de organização (LÉVI-STRASS, 1996, p. 365). E mais, ''Nada é definitivo; podemos tudo recomeçar. O que foi feito e falhou poder ser refeito: 'A idade do ouro que uma cega superstição colocara atrás [ou na frente] de nós, está em nós''. A fraternidade humana ganha um sentido concreto ao apresentar-nos, na tribo mais pobre, nossa imagem confirmada e uma experiência da qual, junto com tantas outras, podemos assimilar as lições. Inclusive reencontraremos nestas um antigo frescor. Pois sabendo que há milênios o homem só conseguiu se repetir, alcançaremos essa nobreza do pensamento que consiste, para além de todas as repetições, em tomar como ponto de partida de nossas reflexões a grandeza indefinível dos começos'' (Idem). O percurso intelectual de Lévi-Strauss e as contribuições que deu às Ciências Humanas são um fragmento desse percurso humano, onde tudo se repete e onde tudo pode ser inovado. Como poucos, ele se fez tão grande como muitos dos pensadores, filósofos e antropólogos que o precederam. Como pensador raro, ele se fez e faz singular, inovador e criador de uma linha de reflexão refinada, que encontra, entre muitos de nós, críticos, súditos e admiradores do legado que ele nos oferece. REFERÊNCIAS Cronos: Revista do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da UFRN, v. 9, n. 2 (jul./dez.2009) Natal (RN): EDFURN – Editora da UFRN, 2000. 21 DOSSE, François. História do Estruturalismo I. O campo do signo, 1945/1966. tradução Alvaro Cabral, São Paulo: Ensaio; Campinas: Editora da Unicamp, 1993. DURAND, Gilbert. Les Structures Anthropologiques de l'imaginaire. Introduction à L’archétypologie générale, 11e Édition, Dunod, Paris, 1992. GEERTZ, Clifford. O saber local. Petrópolis, Editora Vozes, 1997. GIRARD, René. A violência e o Sagrado. São Paulo: Editora Unesp/Paz e Terra, 1990. LEVI-STRAUSS, Claude. As Estruturas Elementares do Parentesco. Petrópolis: Vozes,1982. LÉVI-STRAUSS, Claude. A Noção de Estrutura em Etnologia em Antropologia Estrutural. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1967. Lévi-Strauss. Claude. Entrétien sur Jean de Léry em LÉRY. Jean de. Histoire d'un voyage faict em la terre du Brésil. Paris: Livre de Poche, 2004. LEVI-STRAUSS, Claude. Linguagem e Sociedade em Antropologia estrutural I. Rio de Janeiro, Edições Tempo Brasileiro, 1967. pp. 71-84. LORENZ, Konrad. L'Agression. Paris: Flammarion, 2003. MAUSS, Marcel. O Ensaio Sobre a Dádiva. Formas e razão da troca nas sociedades arcaicas em Sociologia e Antropologia, com introdução de Claude Lévi-Strauss; tradução de Lambeto Puccinnelli. São Paulo: EDUSP, 1974. PACE, David. Claude Lévi-Strauss. O guardião das cinzas. Tradução de Maria Clara Fernandes, São Paulo: Bertrand Brasil, 1992. 2.1.2 Comunicação GRECOM/UFRN Professora Doutora (Texto não disponibilizado para publicação). Wani Pereira 22 2.2 MINICURSOS - Dia 08/10 (quinta-feira) – 14 às 18 horas MC1 - Avaliação e formação no ensino de Ciências Sociais e Humanas - Auditório C (CCHLA) Lenina Lopes Soares Silva [email protected] José Gllauco Smith Avelino de Lima [email protected] Ementa: As mudanças e as transformações tecnológicas nas últimas décadas têm demandado que as instituições de ensino superior reorientem suas práticas no sentido de formar profissionais com competências para produzir e socializar conhecimentos em diferentes espaços socioculturais e econômicos. Aliadas a estas problemáticas estão às questões éticas e a busca da docência preocupada com a formação cidadã, articulada ao processo de humanização de sujeitos que atuarão em um mundo globalizado e multicultural. Partindo-se desta visão contextual, observa-se que o ensino de Ciências sociais e humanas em nível superior deve inserir em suas atividades docentes um processo de avaliação que privilegie a formação dos alunos de forma significativa, inserida em um processo mais amplo de crescimento, desenvolvimento e envolvimento pessoal e social, em um computo de conhecimentos, habilidades e atitudes. Objetivos: Refletir sobre a avaliação e a formação em Ciências Sociais. Propor estratégias e procedimentos de avaliação para além das provas objetivas e subjetivas de natureza apenas aprobatórias. Conteúdos: Avaliação em Ciências Sociais e Humanas: re/conhecendo uma prática. Estratégias e procedimentos avaliativos: valorização do processo de aprendizagem em comunicação com o conhecimento já produzido. Metodologia: Aula expositiva dialogada Apresentação de estratégias e procedimentos avaliativos considerados inovadores. Referências DEPRESBTERIS, L. O desafio da avaliação da aprendizagem: dos fundamentos a uma proposta inovadora. São Paulo, EPU, 1989. MEDEIROS, E. B. Provas objetivas, discursivas, orais e práticas: técnica de construção. 9. ed. Rio de Janeiro. Fundação Getúlio Vargas, 1989. RIOS, T. Compreender e ensinar – por uma docência da melhor qualidade. São Paulo: Cortez, 2001. 23 MC2 - Propriedade Intelectual e Ciências - Auditório de Geografia - CCHLA (CANCELADO) Wellington Fontes Menezes (Mestrando em Economia Universidade Estadual Paulista FCLAr/UNESP) [email protected] Ementa: Compreender o papel das Ciências Sociais em face das novas tecnologias da informação e patentes emergentes na ordem econômica internacional. A abordagem do curso dará particular ênfase a respeito dos conflitos entre direitos patentários e políticas de patentes em saúde pública com relação ao acesso público à medicamentos. Objetivos: O curso tem como objetivo fornecer uma breve exposição dos conceitos básicos da Propriedade Intelectual, no caso específico das patentes, sem perder de vista a sua função social e a perspectiva desenvolvimentista, de forma a possibilitar uma análise crítica dos sistemas de propriedade intelectual brasileiro e internacional. Ao final do curso, espera-se dar uma visão mais específica das questões relativas do caso das patentes de medicamentos e o entendimento dos conflitos de interesses existentes a respeito do monopólio das indústrias farmacêuticas e saúde pública na sociedade. Conteúdos: Propriedade Intelectual: Noções gerais. Propriedade Intelectual: Das origens agrárias ao capitalismo mundializado. As Convenções Internacionais, Acordo TRIPS e regras de Comércio Internacional. Propriedade Intelectual: A barreira do monopólio. Sistema de Patentes. Contradições em processo: monopólio, transferência de tecnologia e difusão do conhecimento. Proteção patentária: assimetrias entre países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento. Licenças compulsórias e a legislação brasileira sobre patentes. Patentes em Saúde Pública. Considerações sobre o sistema de patentes em saúde humana. Acordo TRIPS e as Patentes Farmacêuticas. Política de medicamentos, patentes e questões a fins. Patentes e o caso dos medicamentos antiretrovirais. Metodologia: O conteúdo do curso será desenvolvido através de aulas expositivas, aulas com a utilização de recursos audiovisuais e leitura de textos específicos de apoio. Referências DOMINGUES, Renato Valladares. Patentes Farmacêuticas e Acesso a Medicamentos no Sistema da Organização do Comércio: A aplicação do Acordo TRIPS. São Paulo: Lex Editora, 2005. 24 FIANI, Roberto. Sobre patentes e desenvolvimento. In: Ciência Hoje, n. 258, v. 43, abril. Rio de Janeiro: Instituto Ciência Hoje, 2009. MENEZES, Wellington Fontes. Propriedade Intelectual: Das origens agrárias ao capitalismo mundializado. Anais do V Colóquio Internacional Marx-Engels. Cemarx/UNICAMP, 2007. Disponível em: www.unicamp.br/cemarx/anais_v_coloquio_arquivos/arquivos/com unicacoes/gt3/sessao1/Wellington_Menezes.pdf MENEZES, Wellington Fontes. Capitalismo, monopólio e patentes: propriedade intelectual e a desmedida exploração dos bens intangíveis. Anais do VI Colóquio Internacional Marx-Engels. Cemarx/UNICAMP, 2009 (no prelo). PICARELLI, Márcia Flávia Santini; ARANHA, Márcio Iorio (Organizadores). Política de Patentes em Saúde Humana. São Paulo: Atlas, 2001. PHILIPS, Jeremy; FIRTH, Alison. Introduction to Intellectual Property Law. Great Britain: Oxford University Press, 2006. SHERWOOD, Robert M. Propriedade Intelectual e Desenvolvimento Econômico. São Paulo: EDUSP, 1992. MC3 – Biodanza: as razões do corpo na dança da vida Auditório A – CCHLA Kenia Almeida Nunes Graduanda em Ciências Sociais Bolsista do Programa de Educação Tutorial (PET) Universidade Federal do Rio Grande do Norte) [email protected] Denise Salgado Graduanda em Educação Física Universidade Federal do Rio Grande do Norte Praticante de Biodanza) Ementa: A Biodanza, sistema criado por Rolando Toro, que designa em português a dança da vida. É um sistema de autoconhecimento, de integração e crescimento feito através dos afetos que construímos ao longo da vida com os outros, conosco e com a natureza, o que possibilita um resgate da identidade do ser. A música, o movimento e a emoção compõem esse sistema que leva o aluno a redescobrir o prazer de sentir e a capacidade de se expressar, percebendo que há uma gama de formas de se conhecer o mundo e as coisas do mundo. Objetivos: Esta oficina tem por objetivo fazer uma discussão em torno do corpo e de suas definições difundidas no meio educacional. Um corpo que fora relegado pela educação, de um modo geral, a um lugar de passividade, como mero receptor dos 25 conteúdos. Essa discussão será feita em conjunto com uma experiência corporal, a Biodanza. Metodologia: Para o andamento da oficina em questão será necessário da utilização de materiais, textos base elaborados pela organização da oficina, que envolvam as temáticas de corpo e educação, com base no livro Corporeidade e Educação Física: do corpo-objeto ao corpo-sujeito de Petrúcia da Nóbrega, em conjunto com uma apresentação de slides para melhor esclarecer os conteúdos que a oficina objetiva. Aos participantes recomenda-se roupas leves para a prática da Biodanza. Referências NÓBREGA, Teresinha Petrúcia da. Corporeidade e Educação Física: do corpo-objeto ao corpo-sujeito/ Teresinha Petrucia da Nóbrega. – Natal, RN: EDUFRN, 2005. MC4 – Exclusão digital na era da Internet - Sala C6 – Setor II Maria Aparecida Ramos da Silva Mestranda PPGCS/UFRN Ementa: Expressão da revolução científica e tecnológica constantes no mundo moderno, as novas tecnologias de informação e comunicação, principalmente o computador e a internet, provocaram significativas mudanças nas forças produtivas, nas relações de produção e nas formas de sociabilidade humana. Como conseqüência desse fenômeno, que permeia as relações econômicas, sociais e culturais, surgiram novas formas de exclusão social, pois a falta de acesso às novas tecnologias priva as pessoas de um elemento fundamental para estar integrado a esse universo. Objetivos: Demonstrar que as novas tecnologias da informação e comunicação trouxeram também em seu âmago uma nova forma de desigualdade social: a exclusão digital, que recapitula e reforça as diferenças pré-existentes. Conteúdos: Abordar o surgimento da internet e as novas tecnologias da informação; Mostrar as alterações na sociedade surgidas com a internet; Debater o fenômeno da exclusão digital como uma exclusão social; Apresentar as definições de exclusão digital; Discutir projetos e iniciativas de inclusão digital. Metodologia: Leitura de textos;Discussão em grupo; Utilização de tarjetas para descrever como a exclusão digital ocorre na sociedade contemporânea; Discussão com todos os participantes 26 sobre o resultado das tarjetas; Elaboração de uma carta com propostas para inclusão digital Referências CASTELLS, Manuel. A Sociedade em Rede. A Era da Informação: Economia, Sociedade e Cultura, v. 1. 8. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1999. _______. A Galáxia da Internet: reflexões sobre internet, negócios e sociedade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004. LÉVY, Pierre. As Tecnologias da Inteligência: o Futuro do Pensamento na Era da Informática. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1993. WAISELFISZ, Júlio Jacobo. Mapa das Desigualdades Digitais no Brasil. Brasília: 2007. Disponível em <http://www.ritla.net>. Acesso em: 22 jul. 2009. WARSCHAUER, Mark. Tecnologia e inclusão social: a exclusão digital em debate. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2006. MC5 – Avaliação de Políticas Públicas Psicologia – CCHLA Auditório de Dr. Lincoln Moraes de Souza [email protected] Ementa: Em termos gerais, a avaliação de políticas públicas, no sentido da utilização da literatura especializada da área, ainda é algo bastante recente no Brasil e daí a importância do tema. Além do mais, quando a avaliação é feita a mesma é vinculada apenas a um tipo das várias existentes. Neste sentido, trabalhar com a concepção geral de avaliação e as avaliações de impacto e de processo, simultaneamente no mesmo evento, confere um significado mais amplo e fornece um quadro melhor do assunto. Objetivos: Divulgar a literatura especializada de avaliação de políticas públicas; Mostrar as dissertações de mestrado no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da UFRN que trabalharam com avaliação de políticas públicas; Exemplificar a aplicação da avaliação no Rio Grande do Norte. Conteúdos: Caracterização geral da avaliação de políticas públicas ; avaliação de impacto ; avaliação de processo. Metodologia: Exposição dos temas e experiências de avaliação utilizando recursos áudio-visual (data show);Debates. Referências BARREIRA, Maria Cecília Roxo Nobre; CARVALHO, Maria do Carmo Brant de (orgs.). Tendências e perspectivas na avaliação de políticas e programas sociais. São Paulo; IEE/PUC-SP.,2001. Pág.13/42. COHEN, Ernesto, FRANCO,Rolando. Avaliação de Projetos Sociais. Vozes.São Paulo;1993. 27 DRAIBE, Sônia Miriam. A importância da avaliação das políticas públicas. In: VIVARTA, Veet (coord.). Que país é este? Pobreza, desigualdade e desenvolvimento humano e social no foco da imprensa brasileira. Cortez. São Paulo. 2003.p. 94/95 FIGUEIREDO, Marcus Faria; FIGUEIREDO, Argelina Maria Cheibub. Avaliação política e avaliação de políticas: um quadro de referência teórica. Análise & Conjuntura, v. 1, n. 3, Belo Horizonte, set./dez. 1986. 28 2.3 GRUPOS DE TRABALHO Dia 09/10 (sexta-feira) – 14 às 18 horas Salas do Setor II/CCHLA/UFRN GT1 – História Oral, Memória e Identidades - Sala D2 – Setor II José Anchieta Bezerra de Melo Mestrando /Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFPB José Márcio da Silva Vieira Mestrando/ Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da UFCG [email protected] Ementa: O Grupo de Trabalho pretende constituir um ampliado espaço de discussão e reflexão dos pesquisadores que utilizam perspectivas teórico-metodológicas variadas de História Oral, seja como forma de recobrir fatos não registrados por outro tipo de documentação, ou cuja documentação se quer complementar. Nesse sentido, propomos ainda uma articulação entre Memória e Identidades com o propósito de implementar um diálogo interdisciplinar, estimulando a troca de experiências entre os diversos profissionais que se utilizam da História Oral na investigação dos mais variados temas. TRABALHOS APROVADOS – RESUMOS SIMPLES 01 - HISTÓRIA ORAL: REFLEXÕES SOBRE A CONSTRUÇÃO DE UM CAMPO METODOLÓGICO José Anchieta Bezerra de Melo Mestrando/ Programa de Pós-Graduação em Sociologia - PPGS / UFPB [email protected] José Márcio da Silva Vieira Mestrando/ Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais PPGCS/ UFCG [email protected] Resumo: Ao longo dos séculos, a História Oral se constituiu como a maior fonte humana de produção, conservação e difusão do conhecimento. Nas ciências sociais, a fonte oral obtida através das técnicas de histórias de vida, entrevistas estruturadas e semiestruturadas é utilizada desde os primórdios da disciplina no início do século XX, como instrumentos da metodologia qualitativa. Em sua origem, a História Oral foi associada ao estudo das minorias e dos marginalizados, atualmente, incorporou uma variedade de 29 temas, criando em torno de si um profícuo debate teóricometodológico. É no âmbito dessa discussão que situaremos nossas reflexões, observando o uso e os freqüentes abusos praticados por alguns pesquisadores que utilizam essa metodologia de pesquisa na elaboração de trabalhos acadêmicos. Se por um lado há divergências com relação ao uso da História Oral, podemos considerar como positiva a extensão do campo que ela conquistou. O reconhecimento e a adesão por um considerável número de pesquisadores de diferentes áreas demonstram o seu êxito. Palavras-chave: História Oral. Teoria. Metodologia. 02 - SIGNOS E LINGUAGEM CORPORAL NA CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE SOCIAL NO INTRAMUROS: A PRÁTICA DA TATUAGEM CARCERÁRIA Adriana Pereira de Sousa/PPGCS/UFPB [email protected] Resumo: A tatuagem carcerária traz em si uma prática de uso cultural e social delineada pelos conflitos interiores e exteriores na construção da identidade individual e social do indivíduo, estes resultantes das inter-relações sociais. Portanto, essa nova identidade será construída no limiar tênue entre a ruptura brusca da identidade do eu do mundo em sociedade o qual ele vivia e a nova identidade que passa a ser construída a partir da entrada no cárcere, onde, a mutilação do eu acontece a todo instante e em todos os aspectos da vida social. É nesse limiar tênue em que os signos que representam à criminalidade são inscritos a flor da pele. O desenho escolhido e o local a ser tatuado denunciam as características particulares da personalidade de cada indivíduo, um ritual de identificação do apenado enquanto tal. A tatuagem carcerária é reconhecida pelos seus traços grossos e desenhos mal acabados, resultado das técnicas rudimentares utilizadas nas prisões. Palavras Chave: Tatuagem; Apenado; Identidade Social. 03 - VELHICE E EDUCAÇÃO: UM ESTUDO SOBRE AS EXPERIÊNCIAS COTIDIANAS VIVIDAS POR IDOSOS EM PROGRAMAS DE ALFABETIZAÇÃO Elânia de Moura Rocha [email protected] Mestra em sociologia(UFCG/FAESF) Resumo: O presente trabalho evidenciou as experiências de alfabetização para idosos beneficiados por políticas de inclusão e participação em grupos para terceira idade. Teve como ponto de referência os discursos de 08 (oito) idosos, que frequentaram assiduamente as atividades de alfabetização do Centro Municipal de 30 Convivência do Idoso da Prefeitura Municipal de Campina Grande – PB. O objetivo geral deste trabalho foi analisar as experiências cotidianas de idosos em programas educacionais para terceira idade. A metodologia etnográfica baseou-se em observação direta da prática pedagógica no projeto de Educação de Jovens e Adultos realizado no Centro Municipal de Convivência do Idoso, no período de 2006, como também a entrevista semi-estruturada para analisar o perfil dos sujeitos pesquisados. Durante o período de coleta de dados foi possível registrar a história pessoal de cada idoso que expressaram fatos do seu cotidiano, destacando acontecimentos que marcaram suas vidas desde a infância até a velhice. O referencial teórico abordado neste trabalho foi o da teoria do letramento e da velhice, na qual consideramos o pensamento teórico de Paulo Freire, Kleiman, Tfouni, Derbert, Motta, Cabral, entre outros. As conclusões permitem mostrar que mesmo tardiamente a educação é benéfica, trazendo resultados positivos para os idosos. Além disso, verificou-se que a alfabetização contribuiu para qualificar o idoso, tornando-o um novo cidadão, consciente de seus direitos, melhor sintonizado com as transformações sociais e mais determinados a lutar contra preconceitos. Palavras-chave: envelhecimento; idoso; educação; alfabetização. 04 - REFLEXÕES SOBRE AS MEMÓRIAS DE UM GRUPO DE ASSENTADOS NA PARAÍBA Francisco Fagundes de Paiva Neto Doutorando Em Ciências Sociais/UFCG Prof.: Depto História/UEPB) [email protected] Resumo: Trata-se de um estudo de caso que privilegiou as narrativas de um grupo de camponeses, cuja atuação pela reforma agrária se deu na década de 1980. Através da produção de fontes orais e do uso da metodologia qualitativa, analisamos as memórias dos camponeses a partir da dinâmica da heterogeneidade política grupal, cuja expressão pode ser associada a noção de ―memória dividida‖, conforme Portelli. O ato de narrar dos camponeses nos levou a percepção de estratégias de preservação ou de apresentação das memórias como a definição de um capital político/religioso em constante disputa. Palavras-Chaves: Reforma Agrária-Conflitividade. 05 - “ELES NÃO TINHAM CIVILIZAÇÃO...” A RECONSTRUÇÃO DA HISTÓRIA DA OCUPAÇÃO DO OESTE DO PARANÁ A PARTIR DA MEMÓRIA DOS COLONOS NO MUNICÍPIO DE CASCAVEL 31 Vilson Cesar Schenato [email protected] Mestrando PPGCS- UFCG Resumo: A ocupação da fronteira Oeste do Paraná foi marcada por um processo conflituoso de expropriação, grilagem e violência, que não é informado pelas fontes jornalísticas e da história oficial sobre o processo de colonização daquele lugar. Tais fontes negam a existência dos conflitos, fabricando uma memória de um passado de glória, desbravamento e pioneirismo por parte dos colonizadores com um tipo étnico específico que era o migrante de descendência Européia, sinônimo de trabalho produtivo, progresso e civilização. Naquele cenário, no entanto, havia a presença dos chamados posseiros, (caboclos e indígenas) que foram explorados, silenciados e expulsos de suas terras, por não ter a posse cartorial da mesma.(SCHREINER, 2002) O discurso dominante, exclui, em sua construção, a visão desses grupos, que foram só recentemente recuperados por algumas fontes da história crítica.(RIBEIRO, 2000 e LAVERDI, 2005, MENEZES, 1987) Evidenciamos nos discursos orais dos colonos que habitam hoje aquele espaço, uma referência negativa aos indígenas e caboclos, como sendo, aqueles que não seriam portadores de valores que os classificaria como humanos: uma ética específica de trabalho, uma forma de se comportar perante os outros, a civilidade e a humildade. Nesse artigo, iremos abordar a forma como os colonos legitimaram a posse da terra, afirmando-se a partir da des/legitimação e desqualificação do outro, no passado recente como no presente. Temos aqui como metodologia a reconstrução oral da história (MONTENEGRO, 2001, MENEZES, 1987) da ocupação do lugar pelos colonos. Palavras-chave: Colonos; Ocupação; Des/legitimação. 06 - A FIGURA FALADA: UMA EXPERIÊNCIA SOBRE DEPOIMENTOS ORAIS ACERCA DO ESCRITOR ALLYRIO MEIRA WANDERLEY Mário Gregório Cabral Diniz Mestrando em Teoria e História Literária Programa de Pós-Graduação em Teoria e História Literária do Instituto de Estudos da Linguagem, Unicamp. [email protected] Resumo: A presente comunicação não faz parte da minha pesquisa ―oficial‖ sobre o prosador, ensaísta e crítico literário paraibano Allyrio Meira Wanderley (1906-1955). As fontes principais tem sido cartas, críticas e artigos publicados em jornais da época da produção intelectual do autor e seus próprios livros (quatro romances e dois ensaios). Todavia, conforme surgiram 32 possibilidades de encontrar pessoas que dessem algum testemunho sobre ele, a pesquisa abriu exceção de sua ―oficialidade‖ para acolher essas falas que ora tem ajudado a elucidar pontos do meu estudo. Assim, em João Pessoa encontrei o filho de Allyrio, o exprofessor da UFPB, Sandro Meira Wanderley. Apesar de ser um dos mais novos e de ter convivido pouco com o pai, consegui nesse diálogo colher dados importantes da vida pessoal e da produção intelectual do escritor. Em Patos, onde nasceu Allyrio, um senhor de 95 anos ainda possuía lembranças do amigo mais velho, o ―esquisito Allyrio‖, segundo ele. ―Seu‖ Simplício (a quem dedico in memoriam esta comunicação), ainda me cedeu informações valiosas sobre a família Meira Wanderley, com a qual se relacionou. De idade avançada e com dificuldade típica de evocar e comunicar as lembranças, em seu auxílio veio dona Fátima Simplício, sobrinha do depoente e que, em tempos anteriores, quando a memória fluía com mais vigor, escutou muitas histórias que este contou sobre o amigo ilustre. Agradeço a ela a contribuição. Faço aqui, portanto, um relato dessa experiência e é possível adiantar, pelo menos, a conclusão de que, comparando as duas entrevistas, a figura de Allyrio Meira Wanderley construída a partir dos relatos orais permanece tão intrigante quanto aquela encontrada nas pesquisas de documentos escritos. Palavras-chave: Allyrio Meira Wanderley; fontes orais; história intelectual; literatura brasileira. 07 - OS SERTÕES, DE EUCLIDES DA CUNHA: HISTÓRIA, ESTÓRIAS & “CAUSOS” Sandra S. F. Erickson Letras - UFRN [email protected] Resumo: Magnus opus da literatura brasileira, Os sertões (1902), de Euclides da Cunha (1866-1909), é o texto paradigmático para definir/problematizar a/uma identidade brasileira. A história de sua fortuna crítica e sua recepção na língua inglesa é tão fascinante quanto a história do massacre da comunidade camponesa cristã de Canudos que o autor resgata e denuncia. Resumido e ―copiado‖ (no sentido técnico de copião) em A Brazilian Mystic (Robert Bontine Cunninghame Graham, inglês-escocês, 1922), traduzido integralmente em 1944, inspirador de outras obras importantes (La guerra del fin del mundo [1981, Mario Vargas Llosa, espanhol], Veredicto em Canudos [1970, Sandor Marai, húngaro], The Vale of Tears [Robert Levine, inglês, 1992) ainda assim, acaba excluído do ―cânone ocidental.‖ Interessa-nos discutir a recepção da obra em relação à sua força poética e seu lugar no cânone da crítica literária enquanto instituição cultural cujo papel é, não apenas de preservar (selecionando os textos para a memória cultural), mas de defender 33 e, se for caso, impor ao cânone, obras que representem o espaço da identidade cultural de um povo. Propomos a história da recepção crítica de Os sertões como personificada em La guerra, no personagem Jurema que simboliza, do ponto de vista estético e ideológico, a relação do texto de Cunha com um novo tipo de exploração do sertão, a saber a de sua cultura. Como Iracema, Jurema se torna, em La guerra, um porta-voz simbólico da exploração do sertão. Palavras Chaves: Os sertões; ciclo narrativo; recepção crítica na língua inglesa; Canudos. 08 - QUILOMBO URBANO DA MALOCA: MEMÓRIA ORAL E RESIGNIFICAÇÃO DE PROCESSOS IDENTITÁRIOS Franklin Timóteo Souza do Espírito Santo/UFRN [email protected] Resumo: Em sete de fevereiro de 2007, a Comunidade Maloca, situada no Bairro Getúlio Vargas, vizinho ao Centro de Aracaju SE, foi reconhecida como Comunidade Remanescente de Quilombo. A Maloca detém uma característica distinta da maioria das comunidades quilombolas por estar inclusa em um centro urbano, sendo intitulada como o segundo Quilombo Urbano certificado pela Fundação Cultural Palmares no Brasil. A intitulação da comunidade foi contextualizada a partir de um processo judicial que se desencadeava desde 1993.O senhor José Getúlio, morador da Rua N. Sra.das Dores, e que sua residência faz limite com comunidade, alegou que Dona Lundinara tinha invadido 2 m2 de seu quintal. Após um pedido de reintegração de posse, e da devolução dos 2 m2 por D. Lundinara, mesmo essa alegando não tê-los invadido,o resultado da sentença foi a devolução de 198 m2,totalizando toda a área territorial da Comunidade Maloca.Algumas residências por terem suas demarcações de terra muito antigas,desde 1920,não tinham escritura ou documentação similar, facilitando o resultado do processo contra os moradores, recebendo esses em novembro de 2006 ordem de despejo pela justiça municipal de Aracaju.Após catalogação de dados e documentos com moradores,tendo muitos desses uma ascendência familiar escravista oriunda de antigos engenhos do estado de Sergipe; dados esses repassados a Fundação Palmares pela Associação CRILIBER(Criança e Liberdade), órgão que responde pela comunidade; o grupo foi reconhecido como Remanescente de Quilombo. 09 - CONSTRUÇÕES IDENTITÁRIAS NAS CARTOGRAFIAS DO CENTRO DE CONVIVÊNCIA EM CAMPINA GRANDE 34 Valdirene Pereira de Sousa [email protected] Resumo: O presente estudo é parte de uma dissertação de mestrado que tem como objetivo investir em indagações sobre as trajetórias tecidas pelas sensibilidades senescentes cartografadas na contemporaneidade. Esse estudo traz como um de seus objetivos pensar a construção dos sentimentos de velhice partilhados pelos participantes do Centro de Convivência- espaço que congrega grupos de terceira idade em Campina Grande -, e a construção das identidades corpóreas, que vão delineando as subjetividades e as relações de um grupo que se une nas práticas de sociabilidades partilhadas. Assumir o desafio de pesquisar o universo dos idosos participantes dos grupos de terceira idade e deflagrar discussões que transitam em meio a relações de poder é adentrar nas ambivalências da história oral, é perceber a história como invenção, como incentivadora da imaginação e não como portadora de uma verdade fixa. A história oral precisa ser vista enquanto possibilidade metodológica não-dicotômica às fontes escritas, pois elas se contaminam e se entrelaçam na tecitura da História. A pesquisa que desenvolvi encontra na história oral aporte metodológico e, a partir das entrevistas realizadas com a equipe responsável pelo Centro de Convivência e com os idosos participantes, se distende a materialização, em texto, das experiências que compartilhei e compartilho nessa pesquisa. 10- A MEMÓRIA MIDIÁTICA NA CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE: O CASO DA RESIDÊNCIA UNIVERSITÁRIA MISTA DA UFCG Jéssica Lôbo Sobreira¹ [email protected] Resumo: Este trabalho nasceu com nossa curiosidade em saber como eram estabelecidas as interações sociais dentro da Residência Mista da Universidade Federal de Campina Grande, tendo este ambiente como um local ―mistificado‖ pela sociedade de um modo geral, principalmente, na memória das pessoas mais antigas de nossa sociedade. Assim como, pelo nosso interesse em analisar as interações sociais dentro deste ambiente e da necessidade de promover um melhor conhecimento das problemáticas existentes neste cotidiano, tendo-as como fenômeno de grande relevância dentro do campo da Sociologia. É sabido que, os estudantes carentes que são privilegiados com o benefício da Residência Universitária são constantemente vítima de preconceitos 35 pela sociedade em geral, sendo estas discriminações mais freqüentes dentro do ambiente universitário, principalmente à memória do local onde está situada a casa e ausência de conhecimentos à cerca deste benefício. Devido a isso, a casa e os indivíduos que moram nela são tidos como ―excluídos‖ da sociedade, marginalizados principalmente no ambiente universitário. Foi-se feita uma revisão bibliográfica acerca das interações sociais e sociabilidade; além de fontes históricas, jornalísticas entre outras, sobre acontecimentos e notícias que envolveram a Residência em questão e os indivíduos pertencentes e ou envolvidos nesse ambiente. Os estudos teóricos e empíricos foram empreendidos a partir de atividades voltadas a compreensão do estabelecimento das interações sociais enquanto uma dimensão sociológica e como perspectiva histórica. O presente artigo busca investigar como são estabelecidas as interações sociais no ambiente da Residência Universitária Mista da Universidade Federal de Campina Grande, procurando ―desmistificar‖ o enfoque da mídia neste cotidiano,analisando como estas ocorrem e de que modo se origina a criação de supostos grupos dentro deste ambiente, inserindo tais processos nas dinâmicas de sociabilidade dentro do mesmo, bem como considerando também a esfera subjetiva dos sujeitos que experenciam estas. Palavras-chave: Construção da Identidade; Memória; Juventude; Interação Social. 11- ENTRE CÁQUIS E LEMBRANÇAS: O COLÉGIO ESTADUAL DA PRATA COMO ESPAÇO DE MEMÓRIA E PATRIMÔNIO EDUCACIONAL CAMPINENSE Ramon de Alcântara Aleixo Universidade Estadual da Paraíba-UEPB. ¹ [email protected] Profa. Patrícia Cristina de Aragão Araújo Universidade Estadual da Paraíba- UEPB. ² Resumo: Este estudo se destina a analisar, a partir do conceito de memória coletiva, as múltiplas percepções de ex-alunos/as acerca da vivência discente à frente do Colégio Estadual de Ensino Médio Dr. Elpídeo de Almeida, mais conhecido como o ―gigantão da Prata‖, em virtude de suas instalações físicas –uma das maiores do estado da Paraíba- e de sua localização no bairro da Prata, na cidade de Campina Grande-PB. Dessa forma, propomos, a partir de depoimentos dos sujeitos históricos atuantes na tessitura da trama cotidiana desse espaço educacional, buscar compreender a dinâmica social em que este espaço de aprendizagem está imerso, 36 bem como as múltiplas experiências vividas nesta instituição; objetivando, dessa forma, a elucidação de uma perspectiva patrimonialista que vise perceber, a partir da memória coletiva presente em seus relatos, esta instituição de ensino como lugar de memória acerca da instrução publica campinense e, consequentemente, atentarmos para a efetivação de políticas públicas de preservação histórica atinentes a esta instituição de ensino. Referenciamo-nos teoricamente nos trabalhos desenvolvidos por CERTEAU (1994), FOUCAULT (1999), HALBWACHS (1990), e NORA (1993). Como procedimento metodológico, recorremos aos arquivos da referida instituição (fotografias, diários de classe, ofícios da inspetoria federal e estadual de ensino), bem como aos relatos de ex-alunos/as acerca de suas experiências e percepções no que tange a tessitura da história da educação campinense, em especial às suas vivências nessa instituição educacional. Os resultados preliminares apontam para a iminente necessidade de efetuarmos políticas publicas que visem à percepção da referida instituição como patrimônio educacional campinense, no qual estão imersos histórias de vida que necessitam vir à tona, sob pena de ficarem esmaecidas e se perderem na dinâmica social bastante fluida em que estamos inseridos nesses tempos para além da modernidade. Palavras-chave: Memória; Patrimônio educacional; Colégio Estadual da Prata. 12MEMÓRIAS (RE)EDITADAS E IDENTIDADES INSTITUÍDAS: RASTREANDO BIOGRAFIAS SENTIMENTAIS Silêde Leila Oliveira Cavalcanti3 [email protected] Resumo: O desafio de investigar temáticas no campo das subjetividades e dos sentimentos, tendo como recorte temático as sensibilidades afetivas de idosos(as) na contemporaneidade, articuladas as identidades de gênero e de família, me conduziu ao encontro de biografias, lembranças, narrativas e memórias como suporte documental imprescindível de minhas análises e elaborações teórico- metodológicas da pesquisa do trabalho de doutoramento que ora realizo. A crença do direito/dever da memória como caminho de reconhecimento social tem sido enfatizada por movimentos sociais e atitudes políticas de 3 A autora é professora da unidade acadêmica de História e Geografia do Centro de Humanidades da Universidade Federal de Campina Grande e doutoranda pela Universidade Federal de Pernambuco 37 determinados grupos sociais marginalizados e silenciados sócio e historicamente em seus valores, demandas e desejos. Debruço-me sobre as memórias involuntárias, fugidias, abandonando o campo da memória voluntária, já historicizada e consagrada na contemporaneidade, visto que na operacionalização historiográfica das memórias, tem se dado ênfase e consagração a memória como faculdade intelectual e cognitiva, como produtora do conhecimento, mutilando a polissemia das memórias em suas várias dimensões e estatutos, tão bem enfatizados por Proust e Bérgson, e considerando sua trifuncionalidade que seriam a memória-ação, a memória-afetiva e a memória conhecimento. Palavras - chave: Memórias; identidades; sentimento. 13- “...E SEM O SEU TRABALHO O HOMEM NÃO TEM HONRA” NOTAS SOBRE AS TRANSFORMAÇÕES NO MUNDO DO TRABALHO, DESEMPREGO, POLÍTICAS DE PROTEÇÃO SOCIAL E IMPACTOS NA IDENTIDADE SOCIAL E MOVIMENTO SINDICAL Ana Maria Morais Costa Mestranda do PPGCS/UFRN [email protected] Dr. José Willington Germano Orientador [email protected] Resumo: Este trabalho apresenta algumas reflexões sobre as transformações no mundo do trabalho e os impactos na sociabilidade contemporânea, destacando as identidades sociais e a organização política e sindical das pessoas que vivem do trabalho. Discute as implicações da revolução tecnológica sobre os empregos e os efeitos sociais que se apresentam como altas taxas de desemprego, exclusão social, insegurança e precariedade das novas formas de ocupação, queda dos salários reais, que afetam as dimensões materiais e subjetivas da classe trabalhadora. As ferramentas de análises aqui empreendidas foram construídas a partir da leitura da obra de Robert Castel: As metamorfoses da questão social – uma crônica do salário, ampliada com a revisão da bibliografia específica desta temática. O enfraquecimento da condição salarial é abordada por Castel (2001) como uma questão social. A condição do trabalhador assalariado esteve por muito tempo à margem da sociedade; em seguida subordinada. Porém no momento em o trabalho é reconhecido como principal atributo para caracterizar o status que situa e classifica um indivíduo na sociedade em detrimento do pertencimento familiar e comunitário, a centralidade do trabalho é recolocada em questão. Para o autor, 38 o trabalho seria uma forma de coesão social, muito mais, que uma condição de tarefa remunerada. De modo que, o perfil de ―trabalhadores sem trabalho‖, resulta no enfraquecimento da condição salarial e fragilização da solidariedade social. Palavras-Chave: Trabalho assalariado; Identidade social; Movimento sindical. 14- EXPERIÊNCIAS DE VIUVEZ NA VELHICE Kátia Ramos Silva (UFCG) Benedita Edina da Silva Lima Cabral (Orientadora/UFCG) [email protected] Resumo: O acentuado aumento da expectativa de vida da população mundial e brasileira, em particular, provoca sensíveis alterações na dinâmica familiar e relacional, que caracterizam a sociedade contemporânea. É neste contexto que o segmento populacional que adquire cada vez mais espaço nos debates acadêmicos e nas políticas públicas é aquele que atinge a faixa etária dos 60 anos de idade. Na discussão sobre o tema idoso e família, um aspecto desperta a atenção dos estudiosos é o estado conjugal da população idosa, na medida em que dados demográficos apontam para a significativa prevalência da viuvez na velhice. Esse dado, portanto, adquire importância expressiva na análise da velhice na contemporaneidade, visto que essa condição conjugal modifica, de maneira singular, a dinâmica familiar e as estruturas da sociedade. Partindo desse pressuposto, esse trabalho tem o objetivo de atentar para as experiências de viuvez, de homens e mulheres com 60 anos e mais de idade, que passaram de uma condição de conjugalidade para a de viuvez na velhice. Para tanto, entrevistamos sete mulheres e três homens e os registros coletados durante a realização das entrevistas foram analisados à luz de um referencial teórico referente aos temas: velhice, família, viuvez e morte. Assim, as experiências de tornarse velho e vivenciar a condição de viuvez conduzem a uma maior reflexão sobre essa condição peculiar e apontam para um universo denso da vida conjugal. 15- OPERAÇÃO DEMOCRÁTICA: GILBERTO FREYRE E SEUS ARTIGOS NA IMPRENSA NO PERÍODO 1964-1979 Rachel Soares Cavalcanti [email protected] Jean Carlos UFPB – PPGS 39 CAPES Resumo: Este trabalho consiste em analisar como Gilberto Freyre utilizou particularidades teóricas contidas em sua obra como elemento de legitimação de um regime de poder; utilizando como base seus artigos publicados na imprensa no período de 1964 a 1979. Com base em algumas abordagens oferecidas por Freyre, tais como as relações entre o nacional e o regional, o patriarcalismo, o embate do tradicional face ao moderno, entre outras, procuro identificar como o autor reproduziu e incorporou temáticas encontradas em sua obra para legitimar o Golpe Militar. Utilizo os artigos publicados no Diário de Pernambuco, Jornal do Comércio e na revista O Cruzeiro como suporte do presente estudo. Procuro perceber o que tem em comum na obra freyriana e em seus escritos na imprensa durante o período citado. Em seus artigos publicados na imprensa durante o regime militar, Freyre expande essa idéia de região para nação, e partindo de um mesmo artifício, o autor faz um chamado à população para deter o movimento comunista e fazer uma ―reconstrução social‖. A fundamentação teórica utilizada em ambos os casos é a mesma, o que difere são as condições históricas, o posicionamento de Freyre diante um novo quadro político e o modo de como ela é utilizada. É interessante pensar como um autor tão conhecido pela sua ousadia, principalmente em Casa Grande & Senzala, abarrotou a imprensa de escritos legitimando a Ditadura. Este estudo também se propõe a analisar essa ―aparente‖ dualidade que existe entre o seu pensamento teórico e seu posicionamento político durante o Regime Militar. Utilizo como referencial teórico autores como Ricardo Benzaquen, Jessé Souza, Carlos Guilherme Mota, entre outros. Sendo assim, procuro fundamentar o objetivo o qual me proponho. Além das obras do próprio Freyre e dos seus artigos publicados durante a Ditadura. Este trabalho tentará construir uma discussão acerca de várias questões que permeiam a formação do pensamento social brasileiro. Palavras-Chaves: nacionalismo; regionalismo; regime militar; democracia 16“MÃE É TUDO IGUAL”: ESTRATÉGIAS DE DESLEGITIMAÇÃO MORAL DE MULHERES COM FILHAS EM UMA INSTITUIÇÃO ABRIGO Gilson José Rodrigues Junior Universidade Federal de Pernambuco (PPGA-UFPE) Graduado em Ciências Sociais (UFRN) Mestrando em Antropologia (Bolsista CAPES) [email protected] 40 Resumo: A presente pesquisa é fruto da elaboração da dissertação de mestrado, que tem como foco pensar sobre as estratégias de deslegitimação, quando não legais, morais, que estigmatizam algumas mulheres com filhas (crianças e adolescentes) assistidas por uma ONG de orientação católica – Escola Profissional Lar de Nazaré (LN)- em caráter de abrigo. Neste sentido, busquei manter conversas informais com os diferentes atores que compõe este universo: equipe que coordena o LN, juiz e promotor da infância e juventude, técnicos sociais (psicólogos, pedagogos, assistentes sociais), conselheiros tutelares, e algumas das referidas mulheres. Isto tem permitido pensar sobre a construção da cidadania moderna enquanto parte de um ―processo civilizador‖, que não ocorrendo de forma homogênea, exaltará certos indivíduos em detrimento de outros. Neste trabalho específico, as crianças e adolescentes são percebidos como os principais alvos desse processo, a partir de uma gramática moral naturalizada, enquanto as mulheres, quando não correspondem aos ideais de ―eterno feminino‖ e ―amor materno‖, são rebaixadas socialmente, passando por um tipo de processo ―descivilizador‖. Palavras-chave: Cidadania; Instinto materno; Processo civilizador; Invisibilização social. 17- O MESTRE DE CAPOEIRA: GENEALOGIA, RITUAIS E VALORES Juliana Carmen Brito Rodrigues Mestranda em Sociologia – UFPB Prof. Dr. Antônio Giovanni Boaes Gonçalves (UFPB) Orientador Resumo: Este artigo propõe a análise da figura do mestre de capoeira. Com base na literatura referente ao tema, procura investigar a origem histórica dessa figura, bem como a sua importância, no meio em que está inserida. Dialogando com autores das Ciências Sociais, busca compreender o imaginário que se constrói em torno do mestre e propõe uma discussão sobre a maneira como esse simbolismo é construído. Os rituais da hierarquia e do respeito, que estão entre os valores transmitidos pelos mestres, através das gerações, por meio da oralidade (tradição oral), também serão analisados, na tentativa de demonstrar que, em meio a esse vasto universo de sabedoria, existem questões que são comprovadas historicamente (fatos) e outras que são parte do imaginário popular (mitos). 41 Palavras-chave: Mestre de capoeira; Hierarquia; Tradição oral; Fatos; Mitos. 18 - MEMÓRIA: IDENTIDADES VESTÍGIOS PARA CONSTRUÇÃO DE Paula Rejane Fernandes UEPB [email protected] Resumo: Os marcos temporais contribuem para a produção de identidades. Eles, dentro de uma cidade, são bastante visíveis uma vez que são edificados a partir de alguns acontecimentos elegidos como sendo importantes e marcantes na história da cidade. A memória tem um papel político, por isso, para nós historiadores, a importância de pensarmos o porquê de uma sociedade, grupo étnico, cidade, nação lembrar muito de algo, de determinados fatos, datas e esquecer outros. Devemos entender e investigar as memórias como sendo uma ―moeda‖ valiosa na construção de identidades e legitimação de poderes sejam eles políticos ou simbólicos. Sendo assim, devemos não cultuar as memórias, mas estabelecer com elas uma relação de investigação e problematização que possa nos ajudar a entender a passeidade, entender como uma época, uma sociedade, uma cidade nomeia a si mesma, as mudanças pelas quais passa e forja marcos identitários. 19- UM OUTRO OLHAR SOBRE A VIDA ASILAR Carla Gabriela Mendes de Azevedo (UFCG) Thaiany Evangelista da Costa (UFCG) [email protected] Resumo: O Asilo é uma Instituição burocrática cuja organização é fundada em normas e regulamentos voltados para atender o idoso razoavelmente confortável. Abrigam idosos que por vontade própria escolhem ali viver e aqueles abandonados por suas famílias, dentre outros motivos. Neste trabalho discutimos o impacto do abandono de idosos por suas famílias, buscando analisar o significado a fragilidade dos laços familiares, bem como perceber como o asilado assimila a distância da vida familiar e social. Palavras-chave: Idoso; Asilo; Família 20- “O TEMPO DO CATIVEIRO, O TEMPO DA LIBERDADE”: HISTÓRIAS DE VIDA DE TRABALHADORES RURAIS ASSENTADOS José Márcio da Silva Vieira 42 [email protected] José Anchieta Bezerra de Melo [email protected] Resumo: Este trabalho resulta de uma pesquisa realizada em assentamentos rurais situados no município de Sumé, microrregião do Cariri do Estado da Paraíba. Intenciona analisar relatos orais de agricultores ―ex-sem-terra‖, atualmente assentados da reforma agrária, a partir da oposição entre dois períodos distintos na história de suas vidas: o chamado ―regime de patrão‖ versus ―a vida de assentado.‖ No primeiro caso, os trabalhadores rurais relembram e atribuem significados àquele período, em que trabalhavam na condição de ―parceiros‖, ―meeiros‖, ―moradores‖ de latifundiários da região, época geralmente descrita a partir de expressões do tipo ―tempo do cativeiro‖, ―tempo da sujeição‖ em que se ―trabalhava para os outros.‖ No segundo, por sua vez, os mesmos o vêem como o ―tempo da liberdade‖, em que tudo que se produz ―é para a família.‖ Como embasamento teórico, utilizamos autores como Sidersky, para quem, o camponês se diferencia dos demais trabalhadores assalariados, pelo fato de deter, ainda que de maneira relativa, o controle sobre os instrumentos de produção, o tempo e organização do trabalho etc. 21- ESTUDOS CULTURAIS, INFÂNCIAS E IDENTIDADES ETÁRIAS Keila Queiroz e Silva (UFCG) Jannefrance Gonçalves da Costa [email protected] Resumo: Os estudos culturais sobre infância têm contribuído para o processo de relativização das experiências infantes considerandose suas diversidades espaço-temporais. A nossa pesquisa etnográfica acerca das cartografias infantes paraibanas partiu do pressuposto teórico-metodológico de que as identidades são relacionais, portanto do reconhecimento de que só é possível dar visibilidade às diversas sensibilidades infantes se assumirmos uma leitura destas em relação às outras identidades etárias. Conforme dispôs Sacristan (2006) quem inventou historicamente o menor foram os adultos da sociedade moderna ocidental, colocando-os na condição dos que ainda vão ser. Os sujeitos da nossa pesquisa, além das crianças foram os idosos cuidadores e provedores destas que constroem as suas identidades no cotidiano de famílias que denominamos de avoternais (SILVA,2008). A reconfiguração das identidades senescentes foi possível, não reproduzindo os discursos que inventaram a terceira idade ou a velhice bem-sucedida, mas tendo como referência simbólica as experiências de mulheres 43 idosas pobres que vivem situações diárias de risco e fragilidade tentando assegurar aos seus netos e bisnetos o mínimo de segurança, dignidade e sentimento de família. Palavras-chave: infâncias, estudos culturais, identidades etárias GT 1: HISTÓRIA ORAL, MEMÓRIA E IDENTIDADE RESUMOS EXPANDIDOS 01 - HISTÓRIA ORAL: REFLEXÕES SOBRE A CONSTRUÇÃO DE UM CAMPO METODOLÓGICO José Anchieta Bezerra de Melo Mestrando/Programa de Pós-Graduação em Sociologia - PPGS / UFPB) [email protected] José Márcio da Silva Vieira Mestrando/Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais - PPGCS/ UFCG). [email protected] Ao longo dos séculos, a História Oral se constituiu como a maior fonte humana de produção, conservação e difusão do conhecimento. Muitos estudiosos buscam na Grécia antiga as suas origens, apresentando Heródoto como o pai da história oral (TREBITSCH, 1994:25). No entanto, é apenas na década de 1960 que a construção de um campo metodológico nomeado ―História Oral‖, é defendido por historiadores que começaram a utilizar a fonte oral, o que gera um debate intenso e polêmico com aqueles pesquisadores que utilizam basicamente os documentos escritos. Nas Ciências Sociais, no entanto, a fonte oral obtida através das técnicas de histórias de vida, entrevistas estruturadas e semiestruturadas é utilizada desde os primórdios da disciplina no início do século XX como instrumentos da metodologia qualitativa. A utilização de fontes orais pelos historiadores aproxima a História das ciências humanas particularmente, da Antropologia. (HAGUETTE, 1997). Na antropologia, o trabalho de campo, que inclui tanto as falas dos sujeitos pesquisados quanto a observação de comportamentos é constituinte da própria disciplina, no entanto, as fontes orais são colocadas sob suspeita por alguns historiadores. Nos Estados Unidos da América, a História Oral, teve sua origem datada em 1984 com a fundação do Columbia History Office que visava preservar a memória das elites econômicas e culturais do país. Mas somente em 1964 é que passaria por um momento de extensa produção e criação. De um número de 80 centros no ano de 1961, em 1965 esta quantidade irá atingir quase 300 44 departamentos. O clima contestador e revolucionário da década de 1960 contribui para o uso cada vez mais freqüente da História Oral. A América não estava resumida apenas á guerra do Vietnã, paralelamente ao nacionalismo de muitos americanos, uma outra America surgia, revelada através do movimento negro, feminista, das minorias étnicas, dos imigrantes latinos e daqueles taxados de ―delinqüentes‖, também possuidores de um nacionalismo, porém, marcado por uma visão idealista e existencialista. Assim, cientistas políticos e historiadores pretendiam ―dar voz‖ às minorias, construindo, assim, a chamada história ―vista de baixo‖, história dos humildes e dos sem história. Ela tira do esquecimento aquilo que a história oficial sepultou (TREBITSCH, 1994:23), e se posiciona contra a ficção da subjetividade defendida pelos positivistas. Esta atenção que a História Oral dedicou às chamadas minorias sociais, ressaltou a importância de memórias subterrâneas que vão de encontro com a memória oficial e a memória nacional. (POLLAK, 1989:04). A década de 80 representa a consagração da História Oral no mundo. Em Bucareste, no Congresso Internacional das Ciências Históricas, ela vai finalmente tornar-se legitima no cenário cientifico histórico. Em 1980, com a fundação do International Journal of Oral History, teremos a institucionalização e mundialização da História Oral, com a publicação de grandes obras. O desenvolvimento de análises de caráter metodológico, no entanto, não significará um rompimento com a perspectiva militante. Ao contrário, nos países do leste europeu, logo após a queda do comunismo, a História Oral vai surgir como um recurso libertador para povos que permaneceram em silêncio por meio século. No caso brasileiro, a História Oral segue mais ou menos as trilhas dos europeus e norte-americanos. O seu desenvolvimento por aqui data de 1970. Em 1974 é criado o grupo de documentação em Ciências Sociais (GDCS). A idéia era criar arquivos na área de Ciências Sociais, com o objetivo de contribuir para a preservação de documentos necessários aos estudiosos das ciências sociais no Brasil. Em 1975, patrocinada pela Fundação Ford, é realizada a primeira experiência com História Oral no Brasil. (FERREIRA, 1998:19: 30). Nos anos 1975 e1977, após dois primeiros cursos, tentou-se alargar as fronteiras da História Oral no Brasil, mas isto se deu de forma precária e desorganizada. A partir dos anos 1990, ela ascende com força suficiente para ser reconhecida, nacional e internacionalmente numa articulação da academia com um crescente número de encontros promovidos, pautados na criação da Associação Brasileira de História Oral, e frente a uma demanda social ampla que passou a abranger a disciplina. 45 O boom da História Oral nos anos 1990, com sua incorporação pelos programas de pós-graduação em história, a disseminação de cursos e a multiplicação de seminários em todo o mundo. Por outro lado, o estabelecimento e o aprofundamento de contato com pesquisadores estrangeiros e com programas de reconhecido mérito internacional, propiciados por esses encontros, criaram canais importantes para o debate e a troca da experiência. (FERREIRA, 1998:23). A História Oral foi alvo de diversas criticas, principalmente de historiadores que utilizam e apenas legitimam fontes escritas como documento na história. Uma das criticas mais sérias é o questionamento da legitimidade dos documentos orais devido a influencia da subjetividade dos informantes. No entanto, os documentos escritos também não estão isentos da subjetividade de quem os produzem, bem como dos interesses e intenções dos envolvidos na elaboração do documento. Os trabalhos baseados nos relatos orais tentam incorporar as vantagens da subjetividade dos documentos produzidos pela metodologia da História Oral. Se por um lado há divergências com relação ao uso da História Oral, podemos considerar como positivo a extensão do campo que ela conquistou. Se na origem, ela foi associada ao estudo das minorias, dos marginalizados, atualmente, incorporou no seu campo um debate teórico-metodológico profícuo. O reconhecimento e a adesão por um considerável número de pesquisadores de diferentes disciplinas demonstram o seu êxito. REFERÊNCIAS BOSI, Ecléa. Memória e Sociedade: lembranças de velhos. 3. ed., São Paulo, Companhia das Letras, 1994. FERREIRA, Marieta de M. História oral e tempo presente. In: (Re) Introduzindo a História Oral no Brasil. (org.) José Carlos Sebe Bom Meihy. São Paulo: Xamã, 1996. p. 11-21. FERREIRA e AMADO. Usos e Abusos da História Oral. 1998, 2ª Ed. HAGUETTE, Tereza Maria Frota. Metodologias Qualitativas na Sociologia. Petrópolis. 5. ed. Vozes. 1997. LE GOFF, Jacques. História e Memória. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1996. POLLAK, Michael. Memória e Identidade Social. In: Estudos Históricos. Rio de Janeiro, vol. 5. n. 10, 1992, p. 200-215. MEIHY, J. C. S. B. Manual de história oral. São Paulo, Edições Loyola, 1996. MONTENEGRO, Antonio Torres. História oral e memória: a cultura popular revisitada. São Paulo: Contexto, 1992. 46 PRINS, Gwyn. História oral. In: BURKE, Peter (org.). A escrita da história: novas perspectivas. São Paulo: Editora da UNESP, 1992. p.163-198. SIMSON, Olga Rodrigues de Moraes (org.). Os desafios contemporâneos da história oral. Campinas: CMU/UNICAMP, 1997. THOMPSON, P. A voz do passado: história oral. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1992. THOMSON, Alistair. Recompondo a memória: questões sobre a relação entre História Oral e as memórias. Projeto História, São Paulo, n.15, abr.1997, p.51-71. TREBITSCH, Michel. "A função epistemológica e ideológica da história oral no discurso da história contemporânea". In: Marieta de Moraes Ferreira (org.), História oral e multidisciplinaridade. Rio de Janeiro, Diadorim/Finep, 1994, p.19-43. O2 - SIGNOS E LINGUAGEM CORPORAL NA CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE SOCIAL NO INTRAMUROS: A PRÁTICA DA TATUAGEM CARCERÁRIA Adriana Pereira de Sousa Mestranda em Sociologia – PPGS – UFPB Este trabalho é uma reflexão prévia do resultado parcial da pesquisa de campo realizada sobre ―a prática da tatuagem carcerária‖ em João Pessoa – Estado da Paraíba, tendo como seu principal objetivo analisar a prática da tatuagem carcerária como signos de representação de poder, demarcação de território, subjetividade do indivíduo e construção de uma identidade individual e social no intramuros do Instituto Penal Desembargador Silvio Porto. A partir de entrevistas livres e direcionadas com os reclusos, foi possível constatar que a tatuagem carcerária pode ser entendida como uma linguagem específica e codificada entre a comunidade de cativos, porém, a sua prática se reveste de várias nuanças e significados de acordo com o lugar e o resultado pretendido pelo ator. Dentro dessa sociedade a tatuagem traz em si uma prática de uso cultural e social delineada pelos conflitos interiores e exteriores na construção da identidade individual e social do indivíduo, estes resultantes das inter-relações sociais. Partindo do pressuposto que o poder não é um atributo exclusivo do Estado, e sim, um exercício constante que se realiza de várias maneiras e em locais distinto estando sempre presente nas relações sociais, a prática da tatuagem carcerária encontra-se dentro desse contexto. O indivíduo tem a possibilidade de marcar o seu corpo de acordo com a simbologia que ele queira representar em relação ao crime cometido, sendo esta uma forma de exibição 47 de periculosidade, exprimindo um sentido de intimidação e ao mesmo tempo de poder sobre àqueles que são considerados mais fracos (FOUCAULT, 1987). Quando o indivíduo adentra ao intramuros, a partir do momento em que ele cruza o portão de entrada da sociedade dos cativos há uma ruptura brusca da sua identidade individual e social, a partir de então, este desenvolverá novas formas de comportamento e novas redes de sociabilidades independentemente da sua vontade, construindo sua identidade individual e social a partir das regras estabelecidas no intramuros, sendo estas regras a imbricação das regras institucionais com as regras estabelecidas pela própria comunidade dos cativos que já estavam postas e estabelecidas muito antes da sua chegada nesse mundo novo. Segundo Goffman (2005), a barreira que as instituições totais colocam entre o internado e o mundo externo assinala a primeira mutilação do eu. Portanto, essa nova identidade será construída no limiar tênue entre a ruptura brusca da identidade do eu do mundo em sociedade o qual ele vivia e a nova identidade que passa a ser construída a partir da entrada no cárcere onde a mutilação do eu acontece a todo instante e em todos os aspectos da vida social. Assim, ―a vida do internado é constantemente penetrada pela interação de sansão vinda de cima, sobretudo sobre o período inicial de estada, antes de o internado aceitar os regulamentos sem pensar no assunto‖ (GOFFMAN, 2005, p. 42). Para esse indivíduo, o conflito entre o mundo externo e o mundo interno o qual agora ele pertence mesmo contra a sua vontade o levará a uma crise de identidade sem precedentes, esta muitas vezes caracterizada com sentimento de revolta, violência, amargura, angústia e solidão. Resultante desses conflitos entre o eu individual e o eu social que está em transformação e em desenvolvimento constante aparecem às primeiras tatuagens do cárcere. Pude observar que a maioria dos indivíduos que trazem tatuagens em seus corpos ligadas a criminalidade foram feitas nos primeiros anos de estada, período de adaptação das regras institucionais e das regras sociais criadas pela própria comunidade dos cativos, as quais na maioria das vezes vão de encontro com o seu eu que foi expropriado sem o seu consentimento enquanto indivíduo e sujeito. Considerando o intramuros como uma sociedade específica a ser analisada, a inter-relação entre os próprios cativos e estes com a instituição propicia a construção de uma história que segue um curso não pretendido ou planejado por qualquer dos indivíduos que compõem essa rede de sociabilidades (ELIAS, 2004). Dentro desse contexto singular a sociedade dos cativos é o resultado das interrelações entre os próprios cativos, entre os cativos e o corpo de funcionários, entre os cativos e a própria instituição e entre o corpo 48 de funcionários e a instituição, onde o poder perpassa por todas as esferas das inter-relações sociais. No sistema prisional o indivíduo é considerado singular em seu modo de ser, agir e pensar, mas, ao mesmo tempo ele compartilha comportamentos, pensamentos e sentimentos em comum dentro da sociedade da qual está inserido. Todos os aspectos da vida são realizados num mesmo local, sob uma única autoridade, todos recebem o mesmo tipo de tratamento e são obrigados a fazer as mesmas coisas em companhia de muitos outros com regras e horários rigorosamente estabelecidos independentemente da sua vontade. Toda atividade é imposta de cima, por um sistema de regras explícitas vigiadas por um grupo de funcionários (GOFFMAN, 2005). Dessa forma, a construção da identidade social torna-se conflitante para o indivíduo, uma vez que, cada indivíduo interage de acordo com a sua singularidade e é visto e tratado sem distinção individual, o tratamento dispensado é comum a todos, sem diferenciação alguma, aos olhos da instituição são considerados apenas como um único corpo social. A tatuagem carcerária também é uma prática resultante da construção de uma identidade individual e social que perpassa pelas redes de poder e de relação entre seus pares e o corpo institucional. Sendo esta apresentada como uma imbricação dessas relações, onde o indivíduo inscreve em sua pele a partir da sua subjetividade, exteriorizando o conflito entre o eu individual e o eu social dentro dessa sociedade específica. Ao adentrar numa instituição total, durante o processo de aniquilação do eu em sociedade e a construção do eu no intramuros o indivíduo vive um conflito interior em relação a sua identidade, quem ele era não pode ser mais, assim, este eu social ficará em sua memória, pois, não condiz com a sociedade da qual esse indivíduo passou a fazer parte. É nesse limiar que as primeiras inscrições na pele dentro do cárcere decorrem com um caráter especificamente ligado a pessoa do criminoso e que mais tarde perante seus pares essas inscrições a flor da pele ganhará o respaldo de virilidade, força e masculinidade atribuindo-lhe status social. Alguns desenhos demonstram claramente essa evidência devido a sua especificidade. A parte do corpo escolhida para ser tatuada faz parte de um ritual de identificação do prisioneiro enquanto tal, na intenção de exibir em seu corpo a sua periculosidade, ser temido e respeitado, uma imposição velada, onde o indivíduo não precisa dizer quem é, basta olhar-lhe para temê-lo e não ousar enfrentálo. É um tipo de aviso estampado no corpo, para ser temido, respeitado e obedecido. 49 A tatuagem carcerária pode ser entendida como uma linguagem específica e codificada entre a comunidade de cativos, porém, a sua prática se reveste de várias nuanças e significados de acordo com o lugar do ator e o resultado pretendido. Alguns se tatuam apenas pelo simples fato de gostarem de tatuagem, ou ainda para passar o tempo. Outros na intenção de forjar uma identidade para ter ―consideração‖ perante seus pares. Alguns desconhecem os significados dos desenhos relacionados com a criminalidade, só depois de tatuarem-se é que então tomam ciência, porém, os casos mais comuns são àqueles em que a tatuagem representa signos de criminalidade, e esta está ligada diretamente ao conflito entre o eu individual e social do indivíduo em sociedade e a construção da identidade individual e social do recluso no intramuros. O desenho escolhido e o local a ser tatuado denunciam características particulares da personalidade de cada indivíduo, falando por si só, o desenho expressa na maioria das vezes os seus sentimentos mais íntimos. A tatuagem carcerária é a expressão mais significativa do ser humano que está por trás do criminoso, onde este inscreve em sua pele a sua história de vida e do cárcere, através dos signos o indivíduo revela os seus sentimentos e segredos mais secretos que jamais ousaria revelá-los. REFERÊNCIAS BRETON, David Le. A Sociologia do Corpo. 2 ed. Petrópolis: Vozes, 2007. CARDOSO DE OLIVEIRA, Roberto. Caminhos da Identidade: ensaios sobre etnicidade e multiculturalismo. São Paulo: UNESP; Brasília: Paralelo 15, 2006. COELHO, Edmundo Campos. A Oficina do Diabo. Rio de Janeiro: Record, 2005. ELIAS, Norbert. A Sociedade dos Indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994. FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. 16 ed. Petrópolis: Editora Vozes, 1997. GOFFMAN, Erving. Estigma: Notas sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada. 3. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,1980. _______ Manicômios, Prisões, e Conventos. 7ed. São Paulo: Perspectiva, 2005. MARQUES, Toni. O Brasil tatuado e outros mundos. Rio de Janeiro: Rocco, 1997. OSÓRIO, Andréa Barbosa. O Gênero da Tatuagem: Continuidades e novos usos relativos à prática na cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2006. Tese (Doutoramento em Antropologia Social) Programa de Pós-Graduação em Sociologia e 50 Antropologia – PPGSA, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais – IFCS, Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. RAMALHO, José Ricardo. Mundo do Crime: A Ordem pelo Avesso. 2 ed. Rio de Janeiro: Grall, 1983. RODRIGUES, Guilherme Silveira. Código de Cela: O Mistério das Prisões. São Paulo: WVC EDITORA, 2001. SOUSA, Adriana Pereira. O uso do corpo como tela de arte: a trajetória da tatuagem em João Pessoa. João Pessoa, 2007. Monografia (Trabalho Acadêmico de Conclusão de Curso em História), Universidade Federal da Paraíba. 03 - VELHICE E EDUCAÇÃO: UM ESTUDO SOBRE AS EXPERIÊNCIAS COTIDIANAS VIVIDAS POR IDOSOS EM PROGRAMAS DE ALFABETIZAÇÃO Elânia De Moura Rocha (MS. SOCIOLOGIA -UFCG/FAESF) [email protected] Introdução: O crescimento acelerado da população idosa no Brasil nas últimas décadas pôs em evidência a problemática relacionada à velhice, tanto do ponto de vista estritamente médico, quanto do socioeconômico. A questão ganhou nova relevância entre as preocupações dos governos, da sociedade e dos meios científicos. Face ao quadro atual e prospectivo do envelhecimento populacional e sua transformação em ―problema social‖, passaram a ser preocupações da sociedade as questões relacionadas à promoção da saúde e bem estar de idosos; a integração das diversas gerações, bem como a busca para reduzir os preconceitos com relação à idade cronológica e a vida de aposentado, dentre outras. Desse modo, a educação para idosos passou a fazer parte das políticas públicas e das mais diversas propostas associativas, tornando-se uma via para manter ativos socialmente os que envelhecem. Os Grupos de Convivência e as Universidades da Terceira Idade amparadas pela Política Nacional do Idoso (Art. 10 da Lei n. 8.842 de 04/01/1994) têm desempenhado um papel importante com a criação de programas educacionais para atender esta camada da população. Esses programas se tornaram modelos aceitos e implementados pela ação estatal, consolidando-se como alternativas de uma política social que legitima essas atividades. Segundo dados do IBGE (2004) constata-se, que existiam no Brasil 15,1 milhões de analfabetos acima dos 15 anos. Entre a população idosa o analfabetismo funcional totaliza 49%, 23% declaram não saber ler e escrever, 4% afirma só saber ler e escrever o próprio nome e 22% considera a leitura e a escrita atividades penosas. Tfouni (2004) mostra que as conseqüências do analfabetismo na conjuntura das sociedades contemporâneas são amplas: constitui 51 um empecilho à liberdade plena das pessoas, afeta a auto-estima, e é também um impedimento concreto ao exercício da cidadania. Inegavelmente, em uma sociedade de conhecimento cada vez mais socializado e diversificado, a educação se torna imprescindível para a melhoria da qualidade de vida de todas as pessoas e também das mais velhas, sendo essencial para desmistificar verdades consolidadas e construir novos significados sobre o envelhecimento e outros aspectos da vida humana. Diante disso, este estudo teve como objetivo analisar as experiências de alfabetização vivenciadas por idosos beneficiados pelas políticas de inclusão realizadas em grupos para terceira idade. Materiais e Métodos: Este estudo se caracterizou por uma abordagem etnográfica para construir um estudo de caso sobre alfabetização de idosos. Optou-se por esse procedimento para desvelar os significados que indivíduos idosos atribuem às experiências de aprendizagem, uma vez que a pesquisa etnográfica pressupõe a descrição e a interpretação em busca de explicar o quê as pessoas fazem em um determinado ambiente (a sala de aula, por exemplo), quais os resultados de suas interações, e qual o entendimento têm do que estão fazendo (GEERTZ, 1989). O lócus de investigação empírica o Centro Municipal de Convivência do Idoso - CMCI , da Prefeitura Municipal de Campina Grande – PB é o cenário real onde a atividade especifica de alfabetização e letramento se desenvolveu e tornou-se objeto desse estudo durante o ano de 2006 e 2007. Foram selecionados para pesquisa 08 idosos (01 homem e 07 mulheres) na faixa etária entre 50 e 79 anos que freqüentavam assiduamente as aulas do Projeto EJA do Centro Municipal de Convivência do Idoso. Para apreender as significações que os idosos atribuem as suas experiências de alfabetização, priorizamos como instrumentos de coleta de dados: 1) a observação direta, o que permitirá o contato face a face com os sujeitos da pesquisa, para acompanhar as ações dos atores em seu contexto natural, a partir de suas perspectivas e seus pontos de vista (CHIZZOTTI, 1998); 2) a entrevista semi-estruturada em que nos dirigimos aos sujeitos através de algumas perguntas iniciais pré-estabelecidas, que servem para desencadear uma conversa sobre suas práticas de alfabetização. Para sistematização dos dados e análise do conjunto de informações obtidos no trabalho de campo utilizamos à abordagem qualitativa visando ―interpretar a compreensão dos atores sociais no contexto cultural em que produzem a informação‖ (op.cit., 99). Resultados e Discussão: Constata-se que os alunos pesquisados têm idades compreendidas entre 50 e 79 anos. Como já demonstrado por diversas pesquisas (MOTTA, 1997; CABRAL, 52 1997; DEBERT, 1999) também registramos concentração maior do sexo feminino. Apesar da diferença etária no grupo remanescente demonstra disposição e desejo de participar de atividades educacionais, certamente para dar um novo sentido à vida, e ainda, superar estereótipos da velhice, tão discriminada em nossa sociedade. Constata-se ainda que 75% dos participantes moram com a família, enquanto 25% residem sós. Conforme esclarecido nas entrevistas a maioria reside com os filhos, netos, genros e noras. Vários estudos mostram a importância da família, considerando-se as relações familiares como imprescindíveis para os idosos. Quanto ao estado civil, encontramos um número maior de mulheres viúvas 37,5%, 25% casadas e 25% são solteiras. Segundo dados do IBGE em nossa sociedade prevalecem um elevado contingente de viúvas, as quais contrastam com a alta proporção de homens casados. Quanto aos padrões de renda econômica constatamos que 37,5% recebem aposentadoria, 12,5% são aposentadas e pensionistas. Sendo que 12,5% são assalariadas e 12,5% são pensionistas. Dos motivos de vir para o CMCI identificamos que os idosos declaram querer adquirir conhecimentos e conquistar novas amizades. Muitos reclamam de tristeza e depressão, mesmo que em família, ou da falta de atividade, em decorrência da aposentadoria. Verificamos também que embora a maioria não tenha estado no mercado formal de trabalho, as que estiveram, declaram profissões como professoras, costureiras, artesã e empregada doméstica. Verificamos que a renda da maioria pesquisada (62,5%) varia de 1 a 2 salários mínimos. Esta renda visivelmente baixa denota que os idosos pesquisados fazem parte das camadas populares da sociedade. Sendo que 12,5% sobrevivem com uma renda inferior a 1 salário mínimo. Em relação á escolaridade do grupo pesquisado verifica-se na tabela 6 o pouco tempo de escolarização dos alunos. Constata-se que 50% dos participantes sabem assinar o nome. Entre as mulheres 12,5% cursaram até 3ª do primário, e 12,5% tem a 4ª do primário. Considerações Finais: Um dos grandes problemas vividos pelos idosos hoje é sua adaptação às exigências do mundo moderno. Isto se deve, em parte, à falta de oportunidade educacional desta geração, de uma época em que freqüentar escola era um privilégio de poucos. Segundo IBGE (2004) entre a população idosa o analfabetismo funcional totaliza 49%, 23% declaram não saber ler e escrever, 4% afirma só saber ler e escrever o próprio nome e 22% considera a leitura e a escrita atividades penosas. Esses dados mostram que o número de idosos analfabetos ainda é muito alto. As experiências resultantes da prática de atividades educativas propostas no projeto EJA do Centro Municipal de 53 Convivência do Idoso na cidade de Campina Grande-PB, foram comentadas pelos idosos remanescentes como importantes ganhos em diversos âmbitos de suas vidas porque, intensifica os contatos sociais, a troca de vivências, de conhecimentos e de aperfeiçoamento pessoal. REFERÊNCIAS ANDRÉ, Marli E. D. A. de. Etnografia da prática escolar. Campinas, Papirus, 1995. ARIÈS, Philippe. História Social da Criança e da Família. RJ: Guanabara, 1981. BARROS, Myriam Lins de.Velhice ou terceira idade? RJ: Fundação Getúlio Vargas, 1998. BERQUÓ, Elza. ―Considerações sobre o envelhecimento da população no Brasil‖. In: Velhice e sociedade. Anita L. Neri e Guita G. Debert (Orgs.). Campinas, SP: Papirus, 1999. BRANDÃO, C. R. O que é educação? SP. Brasiliense, 1984. CABRAL, Benedita E. S. L. ―A vida começa toda dia‖. In: Estudos Feministas, n.1/97; v. I, IFCH/UFRJ, Rio de Janeiro, 1997. CACHIONE. M. Quem educa os idosos?: Um estudo sobre professores de Universidades da Terceira Idade. Campinas, SP: Alínea, 2003. CHIZZOTTI, A. Pesquisa em ciências humanas e sociais. São Paulo: Cortez, 1998. DEBERT, Guita G. A reinvenção da velhice: socialização e reprivatização do envelhecimento. São Paulo: Fapesp, 1999. FREIRE. Paulo. Pedagogia da autonomia. Saberes necessários à prática educativa.SP: Paz e Terra, 2001. _______. Educação Como Prática da Liberdade. RJ: Paz e Terra, 1984. GEERTZ, A. G. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1989. MOTTA, Alda B. ―Palavras e convivência – Idosos hoje‖. In: Estudos Feministas, n.1/97; v. I, IFCH/UFRJ, Rio de Janeiro, 1997. TFOUNI. Leda V. Letramento e alfabetização. SP: Cortez, 2004. 04 - REFLEXÕES SOBRE AS MEMÓRIAS DE UM GRUPO DE ASSENTADOS NA PARAÍBA Francisco Fagundes de Paiva Neto Doutorando em Ciências Sociais/UFCG Prof.: Depto História/UEPB O nosso interesse pela área de assentamento decorreu de entrevistas com religiosos e leigos militantes da teologia da 54 libertação nos anos 80. A realização de entrevistas sobre a trajetória de um religioso estrangeiro nos demonstrou uma relação entre um padre e um leigo, que auxiliava na mobilização dos camponeses na área que chamaremos de Soledade Vasca. O padre portava um carisma, que auxiliava na organização da luta camponesa, através do apoio material, pedagógico e do estabelecimento de estratégias. O leigo em questão tornou-se o alter ego do religioso, pois realizava façanhas que causariam problemas se fossem praticadas por um padre. A realização de outras entrevistas com outro religioso nos acentuou a curiosidade pela área, quando ocorreu a referência a uma ―procissão‖, na qual os participantes levavam um andor, o padre ia ao centro do grupo dos caminhantes e nas extremidades alguns camponeses traziam as suas espingardas de soca carregadas e prontas para defender o religioso de um possível ataque de pistoleiros. Os cânticos assustavam as aves noturnas e as luzes de velas, de lamparinas e de ―flashlights‖ exorcizavam as trevas e revelavam os insetos em seus vôos noturnos. O religioso que fez a revelação recordou da cena e nos assegurou da ciência do colega das ações do alter ego em relação a expulsão de jagunços da área, a partir de uma ação mais audaciosa. Pode nos narrar esses eventos porque nessa ocasião teve a incumbência de ir até a área com um carro para trazer o colega em segurança. Outro padre, por sua vez, mencionou que também chegou a ir com um colega a uma área e de serem vítimas de disparos no carro, que provavelmente foram deflagradas por pessoas contratadas por algum fazendeiro incomodado com as ações políticas em torno da reforma agrária na sua propriedade. A quebra da obediência as normas da CPT, em relação a prática de escaramuças armadas, segundo o sacerdote nos afirmou foi uma prática que fugiu aos conselhos dados aos camponeses para não se confrontarem com armas; da afirmação pelo coletivo de trabalhadores rurais ou de camponeses ―de que não se preocupasse que saberiam o que fazer‖ e de que ―até hoje não soube quem eram os homens que realizaram a expulsão dos jagunços‖. As assertivas, o olhar e a expressão facial nos acentuaram a impressão de indícios de conhecimento da movimentação, mas demarcava um espaço de ocultação do alter ego (que posteriormente comprometeu a amizade, ao querer impor aos demais assentados as suas vontades) e de preservação de algumas dinâmicas de estratégias, que não deveriam ser reveladas a um estranho, mesmo sem ter havido nenhum incidente grave. Intuímos que podíamos nos servir daquela inferência para tentar desvelar os caminhos percorridos pela gente de Soledade Vasca para realização da passagem da condição de foreiros para assentados, garantindo a preservação dos seus vínculos com 55 aquela área, que por algumas gerações já vinha sendo trabalhada. A permanência no âmbito daquele município tende juntamente a preservação de vínculos familiares e culturais, pois há anos tem ocorrido uma sagria populacional para áreas metropolitanas das regiões Centro-oeste (colheita e encaixotamento de tomate) e Nordeste (trabalho sazonal das usinas). Partimos para o campo ―deslocar a nossa própria subjetividade‖, podendo ―distinguir o piscar mecânico e fisiológico de uma piscadela sutil e comunicativa‖ no cruzamento dos ―caminhos da empatia e da humildade‖ (DA MATTA, 1978, p. 35). Alguns questionamentos nos surgiram: como um agente social se torna uma liderança político-religiosa para os camponeses de um rincão paraibano? Como a luta pela terra foi um meio de forjar as condições para um padre se tornar um líder religioso e político entre os camponeses? Como através de uma perspectiva etnográfica as memórias se dispuseram em transmitir relatos sobre essa experiência? (Como os relatos unificam e afastam os narradores no assentamento?) A realização de uma pesquisa com uma metodologia qualitativa exigiu-nos algumas condições fundamentais, dentre elas uma boa interação com os nossos narradores. Essa fase nos fez rememorar as reflexões de BERREMAN (1980, p. 125) sobre a questão da apresentação pesquisador/grupo e o processo de interação com toda a sua pluralidade de caracteres: a disponibilidade em falar certas coisas ou a arte de também negaceá-las, quando é necessário ante a possível e provável intromissão em assuntos internos ou que exigem algum grau de iniciação. A partir dessa reflexão, queremos acentuar um ponto, que esteve presente na nossa experiência. A questão da impressão a cerca dos membros do assentamento, a partir da construção de determinadas narrativas, que foram assumindo gradativamente uma disputa em torno de determinados eventos referentes a própria dinâmica da luta política para constituição do assentamento. O ato de narrar assumia, cada vez em que se realizava uma entrevista, um espaço de disputa em relação a outras falas e a outras versões, embora ocorresse complementariedades narrativas, ao nosso julgamento de grande importância para se compreender a dinâmica das disputas internas e da especificidade da participação em cada um dos grupos envolvidos. Conforme LEVI (1992, p.153): os micro-historiadores concentraram-se nas contradições dos sistemas normativos e por isso na fragmentação, nas contradições e na pluralidade dos pontos de vista que tornam todos os sistemas fluidos e abertos. 56 Essa preocupação nos acentua a percepção para uma visualização mais plena no que se refere aos envolvidos nas disputas políticas da área em questão. A normatividade institucional, como, veremos, também foi esgarçada pela autonomia dos agentes. Considerando a área do nosso estudo, as sociações em grupos religioso-políticos foram rememoradas nas suas modalidades de estratégias de subversão, tendo a forma de um importante capital no que tange a memória dos participantes. Por outro, lado houve participantes cujas ações, diante de condições que aviltavam ainda mais as suas condições sociais e a sua dignidade humana, recorreram as escaramuças para tentar trazer a intranqüilidade contra um bando promotor de violências contra os camponeses acampados na área. Scott (2000) entende que as noções de ―dignidade‖ e de ―autonomia‖ colaboram para se compreender diretamente as complexas interelações entre os grupos sociais. Quando se referiu as resistências de escravos mencionou que a dignidade humana em uma situação de servidão pode ser severamente afetada, porque o amo tem o poder de vida e de morte sobre o seu escravo. Na área em que estudamos a noção de ―dignidade‖ aviltada não se refere apenas aos escravos, mas a homens livres em condições sociais aviltantes. De toda forma, concordamos com Scott (op. cit) quando afirma que a solidariedade entre subordinados, se se obtém, se deve paradoxalmente a certo grau de conflito. Compreendemos que esse capital memorial, as memórias dos participantes, não pode ser olvidado, sob pena de empobrecer e solapar a memória dos grupos. Optamos por buscar a polifonia dos discursos. Os conflitos entre os grupos de acampados em torno de estratégias individuais e coletivas diversas exercem um protagonismo importante, que nos permite entender como se processava a luta pela reforma agrária. Ao mesmo tempo, há que se notar como esse grupos se unificavam diante de um grupo mais forte, como um ―indivíduo-coletivo‖ para reivindicar o direito a terra, que só poderia naquelas circunstâncias ser viabilizada pelo empreendimento comunitário. A nossa discussão se aproxima a de Grendi e E. Thompson sobre a compreensão ―relacional‖ de classe. A perspectiva de Grendi no âmbito da micro-história faz ver a história social como uma ―história das relações entre pessoas e grupos‖, pois um recorte temporal/espacial (urbano ou rural) falanos sempre de séries ou redes de relações interpessoais. A nossa experiência etnográfica nos fez refletir sobre as negaças dos nossos entrevistados em relação a preservação de informações concernentes a dinâmica do conflito em Soledade Vasca, mormente quando ocorreram as rusgas entre os pistoleiros e os acampados. Acreditamos da prática do que chamamos aqui de estratégia do silêncio tenha por base alguns preceitos: 1º) Não associar as 57 reivindicações a atos violentos, pois não havia uma unanimidade entre os acampados da expulsão por meio do uso da violência, devido as orientações constantes da Igreja de não se contraporem por meio de armas de fogo; 2º.) Quando ocorreram as menções aos tiroteios e ao cerco resultante na expulsão, o narrador sempre presenciava, mas nunca estava participando ativamente, ou seja, portanto uma arma; 3º.) Os nomes dos participantes eram sempre ocultados, exceto o de C. e de A.; 4º.) Quando uma narradora afirmou sutilmente a ocorrência das trocas de tiro, atribuiu a organização da ação a um agente que não fazia mais parte da comunidade e de um homem já falecido, que havia feito um ―favor‖; 5º.) As armas que eram portadas para fazer a guarda dos tijolos tinham como fim, eventualmente, caçar algum animal de pequeno porte; 6º.) O temor as sanções sociais ao uso de armas, sobretudo, devido a possibilidade de criminalização dos movimentos sociais quando se afirmam publicamente como armados; e, 7º.) A mediação da Igreja visava exatamente um compromisso explícito de não se utilizar armas, porque o objetivo da pastoral se voltava para uma reforma social, na qual a preservação da vida dos militantes e dos adversários deveria se circunscrever. Assim, temos consciência de que as revelações foram parciais, limitadas pela própria forma de organização grupal em relação com aqueles que não pertencem ao assentamento e tampouco foram participantes dos eventos. Os narradores, como forma de preservar o conteúdo das refregas, tendiam sempre a elaborar um jogo lingüístico para driblar a própria participação; atribuir a pessoas que vieram de fora. Para Alessandro Portelli a memória é dividida entre a instituicionalizada e a comunitária, mas dela também faz parte a pluralidade dos inúmeros fragmentos das diferentes memórias, que não podem jamais ser ignorados pelo pesquisador, sob o pena de deixar de lado o fato da elaboração da memória e do ato de lembrar como individuais. Entre a memória oficial e a comunitária existem outras memórias que precisam ser ouvidas. REFERÊNCIAS BARTH, Fredrick. O guru, o iniciador e outras variações antropológicas. Rio de Janeiro: Contra capa Livraria, 2000. BERREMAN, Gerard D. Por detrás de muitas máscaras. In: Desvendando máscaras sociais. Rio de Janeiro: Editora Francisco Alves, 1980, p. 123-172. BOURDIEU, Pierre. Outline of a Theory of Pratice. Cambridge, 1977, p. 192. DAMATTA, Roberto. O ofício de etnólogo, ou como ter “Antrhopological Blues”. In: 58 GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1989. GRENDI, Edoardo. ―Micro-analisi e storia sociale‖. In: Quaderni Storici, n. 35. Oral History fra Antropologia e Storia. Ancona, Maggio. Agosto 1977 LEVI, Giovanni. Sobre a micro-história. In: Burke, Peter. (Org.). A escrita da história: novas perspectivas. São Paulo: Ed. Unesp, 1992, p. 153-155. PORTELLI, Alessandro. O massacre de Civitella Val di Chiana (Toscana, 29 de junho de 1944): mito e política, luto e senso comum. In: Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1996. SCOTT, James. Los dominados y el arte de la resistencia: discursos ocultos. México: Ediciones Era, 2000. 05 - “ELES NÃO TINHAM CIVILIZAÇÃO...” a reconstrução da história da ocupação do Oeste do Paraná à partir da memória dos colonos no município de Cascavel Vilson Cesar Schenato Mestrando PPGCS/UFCG Este artigo pretende contribuir com a recuperação da história não oficial da ocupação de terras no Oeste do Estado do Paraná. Tendo a História Oral como suporte metodológico, busca-se aqui demonstras a complexidade da memória sobre a colonização ocorrida naquela região entre a 2ª metade do século XX, que foi marcada por disputas e negação de sujeitos ali presentes. A metodologia da História Oral foi utilizada por meio de entrevistas com colonos da comunidade Linha São Roque no município de Cascavel/PR. De acordo com Montenegro (2001), o trabalho da história oral junto aos segmentos populares resgata um nível de historicidade que comumente era conhecida através da versão produzida pelos meios oficiais e é com esse sentido que vamos recuperar aqui os relatos orais. É necessário considerar que a representação do passado que predomina na memória coletiva e individual tem uma significativa participação no governo individual e social (MONTENEGRO, 2001). Assim, ao resgatarmos os relatos orais dos colonos, estamos recriando uma realidade que apesar de selecionado da memória destes, diz respeito aos processos sociais e históricos daquele contexto social. A ocupação da fronteira Oeste do Paraná foi marcada por um processo conflituoso de expropriação, grilagem e violência, que não é informado pelas fontes jornalísticas e da história oficial sobre o processo de colonização daquele lugar. 59 Os discursos oficiais geralmente ―apagam‖ da memória este passado recente e conflituoso, querendo além de ressaltar o desbravamento das terras ―despovoadas‖ pelos migrantes, reconstruir uma imagem e identidade regional harmônica e homogênea, escamoteando os conflitos ou culpando os posseiros por qualquer conflito que por ventura aparecesse, eximindo assim, os grileiros, as colonizadoras e os próprios governos do Estado do Paraná. Abrindo-se, um espaço importante para investigar o modo como num local pré-determinado pode-se recuperar o modelo pelo qual se atribui identidade ao outro e como se constrói ou se reforça uma identidade portada nas transações sociais. É também na memória oficial que temos a heroicização do ―pioneiro‖ em uma identidade formada por ―gente que faz‖, anulando-se a possibilidade de evidenciar outros sujeitos que não compartilham dessa ―identidade‖ regional. Além dos posseiros, os indígenas são ―outros‖ que não são lembrados, mas sim silenciados nas versões oficiais da história e do imaginário social hegemônico. Apesar de ali estarem anteriormente, os Guarani são vistos como ―intrusos‖ e obstáculos a serem removidos pelos colonizadores para a instalação dos colonos (RIBEIRO, 2000: 96). Incentivados pela campanha de Marcha para Oeste, estes colonos, para continuarem se reproduzindo socialmente enquanto camponeses, compartilharam dessa ideologia de povoamento que deveria ser realizada por aqueles que eram ―afeitos ao trabalho‖, ―construtores do progresso e de uma Nova Pátria‖, que ao se excluía os caboclos e os indígenas destes projetos de colonização controlados pelo Estado. As empresas colonizadoras na região Oeste do Paraná seletividade de colonos elegeu o migrante como propulsor do moderno, do progresso e este interiorizou uma ética de trabalho árduo e competitiva que lhe garantia o acesso à terra e a sua permanência naquele espaço enquanto fosse considerado um personagem ―civilizatório‖ e ―moderno‖. Um recorte étnico que deslegitimou a terra dos ―caboclos‖ pode ser ainda hoje buscado na memória de alguns colonos que para se auto-afirmarem naquele espaço desqualificavam e negavam a humanidade do ―outro‖. É o que se percebe ainda hoje na fala deste colono da Linha São Roque em Cascavel PR: Caboclo, aquele povo sem conhecimento, sem cultura. É a onde que sumiu, tinha dois. Disse que era meio brabo ainda. Mas foram sumindo também, nem sei pra onde foram essa gente, sumiram. (...) Era, não tem conhecimento das coisas né, tem que ser isso daí né, por que a pessoa com conhecimento não é bravo, é fácil você mexer com quem tem conhecimento, a verdade, onde é que ta o erro, e a onde ta a verdade né, e esse povo é o seguinte, eles acham que o certo é o que ele imagina né. O certo é o que eles 60 pensar e pronto. (...) Eram, gente mais conhecido, que falavam, que eles eram gente meia, andavam com revolver na cinta, armado né, é isso ai né. Eles sempre queriam ser mais que os outros aqui, eles tinham um jeitinho diferente, não tinham civilização não. (Colono A.M, 66 anos). Lembramos autores como ELIAS E SCOTSON (2000), discutem sobre o estigma, em que o grupo que detém mais poder afirma sua superioridade ao estigmatizar o―outro‖ como pessoas de origem inferior ou ―sem origem‖, ―sem conhecimento‖, ―incivilizadas‖. Isso não se deve ao acaso, mas num contexto em que o grupo que detém mais poder, tenta manter sua superioridade social por meio do estigma étnico ao grupo menos poderoso que ao incorporá-lo se vê com os olhos dos vencedores que adentram em suas almas, para se apropriar de suas terras. Não seria esse o segredo de como de repente aqueles caboclos sumiram? Muitos ficaram pela região trabalhando como ―peões‖ nas fazendas ou migraram para outras regiões ou para a cidade, alguns com raras exceções viraram arrendatários e conseguiram adquirir uma posse escriturada, outros ainda lutaram pela terra e alguns poucos foram assentados. As representações altamente negativas que os brancos elaboravam (e continuam a elaborar em contextos parecidos) para aqueles nativos, sintetizadas na categoria de ―caboclo‖ que ao ser adotada pelos próprios indígenas, seria também a interiorização dos termos etnocêntricos dos brancos. O ―caboclo‖ para os civilizados seria o sinônimo do intruso, preguiçoso e não-confiável e que portanto não mereceria a terra em que estava. (OLIVEIRA, 1976). A negação, ou pormenorização na própria historiografia, tanto de conflitos sociais agrários, bem como da existência de indígenas na região revela tanto a construção oficial de um passado mais harmônico do que foi, e ao mesmo tempo, o apagamento de outros sujeitos da memória oficial, elaborada muitas vezes por encomendas das prefeituras . Esta história enviesada a partir de interesses políticos encontra-se também em certos trabalhos acadêmicos, sobre a região, que com a chancela da ciência acaba por fabricar uma ―verdade‖ que só incluiu como agentes da história aqueles que os atores sociais que os convém. É preciso ver esses documentos enquanto monumentos no sentido proposto por Le Goff (1996) e perceber que estes são construções que carregam intencionalidades, remetem ás condições sócio-históricas em que foram fabricados, sabendo-se que todo documento pode ter sido manipulado inclusive pelo silêncio. Tentando colocar a luz esta problemática da invisibilidade do elemento indígena em um passado não muito distante, Ribeiro (2000) por meio de uma perspectiva crítica defende que ao invés de uma história que mascara os conflitos e as contradições, é 61 importante perceber uma história com a presença de ―outros‖ na região e com relações de poder que chegam aos dias de hoje. O ―outro‖, neste caso, o indígena desmascara a idéia de uma identidade regional homogênea, ou uma visão única de identidade na região. (RIBEIRO, 2000). Além de não reconhecerem o trabalho daqueles indígenas no passado, a população em geral desconhece que existia indígenas na região, pensando que os mesmos foram trazidos de outros lugares para as reservas em que hoje estão ―confinados‖. O empreendimento colonizador após utilizar o indígena, se encarregou de desencadear um processo de ―limpeza étnica‖ em que os que fossem ―sem origem‖ não podiam conviver com o migrante. ―A idealização do modelo de colonização e do grupo humano escolhido, acaba por perpetuar até a contemporaneidade a imagem de região etnicamente homogênea‖. (RIBEIRO, 2001) Os argumentos utilizados pelos colonizadores são de que o indígena seria ―primitivo‖, ―selvagem‖ ―incivilizado‖ ou como disse certo colono sobre os caboclos ―sem cultura‖, desta maneira ao negar a humanidade do ―outro‖ é também lhe negar que o mesmo tenha direito a disputar aquele espaço, lhe negar o direito à terra, que ficaria livre para as frentes de expansão re-ocuparem, repovoarem aquele lugar. A sucessiva redução dos territórios indígenas se deu em meio a processos dinâmicos e complexos com muitos conflitos, e não de maneira simplista como apresentada na história oficial de prefeituras. (RIBEIRO, 2000:94). A ideologia do trabalho árduo e produtivo que desenvolveria o progresso, ora utilizada como um diferencial frente à outros povos e etnias da região, vai se mostrar falaciosa pela própria história, mesmo no momento da colonização em que os conflitos por terra e a expulsão vão se configurar até a contemporaneidade por razões diversas, o que expõem a fragilidade do modelo de colonização. Por parte dos grupos dominantes há a necessidade de se manter escondido esse passado, emitindo discursos que de maneira repetida faça se impregnar no imaginário social como a realidade naturalizada, uma vez naturalizada impede-se o questionamento, a desconstrução de um passado que quem conta foi quem venceu. Ou seja, quem foi negado, expropriado, humilhado, expulso ou morto ficaria no silencio imposto pelos que venceram. Longe aqui de colocar de um lado o carrasco e do outro lado as vítimas, trazer à tona essa discussão, significa é perceber que nesses processos sócio-dinâmicos de disputa, principalmente por território, se deu um encontro de culturas na situação de contato, lutando para impor uma visão e di-visão do mundo, é também uma luta de classificações e desclassificações do ―outro‖, com quem se disputa, sobretudo a posse da terra. Há nessas relações lutas 62 simbólicas, onde quem possui um maior quantum de capital simbólico consegue legitimar a ordem social, enquanto uma ordem legítima, evidente, natural. (BORDIEU, 1990: 159 – 163). Deste modo, visualiza-se que o cenário conflituoso que se configurou na história oestina também teve como enredo os confrontos diversos entre grupos indígenas, caboclos e brancos e que apesar dos primeiros serem relegados ao esquecimento pela memória oficial, resistem e continuam existindo enquanto tais, constituindo parte da heterogeneidade étnica e social que compõe o oeste do Paraná. REFERENCIAS BOURDIEU, Pierre. Espaço Social e Poder Simbólico, In: Coisas Ditas 1. ed., Brasiliense São Paulo, 1990 ELIAS, Norbert; e SCOTSON, John. L.; Os estabelecidos e os outsiders: sociologia das relações de poder a partir de uma comunidade; – Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000, 224 p. LE GOFF, Jacques. ―Documento / Monumento‖ In: História e Memória. 4. ed. Campinas: Unicamp, 1996. MONTENEGRO, Antônio Torres. História Oral e Memória. A cultura popular revistada.Contexto: São Paulo, 2001. OLIVEIRA, Roberto Cardoso. Identidade, Etnia, Estrutura Social. 1. ed. São Paulo: Livraria Pioneira Editora,1976. POLLAK, M. Memória, esquecimento, silêncio. Estudos históricos, Rio de Janeiro: CPDOC, n.3, 1989. RIBEIRO, S.I.G. Índios e brancos no Oeste do Paraná: Fronteira e fricção interétnica. Revista Tempos históricos, v. 02, n. 01 pg. 93-116. M.C. Rondon, Mar/2000. ______, Um passe de mágica: Breve ensaio sobre a construção da inexistência de índios no Oeste Paranaense, Revista Tempo da Ciência – CCHS – UNIOESTE: Toledo, v. 8 n. 15 p. 59-68 jan/jun. 2001. 07 - OS SERTÕES, DE EUCLIDES DA CUNHA: HISTÓRIA, ESTÓRIAS & “CAUSOS” Dr. Sandra S. F. Erickson Departamento de Letras, UFRN A saga de Canudos apareceu pela primeira vez na língua inglesa em 1920 através de uma obra entre o romance histórico e biografia intitulado A Brazilian Mystic: Life and Miracles of Antonio Conselheiro, do escritor escocês Robert Bontine Cunninghame Graham (1852-1936, daqui em diante ABM). Conforme o autor relata no Prefácio, tendo visitado os pampas argentinos e brasileiros alguns anos antes, ele tinha tomado conhecimento dos 63 episódios de Canudos. Graham foi encorajado a escrever sobre o assunto para o público inglês por seu amigo, o então presidente Norte-Americano, Theodore Roosevelt (1858-1919), já que, lhes disse Roosevelt, Graham ―entendia sua [dos brasileiros] lingo.‖ O que Graham fez, todavia, foi apenas copiar, e de forma bastante simplificada, o livro de Euclides da Cunha, Os sertões (1902; daqui em diante OS). Conforme observou Frederic C. H. Garcia, em ―Duas apresentações de Euclides da Cunha‖ (1972), não é difícil se verificar que a citada obra constitui um plágio—mal feito—do texto de Cunha, o qual somente em 1944 foi traduzido para o inglês por Samuel Putnam (1892-1950) como Rebellion in The Backlands. Traduções deixam sempre a desejar e essa não é exceção; entretanto, salvaguardadas as dificuldades de se traduzir vocábulos essenciais para a formação do imaginário e para o desenvolvimento da temática de Cunha (como ―sertanejo‖ e ―sertão,‖ respectivamente traduzidos por backlander e backlands), a tradução de Putnam é excelente. Ele tenta o mais possível dar ao leitor o texto original, sem nenhuma intenção de ―corrigir‖ e, assim, modificar o estilo, as imagens, conceitos ou acontecimentos relatados no texto original. Inúmeras notas tentam dar conta da difícil tarefa de informar o leitor ―alienígena‖ o mais fielmente possível das escolhas léxicas, do contexto sociológico, histórico e lingüístico do texto. OS, referência obrigatória em toda escritura sobre o Brasil, tem uma trajetória interessante na língua inglesa. Resumido e ―copiado‖ (no sentido técnico de copião) em ABM, finalmente traduzido integralmente, ainda assim, acabou excluído do ―cânone ocidental‖ de Harold Bloom não só em O cânone ocidental (1994), mas em suas subseqüentes reformulações e eventuais inclusões de alguns outros autores brasileiros. Bloom justifica a não inclusão de mais autores brasileiros no grande cânone com o argumento de que é difícil avaliar competentemente a literatura brasileira porque existem poucas e más traduções dos clássicos brasileiros no inglês. Todavia, considerada ―clássica‖ em seus próprios termos, a tradução de Putnam disponibilizou a obra para a comunidade internacional e a partir dela um ciclo de narrativas sobre Canudos se gerou (Itebelet Canudosban [Veredicto em Canudos], Sandor Marai, 1967; La guerra del fin del mundo, 1985; Três Versões de Judas, Jorge Luis Borges, 1944; Vale of Tears, Robert Levine, 1992). Considerado o livro mais importante de nossa língua, é de se estranhar o fato de que seu plágio (ABM) é encoberto e celebrado como uma grande obra e que sequer o artigo de Garcia conste nas discussões e listas de referências. A situação do plágio é tão óbvia que foi percebida por Vargas Llosa, o qual a adotou como tema central de sua revisitação de OS, La guerra del fin del mundo 64 (daqui em diante LG), onde aparece personificado em Jurema. Como Iracema, Jurema se torna um porta-voz simbólico da exploração do sertão (sua propriedade cultural) e se constitui em um meta-comentário da história crítica de OS na língua inglesa (ver Erickson, 2006). Mnemosine: a fortuna crítica de Cunha na língua inglesa: Garcia sugere, no ensaio citado, que a demora da tradução de OS para o inglês se deveu ao fato de que Graham ―roubou‖ o interesse da história; pois como seu texto foi um copião, e já que tinha sido relativamente bem sucedido junto ao público, editorialmente não se justificou, por muito tempo, a tradução completa de uma obra reconhecida como hermética inclusive na própria língua nativa. Quando finalmente recebeu a tradução integral (1944) a obra foi prefaciada pelo reputado brasilianista Isaac Goldberg (1887-1938), que menciona ABM somente en passeant e sem se referir ao plágio. Talvez Goldberg não tenha tido coragem de ―dar nome ao boi‖ por causa do prestígio político e da popularidade literária de Graham, que além de ser amigo e admirado por escritores como Joseph Conrad e Bernard Shaw, foi também respeitado representante do parlamento inglês. Talvez Goldberg não compreendesse português o suficiente para defender a tese. A questão ficou adormecida e a indignação de Garcia passou despercebida. Embora Graham tivesse certa reputação e apreço entre os interessados na espécie genérica bastante popular no século XIX do sketch e travelling literature (literatura de informação e viagem), ele nunca se tornou um escritor de porte no cânone inglês—nem no escocês. Recentemente, dois críticos o estudam mais de perto: Cedric Watts e John Walker, os quais, ainda que sistematicamente ignorando, os comentários pertinentes, competentes de Garcia não puderam deixar de notar ―a pedra no caminho‖ de uma possível fama de Graham. Esses críticos, sem mencionar Garcia, se referem à sua acusação de plágio veladamente, refutando-a com argumentos falaciosos e a sugestão de que tal comentário não passa de histeria alegando que ele escreve com furor trágico, sempre defendendo os jagunços e a eles solidários; seu texto ―é [sic] uma versão literária de Os sertões‖ (WALKER, 1986-87). Ou seja, eles insinuam que OS não possui essas qualidades (tragicidade, simpatia e defesa dos jagunços) e não é um texto literário. Esse ponto importante da fortuna crítica de OS na língua inglesa começou a vir à tona a partir da publicação de LG, onde, conforme apontou J. A. MacAdams (1987) consta uma alusão direta a Graham (ver ABM, p. 48 e LG, p. 68). Esse episódio indica a familiaridade de Llosa com o escocês. MacAdams ainda atribui a 65 Graham o pioneirismo na ―técnica‖ pós-moderna do pastiche (tema extensivamente tratado em ERICKSON 1995, 1999, 2006). Para o presente propósito vale à pena ressaltar que 1. as suspeitas de Garcia procedem e suas essas assertivas podem ser facilmente verificadas por qualquer conhecedor dos dois textos; e 2. a sugestão de que Graham foi um pioneiro no uso de técnicas pósmodernas é absurda e insustentável à luz de qualquer estudo competente da estética pós-moderna e de outras obras e ―técnicas‖ do escritor. Vale ainda observar o comentário de Jorge Luis Borges de que ―após haver lido esse [OS] livro, li um derivado de Os sertões que é A Brazilian Mystic, de Graham, o qual conta a mesma história, porém de um modo simples‖ (Oleone Coelho, 2001). Esse assunto importante e a valiosa observação de MacAdams sobre a referida alusão de Graham no texto de Llosa não tem merecido tratamento adequado da crítica contemporânea. Leopoldo Bernucci, um conhecido contribuinte da fortuna crítica de OS levantou a curiosa tese de que a composição de OS teve por princípio estrutural a ―reciclagem textual‖ (BERNUCCI, 1995). Assim, ao invés de resgatar OS, ele fez de Cunha um Graham, trataandor o próprio OS como plágio, pastiche e paráfrase enfraquecendo e deslegitimando a questão para os estudiosos. Veja-se a seguir alguns exemplos gritantes de Bernucci: discutindo a prersença de outros textos em OS (O sertanejo e O gaúcho, de José de Alencar, e Os jagunços, de Afonso Arinos), Bernucci conclui: ―não quero com isso sugerir que haja descuidos ou erros de composição cometidos por Euclides da Cunha. Não se trata, portanto de ‗equívocos‘, mas sim de um plano‖ (p. 20; grifo nosso). Bernucci cria o moto ―dize-me de onde vens e eu te direi como és‖ para o que ele cognomina ―fórmula‖ de apropriação textual euclidiana (p. 33). A imitação dos sentidos faz várias insinuações que colocam a criatividade, originalidade e idoneidade de Cunha em cheque: ―trabalhou para o governo e teve tempo ainda para praticar sua sempre esquiva literatura‖ (p. 39; grifo nosso); a publicação de OS foi apenas uma ―estratégia política de Euclides‖ que ―sem dúvidas queria projetar-se nacionalmente não só como reconhecido escritor, mas também como o escritor ‗oficial‘ da Guerra de Canudos‖ (p. 1). Comentando o uso de Cunha dos jornais da época, ele observa ―dispensando-se mais uma vez, de identificar a fonte‖ (p. 59). Como último exemplo, Bernucci observa sobre o uso de Cunha de seu diário da expedição a Canudos, ―Frente a uma citação [...] cuja sintaxe ou morfologia lhe desagradava, ele a modificava sem escrúpulos [...] para dar-lhes um contorno ora mais suave ora mais claro que, afinal, já deixava ver ligeiramente diferente no que diz respeito ao seu conteúdo original‖ (p.115; grifo nosso). Assim, de maneira falaciosa, Bernucci representa o 66 próprio Cunha como um plagiador, Bernucci questiona o estatuto de OS na crítica literária inglesa e justifica os atuais críticos de Graham que tentam defendê-lo de Garcia. História, estória & memória: Um dos aspectos mais interessantes do romance de Vargas Llosa é sua estrutura, qual seja as diversas sub-narrativas paralelas do texto (a estória de cada personagem) convergindo para a narrativa principal (Conselheiro e a comunidade de Canudos), constituindo uma espécie de ―árvore de textos‖, os quais têm como tronco central OS; ou seja, Llosa procurou catalogar criativamente textos sobre Canudos inspirados em OS, fazendo em sua narrativa o que fez Geoffrey Chaucer em Canterbury Tales: cada história individual é contada como parte de uma peregrinação em direção à ―catedral‖ de taipa de Conselheiro—ou seja, em direção às relações de cada texto com OS. Enquanto Jurema, árvore típica do sertão, simboliza a terra sertaneja, Graham foi o primeiro estrangeiro a se apropriar to texto de Cunha para beneficio próprio. Ele é um exemplo da invasão da cultura Européia, prevista na dialética da terra na Parte I de OS (ver ERICKSON, 2006). Os episódios envolvendo os personagens Jurema, Rufino e Galileo Gall, especificamente o assalto sexual sofrido por Jurema e perpetrado por Gall representam a relação de exploração do sertão pela ―civilização‖ vindo de fora. Gall, o militante esquerdista escocês que vem para o Brasil para se aliar aos Conselheristas, é descrito como pedântico e arrogante; apesar de sua ideologia antiburguesa e antiimperialista, seu olhar sobre a terra (sertão) é sempre colonizador. A relação do sertão com esse tipo de exploração (cultural, histórica) que o plágio de Graham representa é dramaticamente simbolizada, em La guerra, pelo estupro de Gall (Graham) sofrido por Jurema (OS) e que seu marido, o sertanejo Rufino, tenta a todo o custo vingar. Como Iracema se tornou um símbolo da terra brasileira, Jurema se tornou um símbolo do sertão; ela representa a terra sertaneja e seu território literário, OS. Vale a pena lembrar que em OS, a descrição da jurema ocupa um lugar destacado na narrativa. Jurema é o ―tropo vingador‖ e a presença de Graham, no personagem Galileo Gall representa, conforme já observado, um metacomentário da fortuna crítica de Cunha na língua inglesa. Observe-se que ABM não tem merecido o escrutínio de nossos críticos e foi traduzido para o português apenas em 2002, como parte das celebrações do centenário da publicação de OS. Carlos Eduardo Lins da Silva, saudou assim, a tradução do plágio: ―A crítica literária internacional coloca Um místico brasileiro entre a tríade das grandes obras sobre Canudos (ao lado de Os sertões e de Guerra do Fim do Mundo, de Mario Vargas Llosa).‖ A importância da questão é auto-evidente. Para cumprir, como diz 67 Martin Heidegger, o papel de guardar e preservar os objetos culturais de uma comunidade e, assim, acrescentar-lhes o valor que a canonicidade manterá para as próximas gerações é preciso que a comunidade crítica vele por esses objetos; que se mantenha atualizada em seus destinos e usos públicos. Cuidar de nosso patrimônio histórico quer dizer cuidar dos nossos textos, estar atento a suas ―revisitações‖ e suas repercussões no cânone maior. OS é um dos nossos melhores candidatos ao cânone universal. Vale à pena para a crítica se debruçar sobre esses textos e sobre suas repercussões críticas, tanto no Brasil, como fora. No agon constante de se inscrever no cânone universal, nossos escritores têm feito sua parte. Temos canônicos em todos os gêneros literários que poderiam facilmente ocupar seus lugares no panteão dos grandes. Falta os críticos fazer a sua. REFERÊNCIAS BERNUCCI, Leopoldo. A imitação dos sentidos. São Paulo: Edusp: 1995. CUNHA, Euclides. Os sertões. Ed. Crítica. Walnice Nogueira Galvão. São Paulo: Brasiliense, 1985. COELHO, Oleone. Canudos não se rendeu: poesias. Carlos Pronzato, ed. Salvador: Uneb, 2001. ERICKSON, Sandra S. F. Os sertões [...]: Thrice Told Tales. João Pessoa: Editora Universitária, 2006. ERICKSON, Sandra S. F. “Dialectics in Vargas Llosa’s La guerra del fin del mundo”. Chasqui 21.1 (1992): 11-26. ERICKSON, Sandra S. F. ―Cunninghame Graham‘s Plagiarism of Cunha‘s Os sertões and its Role in Mario Vargas Llosa’s La guerra del fin del mundo”. Luzo-Brazilian Review 29. 2 (1992): 67-8. ERICKSON, Sandra S. F. ―Os sertões como tragédia hegeliana‖. Revista do Centro de Artes e Letras 17.1.2 [Santa Maria (RS)] (1995): 139-148. ERICKSON, Sandra, ―O cânone Ocidental: os livros e a escola do tempo‖ por Harold Bloom. Princípios v. 6 n.7, Natal, p. 121-132, 1999. GARCIA, Frederick C. H. ―Duas apresentações de Euclides da Cunha‖. Luso-Brazilian Review 52 (1972): 23-34. GRAHAM, Robert Bontine Cunninghame. A Brazilian Mystic: Being the Life and Miracles of Antonio Conselheiro. London: Heinemann; New York: Mead, 1920. LLOSA, Mario Vargas. A guerra do fim do mundo. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1985. 68 MACADAMS, Alfred J. “Epic Adumbrations: Carlyle, Hardy, da Cunha, and Vargas Llosa‖. Textual Confrontations. Chicago: University of Chicago Press, 1987. SILVA, Carlos Eduardo Lins da. ―Cunninghame Graham vê Canudos com olhos europeus‖ Disponível em www.nordesteweb.com/not01_0303/ne_not_20030215c.ht acessado 21/02/2007. WALKER, John. ―Cunnighame Graham and the Critics: A Reappraisal.‖ Studies in Scottish Literature [USA] n. 19 (1985): 106-114. 08 - QUILOMBO URBANO DA MALOCA: MEMÓRIA ORAL E RESIGNIFICAÇÃO DE PROCESSOS IDENTITÁRIOS 4 Franklin Timóteo Souza do Espírito Santo Universidade Federal do Rio Grande do Norte [email protected] Em sete de fevereiro de 2007, a Comunidade Maloca, situada no Bairro Getúlio Vargas, vizinho ao Centro de Aracaju - SE, foi reconhecida como Comunidade Remanescente de Quilombo. A Maloca detém uma característica distinta da maioria das comunidades quilombolas por estar inclusa em um centro urbano, sendo intitulada como o segundo Quilombo Urbano certificado pela Fundação Cultural Palmares no Brasil. A intitulação da comunidade foi contextualizada a partir de um processo judicial que se desencadeava desde 1993.O senhor José Getúlio, morador da Rua N. Sra.das Dores, e que sua residência faz limite com comunidade, alegou que Dona Lundinara tinha invadido 2 m2 de seu quintal. Após um pedido de reintegração de posse, e da devolução dos 2 m2 por D. Lundinara, mesmo essa alegando não tê-los invadido,o resultado da sentença foi a devolução de 198 m2,totalizando toda a área territorial da Comunidade Maloca.Algumas residências por terem suas demarcações de terra muito antigas,desde 1920,não tinham escritura ou documentação similar, facilitando o resultado do processo contra os moradores, recebendo esses em novembro de 2006 ordem de despejo pela justiça municipal de Aracaju.Após catalogação de dados e documentos com moradores,tendo muitos desses uma ascendência familiar escravista oriunda de antigos engenhos do estado de Sergipe; dados esses repassados a Fundação Palmares pela Associação CRILIBER(Criança e Liberdade), órgão que responde 4 Aluno do Programa de Pós – Graduação (mestrado) em Ciências Sociais – UFRN. 69 pela comunidade; o grupo foi reconhecido como Remanescente de Quilombo. A Maloca e suas Estruturas Sociais: A Comunidade localiza-se em uma área geográfica de morro (antigo Morro do Cruzeiro), próximo ao centro de Aracaju, hoje Bairro Getúlio Vargas. Em sua estrutura territorial, segundo moradores, havia quatro acessos na Maloca, que caracterizavam numa visão aérea, uma cruz. Hoje existem apenas dois acessos: um pela Rua Nossa Senhora das Dores e o outro pela Rua Riachão. Figura 1 – Foto aérea do Centro de Criatividade de Sergipe.1985. Vista da comunidade Maloca ( Fotógrafo desconhecido) Vivem na Maloca hoje em torno de 45 (quarenta e cinco) famílias, totalizando 188 moradores. Segundo informantes, foi Andrelino José dos Santos o primeiro morador e demarcador do espaço geográfico da Maloca. Sr. Andrelino teria vindo do Povoado Central em Riachuelo – SE (antigo engenho de cana-de-açúcar), em busca de nova perspectiva de vida na capital em meados de 1930. O Morro do Cruzeiro onde localizava-se a Caixa D´água era um local de concentração de migrantes negros (escravos). Tal proximidade com a Maloca trouxe naturalmente futuras relações sociais com os próprios moradores, relações essas ligadas à alimentação, moradia e matrimônio. Supõe-se que os primeiros moradores limparam o terreno, demarcaram o território (acredita-se que não encontraram maiores resistências na demarcação do espaço) e constroem suas moradias5. 5 Segundo Dona Maria das Virgens dos Santos (Dona Caçula), supostamente a nomenclatura Maloca deu-se por a grande maioria das casas formadas de palhas e caibros assemelharem-se a ocas indígenas, dando enfim, origem ao nome Maloca. 70 Figura 2 – Foto aérea do quarteirão onde se encontra a “Comunidade Maloca” (Google Earth,2009) Marco Teórico Preliminar: Entendo que analisando as narrativas orais de alguns moradores poderíamos assim, entender momentos criados e vividos no contexto da comunidade no seu processo de identidade. Lévi Strauss ( 1996) já afirmava que o conceito de identidade não deveria ser construído sobre um referente empírico, mas simbólico e cultural, pondo-se em questão não apenas o discurso, mas também o lugar e a ótica de interação com o grupo. O lado étnico é valorizado no discurso dos moradores. Eles assemelham a sua etnia ao lugar. Valorizam suas práticas culturais e reconhecem suas ascendências familiares. Já no que se refere à etnia Stuart Hall define-a ―pelas características culturais – língua, religião, costumes, tradição, sentimento de lugar – que são partilhados por um povo‖ (1997p.67). Para o autor não se pode entender a identidade como algo dado, ou simplesmente definido, devemos entendê-la a partir da reconstrução de um processo histórico do grupo ou lugar, no nosso caso, a Maloca. O trabalho de campo, processo através do qual o cientista social observa de perto a comunidade pesquisada para de algum modo interpretá-la, desempenha um papel de fundamental importância na definição de conceitos antropológicos, sociológicos e de levantamento da memoria oral. A afirmativa que tange à obra de Maurice Halbwachs nos mostra que a memória individual é constituída sempre a partir de uma memória coletiva, sendo tais lembranças estabelecidas no interior e na identidade do grupo. Diferentemente de estudos históricos onde temos a compreensão de acontecimentos vividos num país por exemplo, as lembranças contidas por indivíduos de certo grupo a ser observado nos personificam a reconstrução de vivências e experiências , podendose a cada momento das observações serem descobertos novos fatos e interpretações.Para Halbwachs: 71 a história começa somente do ponto onde acaba a tradição, momento em que se apaga ou se decompõe a memória social. Enquanto uma lembrança subsiste, é inútil fixá –la por escrito‖ ( HALBWACHS, 2004: p.85) É notório aspectos e interpretações da comunidade. O meu campo empírico vai além da análise da estrutura social da Maloca, mas em particular, pretendo entender como interrelacionar situações vividas com aceitação de uma identidade negra, sintetizando informações, sabendo que esta mesma age como movimento social. Ainda para Halbwachs: Toda a arte do orador consiste talvez em dar àqueles que ouvem a ilusão de que as convicções e os sentimentos que ele desperta neles não lhes foram sugeridos de fora, que eles nasceram deles mesmo, que ele somente adivinhou o que se elaborava no segredo de sua consciência e não lhes emprestou mais que sua voz. (HALBWACHS, 2004: p.47) Não pretendo narrar, mas catalogar vontades, lembranças e vivências de tais atores sociais. Não penso na observação participante como uma técnica ou apenas um procedimento realizado pelo cientista social. Analiso a observação participante conforme Vagner Gonçalves da Silva: O grupo também mobiliza seu sistema de classificação para tornar aquele que inicialmente era um ―estrangeiro‖ em uma ―pessoa de dentro‖, isto é, um sujeito socialmente reconhecido. Este processo é de mútuo reconhecimento entre o antropólogo e o grupo investigado ocorre em todas as pesquisas nas quais a observação participante é uma exigência para a produção de conhecimentos, porém, tende a variar de acordo com certas especificidades(SILVA, 1998). Como mostrou James Clifford (1988), as referências ao trabalho de campo nas etnografias, em geral, ficam restritas as introduções metodológicas ou notas de rodapé, nas quais se quantifica o tempo de convivência do cientista social com o grupo pesquisado, a forma como esse profissional chegou ao campo e como se iniciou sua pesquisa, enfim, ―dados objetivos‖ que pretendem mostrar ao leitor a grande ―proximidade‖ atingida pelo sociólogo/antropólogo em relação ao grupo que descreve. Na Maloca6 estratégias conjuntas foram elaboradas para concretização de seu espaço, mas confunde-se a resignificação da sua identidade em relação à realidade urbana e a processos de legitimação de comunidades quilombolas de característica rural. 6 Na Maloca pelo INCRA foram reconhecidas apenas 20 famílias, por essas, terem suas origens e permeações com mais de 20 anos no local, sendo necessário por essas, uma auto-afirmação e/ou auto – reconhecimento étnico – cultural aferidos na comunidade. 72 Para que se entenda a identidade dos moradores da comunidade é necessário que se entenda o contexto social no qual esta identidade encontra-se inserida, sendo a memória responsável por muitas significações e interpretações do lugar. O contato com a vida urbana do centro de Aracaju pode ter sido capaz de modificálas. A respeito disso Gilberto Velho afirma que: (...) a construção de identidades básicas subordina-se a constelações culturais singulares e conjuntos simbólicos delimitáveis. O que está em jogo é o processo histórico abrangente, e a dinâmica das relações entre sistemas culturais com repercussão na existência de indivíduos particulares. (VELHO, 2003, p.39). Expectativas: Este trabalho consiste em coletar dados e informações através de análises e entrevistas aos atores sociais da comunidade baseando-se em suas próprias práticas sociais dentro da comunidade Maloca, nos cabendo como observador, a transcrição desses fatos e a interpretação de alguns deles e concomitantemente a análise comparativa aos dados coletados no trabalho monográfico : ―Introdução ao estudo da memória social e identidade dos moradores da Maloca /Aracaju /SE (SANTOS,2008). Entendo as relações sociais como princípio empregado para modelos que tornam e manifestam a sua própria estrutura social. A descrição de mitos, contos, fatos, enfim, a descrição da memória social7 e de valores construídos pelos moradores da Maloca é fundamental para o andamento desse projeto onde por conseqüência nos trará as origens e o entendimento da formação social, estrutural e matrimonial resignificando a idéia de identidade8 e memória social de tais atores sociais; a origem de seu espaço territorial, suas crenças, seus ideais religiosos e sua diversidade cultural concomitantemente. A idéia do projeto nos mostra inúmeras possibilidades de interpretação da experiência vivida no campo e da dificuldade que senti no exercício das transposições e análises das entrevistas no trabalho monográfico. Como mostrou James Clifford (1988), as 7 Entendo que analisando as fontes orais de alguns moradores, poderia assim, entender momentos criados e vividos no contexto da comunidade. A partir das entrevistas feitas no grupo na execução do trabalho monográfico, essas, me permitiu o conhecimentos de valores religiosos, educacionais, matrimoniais e culturais preservados na comunidade, esses, mantidos como patrimônio simbólico da Maloca. 8 A identidade expressa pelos moradores da Maloca que pretendo identificar no projeto se constrói também a partir de um processo de comparação social. À medida que analiso as lembranças, tais sujeitos comparam também as diferenças e semelhanças com o outro, construindo sua identidade dentro de seu processo de formação de identidade. Nos é satisfatório dizer que a presença do outro num convívio social ora facilita o desempenho na transcrição das lembranças, ora dificulta, para que livremente sejam encontrados possível divergências de fatos e ações em conjunto. 73 referências ao trabalho de campo nas etnografias,em geral, ficam restritas as introduções metodológicas ou notas de rodapé, nas quais se quantifica o tempo de convivência do cientista social com o grupo pesquisado, a forma como esse profissional chegou ao campo e como se iniciou sua pesquisa, enfim, ―dados objetivos‖ que pretendem mostrar ao leitor a grande ―proximidade‖ atingida pelo sociólogo/antropólogo em relação ao grupo que descreve. Na Maloca estratégias conjuntas foram elaboradas para concretização de seu espaço, mas confunde-se a resignificação da sua identidade em relação à realidade urbana e a processos de legitimação de comunidades quilombolas de característica rural. REFERÊNCIAS BASTIDE, Roger. As religiões africanas no Brasil. 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Petrópolis: Vozes, 1997. 09 - CONSTRUÇÕES IDENTITÁRIAS NAS CARTOGRAFIAS DO CENTRO DE CONVIVÊNCIA EM CAMPINA GRANDE Valdirene Pereira de Sousa 9 O presente estudo é parte de uma dissertação de mestrado que tem como objetivo investir em indagações sobre as trajetórias tecidas pelas sensibilidades senescentes cartografadas na contemporaneidade. Esse estudo traz como um de seus objetivos pensar a construção dos sentimentos de velhice partilhados pelos participantes do Centro de Convivência- espaço que congrega grupos de terceira idade em Campina Grande -, e a construção das identidades corpóreas, que vão delineando as subjetividades e as relações de um grupo que se une nas práticas de sociabilidades partilhadas. A nossa sociedade torna-se cada vez mais marcada pela valorização das culturas juvenis performáticas (Pais, 2006). A juventude vem deixando de ser apenas uma categoria etária, devido à perda de conexão com um grupo etário específico, e vem se transformando em valor (DEBERT, 2004), um valor que cada vez mais é perseguido pelas biossociabilidades contemporâneas. O culto à juventude se presentifica no meio social através de propagandas, revistas, programas televisivos, filmes, músicas, enfim, vários instrumentos sociais que canalizam constituições de subjetividades avessas à senectude. As imagens de juventude veiculadas socialmente representam um mundo maravilhoso, com histórias de felicidade que aparentam nunca chegar ao fim e são marcadas por uma ambiência (MAFFESOLI, 2005) contemporânea que (re)afirma esses valores nas práticas cotidianas dos indivíduos. 9 Mestranda vinculada ao Programa de Pós-graduação em História da UFCG; Bolsista da CAPES/UFCG. 75 É dentro desse corpo coletivo que partilha valores em comum sem perder de vista as particularidades e especificidades existentes -, que se insere a imposição de uma imagem de velhice enquanto prática política cotidiana fundamentada em moldes de juventude e determinada enquanto um ideal a ser seguido. Os discursos imagéticos que são representados pela cultura midiática ditam uma tirania da beleza que aprisiona os corpos, determinando um ideal padronizado a ser seguido, um modelo que precisa ser perseguido obrigatoriamente por aqueles que desejam se sentir inseridos e aceitos socialmente. Ser velho significa, de acordo com os ideais éticos e estéticos jovens, estar à margem, ser um ―outro‖ desarraigado socialmente; segundo Bauman (2005) aqueles que não comungam e não partilham dessa concepção constituída e reafirmada pela sociedade de consumo precisam, segundo a lógica contemporânea, ser ―removidos‖, pois se tornam ―excessivos e redundantes‖, sem espaço social, são os ―refugos humanos‖, denominação usada por ele em sua obra Vidas Desperdiçadas. Há, no entanto, uma tendência em nosso meio social de fuga e silenciamento daquilo que nos incomoda, segundo Bauman (2005, p.38) ―removemos os dejetos da maneira mais radical e efetiva: tornando-os invisíveis, por não olhá-los, e inimagináveis, por não pensarmos neles‖. Pensar as práticas discursivas que incidem sobre o processo de envelhecer na nossa sociedade; as novas sensibilidades investidas sobre a velhice, os discursos que determinam a emergência de políticas públicas destinadas a idosos como é o caso dos grupos de terceira idade e sua ênfase numa velhice satisfatória, são questões que precisam ser problematizadas e repensadas dentro de um contexto marcado pelo ―hiperconsumo‖, pelo ―hipernacisismo‖ e pela ―hipermodernidade‖ (LIPOVETSKY, 2004), onde as relações são fluídas, mas não impedem a formação de ―comunidades emocionais‖ (MAFFESOLI, 2006) e a busca de relações interpessoais. ,Assumir o desafio de pesquisar o universo dos idosos participantes dos grupos de terceira idade e deflagrar discussões que transitam em meio a relações de poder é adentrar nas ambivalências da história oral, é perceber a história como invenção, como incentivadora da imaginação e não como portadora de uma verdade fixa. A história oral precisa ser vista enquanto possibilidade metodológica não-dicotômica às fontes escritas, pois elas se contaminam e se entrelaçam na tecitura da História. A pesquisa que desenvolvi encontra na história oral aporte metodológico e, a partir das entrevistas realizadas com a equipe responsável pelo Centro de Convivência e com os idosos participantes, se distende a materialização, em texto, das experiências que compartilhei e compartilho nessa pesquisa. Os 76 métodos da História oral me deram os aportes para a construção dos caminhos que seguem a pesquisa, apesar de todo o silenciamento e da ―impossibilidade de fazer história oral sob o império da sociedade escriturística‖ (ALBUQUERQUE JUNIOR, 2007). Para fundamentação da pesquisa foi importante o diálogo com alguns autores que trabalham com a História oral, Michel Trebitsch, Gwyn Prins, Olga Von Simson, Monique Augras, Alessandro Portelli dentre outros. REFERÊNCIAS ALBUQUERQUE JUNIOR, Durval Muniz de. As dobras do dizer: Da (im)possibilidade Da História Oral. IN: História a arte de inventar o passado. Bauru, SP: Edusc, 2007. AUGRAS, Monique. História oral e subjetividade. In: Simson, O.R.M.Von.(org.) Os desafios contemporâneos da História Oral. Campinas: UNICAMP, 1997, p. 213-222. BARROS, Myriam Moraes Lins de (org.). Velhice ou terceira idade? Estudos antropológicos sobre identidade, memória e política. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007. BAUMAN, Zygmunt. Identidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005a. ______. Vidas Desperdiçadas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005. BEAUVOIR, Simone de. A velhice. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1996. BORGES, Maria Claudia Moura. O Idoso e as Políticas Públicas Sociais no Brasil. In: As múltiplas faces da velhice no Brasil. Campinas: Alínea. 2003. DEBERT, Guita Grin. A antropologia e o estudo dos grupos e das categorias de idade. In: Velhice ou terceira idade? Estudos antropológicos sobre identidade, memória e política. 3ª Ed. 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Rio de Janeiro:Diadorim/FINEP, 1994, p. 19-43. 10 - A MEMÓRIA MIDIÁTICA NA CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE: O CASO DA RESIDÊNCIA UNIVERSITÁRIA MISTA DA UFCG Jéssica Lôbo Sobreira [email protected] Introdução: A Residência Universitária Mista da Universidade Federal de Campina Grande pertencente ao campus de Campina Grande nesta respectiva cidade, surgiu em meados de 1980, época em que esta Universidade ainda era denominada Universidade Federal da Paraíba, surgindo inicialmente não como uma residência propriamente dita, mas como uma alternativa a um grupo de estudantes oriundos de regiões carentes do interior do Brasil e recém aprovados no vestibular para essa mesma instituição. Não tendo como custearem as despesas para dar continuidade a seus estudos, resolveram como alternativa invadir uma casa, cujas dependências eram pertencentes a esta universidade, porém esta casa era destinada para a construção de um almoxarifado, não tendo pessoas Não podemos afirmar ao certo como ocorreu a ocupação da casa que se tornou a Residência Universitária posteriormente, pois, o acervo disponível de documentos arquivados se constitui apenas de recortes de jornais da época e de estudantes que fizeram parte das primeiras invasões, assim como alguns relatórios formulados pela 78 diretoria da casa, na época, a partir destes recortes de jornais, entretanto ninguém se preocupou em etnografar o que estava acontecendo. A Residência como moradia estudantil é uma alternativa concreta que permite ao estudante de baixa renda, portanto, marginalizado, ter acesso à educação. Tal definição nos leva a concluir que a moradia estudantil é uma situação visível de democratização do Ensino, especificamente a Residência Universitária dentro do contexto educacional representa uma luta contra o processo crescente de elitização e privatização do ensino. A moradia estudantil possui dois objetivos específicos. O primeiro é de caráter material, isto é, prestações de assistência a estudantes economicamente carentes, que, devido a sua condição econômica, tornam-se marginalizados do acesso à educação. A segunda é de caráter formal. A forma pela qual a moradia estudantil deve prestar seus serviços deve ser autônoma. (SENCE, 1987-1988) No passado, falar na Residência Universitária nos remetia a pensar automaticamente no conceito formal de bagunça, imaginar um lugar, uma casa formada só por jovens, aonde todos os indivíduos poderiam ter a liberdade para fazer o que quisessem, sem que se considerassem as suas especificidades, ou seja, essa casa e os estudantes que lá residiam eram postos à margem da sociedade, discriminando-os, como ocorre em alguns casos atualmente, especialmente entre as pessoas mais antigas da sociedade que conheceram essa realidade e ainda mantém essa imagem das pessoas que lá residem. Atualmente essa relação da Residência com valores pejorativos prevalece e, seja entre as pessoas circunvizinhas ou mesmo na comunidade acadêmica em geral, a Residência e os estudantes que lá habitam continuam a ser referência para prostituição, consumo de drogas, marginalização... herança das décadas de 80 e meados de 90, época em que a residência era um referencial a todas essas questões e, também, onde neste período houve inspeções da polícia federal visando ―solucionar‖ essas questões. Porém, passada esta fase da Residência nas suas práticas cotidianas, encontramonos, pois, diante de um cenário regido por preceitos diferentes dos que são veiculados corriqueiramente nos mais diversos tipos de ambiente da sociedade. Desse modo, para que se possa compreender às múltiplas dimensões das interações sociais nesse local, assim como, as focalizações da mídia e sua influência na constituição da identidade dos indivíduos que pertencem a este, consideramos as esferas presentes no universo deste cotidiano nas suas fontes históricas. Metodologia: O trabalho se inicia com a revisão bibliográfica acerca das interações sociais, em especial fontes acadêmicas, bem como, os estudos sobre interações sociais, sociabilidade, relações 79 sociais na juventude em geral, em especial, os de enfoques antropológicos e sociológicos, além de fontes históricas, jornalísticas entre outras, sobre acontecimentos e notícias que envolveram a Residência em questão e os indivíduos pertencentes e ou envolvidos nesse ambiente. Além dos citados, consideraremos ainda os estudos a cerca da identidade do eu e a questão referente ao cotidiano. Resultados e Discussões: A presente pesquisa significa a materialização da nossa curiosidade em saber como são estabelecidas as relações sociais dentro de uma residência universitária mista e como ocorre o processo da construção da identidade nesse ambiente por se tratar de um local com uma estrutura constituída por jovens em formação, com sua primeira experiência com a Universidade e que, muitas vezes constitui-se a primeira formação em nível superior na família. Neste trabalho buscamos investigar as particularidades sociais existentes no âmbito da residência universitária mista da Universidade Federal de Campina Grande, bem como a formação de supostos grupos como ―resultado‖ destas interações. Propomos, portanto, uma análise das interações sociais ocorridas no âmbito da Residência Universitária analisando como as mesmas acontecem, assim como se dá a formação de supostos grupos e de que modo as ―mistificações‖ deste cotidiano impostas pela mídia e pela própria memória deste local, influenciam o processo de construção da identidade. Nesse sentido, concordamos com autores como Simmel quando faz referência à sociabilidade como uma condição inerente e gerada pelas formas sociais, as quais são resultantes das múltiplas combinações interacionais acionadas pelos propósitos, impulsos e desejos dos indivíduos e dos grupos e classes sociais sintetizadas pela própria formação de uma dada sociedade (SIMMEL, 2006: 59-72). Conclusões: Nos mais diversos sistemas de moradia estudantil os processos de sociabilidade são recorrentes, seja considerando as interações sociais ou a dispersão de grupos dentro desse ambiente. A dinâmica da Residência se marca essencialmente pelos processos de interações sociais , neste sentido, esses ―encontros‖ se situa no que diz Goffman (1975) ―papel social‖ apresentando-se deste modo enquanto uma das diversas opções postas nesse espaço para a vivência do cotidiano. Buscamos compreender como estes processos são vivenciados na Residência Mista da Federal de Campina Grande. A busca por um sentido subjetivo atribuído as dinâmicas de interação social e no cotidiano de sociabilidade no âmbito da residência universitária será nosso foco de análise, por isso Goffmann nos foi tão caro. 80 Com efeito, de acordo com Simmel, a sociabilidade é uma condição inerente e gerada pelas formas sociais, as quais são resultantes das múltiplas combinações interacionais acionadas pelos propósitos, impulsos e desejos dos indivíduos e dos grupos e classes sociais sintetizadas pela própria formação de uma dada sociedade (SIMMEL, 2006: 59-72).É nesse sentido que propomos a criação de uma categoria teórico-analítica que seja capaz de dar conta do nosso objeto de estudo. Isto é plenamente justificável em nosso caso, tendo em vista que o processo de produção dos discursos que envolvem o universo da residência se deu num contexto, intermediado por situações semelhantes, seja pelo aspecto econômico, seja pelo aspecto social Falamos de identidade social como uma construção simbólica que se dá em relação ao outro e se constitui num processo histórico e cultural que, operando com o passado, com a ancestralidade e a hereditariedade, processa o presente e transforma-se a cada momento e a cada contexto da história (Silva, 2002). Por fim, invertendo valorativamente alguns aspectos sociais e culturais oriundos das relações de sociabilidade, os indivíduos buscam, através deste processo, legitimar-se no campo social mais amplo. REFERÊNCIAS ALCÂNTARA JR, José. Georg Simmel e a sociabilidade. In: George Simmel e as sociabilidades do moderno: uma introdução.(Org.) João Carlos Tedesco, Passo Fundo,RS. BRYM, Robert. et all. Sociologia: uma bússola para um novo mundo. São Paulo. Editora Thomson Learnig, 2006. ELIAS, Norbert. A Sociedade dos Indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997. GOFFMANN, Erving. Interações Sociais do eu na vida cotidiana. tradução de Maria Célia Santos Raposo. Petrópolis,Vozes,1975. LEFEBVRE, Henri. LEFEBVRE, Henri. A vida cotidiana no mundo moderno. São Paulo: Ed. Ática,1980. REZENDE,Claúdia Barcellos. 1990. “Diversidade e identidade: discutindo jovens de camadas médias urbanas”. Comunicação do Programa de Pós Graduação em Antropologia Social,n.18,p.524. Disponível em: http://www.cpdoc.fgv.br/revista/arq/315.pdf acessado em maio/2009 SENCE. Boletim da, Orgão de divulgação da Secretaria Nacional das Casas de Estudantes. Gestão, RS : 1987/1988.500 exemplares 81 SILVA, Jaime José da. Mestiçagem e Identidade: o desafio brasileiro. Monografia de conclusão de curso de graduação em Ciências Sociais. Rio de Janeiro: PUC, 2002. SIMMEL. Georg. Questões fundamentais de sociologia. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor,2006. 11 – ENTRE CÁQUIS E LEMBRANÇAS: O COLÉGIO ESTADUAL DA PRATA COMO ESPAÇO DE MEMÓRIA E PATRIMÔNIO EDUCACIONAL CAMPINENSE Ramon de Alcântara Aleixo Universidade Estadual da Paraíba-UEPB ¹ Profa. Patrícia Cristina de Aragão Araújo Universidade Estadual da Paraíba- UEPB ² Introdução: Em meio às bruscas transformações sócio-históricas nas quais estamos imersos nesse início de século XXI, observamos a tessitura de uma dinâmica espaço-temporal cada vez mais fluida, onde os acontecimentos disseminados pela mídia esvaem-se em meio ao que poderíamos denominar de ―bombardeio epistemológico‖ no que tange às mais variadas nuances da vida cotidiana, contribuindo, dessa forma, para a emersão de práticas que visam à ―preservação‖ de arquivos, museus e demais lugares que representam uma importante significação histórico-social direta ou indiretamente ligada às histórias de vidas de determinado local. Nesse período de profunda valorização das questões identitárias, somos intuídos por uma expressiva necessidade de reinventarmos nossos passados, com vistas a nos perceber enquanto sujeitos históricos pertencentes a uma dada organização sócio-cultural a qual nossas vivências e lembranças necessitam serem (re) escritas, sob pena de se perderem em meio ao dinâmico fluxo informacional em que estamos envoltos. A escrita da História, dessa forma, assume importante papel nessas sociedades para além da modernidade, onde a relação entre vivência cotidiana e a memória dos mais diversos âmbitos da vivência humana consiste no binômio bastante disseminado pelas políticas públicas de conservação, bem como pelos estudos acadêmicos que versam sobre essa perspectiva epistemológica. Sendo assim, destacamos a falência de certo projeto escriturário da História que assentado na perspectiva positivista/historicista acreditava poder reproduzir determinado acontecimento tal como se passou, como uma espécie de mímesis do real; segregando, dessa forma, as fontes históricas numa categoria em que relatos orais e reminiscências estavam pretensamente excluídas, sob pena 82 de comprometimento da tessitura de um projeto científico para o saber histórico. Contudo, as inúmeras transformações teórico-metodológicas advindas a partir da emersão da Escola dos Annales, na década de 1920, contribuíram para o despertar da percepção da diversidade das fontes históricas, bem como para o estabelecimento de um diálogo bastante necessário com as demais ciências humanas, tais como a sociologia, antropologia, dentre outras que, influenciadas pelas transformações advindas a partir da virada lingüística linguistic turn- contribuíram para a percepção da escrita e produção textual, em nosso caso para a escrita da história, não como uma superfície lisa que refletia a realidade dos eventos passados trazidos à tona pelo trabalho de pesquisa documental, mas como uma superfície cheia de altos e baixos, silêncios e lacunas que deveriam ser interrogados como elementos constitutivos acerca da narrativa do passado. Somos levados, dessa forma, a perceber a subordinação do texto histórico a uma gramática e semântica que contribuem, em certa medida, por estalar uma situação de tensão/apreensão no processo de escrita da história; alterando-se, dessa forma, a compreensão do trabalho do historiador, onde a dimensão evocativa passa assumir o primeiro plano, inscrevendo o trabalho de narrar o passado como parte dos esforços voltados à lembrança e à recordação. Lembrança e recordação constituem, nessa perspectiva, a condição sine que nom para o exercício do ofício do historiador, visto que é na dimensão evocativa que a história passa a ganhar vida, tal como em um cenário escuro, no qual incidimos as luzes da ribalta para tornar possível o desenrolar do espetáculo cotidiano de nossas vivências. O nosso objetivo, ao longo desse estudo, não visa a uma completa repulsa ao documento escrito como forma de produção dos saberes históricos. Longe disso, o que propomos nessas linhas consiste numa espécie de mescla aonde lembrança e recordação aliadas à fonte documental impressa possam elucidar e sanar as inquietações que consistem a condição essencialmente detetivesca que envolve a instigante tarefa de procurar nos indícios e sinais as ―razões de ser‖ de um tempo no qual não vivemos a não ser a partir do diálogo com as fontes, sejam elas documentais ou fruto das reminiscências individuais que tecerão a história coletiva de um dado espaço-tempo. Sendo assim, propomos a elucidação de uma discussão em torno dos conceitos de história e memória, nas perspectivas de Halbwachs (1990) e Pierre Nora (1993), com vista a tecermos um diálogo assentado na compreensão dos lugares de memória como espaços de interação entre a polifonia de vozes que ecoam dos 83 relatos individuais, vislumbrando, assim, a percepção do processo de memória social, como algo coletivo no qual os múltiplos relatos amalgamam-se com o intuito de ―desvelarmos‖ as percepções da vivência histórica. A escolha da Colégio Estadual de Ensino Médio Dr. Elpídeo de Almeida –Estadual da Prata- insere-se no contexto da dimensão e importância histórica educativa para a cidade e um grande contingente de ex-alunos/as e professores/as assumida por esta instituição, onde acreditamos ser possível a problematização de questões inerentes à tessitura das diversas relações estabelecidas entre os sujeitos da aprendizagem e educadores; observando, dessa forma, as diversas nuanças, bem como as diferentes formas de ressignificar práticas e ações processadas nos relatos de seus sujeitos histórico-sociais. A memória coletiva e os lugares de memória: uma confluência necessária para a escrita da história: Em meio ao contexto sócio-histórico marcado pela internacionalização das relações econômico-sociais e culturais, assentadas no que Pierre Nora (1993) chama de aceleração do tempo, observamos a emersão dos processos de conservação e patrimonialização do passado a partir da perspectiva de se opor ao efeito devastador e desintegrador inerente à rapidez contemporânea que caracteriza a sensação de hegemonia do efêmero forjada pela dinâmica essencialmente fluída dos tempos pós-modernos. Dessa forma, somos ―contagiados‖ por uma espécie de avalanche de processos de ―memorialização‖, configurando uma espécie de retorno do ―eu‖ e da subjetividade como critério de legitimação dos discursos sobre o passado, assim como a sobrevalorização do testemunho como fonte capaz de assegurar a veracidade das falas sobre o passado (GUIMARÃES, 2007). Contudo, se nos ativermos a meados do século passado, observaremos a preocupação elucidada pelo sociólogo Maurice Halbwachs que, ao formular o conceito de memória coletiva ou social, já apontava para a dicotomização inerente aos processos de percepção da memória coletiva e do processo histórico. De acordo com essa perspectiva, a memória social e coletiva diferiria da história, na medida em que esta acabaria segundo sua percepção, no ponto onde a memória não mais se sustentasse, em virtude de não haver a coexistência de um grupo como suporte para as lembranças existentes, consistindo na única forma de salvaguardá-las o relato escrito das experiências vivenciadas: No instante em que o grupo desaparece, a única forma de salvar as lembranças, que para os grupos existentes são exteriores é fixá-las em uma narrativa seguida por sua vez que as palavras e os pensamentos morrem, mas os escritos permanecem. Se a condição necessária para que 84 haja memória, é que o sentido de que busca suas lembranças num movimento contínuo, como a história seria uma memória, uma vez que há uma solução de continuidade entre a sociedade que lê esta história e os grupos de testemunhas e atores outrora dos fatos que ali estão narrados? (HALBWACHS, 1990. p. 23). Sendo assim, a escrita da história seria marcada pela impessoalidade, bem como pelo desaparecimento dos grupos com suas construções que cederiam lugar a outros, na medida em que fossem registrados pela escrita histórica. A renovação permanente das lembranças, defendidas pelo sociólogo, evidenciaria um outro aspecto dicotomizante entre memória e história, ou seja, a maneira como se relacionam com o tempo consiste na condição necessária para a existência da memória. Essa relação, para Halbwachs, deve ser marcada pelo sentimento de continuidade presente no indivíduo que se lembra, visto que a memória, de acordo com essa perspectiva, não se caracteriza pelo sentimento de corte ou ruptura entre o passado e presente, mas pela coexistência de elementos que se mantêm vivos na consciência do grupo que a mantém. Seria o grupo e não o indivíduo que garantiria a permanência do passado no presente, configurando o tempo longo a que se refere o autor em sua obra A Memória Coletiva. Em meados dos anos 1980 encontramos, nas reflexões desenvolvidas pelo Historiador francês Pierre Nora, uma nova distinção entre memória e história, bem como a elaboração da noção conceitual dos lugares de memória. Baseando-se no processo denominado como ―aceleração histórica‖, Nora permeia sua discussão acerca da relação entre memória e história pautando-se das transformações advindas a partir do processo de mundialização das relações econômico-sociais e culturais, visto que a ameaça do esquecimento proporcionado pelos avanços técnico-científicos proporcionariam o que ele denomina como ―obsessão pelo registro, pelos traços, pelos arquivos, em síntese pela história.‖ Aceleração da História. Para além da metáfora, é preciso ter a noção do que a expressão significa: uma oscilação cada vez mais rápida de um passado definitivamente morto, a percepção global de qualquer coisa como desaparecida - uma ruptura de equilíbrio. O arrancar do que ainda sobrou de vivido no calor da tradição, no mutismo do costume, na repetição ancestral, sob o impulso de um sentimento histórico profundo. A ascensão à consciência de si mesmo sob o signo determinando o fim de alguma coisa desde sempre ameaçada. Falas-se tanto de memória porque ela não existe mais (NORA 1993, p. 55). 85 Compactuando com a perspectiva trilhada por Halbwachs, Nora aponta a diferenciação entre memória e história na medida em que a última consiste no registro, bem como na problematização crítico-reflexiva acerca das lembranças coexistentes na estrutura social em que o grupo está (ou não) inserido. A memória, de acordo com esse processo, versaria sobre o processo vivido, conduzido por grupos vivos, em permanente mutação e suscetível a manipulações: A memória é vida, sempre carregada por grupos vivos e, nesse sentido, ela está sempre em permanente evolução, aberta à dialética da lembrança e do esquecimento, inconsciente de suas deformações sucessivas, vulnerável a todos os usos e manipulações, suscetível de longas latências e de repentinas revitalizações (NORA, 1993, p.76). Debruçando-se em questões aparentemente não explicitadas por Halbwachs, Nora contextualiza, situando-nos no processo denominado como ―aceleração da história‖ como forma de tornar inteligível o processo de patrimonialização a que este se refere como lugares de memória. Assentado em conceitos como identidades e a sua perda, os lugares de memória evidenciariam o anseio do retorno a ritos que definem os grupos, bem como na busca do auto-reconhecimento e da auto-diferenciação em voga no mundo pós-moderno. Os lugares de memória nascem e vivem do sentimento que não há memória espontânea, que é preciso criar arquivos, que é preciso manter aniversários, organizar celebrações, pronunciar elogios fúnebres, notariar atas, porque essas operações não naturais. É por isso que a defesa pelas minorias, de uma memória refugiada sobre focos privilegiados e enunciadamente guardados nada mais faz do que levar à incandescência a verdade de todos os lugares de memória. Sem vigilância comemorativa, a história depressa as varreria. São bastiões sobre os quais se escora. Mas se o que eles defendem não estivessem ameaçado, não se teria, tampouco, a necessidade de constituí-los. Se vivêssemos verdadeiramente as lembranças que elas envolvem, eles seriam inúteis. E se, em compensação, a história não se apoderasse deles para deformá-los, transformá-los, soválos e petrificá-los eles não se tornariam lugares de memória (NORA, 1993, p. 97). Identificamos, na leitura de Nora, o movimento conflituoso provocado pela necessidade de retomada dos ritos de outrora em virtude do abandono provocado pelos grupos do presente, onde a amplitude das mudanças advindas com os avanços técnicoinformacionais implicaria na rememoração desses fatos, sob pena 86 de se perderem diante do fluxo contínuo e abrupto inerente às sociabilidades em tempos pós-modernos. Entre lembranças e esquecimentos: o “Colégio da Prata” como lugar de memória da sociedade campinense: Diante de sua significativa importância para a sociedade campinense, tendo em vista o grande número de intelectuais, poetas e poetisas, professores e professaras e demais setores sociais que transitaram por entre os portões do chamado ―Gigantão da Prata‖, a percepção do Colégio Estadual de Ensino Médio Dr. Elpídeo de Almeida como ―lugar de memória‖ educativa da cidade de Campina Grande, torna-se de fundamental importância, na medida em que podemos pensá-lo como espaço de rememoração de importantes acontecimentos ocorridos na cidade, bem como a elucidação de diferentes percepções acerca desse espaço instrutivo. Instituição renomada da região da Borborema, o ―Colégio da Prata‖, como fora primeiramente denominada a instituição instalouse no contexto educacional campinense em inícios da década de 1950, onde a realidade pedagógica da cidade contava apenas com três estabelecimentos de ensino secundário, consistindo, naquele período no então Ginásio Alfredo Dantas, no Colégio Pio XI e Imaculada Conceição, atual colégio das Damas. Dessa forma, a demanda de ofertas com vistas a proporcionar aos jovens campinenses, bem como outros oriundos do sertão e cariri do estado a acessibilidade ao ensino secundário gratuito fez com que em inícios da década de 1950, setores sociais da cidade reivindicassem ao governo estadual a implantação de uma instituição de ensino secundarista na cidade, visando a detenção do grande afluxo de alunos que partiam para as cidades de João Pessoa e Recife objetivando a conclusão de seus processos instrutivos, bem como a aparente inacessibilidade dos setores sociais menos favorecidos que diante da precária situação instrutiva não dispunham de mecanismos com vistas ao prosseguimento de suas jornadas intelectuais. Em resposta à sociedade campinense, o então Governador do Estado, Oswaldo Trigueiro, comprometeu-se em implantar na cidade o curso secundarista público, sanando, dessa forma, a precariedade educacional inerente à cidade de Campina Grande e região nesse período. Em contrapartida, o então governador exigiu a predisposição de um terreno a ser edificado àquela instituição, o que viria acontecer através da doação do terreno exigido pelo Sr. Raimundo Viana, edificando-se na Rua Duque de Caixias, no bairro da Prata, a referida instituição que passaria, em um curto espaço temporal, a postular entre as mais renomadas instituições de ensino do estado da Paraíba. 87 Símbolo de imponência e credibilidade de ensino, a referida instituição contava em seu currículo prescrito disciplinas como Filosofia, Desenho, Latim e Canto visando dessa forma à preparação de grande parcela discente com vistas à admissão nos exames vestibulares. Como nos relata um de seus ex-alunos através de depoimentos escritos cedidos pela Professora Josélia Silva: Recordo, no seu grande quadro de professores, de mestres que a Universidade conquistou depois, mas se dedicavam ao Colégio como se este fosse faculdade mirim para assuntos gerais. Ninguém, tendo freqüentado as aula daquele tempo, consegue esquecer Dumerval Trigueiro (História e Francês), Milton Paiva (Inglês e Português), Antônio Oliveira (Matemática), Josemir Castro (Física), Padre Frederico (Filosofia), Hortêncio Ribeiro (História e Filosofia), Normando Feitosa (História e Geografia), José Morais (Química), João Viana (Português), Willian Tejo (Desenho), Lourdes Amorim (Física) e muitos outros, igualmente brilhantes, capazes, dedicados, respeitosos e exemplares (Juarez Farias apud Josélia Silva, 2009, arquivos do Colégio Estadual da Prata). A suntuosidade expressa por aquela instituição recém-edificada é constantemente relatada através das palavras de seus ex-alunos e alunas que ao rememorarem aos dias de outrora nos relatam as suas experiências, bem como as expectativas da sociedade campinense diante daquele momento certamente apoteótico: Enfim, o primeiro dia de aula. Que deslumbramento! A grandiosidade da edificação só não superava a excelência do corpo docente. Luminares do ensino estavam lá: Dr. Giuseppe Goia, Dr. Lindalvo Farias, Dr. Antônio Morais, Dr. Josemir de Castro, Dr. Hortênsio Ribeiro, Dr. Roberto Videres, Padre Emídio Viana Correa (primeiro diretor), Profº. Milton Paiva, Profº. João Viana Correa, Profº. Raimundo Suassuna, Profº. Normando Feitosa, Profª. Maria do Céu Carvalho, Padre Frederico, Dr. Max Hans, Dr. José Marques, Profª. Lourdes Marques e tantos, tantos outros.... Sabíamos que muitos eram professores universitários, fundadores da Escola Politécnica de Campina Grande, referência e orgulho da Paraíba. (Maria Lígia Loureiro Santos apud Josélia Silva, 2009, arquivos do Colégio Estadual da Prata). Reminiscências saudosas da referida instituição são uma constante nos depoimentos por nós analisados. Neles encontramos indícios de um ufanismo latente, bem como um profundo e imenso respeito por aquele que era um dos maiores grêmios instrutivos da Paraíba: 88 O que posso dizer à atual geração sobre o Colégio Estadual da Prata? Tudo ouso antecipar. Orgulho-me de ser aluno-fundador do educandário da Rua Duque de Caixias, vizinha à Rodrigues Alves, onde vivi a minha doce infância e vibrante adolescência. Quanta saudade! No Colégio da Prata concluí o primeiro e segundo graus, cuja excelência de ensino foi decisiva para o meu relativo êxito –perdoem-me a imodéstia- na graduação de vários cursos, na carreira de educador de gerações e na vida pública em defesa da sociedade. (Ney Suassuna apud Josélia Silva, 2009, arquivos do Colégio Estadual da Prata). Festividades integrantes do calendário escolar também são elucidadas nos depoimentos dos ex-alunos e alunas, consistindo em um importante momento acerca da tessitura da chamada Cultura Escolar, tão em voga nos estudos da História da Educação atualmente: Entre as imagens daquela época que guardo na retina, e no coração, destaco o desfile do sete de setembro em que competíamos com a altivez com colégios rivais, como o Alfredo Dantas, do saudoso Professor Loureiro e o Imaculada, das santas religiosas. (Ney Suassuna apud Josélia Silva, 2009, arquivos do Colégio Estadual da Prata). Os ―anos de chumbo‖ não viriam a tardar e provocar nessa instituição atos ―subversivos‖ que implicariam em severas represálias por parte das instituições militares aqui representadas. Dessa forma, atentamos para a importância do Centro Cívico da referida instituição no que versa à resistência diante das redes coercitivas instaladas em abril de 1964. Símbolo de resistência e politização, o ―Gigantão da Prata‖, como é carinhosamente chamada a instituição por seus ex-alunos/as, consistiu-se em importante movimento de resistência ao poder militar através da organização de passeatas, protestos e encontros ―clandestinos‖, com vistas à discussão de tema políticos e culturais. Contudo, as redes microbianas de poder atuariam de forma bastante veemente na repressão às chamadas ordens subversivas, como nos elucida uma Portaria datada de abril de 1971, informando da proibição de matricular um aluno por três anos, por infringir Leis do Governo Militar. Entretanto, a utilização de táticas e astúcias, não impediu a dinamização alcançada por seus movimentos políticos e culturais. Como nos relata o depoimento de um dos membros do Centro Cívico da referida instituição: O Colégio Estadual marcou definitivamente a minha vida. Foram dez anos de convívio. Enquanto o governo militar ditava as regras, vivíamos o apogeu do movimento 89 Hippie, que falava de amor. Este antagonismo serviu de esteio para a formulação do meu pensamento filosófico e de minha postura diante do mundo, que trago atualmente comigo (Altamir –Mica- Guimarães apud Josélia Silva, 2009, arquivos do Colégio Estadual da Prata). Ao adentrar os anos finais da década de 1970 e inícios dos anos 1980, observamos o processo de massificação do ensino público brasileiro, correspondendo ao aumento do número de instituições escolares, bem como na gradativa diminuição dos quadros de qualidade de ensino. A partir desse período, somos conduzidos a uma aparente situação de decadência da instituição escolar pública evidenciada em nossas observações em algumas escolas, bem como pelo quadro de evasão, retenção e violência escolar. A referida instituição não escapou a esse processo de deterioração da instrução pública nacional. Contudo, observamos, nos relatos dos seus ex-alunos e alunas a ânsia pela conquista de uma maior respaldo educativo acerca das políticas públicas já instituídas no âmbito da educação básica. Eu agora vejo o Estadual da Prata, como ele está nas últimas décadas, enfrentando dificuldades que o impede de atingir seus objetivos em plenitude, embora continue exercendo a finalidade maior de educar. Mas, eu sempre sonho com o Estadual da Prata como ele já foi e deveria continuar sendo, prestigiado pelos poderes constituídos e pela sociedade, pois ele é, em termos educacionais, o porto seguro para muitos, notadamente para aqueles que não têm condições de enfrentar os encargos de uma escola particular. Como na História infantil. Nem tudo está perdido, restam esperanças. (Creusolita Agra apud Josélia Silva, 2009, arquivos do Colégio Estadual da Prata). Se muito dinheiro tivesse, não perderia um segundo sequer, e traria de pôr em prática meu projeto [...] Se eu dispusesse do dinheiro necessário, sem hesitar, botaria preço no Colégio Estadual da Prata e, apesar da possível indignação do secretário de educação, passaria para o meu nome o educandário da minha juventude. Uma vez comprado, logo, logo, trataria de reformulá-lo, visando resgatar-lhe os traços arquitetônicos originais, que tanto marcaram, ao longo de seguidos anos, a sala de exibição de minhas retinas, parceiras da minha míope rebeldia. Ao fim da reforma do colégio de minha adolescência, Oxford da minha desesperança, reuniria meus pertences e ia morar no Gigantão da Prata, de onde se pode, sem incômodos, ver raiar, com intenso brilho, as auroras campinenses. De lá eu poderia, todos os dias, como numa oração matinal, ver a Igreja do Rosário e, a exemplo de um milagroso filme, vislumbrar imagens de Padre Cristóvão e seu Chico, o sacristão, até os dias atuais de 90 padres e tantos padres que lembram nostalgicamente a minha primeira comunhão e os saborosos e ingênuos dias em que eu e os meus amigos de infância pegamos por empréstimo alguns valiosos cruzeiros da magra caixa das almas fruto de nossa sempre imatura caridade cristã. Durante o dia, convocaria meus colegas de turma (os que ainda podem atender a uma chamada escolar) e passaríamos as horas relembrando os nossos sonhos juvenis, nossas músicas, contaríamos, tudo quanto conseguimos ou não realizar. Ouviríamos nossas musicas, contaríamos nossas piadas e daríamos, das escadas mágicas do colégio, bananas para o mundo ou, na pior das hipóteses, jogaríamos suas cascas nas calçadas sob os pés da história para que ela, já que não pode parar, ao menos levasse uma estrondosa queda, o que nos daria os segundos suficientes para pararmos o tempo, São Jorge das nossas fumegantes quimeras‖ (Altamir–MicaGuimarães apud Josélia Silva, 2009, arquivos do Colégio Estadual da Prata). Considerações Finais: Em meio ao contexto social marcado pelo que Pierre Nora denominou de ―aceleração da história‖, torna-se de fundamental importância (re) pensarmos a constituição dos nossos lugares de memória. Dessa forma, devemos atentar para a condição essencialmente precária em que se encontram nossos arquivos, museus e espaços que guardam em suas paredes histórias de vida que necessitam serem evocadas, sob pena de ficarem esmaecidas e amareladas nas gavetas do tempo. No que concerne à referida instituição, é de fundamental importância cobrarmos das autoridades competentes a efetivação de políticas públicas que visem não apenas conservar e tombar casarios históricos, mas que nas diversas nuanças do fazer história possam ser preservadas os mais diversos espaços significativos para os mais variados lugares sociais que atuam cotidianamente no espetáculo de nossas vidas. A história do ―Gigantão da Prata‖ ecoa gritos de socorro. Gritos que necessitam serem olvidos, se não pelas autoridades públicas, ao menos por seus queridos filhos e todos e todas que se interessem na conservação da sua bela e pujante história. Pensar o Colégio Estadual Dr. Elpídeo de Almeida enquanto patrimônio educacional campinense e como lugar de memória de tantos e tantas que por lá passaram, implica em atuarmos de forma veemente, lutando contra o esquecimento a que parece estar relegadas as históricas escadas, as paredes tão ricas de informações que necessitam serem ouvidas para contarem uma outra história que não apenas as dos grandes e heróis e batalhas nacionais, mas histórias de vida, de luta, de resistência que sem a condição da rememoração e lembrança estariam fadadas a se perderem por entre as sinuosas curvas da longa estrada chamada História. 91 REFERÊNCIAS CERTEAU, Michel. A escrita do cotidiano. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1994. FOUCAULT, Michel. As Palavras e as coisas. São Paulo: Martins Fontes, 1999. _______.Vigiar e Punir. 8. ed., Petrópolis: Vozes, 1991. GUIMARÃES, Manoel Luiz Salgado. O presente do passado: as artes de Clio em tempos de memória. In: Cultura política e leituras do passado. 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Campina Grande, 2003. 12 MEMÓRIAS (RE)EDITADAS E IDENTIDADES INSTITUÍDAS: RASTREANDO BIOGRAFIAS SENTIMENTAIS Silêde Leila Oliveira Cavalcanti 10 O desafio de investigar temáticas no campo das subjetividades e dos sentimentos, tendo como recorte temático as sensibilidades afetivas de idosos(as) na contemporaneidade articuladas as identidades de gênero e de família, me conduziu ao encontro de biografias, lembranças, narrativas e memórias como suporte documental imprescindível de minhas análises e elaborações teórico- metodológicas da pesquisa do trabalho de doutoramento que ora se realiza. A crença do direito/dever da memória como caminho de reconhecimento social tem sido enfatizada por movimentos sociais e atitudes políticas de determinados grupos 10 A autora é professora da unidade acadêmica de História e Geografia do Centro de Humanidades da Universidade Federal de Campina Grande e doutoranda pela Universidade Federal de Pernambuco 92 sociais marginalizados e silenciados sócio e historicamente em seus valores, demandas e desejos. Debruço-me sob as memórias involuntárias, fugidias, abandonando o campo da memória voluntária, já historicizada e consagrada na contemporaneidade, visto que na operacionalização da historiográfica das memórias tem se dado ênfase e consagração a memória como faculdade intelectual e cognitiva, como produtora do conhecimento, mutilando a polissemia das memórias em suas várias dimensões e estatutos, tão bem enfatizados por Proust e Bérgson, e considerando sua trifuncionalidade que seriam a memória-ação, a memória-afetiva e a memória conhecimento. Nas três últimas décadas vivemos um verdadeiro ―frenesi da memória‖, irrompendo-se nos campos da historiografia, da antropologia, das ciências sociais como um todo, uma revalorização das fontes orais como instrumento e caminho eficaz de revisitação, reatualização das lembranças e do passado vivido e meio de produção de saberes históricos. A crença do direito/dever da memória como caminho de reconhecimento social tem sido enfatizada por movimentos sociais e atitudes políticas de determinados grupos sociais marginalizados e silenciados sócio e historicamente em seus valores, demandas e desejos. Evidencia-se um acúmulo de falas e uma operacionalização com grau cada vez mais de sofisticado e eficaz, demarcando territórios identitários como culturas afirmativas e inclusivas de grande fôlego, depurando uma questão sensível do reconhecimento social de indivíduos, grupos e tribos marginalizadas. As memórias como fonte histórica e a história oral e/ou a análise do testemunho oral são, respectivamente, os documentos e a metodologia escolhida na construção do referido trabalho. A questão do corpo envelhecido e suas subjetividades e cartografias amorosas são falas muito recorrentes entre muitos dos indivíduos que ora demarcamos como foco de análise; seja pra recordar com saudade, para ser ouvido e fugir da solidão, ou para rejeitar, silenciar, se arrepender, ou ainda, para pensar e viver projetos amorosos num momento que os especialistas consideram estranho. Esses campos de abordagens tem muitas trilhas inexploradas e desejantes de investigação, configurando-se como caminho de afirmação dos cientistas sociais, em especial dos historiadores, como indivíduos comprometidos com o reconhecimento e acolhimento das identidades e das diferenças há muito marginalizadas e silenciadas. Recusando o apego a memória voluntária e optando pela a escuta/análise das memórias involuntárias, trilho um percurso que não comunga com a desqualificação das memórias dos sentimentos e dos (res)sentimentos, que as insere no terreno de irracionalismo avesso à história. Nesse sentido considero as memórias menos 93 como conhecimento e razão e, mais como sensibilidade e afeto, recorrendo a dimensão ética da memória, visto que ― lembramos menos para conhecer do que para agir‖, afirma Ansart, recorrendo a Todorov e Habermas. Esse atributo fortemente ético, certamente incide sobre as condutas dos indivíduos e dos grupos sociais que com suas memórias extremamente diversificadas irrompem e invadem a cena pública em busca reconhecimento, visibilidade e articulação. Mergulhar nas águas turvas e duvidosas das memórias involuntárias, atentando para sua multiplicidade e vulnerabilidade torna mais desafiante e enriquecedora o trabalho do historiador que recusa simplificações e unificações de narrativas e interpretações historiográficas. A questão dos elos entre memória e sentimento estão ainda por ser efetivamente tecidos e explorados em meio a tradições historiográficas que devoram e anulam as emoções como canais de reconhecimento, escuta e atualizações das experiências humanas. Os sentimentos amorosos, de (des) afetos, de ódio, bem como as marcas simbólicas e cicatrizes sociais foram recusados, por uma abordagem racionalizante, como fontes de historicidade, produção de sentidos e de significados na produção de saberes sociais e históricos. As abordagens sobre relatos de vida, de cunho (auto) biográficos, proporcionam o desfilar de palavras- pessoas cujos propósitos de vida não se confundem com os destinos oficiais, pois são personagens anônimos que nada fizeram de ― histórico‖, viveram simplesmente suas vidas como centenas e milhares de contemporâneos, atores indizíveis pelas histórias oficiais. Mergulhar nesses meandros, exige dos historiadores sensibilidades para pensar o sentido estético de seus contemporâneos e para observar como uma experiência narrada oferece fragmentos de vida. Os personagens centrais dessa história são os narradores que não buscam recuar-se do presente para reviver os acontecimentos, pois rememorar é uma atividade orientada pela atualidade (BOSI, 1994), os relatos se dão na perspectiva do presente, apoiando-se em ―fórmulas verbais para acomodar o passado‖, ocorrendo que o trabalho de rememoração aparece ―como um ato de intervenção no caos das imagens guardadas‖.( MALUF, 1995). A memória como prática social e gênero literário (BOSI, 1994; LACERDA, 2000), é marcada pelo discurso-verdade, desejo evidenciado nas escrituras (auto) biográficas (LACERDA, 2000). Nas histórias e nos relatos de vida as lembranças aparecem como produtos de um testemunho ocular da história do seu tempo, promovendo ao depoente a elaboração de seu discurso de forma impermeável as ambivalências, subjetividades e as interpretações pessoais. Nesse jogo de relatos de si encenam-se simultaneamente sentidos, traços, concepções, impressões que revelam o esforço de 94 enquadramento da memória, buscando retirar as impurezas e tensões que conspiram contra uma identidade, uma escrita de si coerente, linear e lógica. No trabalho de pesquisa e análise das reminiscências e marcado pelas limitações e possibilidades do uso da memória, se faz necessário a constituição do pacto autobiográfico, a partir da experiência pessoal revelada a outro, num acordo tácito de um eu autorizado pelo próprio sujeito enunciador (LACERDA, 2000). A operação com as reminiscências é uma tarefa complexa, pois nesse pacto autobiográfico nada é esquecido ou lembrado, logo o trabalho com a memória é uma recriação, no presente, do passado, ou uma reinvenção do passado no presente. Os lapsos de memória podem, assim, ser considerados não apenas falhas ou rupturas, mas como parte do próprio texto. Isso é bem sinaliza como ―se a palavra é uma forma de dizer, é também uma forma de ausência. Essa ambivalência da palavra inscreve-se diferentemente em cada depoimento‖ (LACERDA, 2000:88). Os relatos de experiências passadas, bem como as escritas autobiográficas, denotam uma operação catársica, instaurando, quase sempre, uma atmosfera de dores, nostalgia, melancolia. Movidos muitas vezes pela saudade, velhice, temor a morte e a sensação de ruptura irreversível do passado com o presente e a perda de si mesmo, essas narrativas, orais ou escritas, buscam uma nova estética de existência, como caminho para inventar sentidos e de inventar a si mesmo. REFERÊNCIAS ANSART, Pierre. História e memória dos ressentimentos In: Memória e (res) sentimento Indagações sobre a questão sensível, BRESCIANI, Stela e NAXARA, Márcia (org.); Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2001. ESCOSTEGUY, Ana Carolina. Identidades culturais. Uma discussão em andamento. In: Cartografias dos estudos culturais. Belo Horizonte: Autêntica, 2001 FELDMAN-BIANCO, Bela; CAPINHA, GRAÇA (org.). Identidades: estudos de cultura e poder. SP: Hucitec,2000 GAGNEBIN, Jeanne Marie. Memória, História, Testemunho In: Memória e (res) sentimento Indagações sobre a questão sensível, BRESCIANI, Stela e NAXARA, Márcia (org.); Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2001. ______. Lembrar escrever esquecer SP: ed. 34, 2006 JOSSO, Marie- Christine. Os relatos de histórias de vida como desvelamento dos desafios existenciais da formação e do conhecimento. In: Tempos, Narrativas e ficções: a invenção 95 de si SOUZA, Elizeu Clementino de e ABRAHÂO. Maria Helena Menna (org.); Porto Alegre: Edipucrs: Eduneb, 2006. LACERDA, Lilian Maria. Lendo vidas: A memória como escritura autobiográfica. In: Refúgios do eu: Educação, História e escrita autobiográfica MIGNOT, Ana Chrystina Venâncio, BASTOS, Maria Helena Camara e CUNHA, Maria Teresa Santos (org.) Florianópolis: mulheres, 2000. SEIXAS, Jacy Alves. Percursos de memórias em terras de História: Problemáticas atuais In Memória e (res) sentimento Indagações sobre a questão sensível, BRESCIANI, Stela e NAXARA, Márcia (org.); Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2001. 13 - “...E SEM O SEU TRABALHO O HOMEM NÃO TEM HONRA:” Notas sobre as transformações no mundo do trabalho e impactos na identidade social Ana Maria Morais Costa Mestranda do PPGCS/UFRN [email protected] Dr. José Willington Germano – orientador [email protected] As últimas décadas do século XX foram marcadas por profundas transformações em todas as dimensões da vida e do fazer humano. Porém as transformações que envolvem o mundo do trabalho se constituem como afirma CASTEL (2001) na nova questão social. A sua centralidade se apresenta em diversos elos que envolvem a vida cotidiana nos aspectos econômicos, sociais, culturais e políticos. Dentre os espectros que ameaçam a tessitura social encontram-se o desemprego (com desdobramentos no campo da moradia, saúde, educação, lazer, organização social, dentre outros), insegurança e precariedade nas novas formas de ocupação, queda dos salários reais e exclusão social. É importante destacar que não é qualquer problema social que possa ser analisado como questão social. Torna-se uma questão social, aquele conjunto de problemas que ameaçam o esgaçamento do tecido social. Para CASTEL (2001), as transformações na ordem do trabalho se constituem uma questão social porque a categoria trabalho é muito mais que relações técnicas de produção, implicando num feixe de relações sociais, culturais e identitárias de indivíduos e grupos coletivos. Para o autor os processos de conquista e afirmação da condição salarial, sobretudo no último século, se consolidaram como uma das possibilidades de construção da autonomia social dos 96 indivíduos através do trabalho. As conquistas envolvendo os direitos trabalhistas, salário mínimo garantido, proteções ligadas ao trabalho, afirmando um estatuto do emprego exemplificam uma perspectiva que hoje se encontra fragilizada. Diante do novo cenário encontram-se ainda perplexos, os governos cujas políticas de proteção social têm causado polêmicas nos espaços de debates políticos, vivência e construção da cidadania coletiva e organizada. Os sindicatos, que mergulharam numa crise de orientação política e ideológica em conseqüência do movimento de desregulamentação de leis, supressão de direitos trabalhistas, queda das taxas de sindicalização, dentre outros. A ciência, que necessita aprofundar os questionamentos sobre a sua capacidade de apreender os processos naturais e sociais que se desenvolvem no mundo, e ainda, os organismos internacionais, e os cidadãos. Para CASTEL (2001: p. 495-497), a nova questão social tem como eixo central o enfraquecimento da condição salarial. O autor ressalta que a centralidade do trabalho construída ao longo da história da produção da existência material das pessoas em suas constantes lutas pela sobrevivência, conquista da dignidade e felicidade social, impôs o salariado definitivamente como uma marca em detrimento dos outros suportes da identidade. Desse modo o deslocamento dessa centralidade provoca alterações nas diversas dimensões que envolvem os modos de ser, pensar e viver fundamentado numa representação da história na qual o mundo do trabalho, o progresso, a organização social e política e a felicidade social se encontram e se imbricam na construção dos processos identitários. O salariado acampou durante muito tempo às margens da sociedade; depois aí se instalou, permanecendo subordinado; enfim, se difundiu até envolvê-la completamente para impor sua marca por toda parte. Mas é exatamente no momento em que os atributos vinculados ao trabalho para caracterizar o status que situa e classifica um indivíduo na sociedade pareciam ter se imposto definitivamente, em detrimento dos outros suportes da identidade, como o pertencimento familiar ou a inscrição numa comunidade concreta, que essa centralidade do trabalho é brutalmente recolocada em questão. Para o autor, a perspectiva histórica e sócio-cultural que o trabalho assalariado conquista lhe confere uma situação na qual o trabalho é mais o que o trabalho e, o não trabalho é mais que o desemprego. Ressalta que do século XIX ao século XX seria difícil construir uma idéia de autonomia relacionada ao trabalho, porém houve através de conflitos e lutas, uma transformação na condição do trabalhador. Ao trabalho se associaram garantias que possibilitariam a construção e exercício dessa autonomia. À medida que o trabalho e a condição salarial foram evoluindo 97 historicamente, ser trabalhador não era apenas cumprir uma jornada de tantas horas de trabalho por dia e por semana, era também ter um estatuto. Dessa forma, a sociedade salarial construiu no trabalho seu principal parâmetro de sustentação de um equilíbrio social, de modo que o seu deslocamento apresenta uma situação inédita na escala de meio século, marcada por incertezas e desafiantes processos de reestruturação nas relações de produção. A novidade não é só a retração do crescimento nem mesmo o fim do quase pleno emprego, a menos que se veja aí a manifestação de uma transformação do papel do ―grande integrador‖ desempenhado pelo trabalho. O trabalho como se verificou ao longo desse percurso, é mais que o trabalho e, portanto, o nãotrabalho é mais que o desemprego, o que não é dizer pouco. (CASTEL: 2001 p. 496). Vale salientar que a concepção do trabalho, o sentido a ele hoje atribuído, passou por várias modificações ao longo da história. Na origem, o termo deriva do latim, tripalium que é um instrumento de tortura. Na Grécia, da mesma forma, o trabalho não era valorizado. Era associado à satisfação das necessidades básicas do homem (vestir-se, alimentar-se, produzir, comerciar) e por esse motivo era relegado aos escravos. Para os romanos, a palavra trabalho significava dor, sofrimento. Na Idade Média, o trabalho continuou sendo considerado uma atividade pouco nobre, uma vez que os realmente nobres não deveriam trabalhar. É a partir do século XVIII que essa concepção sofre uma mudança essencial. A idéia de progresso associada ao desenvolvimento da indústria coloca o trabalho humano como principal motor para transformação da natureza, das coisas, e da sociedade. O trabalho se torna a principal referência para o desenvolvimento histórico da sociedade capitalista, conforme MARX (2008: V.I. p. 375), o trabalho é o ponto de partida da produção capitalista: A produção capitalista só começa realmente quando um mesmo capital particular ocupa, de uma só vez, número considerável de trabalhadores, quando o processo de trabalho amplia sua escala e fornece produtos com maior quantidade. A atuação simultânea de grande número de trabalhadores, no mesmo local, ou, se quiser no mesmo campo e atividade, para produzir a mesma espécie de mercadoria sob o comando do mesmo capitalista, historicamente e logicamente constitui, o ponto de partida da produção capitalista. As reflexões de Marx apontam também para o processo dialético presente no trabalho, que permite ao homem criar a si mesmo, sua própria história e o seu lugar. Conforme MARX o trabalho também um processo que reúne o homem e a natureza e que permite ao 98 mesmo regular as relações materiais estabelecidas entre ambos, ao modificá-la, ele muda ao mesmo tempo a sua própria natureza, desenvolvendo forças adormecidas e direcionando-a a agir em obediência ao seu poder. A perspectiva desenvolvida por Marx coloca a centralidade do trabalho no debate do desenvolvimento histórico das sociedades e da evolução do homem. Para ENGELS (1984: p 9), o trabalho é mais do que o ato de transformar a matéria-prima em riqueza. O trabalho ―é o fundamento da vida humana‖. O autor afirma que ―sob determinado aspecto, o trabalho criou o próprio homem‖. Desta forma, ao longo dos últimos séculos o trabalho e, sobretudo, o trabalho assalariado conquistou lugar central na sociedade. A sua posição reconhecida na divisão social do trabalho lhe deu um ―lugar‖ na sociedade. Passou a ser identificado como meio de realização profissional e pessoal e um dos principais instrumentos através do qual o homem dialoga com seu meio social e com seu tempo. Evidentemente não se pretende aqui, apresentar uma visão estática da história. O capitalismo como regime de produção e organização social caracteriza-se pela constante renovação nos métodos de produção e gerenciamento. A revolução tecnológica em curso é sem dúvidas um dos seus grandes marcos. O que se ressalta são algumas características da sociedade que emerge como fruto desta revolução. Na qual, tempo e espaço são resignificados com novas funções, favorecendo o desencaixe das relações sociais, à descentralização da produção e da distribuição de mercadoria, desregulamentação dos direitos dos trabalhadores e uma série de alterações nas dimensões material e subjetivas da classe trabalhadora. A emergência dessas características aponta para KURZ (1992) uma crise do sistema mundial produtor de mercadorias, colocando em xeque a suposta situação de ―normalidade‖ do sistema capitalista dos países do Ocidente. O autor percebe as sucessivas crises do capitalismo como processos inerentes de regulação do mercado. Cada vez mais os países do Ocidente estão diminuindo a capacidade aquisitiva das massas, limitando-se a setores cada vez menores, tendo em vista que as produções com maior produtividade terem que se esforçar para estarem presente em todos os lugares do mundo. Os impactos dessa alteração se revela na correlação entre inovação tecnológica e organizacional e o crescimento dos índices de desemprego industrial, provocando um conjunto de fatores de ordem política, econômica, social e cultural. Para CASTEL (2001: p. 498) entra em crise a própria representação de uma história que associa a déia do progresso com o trabalho e o desenvolvimento: 99 Fundamentalmente, é uma representação do progresso que talvez tenha sido levada pela ―crise‖: a crença de que o amanhã será melhor que o hoje e de que se pode confiar no futuro para melhorar sua condição; ou sob outra forma menos ingênua, a crença na existência de mecanismos para controlar o futuro de uma sociedade desenvolvida, dominar suas turbulências e conduzi-la a formas de equilíbrio organizadas de modo cada vez melhor. Trata-se sem dúvida, de uma herança eufemística do Ideal revolucionário de um domínio completo do homem sobre o seu destino através da ambição de fazer entrar, ainda que à força, o reino dos fins da história. Entretanto, com o progresso, não se trata de instaurar `a força, aqui e agora, um mundo melhor, mas de preparar transições que, progressivamente, é oportuno dizer, permitirão que dele se aproxime. Desse modo, percebe-se que as conseqüências do deslocamento da centralidade do trabalho para o fortalecimento dos elos da identidade social, extrapola o aspecto social da desagregação daqueles que vivem a condição de não-trabalho. A descentralização da produção e a flexibilização das relações de trabalho modificaram a natureza do trabalho, acabando com a relação fixa entre o trabalho e o local de execução, bem como com a estabilidade do trabalhador no seu emprego. CASTEL (2001: p. 531), embora argumente a dificuldade de manejar uma relação entre identidade e trabalho no quadro de uma argumentação rigorosa, afirma que: Seria possível, talvez sintetizar essas transformações recentes dizendo que, para categorias cada vez mais numerosas da população ativa, e a fortiori para as que estão colocadas em situação de inatividade forçada, a identidade pelo trabalho está perdida (…) Certamente é possível identificar vários círculos de identidade coletiva fundada primeiro na profissão ( o coletivo trabalho) e que pode prolongar-se em comunidade de moradia (o bairro popular), em comunidade de modo de vida, (…) opertencimento sindical e político. Para OFFE (1994, p. 178-9), o fato de alguém ser empregado tem pouca importância na definição da identidade social. A ênfase recai para outras questões como estilos de vida e preferência cultural. Para o autor, dizer que é trabalhador informa muito pouco sobre a pessoa. Essa discussão questiona a centralidade do trabalho como categoria sociológica chave para a investigação social e apresenta a possibilidade do reconhecimento da perda de espaço do trabalho como referência das identidades sociais e importância subjetiva na vida das pessoas. Evidentemente a diversidade da classe trabalhadora, devido a heterogeneidade e a fragmentação dificultam de certa forma, a 100 relação trabalho – identidade social. A atual composição interna da classe trabalhadora inclui segmentos diferenciados que sobrevivem de salários: operários, trabalho de capital industrial, comercial e financeiro, empregados na produção de bens materiais e imateriais, funcionários públicos. A identidade com base em traços comuns não coincide. Porém verifica-se que o deslocamento da centralidade do trabalho provocou alterações subjetivas relacionadas aos modos de ser e viver em sociedade com repercussão nas formas de organização política e sindical. REFERÊNCIAS CASTEL, Robert. As metamorfoses da questão social: uma crônica ao salário. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001. ENGELS, Friedrich. O papel do macaco na transformação do macaco em homem. 2. ed. Global, São Paulo, 1984. MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política, V. I. tradução de Reginaldo Sant'Anna. 26. edição. Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 2008. KURZ, Robert. A crise do sistema mundial produtor de mercadorias. In: O colapso da modernização: da derrocada do socialismo de caserna à crise da economia mundial. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. OFFE, Claus. Dominação de classes e sistema político. Sobre a seletividade das instituições políticas. In: Problema estruturais do Estado capitalista, pp. 140-177. _______. Capitalismo desorganizado. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. 14 - EXPERIÊNCIAS DE VIUVEZ NA VELHICE Kátia Ramos Silva Graduada em Ciências Sociais – UFCG Profa. Dra. Benedita Edina da Silva Lima Cabral (PPGCS – UFCG) Orientadora O acentuado aumento da expectativa de vida da população mundial e brasileira, em particular, provoca sensíveis alterações na dinâmica familiar e relacional, que caracterizam a sociedade contemporânea. É neste contexto que o segmento populacional que adquire cada vez mais espaço nos debates acadêmicos e nas políticas públicas é aquele que atinge a faixa etária dos 60 anos de idade. Na discussão sobre o tema idoso e família, um aspecto desperta a atenção dos estudiosos é o estado conjugal da população idosa, na medida em que dados demográficos apontam para a significativa prevalência da viuvez na velhice. Esse dado, 101 portanto, adquire importância expressiva na análise da velhice na contemporaneidade, visto que essa condição conjugal modifica, de maneira singular, a dinâmica familiar e as estruturas da sociedade. Partindo desse pressuposto, esse trabalho tem o objetivo de atentar para as experiências de viuvez, de homens e mulheres com 60 anos e mais de idade, que passaram de uma condição de conjugalidade para a de viuvez na velhice. Para tanto, entrevistamos sete mulheres e três homens e os registros coletados durante a realização das entrevistas foram analisados à luz de um referencial teórico referente aos temas: velhice, família, viuvez e morte. Assim, as experiências de tornar-se velho e vivenciar a condição de viuvez conduzem a uma maior reflexão sobre essa condição peculiar e apontam para um universo denso da vida conjugal. O aumento acentuado da expectativa de vida da população mundial e brasileira, em particular, atrai a atenção de estudiosos de várias áreas de conhecimento – da sociologia aos direitos previdenciários, da psicologia à antropologia – desde a década de 1970, quando passou-se a acompanhar científica e empiricamente as paulatinas, mas significativas alterações nos padrões demográficos vigentes até então. Atreladas a essas sensíveis alterações demográficas, encontram-se as novas configurações familiares e relacionais, que caracterizam a sociedade contemporânea. Com esses novos padrões instituídos, o segmento populacional que adquire cada vez mais espaço nos debates acadêmicos e nas políticas públicas é aquele que atinge a faixa etária dos 60 anos de idade. As discussões sobre o segmento idoso abrangem temáticas diversas, tais como aposentadoria, fragilidade, abandono, violência, a inserção do idoso na família, solidão, são das mais recorrentes. Quando se trata de analisar o tema idoso e família, algo que desperta a atenção é o estado conjugal da população idosa. Segundo dados demográficos, na ―PNAD de 1995, as mulheres viúvas constituíam 45% das mulheres idosas, as separadas 7% e as solteiras outros 7%. Por outro lado, quase 80% dos homens estavam em algum tipo de união conjugal‖. (CAMARANO, 2002, p. 7-8). Assim, a viuvez adquire importância expressiva na análise da velhice, visto que essa condição conjugal modifica, de maneira singular, a dinâmica familiar e as estruturas da sociedade. É importante salientar que embora o número de homens velhos viúvos seja proporcionalmente inferior ao de mulheres idosas que compartilham esse status marital, a análise das experiências de viuvez na velhice pode ser um campo fértil para o debate sobre questões de gênero. A pesquisa busca investigar a condição de viuvez de um grupo de idosos da cidade de Campina Grande – PB. O objetivo é 102 compreender a vivência e as particularidades dos indivíduos na viuvez, e nos deteremos no estudo de homens e mulheres com 60 anos e mais de idade, que passaram de uma condição de conjugalidade para a de viuvez na velhice. Percebemos que a viuvez além de corresponder a uma condição permeada por estereótipos, estigmas (GOFFMAN,1980) e liminaridades, é ainda bastante invisibilizada nos estudos dos cientistas sociais. Quando associada à velhice, embora o peso demográfico seja bastante expressivo, a escassez de pesquisas é mais ―perceptível‖ e os preconceitos ditados por normas sociais parecem ser ainda mais reforçadas. Alda Britto da Motta, pesquisadora reconhecida na área dos estudos de gênero, velhice e geração, se propôs a discutir a questão da viuvez na velhice e apontou para uma das possíveis razões para o ―mistério dessa ausência‖ da viuvez no cenário acadêmico e social, afirmando que isso acontece ―sobretudo porque a condição de viuvez é majoritariamente das mulheres, e identificada, como estereótipo, basicamente a estas‖ (MOTTA, 2005, p.7). A feminização da velhice possivelmente parece exercer uma acentuada influência sobre esse silenciamento da experiência de viuvez na velhice. Contudo, pesquisar um tema pouco explorado, nos instiga a observar a realidade mais detidamente, de forma a contribuir com as discussões ainda incipientes. A morte do cônjuge com quem se compartilhou longos períodos e momentos significativos da história de vida corresponde, talvez, à mais importante perda com a qual os mais velhos têm que lidar e superar. Deste modo, na velhice, essa perda é sentida com maior intensidade, visto que ela atua como uma inexorável ruptura. Ruptura de um tempo, de uma condição, de uma relação, do entrelaçamento de uma dupla trajetória que culmina com a finitude da vida. A análise dos relatos dos participantes da pesquisa explicitou importantes aspectos das experiências de viuvez na velhice. Percepções singulares dos informantes sobre a dupla condição social ostentada – velhos e viúvos – expuseram as formas pelas quais eles reconstroem a passagem limiar da conjugalidade à viuvez, elaboram sua autorepresentação, se colocam diante da finitude da vida e se readaptam à sociedade durante o pós-viuvez. É nesse contexto que a apreciação dos relatos dos entrevistados, possibilitou perceber a diversidade de significados que a condição de viuvez comporta, alternando entre situações de instabilidade emocional e entre modificações nas relações estabelecidas com a família e a rede de sociabilidade dos enviuvados e enviuvadas. A ausência do cônjuge de longa data desestabiliza o cotidiano do viúvo, já anteriormente estabelecido com o par conjugal. As 103 sensações que emergem, portanto, são de incompletude e inconstância, repercutindo em diversas esferas da vida dos indivíduos que vivenciam a condição de viuvez. Reconhecidamente, a perda do par conjugal altera de forma definitiva as estruturas familiares e os aspectos cotidianos da vida dos indivíduos. A instauração de uma nova dinâmica na chefia do lar, a reorganização dos recursos econômicos, mudanças comportamentais, novas formas de relacionamento com filhos e netos, readaptação aos hábitos cotidianos são parte das situações com as quais os viúvos se deparam após a morte do cônjuge. Como já referido, na velhice, todo esse processo de reinserção social e familiar ocorre de forma mais intensa. A partir disso, percebemos que, além das naturais variações de ordem subjetiva nos sujeitos que vivenciaram a passagem da conjugalidade à condição de viuvez na velhice, as distinções entre gênero, geração e classe social, perpassam e influenciam de forma significativa as representações de viuvez que se desenvolvem na contemporaneidade. A discussão sobre a viuvez na velhice, contribui, portanto, para oferecer possibilidades de debates profícuos sobre novas dinâmicas familiares, relacionais e comportamentais que se instauram na vida dos idosos após a perda do par conjugal. REFERÊNCIAS CAMARANO, Ana Amélia. Envelhecimento da população brasileira: uma contribuição demográfica. Texto para discussão, n. 858, Rio de Janeiro, p. 1-31, 2002. GOFFMAN, Erving. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. 3. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1980. MOTTA, Alda Britto da. Viúvas: o mistério da ausência. Estudos Interdisciplinares sobre o Envelhecimento, v. 7, p. 7-34, 2005. 15 - OPERAÇÃO DEMOCRÁTICA: GILBERTO FREYRE E SEUS ARTIGOS NA IMPRENSA NO PERÍODO 1964-1979 Rachel Soares Cavalcanti UFPB – PPGS/CAPES [email protected] O presente estudo tem o intuito de analisar como Gilberto Freyre incorporou as idéias expressas em suas obras para legitimar, em 1964, o Golpe Militar. Por ser um assunto pouco discutido na obra freyriana, vi a oportunidade de aprofundar o estudo de como o autor incorpora sua obra como elemento de legitimação ideológica. 104 A pesquisa é feita com base em uma série de artigos publicados na imprensa nacional, mais especificamente na revista O Cruzeiro, no Jornal do Comércio e no Diário de Pernambuco, no período que vai de 1964 a 1979. Procuro mostrar como os discursos freyrianos se entrelaçam, não apenas teoricamente, mas também em sua forma. Em uma visão preliminar, nota-se que Freyre procura levar ao povo a idéia de que ―um brasileiro verdadeiro‖ é aquele que corrobora com o golpe militar, que ama a nação verdadeiramente e quer vêla em desenvolvimento, então somente desta forma o país retomaria seu espírito de pátria. Partindo da noção do agir brasileiramente, faz um chamado à sociedade com o intuito de ―salvar nosso patrimônio‖ da ―onda vermelha‖ – fazendo assim uma alusão aos ataques comunistas em oposição ao regime militar. O autor em vários momentos apropria-se da função de levar ao povo a noção de reconstrução social, informando que essa é a maior preocupação do regime militarista. A surpreendente trajetória política de Gilberto, que evoluiu da esquerda democrática nos anos de 1930 e 1940 para a direita autoritária a partir de 1950, tem suas raízes no conservadorismo saudosista e aristocrático de sua obra (SOUZA, 2000, p. 225), apesar do seu grau de inovação em termos de método, objeto e estilo. O método cultural de Freyre contém, portanto, o seu fio condutor: o reacionarismo exacerbado que ostentaria publicamente anos mais tarde. Freyre concebeu, de forma idílica e harmônica, as relações entre senhores e escravos, centradas na autoridade benevolente dos patriarcas e na predisposição do negro à dominação, capaz de gerar uma sociedade que favorecia a mobilidade social entre as raças. Com a finalidade de tornar mais clara a análise desta série de artigos, faz-se necessária uma abordagem dividida em torno de duas questões distintas e igualmente importantes. A primeira é referente ao conceito de democracia na análise dos artigos freyrianos, já a segunda remete à questão regional e como tal discurso é inserido em seu posicionamento político-ideológico. Falar de democracia na obra de Gilberto Freyre é um assunto bastante delicado. Devido, principalmente, ao propagado conceito de democracia racial que sempre esteve em meio aos debates de inúmeros comentadores da obra freyriana, e tal conceito fora designado como o centro das discussões acerca da teoria da interpenetração de raças. Apesar de só ter utilizado o termo democracia racial apenas em 1962, tal termo é atribuído a Gilberto Freyre como uma de suas teses centrais, devido à formulação do conceito de democracia social através de uma democracia étnica em Casa-Grande & Senzala. Para Freyre, a democracia social é basicamente uma democracia étnica, ou seja, um espaço de relações onde não existem restrições quanto ao nascimento, à 105 origem, ou ao ―sangue‖ das pessoas – democratização do espaço com a integração entre todas as raças. A problematização acerca da teoria freyriana sobre a democracia étnica ou social é conduzida por acontecimentos históricos e políticos. Portanto, como Gilberto Freyre mantivera uma relação teórica, política e ideológica com o regime salazarista em Portugal, e por conseqüência com o governo de Vargas – é de suma importância considerar que ambos os governos apoiaram efetivamente e sem restrições o regime fascista da Itália, e o nazista da Alemanha, onde a maior característica encontrava-se no apelo da pureza étnica. Então, o conceito democrático em Freyre através da pluralidade de raças precisara ser ―esquecido‖, especialmente pelo próprio autor, já que o quadro político geral em que Freyre estava inserido demandava uma outra forma de pensar o social. Outro assunto urgente: (...) o que eu estou achando do rumo da Operação Democrática no Brasil nos últimos dias ou nas últimas horas. Creio que não vai bem a Operação. Políticos e elementos comprometidíssimos com a situação que os brasileiros independentes e as Forças Armadas uniram-se para desarticular – dado o fato de vir arruinando o Brasil – estão se aproveitando da desarticulação realizada, como se a mesma tivesse sido empreendida em benefício desses grupos e elementos; e não do Brasil. O que é lamentável e parece impor às Forças Armadas o dever de retomarem o controle da operação saneadora. O momento – penso eu – não é para bizantinos legalistas, mas para o início, no país, de uma nova fase de vida política e de ação administrativa, livre de políticas e grupos demasiadamente comprometidos com um recente, triste e vergonhoso passado. Como foi dito anteriormente, o conceito de democracia em Gilberto Freyre não pretende designar uma teoria política, e sim uma teoria social através da interpenetração entre as diferentes raças. Entretanto, baseado na análise dos artigos observa-se que o conceito de democracia é exercido através do que Freyre chama de Operação Democrática. Não há uma definição clara do que vem a ser a operação democrática; no entanto, tal termo remete à idéia de reconstrução social, de um novo rumo para a sociedade brasileira. Freyre deixa claro seu apoio ao novo governo, e principalmente aos métodos utilizados pelas Forças Armadas com o intuito de conter o movimento oposicionista. Neste momento, a democracia para Freyre estava completamente voltada ao processo de reconstrução social – pois, segundo o autor pernambucano, o período que antecedera o golpe militar não era regido por um governo ―verdadeiramente‖ democrático, daí a necessidade de uma reorganização social e política. 106 A reconstrução social é um tema sempre em evidência na obra freyriana. No Manifesto Regionalista, Freyre fala em reconstrução como ferramenta essencial para a manutenção do tradicionalismoregionalista em oposição ao novo sistema que se desenvolvera no país – criticando o processo de europeização que o Brasil estava passando devido às idéias do modernismo. Entretanto, no Golpe de 1964, a reconstrução social para Freyre possuíra um caráter igualmente tradicional. Antes da operação militar, o Brasil encontrava-se sob a regência e os olhares comunistas, referindo-se ao governo do presidente João Goulart – então, com a eclosão do golpe militar o país possuíra a oportunidade de retomar seus valores tradicionais, e reconstruir uma realidade social sem a presença dos ideais comunistas. É importante destacar que praticamente quarenta anos após o Manifesto Regionalista o autor utiliza o mesmo embasamento teórico com o intuito de tornar legítima a ditadura militar. Ao tratar do conceito de democracia nos artigos de Gilberto Freyre, surge a chamada Operação Democrática que tem como principal objetivo promover uma reconstrução social a partir dos valores tradicionais e nacionalistas que, segundo o autor, foram menosprezados no governo anterior. Desta forma, o regime militar seria o principal responsável pelas mudanças e transformações sociais que o país necessitara, além de recuperar o orgulho nacional já esquecido por muitos cidadãos brasileiros, devido à ausência de um governo ―verdadeiramente‖ patriota, ―verdadeiramente‖ democrático. Independentemente de datas, de acontecimentos políticos ou de qualquer fator marcante, Freyre defende arduamente o sentimento regional, o orgulho nacional – e baseado neste ideal de pátria, e de apego ao solo acolhedor, Freyre incorpora e utiliza um discurso ora regionalista, ora nacionalista, com o intuito de envolver o leitor e fazer com que o mesmo sinta-se parte daquele ideal de nação. Gilberto Freyre utiliza constantemente termos como ―verdadeiros brasileiros‖, ―nacionalistas‖, ―amigos da nação‖, enfim, para tentar construir no pensamento dos cidadãos um sentimento de pátria. Os artigos de Gilberto Freyre têm como característica um discurso baseado na necessidade da união nacional, sendo assim, o autor faz um ―chamado‖ ao povo brasileiro, verdadeiramente brasileiro, em propagar os benefícios de possuir um governo realmente comprometido com o progresso nacional. Progresso este visando à recuperação das tradições genuinamente brasileiras, que foram vulgarizadas, em um curto espaço de tempo, pela tentativa da aplicação da ideologia comunista no país, que, segundo Freyre, não passava de uma ideologia importada e financiada pelo capital estrangeiro, e assim denominava os oposicionistas de cidadãos antibrasileiros. O discurso nacionalista de Freyre durante a ditadura 107 militar possuía um caráter ideológico relacionado com elementos que demandam uma legitimação do poder. Ao invés de usufruir dos aspectos econômicos, sociais e políticos para expor à população os benefícios do novo governo, o autor pernambucano optou por utilizar de um discurso patriótico reivindicando o sentimento nacionalista daqueles que desejavam o melhor para a nação, que estava representado no contexto da ditadura militar. Os artigos direcionados ao regime militar concentram-se, em sua maior parte, no ano de 1964, devido à necessidade de tornar o regime militar concreto e efetivo, além da tentativa de angariar o apoio da sociedade em prol do levante nacionalista. O tom arrebanhador está constantemente presente no conteúdo de seus artigos. No Manifesto Regionalista também está presente a necessidade do ―clamor‖, do ―convite‖ e da ―intimação‖ da população em prol da manutenção dos valores regionalistas e tradicionais, do caráter identitário nordestino em detrimento ao discurso modernista a favor de uma modernização, do progresso nacional, no entanto, com as raízes, os valores e os costumes importados do continente europeu. Na tentativa de fazer um apanhado das questões mais relevantes na obra freyriana que servem como suporte teórico na legitimação de um regime de poder, nota-se que o argumento em Gilberto Freyre é bastante circular, no entanto, abarca vários direcionamentos do pensamento social brasileiro. Entretanto, todos os artigos seguem a mesma linha teórica, política e ideológica, chegando a tornar seus argumentos por diversas vezes repetitivos. Podemos até considerar uma busca ―incansável‖ de auto-afirmação do ser regional, tanto no texto do Manifesto Regionalista quanto no conteúdo dos artigos, ou partimos da necessidade de incorporar os ideais expostos por Freyre no imaginário da população, com a finalidade de todos serem regidos a partir de uma mesma ordem. REFERÊNCIAS ANDRADE, Manuel Correia de. ―Gilberto Freyre e o Impacto nos anos 30‖. Revista da USP, São Paulo, 1998, (38): 38-47. ARAÚJO, Ricardo Benzaquen de. Guerra e Paz: Casa-Grande & Senzala e a obra de Gilberto Freyre nos anos 30. Rio de Janeiro: Ed. 34, 2005. BASTOS, Elide Rugai. Gilberto Freyre e o pensamento hispânico. Entre Dom Quixote e Alonso El Bueno. Bauru, SP: EDUSC, 2003. _______ . ―Gilberto Freyre e as Ciências Sociais no Brasil‖. Estudos de Sociologia, Recife, 1995, 1(1): 63-72. FREYRE, Gilberto. 1933. Casa Grande & Senzala. 49. ed. São Paulo: Global editora, 2004. 108 _______ . 1926. Manifesto Regionalista. 4. ed. 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São Paulo: Edusc, 2003. p. 65-82. 16 -“MÃE É TUDO IGUAL”: ESTRATÉGIAS DE DESLEGITIMAÇÃO MORAL DE MULHERES COM FILHAS EM UMA INSTITUIÇÃO ABRIGO Gilson José Rodrigues Junior Universidade Federal de Pernambuco (PPGA-UFPE) Graduado em Ciências Sociais (UFRN) Mestrando em antropologia (Bolsista CAPES) A presente pesquisa é fruto de inquietações, se não suscitadas, moldadas a certo rigor acadêmico desde a graduação em Ciências Sociais (2003-2007), as quais têm na elaboração, em curso, da dissertação de mestrado a possibilidade de um aprofundamento, que, certamente, não se pretende conclusivo. Busquei como marca tradicional, porém não exclusiva, da antropologia, valer-me, principalmente, da etnografia, esta descrição densa que vê a cultura como um documento de atuação. Um documento público, semelhante a [...] um manuscrito estra-nho, desbotado, cheio de elipses, incoerências, emendas suspeitas e comentários tendenciosos [...], como bem ilustrado por Geertz (2008, p.8). Ao decidir realizar o trabalho de campo em Penedo, esta pequena cidade localizada em um estado (Alagoas) que nem é aquele onde curso o mestrado Recife/PE – nem o local onde resido Natal/RN –, fui questionado por diversas pessoas com a mesma pergunta: ―Por 109 que Penedo?‖. O que me leva a adentrar uma trajetória pessoal que perpassa não apenas o ambiente acadêmico, mas outros contextos, principalmente o religioso. No ano de 2007, quando exerci a função de liderança –―ministro local‖ – durante aproximadamente três anos – pela Igreja do Nazareno em Natal, participei da reunião de líderes da referida denominação em Aldeia – distrito de Camaragibe/PE. Dentre os depoimentos, chamou-me atenção o do pastor Mário. Ele falava de como começou a realizar um ―trabalho social‖ junto às crianças e adolescentes em ―situação de risco‖ na cidade de Penedo/AL. Narrou alguns casos nos quais explicava como havia encontrado os ―menores‖, enfatizando bastante os casos daqueles que haviam sido vítimas de abusos sexuais e/ou se prostituíam desde os nove anos de idade. Apesar de compartilhar, com todos os presentes de certas revoltas e/ou sentimentos de felicidade por sua atuação, tive minha atenção voltada para a forma como este retratava as mães dessas crianças e adolescentes. Percebi em sua narrativa certa demonização dessas mulheres, caracterizadas como únicas responsáveis pela situação em que seus filhos haviam sido encontrados. Isto despertou-me para refletir sobre quais seriam suas trajetórias, isto é, quais as realidades, vivenciadas, em sua singularidade, por elas em seu diaa-dia, levando em conta não apenas a situação atual em que se encontravam, mas suas histórias de vida, inclusive como enxergavam valores como maternidade, amor materno, cidadania, entre outras questões a serem elencadas. Em março de 2008 resolvi dar início a fase exploratória da pesquisa, cheguei a Penedo na manhã do dia vinte, sendo recebido pelo pastor Mário. Já havia lhe informado que, apesar de sua insistência, não ficaria hospedado em sua casa. Decisão que veio se mostrar acertada, tendo em vista que as mulheres com quem tive meu primeiro contato, mantido ao longo de toda a pesquisa, haviam tirado seus filhos da AME, e tinham uma visão do pastor e sua família bastante negativa. Certamente se chegasse ao Kamartelo por meio de Mário ou qualquer pessoa ligada a ele, não teria conseguido acessar algumas informações, que se mostraram relevantes no decorrer da pesquisa. Foi nesse período que tomei conhecimento da atuação da Escola Profissional Lar de Nazaré (LN), o que será mais bem detalhado a frente. Em abril do presente ano, o referido pastor já havia saído de Penedo, voltando para sua cidade natal, o Rio de Janeiro. Antes disso muitas das crianças e adolescentes por ele assistidos havia sido entregues de volta para suas famílias de origem, sem que a promotoria da infância ou o juizado fossem informados. Diante disto tornou-se inviável para os fins desta pesquisa manter-se 110 focado nas duas instituições, o que me levou a desenvolver a pesquisa apenas na relação com o LN. As estratégias de deslegitimação que se mostram como formas de desmoralização do ―outro‖ e, inevitavelmente, de sua estigmatização, percebidas durante o trabalho de campo, levaramme, também, a pensar sobre a construção da cidadania na modernidade, enquanto parte de um processo civilizador, o qual não se dá de forma homogênea entre todos os indivíduos e grupos de uma sociedade, como bem nos lembra Elias (1994), hierarquizando, dessa forma, valores e praticas morais, tratando alguns como mais ―civilizados‖ que outros, ou mesmo ―descivilizados‖ (WACQUANT, 2008). Deparei-me com uma relação pretensamente dicotômica entre as representações sobre garotas assistidas pela Escola Profissional Lar de Nazaré (LN), e suas famílias. Se aquelas são alvos de investimentos e afetividades, que visam sua disciplinarização, estas outras são estigmatizadas como principais culpadas ―pelo triste fim de suas filhas.‖ A prática de estigma-tização (GOFFMAN, 1982) dessas mulheres percebida ao longo da pesquisa, como já esperado, não foi algo presente apenas nas conversas e entrevistas realizadas com funcionários do LN, mas em diversos outros momentos junto a outros atores, anteriormente referidos. Com isto não quero construir um discurso que coloque esses atores em um lugar de vilões. Não se trata disso, mas de perceber como, a partir de seus juízos de valor moral podem colaborar para a construção e fortalecimento de barreiras sociais que impeçam reflexões e uma busca mais eficaz por mudanças sociais. Esses juízos evidenciam seu comprometimento com uma visão dominante naturalizada como normal, devendo ser seguida por todos os indivíduos, sem que se leve em consideração as especificidades de seu meio social. Exemplo dis-so é a naturalização da família e dos seus membros, em destaque para o papel da mulher como principal cuidadora dos filhos, e que este cuidado deve se encaixar num ideal de maternagem que advém da idéia de ―instinto materno‖ e do ―eterno feminino‖. Sem negar a importância do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), e muito menos do avanço representado por essa legislação quando comparada com as que lhe antecederam, percebo, a exemplo de outros pesquisadores, que é dado às crianças e adolescentes, a partir de uma gramática moral bastante concisa e naturalizada, um patamar hierárquico superior a outros indivíduos, especialmente daqueles que compõem suas famílias de origem. Isto me levou, também, a contatar algumas das referidas mulheres, conhecendo um pouco de seu cotidiano, ―estratégias de sobrevivência‖, percepções sobre seu entorno social, relações afetivas, etc. 111 A família, juntamente com a sociedade e o Estado, deve ser em termos legais, um es-paço privilegiado para garantir as crianças e adolescentes o que é descrito no ECA como ―direitos fundamentais ‖. Porém, no caso das classes populares, estes estão longe de ser realidade vivida em seu cotidiano. Estas são em sua maioria monoparentais, chefiadas por mulheres. A forma como aparecem representadas parece excluí-las, quando não legal, moralmente, daquilo se tem compreendido por ―ser cidadão‖, encaixando-se no que Souza (2006) chama de subcidadãos. No caso das mulheres com filhas em uma instituição abrigo – foco central desta pesquisa – os estigmas parecem se potencializar, sendo logo apontadas como ―mães negligentes‖, ―irresponsáveis‖, ―mães que abandonam filhos‖ (MOTTA, 2001). O fato de não manterem suas filhas perto de si é logo visto como algo que contraria a ―natureza humana‖ prova de sua ―fraqueza moral‖. Mesmo quando se busca mostrar que se compreende que ―o contexto delas é difícil‖, reitera-se que independente de qualquer coisa ―mãe é mãe‖. Isso aponta para um projeto de normatização da família que se dá, principalmente no início do século XIX em diante, como bem destacam Donzelot (2001) e Costa (2004). Ambos apontam para a parceria entre o Estado e os médicos higienistas na intenção de normatizar as famílias. Ambos destacam o tratamento diferenciado dirigido às famílias ricas e pobres. No caso dessas últimas, as mulheres são eleitas as parecerias dos médicos e técnicos sociais (psicólogos assistentes sociais, pedagogos.). Nesse contexto passase a exaltar a figura feminina como naturalmente cuidadora, ressaltando ―[...] tendências de compaixão maternal que são, por definição, exigidas das mulheres.‖ (BOURDIEU, p.95, 2003). O discurso predominante sobre o amor materno, que o reduz a função biológica de gerar os filhos, deve ser observado como forma de dominação simbólica, dominação masculina, a qual estando naturalizada em nossas práticas culturais será defendida tanto por homens quanto por mulheres como sendo naturais ou até mesmo divinas. Como destaca Bourdieu (2003, p.52) o poder simbólico não vai se instaurar sem que se aja um consenso entre dominantes e dominados. Esta submissão não deve ser compreendida como um ato consciente, mas resultante de estruturas objetivas. Isto irá se refletir na percepção de diferentes atores nos mais diversos campos – familiar, acadêmico, jurídico, – construindo um habitus que perpassa as diferentes classes e grupos sociais, mas que será ressignificado nos diferentes contextos. A maioria dos representantes de instituições públicas e ONGs com quem conversei fala na existência de um ―instinto materno‖, articulando diversas explicações para defendê-lo, assim como para sua suposta ausência, ou pelo menos deficiência, em muitas das mulheres com quem mantêm contato em suas atividades. Em geral essas 112 explicações apontam uma incapacidade de cuidar dos filhos, seja devido a pobreza ou falta de amor ―já que não teriam tido isto dos seus pais, não tem como dar a seus filhos‖, como me disse o promotor da infância, dentre outras questões que buscarei apresentar, ou mesmo ―falta de vergonha na cara‖, como afirmou de forma inflamada uma conselheira tutelar. Apesar de todos os esforços dos estudos feministas para desconstruir com o mito do ―eterno feminino‖ e do ―amor materno‖, estes têm grande força na atualidade, na percepção de mundo da maioria das pessoas em nossa sociedade (SWAIN, 2004). Um cartaz dentro do Conselho Tutelar de Penedo dizia: ―Mãe é impossível existir sem você‖. Distribuído ao redor da frase várias imagens de mulheres com crianças nos braços e ao centro uma imagem de ―Nossa Senhora com o menino Jesus nos braços‖. Este exemplo ilustra a expectativa que se tem sobre as mulheres. O que se dá a partir de uma ótica naturalizante e homogeneizante, a qual invisibiliza as diferentes realidades vivenciadas em grupos e classes sociais diferentes (RODRIGUES Jr, 2007). Não me parece exagero dizer que as mulheres que entrei em contato ao longo da pesquisa parecem se encaixar na idéia de subcidadania (SOUZA, 2006), ou de cidadão de terceira classe (CARVALHO, 2001), já que, juntamente com outros indivíduos pertencentes às camadas mais pobres da população, não têm acesso aos direitos garantidos por lei como sendo fundamentais para uma vida digna . Se observarmos que ainda hoje nossa sociedade reduz as mulheres ao útero, isto é, ao ato de concepção e cuidado dos filhos onde aquelas que não podem ou não querem ter filhos são consideradas como ―anormais‖ (SWAIN, 2004). O que dizer, então, daquelas que os tendo gerado, por diversos motivos e justificativas, se consideram e/ou são consideradas inaptas a maternagem? Certamente se construiu e se constrói ainda hoje toda uma gramática moral que rebaixa essas mulheres ao plano do outroabaixo, o que vai legitimar sua exclusão a certos privilégios resguardados aos mais civilizados. Além disso, a estas mulheres no Bolsa-Família, quando não sua única a principal fonte de renda, encaixando-se naquilo que Loic Wacquant (2008) chama de ―welfare mothers‖, mulheres que são demonizadas, consideradas uma ―ameaça social fantasma‖ , pois vivem as custas da seguridade social (WACQUANT, 2008, p.48). Estas representações parecem camuflar e enfraquecer as críticas ao Estado, já que este aparece como o ―Grande Pai dos Pobres‖. Ao mesmo tempo não se pode negar a importância de programas dessa natureza, é importante que se observe que não bastam para resolver os problemas sociais do Brasil, geralmente reduzido a questões estritamente econômicas. Como mostra Fonseca (2006), sem a culpabilização das mulheres, o Estado teria que assumir a 113 sua incapacidade de cuidar da maior parte de seus cidadãos, os quais, na maioria dos casos, nem podem se encaixar nessa categoria. Exigir dessas famílias, em especial das mulheres, que dêem a seus filhos condições de exercerem plenamente a cidadania enquanto sujeitos de direito, parece ignorar que elas próprias não têm acesso a isto, podendo ser apenas consideradas, como já referido, ―cidadãs de terceira classe‖ (CARVALHO, 2008). REFERÊNCIAS ABREU, Domingos. No bico da cegonha: histórias de adoção internacional e no Brasil. Rio de Janeiro. 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Boitempo Editorial. 2008. 17 - O MESTRE DE CAPOEIRA: GENEALOGIA, RITUAIS E VALORES Juliana Carmen Brito Rodrigues Mestranda em Sociologia – UFPB Orientador: Prof. Dr. Antônio Giovanni Boaes Gonçalves (UFPB) A figura do mestre está presente no imaginário brasileiro desde os tempos mais remotos, em diversos segmentos da sociedade. O mestre sempre foi visto como aquele que detém um grande saber sobre determinado assunto. Por isso, na maioria dos casos, assume uma posição de comando, de liderança, adquirindo respeito e um certo status, principalmente no ambiente do qual faz parte. A denominação de mestre é atribuída a membros de diversos segmentos da sociedade, como na área acadêmica (professor), passando pela culinária (mestre-cuca), pela indústria (chefe de fábrica), até a construção civil (mestre de obras). A presença do mestre é um traço marcante tanto da religião (a exemplo da jurema/umbanda) quanto da cultura popular brasileira, como é verificado em manifestações populares como o carnaval (mestresala), o caboclinho, o cavalo-marinho e a capoeira. Dentro do contexto histórico da capoeira, os dois mestres de maior destaque ganharam visibilidade principalmente a partir do início da 115 década de 1930: Vicente Ferreira Pastinha (Mestre Pastinha, 18891981) e Manoel dos Reis Machado (Mestre Bimba, 1900-1974). Baianos de Salvador, ambos apareceram no cenário da capoeira, e, consequentemente, na literatura referente ao tema, já sob a denominação de mestres. Pastinha foi iniciado na capoeira aos 10 anos de idade pelo africano Benedito (Freire, 1967) e Bimba pelo africano Bentinho (CAPOEIRA, 2005). Da mesma forma que a origem da capoeira possui várias versões, a introdução da denominação de mestre ao mais antigo e detentor de toda a sabedoria também está inserida em um contexto polêmico. A literatura referente à capoeira não dispõe de informações específicas sobre essa temática, nem a respeito de todo o simbolismo criado em torno da figura do mestre e conservado até os dias atuais pelos adeptos da capoeiragem. O que se sabe é que a ―tradição‖ perpetuou e que cada grupo possui pelo menos um mestre, a quem os alunos e demais professores devem respeitar como autoridade máxima, detentora de todo o conhecimento sobre a capoeira e de sabedoria suficiente para aconselhar os seus discípulos sobre os caminhos que devem ser trilhados na roda e na vida. Como podemos verificar em Hobsbawn e Rancer (2002), ―é mais difícil descobrir a origem das tradições quando tenham sido em parte inventadas, em parte desenvolvidas em grupos fechados‖. Com base na ideia de Assunção (2005), de que ―o universo da capoeira é composto por muitos mitos que acabaram sendo adotados como verdades absolutas‖, podemos propor uma reflexão sobre o fato de, dentro desse universo, a figura do mestre ser tratada como detentora de pleno conhecimento sobre o jogo (da capoeira) e sobre a vida. Em entrevista concedida ao jornalista Roberto Freire, da Revista Realidade (1967), mestre Pastinha – já consagrado como principal nome da capoeira Angola – confirma a existência de controvérsias com relação à origem da capoeira, por meio da seguinte declaração: ―tem muita história sobre o começo da capoeira que ninguém sabe se é verdadeira ou não‖. Em outro momento de sua fala, na mesma publicação, Vicente Ferreira Pastinha, então com 78 anos, cita o nome de vários capoeiristas já falecidos – Bigode de Seda, Américo Ciência, Bugalho, Amorzinho, Zé Bom Pé, Chico Três Pedaços, Tibirici da Folha Grossa, Doze Homens, Inimigo Sem Tripa, Zé do U, Vitorino Braço Torto, Zé do Saco, Bené do Correio, Sete Mortes, Chico Me Dá, Júlia Fogareira e Maria Homem – classificando-os como ―grandes capoeiristas do passado‖, porém, sem referir-se a nenhum deles como mestre. Diante dessa declaração de Pastinha, verifica-se um indício de que a ―tradição‖ de atribuir aos capoeiristas mais antigos e mais experientes a denominação de mestre teve início – ou se fortaleceu 116 – durante o período em que a capoeira deixou de ser aprendida quase que exclusivamente na rua – por meio da observação –, ou de pessoa a pessoa (Capoeira, 2005), e passou a ser ensinada de uma forma mais organizada, dentro de um contexto semelhante ao de uma escola, em que as figuras do professor e dos alunos estavam bem definidas. O marco desse processo de transformação foi Manoel dos Reis Machado (mestre Bimba), que fundou a primeira academia de capoeira da Bahia, na década de 1930 (CAPOEIRA, 2005). Bimba havia praticado capoeira Angola durante dez anos e, em seguida, sistematizou a capoeira, ao compor um método de ensino com 52 golpes oriundos de outras artes marciais, a exemplo da savate, do jíu-jitsu, da luta greco-romana, do judô (FREIRE, 1967) e do batuque (dança originária dos negros do Congo e de Angola) (ASSUNÇÃO, 2005). A esse novo estilo de jogo, Bimba deu o nome de Luta Regional Baiana – que depois passou a ser conhecida como capoeira Regional. As principais diferenças entre os estilos Angola e Regional são verificadas no posicionamento dos capoeiristas durante o jogo. A Angola, que possui um ritmo mais lento, é jogada próximo ao chão. Já na Regional, o jogo é ligeiro e jogado em pé. Ao levar a capoeira para a academia, Bimba passou a receber alunos de todas as partes, incluindo jovens das classes média e alta. Nos anos 1960, passavam pela academia de Bimba 150 alunos por ano, em média (FREIRE, 1967), entre os quais estavam incluídos vários estudantes universitários. Bimba criou ainda um sistema de graduação, a partir do qual a noção de hierarquia foi fortalecida e surgiram os rituais de iniciação (batizado) e os de continuação da trajetória, tais como: formatura e cursos de especialização e emboscada. Este último funcionava como preparação para possíveis combates reais. Na hierarquia introduzida por Bimba na vadiação baiana, conforme Assunção (2005, p.34), distinguiam-se as figuras dos calouros, dos formados e dos formados especializados. O aluno formado e o especializado adquiriram, portanto, mais respeito junto ao mestre e aos demais colegas. Em 1941, mestre Pastinha abriu sua academia, ―criou um código moral e, semelhante a Bimba, selecionou e organizou aspectos da capoeiragem da época para criar seu estilo‖ (CAPOEIRA, 2005, p.12). Embora houvesse adotado propostas metodológicas semelhantes às de Bimba, o discurso de Pastinha sempre enfatizou a importância de se preservar as raízes da capoeira e as tradições (FREIRE, 1967). Embora com estilos aparentemente distintos, ambos os mestres faziam questão de enfatizar que ―a capoeira é uma só‖, como é possível verificar em Decânio (1997) e em Freire (1967). Outra característica comum aos ―ancestrais mitológicos de todos os 117 jogadores de capoeira‖ – Pastinha e Bimba – é que os dois possuíam propostas ―extremamente acadêmicas‖ (CAPOEIRA, 2005, p.13). Mais um indício de que a denominação de mestre só teria se fortalecido a partir do momento em que Bimba e, em seguida, Pastinha passam a ensinar capoeira de forma mais organizada é apresentado por Nestor Capoeira (2005, p.16), quanto trata da ―Velha-Guarda da Capoeira‖: A partir de 1950, e mais fortemente em 1960, além dos conhecidos mestres Bimba (1900-1974) e Pastinha (1889-1981), criadores dos estilos Regional e Angola, começaram a aparecer outros mestres – Noronha, Waldemar, Caiçaras, Canjiquinha, Atenilo, etc. –, que darão importante contribuição ao Jogo da Capoeira em Salvador. Mais tarde, por volta de 1985, este grupo de mestres baianos será conhecido como a Velha-Guarda da Capoeira. Considerando-se a trajetória de um capoeirista até a obtenção da graduação de mestre – que pode ultrapassar 25 anos de treinamento e aprendizado – podemos propor uma reflexão sobre o que Bourdieu (1998) define como ―poder simbólico‖. Nos grupos de capoeira em que o sistema de graduação é mais rigoroso, os capoeiristas se formam mestres com idade próxima ou superior a 50 anos. A essa altura, o mestre – que não está mais no auge de sua forma física e, possivelmente, convive com lesões decorrentes dos diversos anos de prática esportiva – já conta com um corpo de contramestres e professores, responsáveis por executar parte das delegações do grupo. Dessa forma, é construído um sistema de prestígio e o papel do mestre se concentra, portanto, em repassar seus conhecimentos e sua sabedoria – por meio da oralidade – e administrar esse prestígio adquirido. A oralidade prevalece, inclusive, na hora de dar os comandos das sequências de golpes e movimentos corporais que serão executados pelos alunos, durante os treinos. A maneira com que ocorrem as relações mestre-aluno de capoeira nos remete ainda ao que Weber chama de ―dominação carismática‖. Na definição weberiana, o carisma corresponde a ―uma certa qualidade que caracteriza uma personalidade individual, e em virtude da qual esse personagem é considerado extraordinário e tratado como se fosse dotado de poderes ou qualidades sobrenaturais, sobrehumanos ou, pelo menos, excepcionais‖ (in Giddens, 1994, p.223). Um certo tipo de devoção dos alunos com relação aos seus mestres – incluindo os já falecidos – iniciou-se na época de Pastinha e Bimba e é verificado até hoje entre os adeptos da capoeira. A partir da pesquisa bibliográfica realizada para a elaboração deste artigo – que é parte de uma pesquisa que está começando – percebemos que as modificações implantadas por mestre Bimba deram início um novo processo na trajetória evolutiva da capoeira, 118 que foi desde a sua criminalização (em 1890) até sua ―oficialização como desporto‖, em 1972 (MARINHO, 1982). Com a esportização da capoeira, portanto, a disciplina característica do treinamento esportivo parece ter intensificado a hierarquia e a rigidez típicas da relação mestre-aluno. Dessa forma, podemos afirmar que o mestre exerce forte influência no imaginário geral – dentro do universo da capoeira e, algumas vezes, fora dele – e que o surgimento, a evolução e a importância dessa figura sofreram influência da sistematização da arte-lutadança, a partir da década de 1930. Com base na análise da literatura referente ao tema, percebemos que foi nessa época que outros elementos, oriundos da cultura urbana (como a introdução da uniformização e do fortalecimento da noção de hierarquia), também passaram a ocupar espaço no contexto da capoeiragem, influenciando nos rumos seguidos pelo processo evolutivo dessa manifestação popular que virou esporte praticado no mundo inteiro e cujos mitos se confundem com a história e a história se confunde com os mitos. REFERÊNCIAS ADORNO, Camille. A Arte da capoeira. Goiânia: Kelps, 1987. ASSUNÇÃO, Matthias Röhrig. Capoeira: the history of an afrobrazilian martial art. London: Routledge, Taylor and Francis Group, 2005. BOURDIEU, Pierre. A Economia das trocas lingüísticas. 2. ed. São Paulo: Edusp, 1998. CAPOEIRA, Nestor. In: Vídeo Escola de Capoeira – A Escola Nestor Capoeira (by Jorge Itapuã Beiramar). (livreto). Rio de Janeiro: Saú&Magem, 2005. DECÂNIO Filho, Ângelo A. A herança de mestre Bimba. 2 ed. 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Em Mossoró podemos citar a Abolição dos escravos em 30 de setembro de 1883, a partir dessa data a cidade passa a ser nomeada e representada em jornal local ―O Mossoroense‖ e por memorialistas, a exemplo de Luís da Câmara Cascudo (1996), como sendo uma cidade libertadora, a frente do seu tempo, amiga da liberdade e dos homens. Para representar o caráter emancipador do povo mossoroense, em 30 de setembro de 1904 realizou-se a inauguração da Estátua da Liberdade em Mossoró na Praça da Redenção. Inaugura-se, hoje, nesta cidade, á Praça da Redenção a Estatua da Liberdade, trabalho artístico do inteligente archicteto e esculpidor Francisco Paulino da Silva. Foi erigida em comemoração da áurea data 30 de setembro de 1883,dia da emancipação total dos escravos de Mossoró, que, por ter sido o primeiro municipio livre deste Estado mereceu a denominação de Acarape do Rio Grande do Norte, tomando igualmente a vanguarda do movimento emancipador. (Jornal ―O Mossoroense‖ 30-09-1904 nº.56) A idéia de liberdade, de dia memorável e que particulariza a cidade diante das demais também é dada a ler no jornal do dia 30 de setembro de 1910. [...] já o Mossoró, sobranceiro na vanguarda dos pelotões abolicionistas, constituia-se o 2º município livre do Brazil. 30 de Setembro de 1883 é e sempre será a data gloriosa de Mossoró; pois foi n‘esse memoravel dia que o sol ardente do nosso firmamento illuminou a primeira parcélla livre do território abençoado do Rio Grande do Norte. (Jornal O Mossoroense, 30-09-1910 nº 240) Podemos ler esse acontecimento não apenas como algo que faz de Mossoró pioneira, mas, também como um símbolo de sua modernidade e do seu destino direcionado para o progresso, para o avanço. Outro marco, tomado como construtor da cidade é a expulsão do bando do cangaceiro Lampião em 13 de junho de 1927. Mais uma vez coloca Mossoró como pioneira e valente ao 120 resistir às investidas do bando de cangaceiros liderados por Virgolino Ferreira, Lampião. Tais marcos precisam sempre serem reforçados para que não percam sua força simbólica. Daí a criação de festas comemorativas e instituição de dias de feriados municipais. O 30 de Setembro tornou-se um feriado municipal comemorado anualmente. Já a resistência a invasão do bando de Lampião é comemorada no mês de junho através da peça ―Chuva de Bala no País de Mossoró‖ encenada a céu aberto durante o período de festas juninas da cidade. Aqui podemos estabelecer uma diferenciação entre o ato de comemorar e de rememorar. Segundo Gagnebin (2006), comemorar consiste em um ato de repetição do passado e de fatos, exaltação do passado como tempo de glórias e produtor de exemplos a serem seguidos pelas gerações futuras. O rememorar faz uso da memória ativa, uma memória que lembra do passado não para consagrá-lo, exaltá-lo enquanto áureo ou de glórias, mas o lembra para evitar repetições. Proporia, então, uma distinção entre a atividade de comemoração, que desliza perigosamente para o religioso ou, então, para as celebrações de Estado, com paradas e bandeiras, e um outro conceito, o de rememoração, assim traduzindo aquilo que Benjamin chama de Eingedenken, em oposição à Erinnerung de Hegel e as várias formas de apologia. (GAGNEBIN, 2006, p. 55) (Grifos da autora) Fazer essa distinção só é possível se o historiador assumir uma postura ética diante da memória. Essa postura não se restringe unicamente as memórias de guerra, de genocídios, pode ser (e deve ser) expandida a outros tipos de memórias, de passados, sejam eles de indivíduos ou de cidade. Uma vez que a memória tem um papel político (RICOEUR apud Dosse, 2004) daí a importância de pensarmos o porquê de uma sociedade, grupo étnico, cidade, nação lembrar muito de algo, de determinados fatos, datas e esquecer de outros. Por que uma cidade edifica certos monumentos, estátuas, inauguração de praças, nomes de ruas e edifícios em detrimentos de outros nomes? A memória é uma ―moeda‖ valiosa na construção de identidades e legitimação de poderes sejam eles políticos ou simbólicos. Moeda usada não apenas por nós historiadores, mas também por outros estudiosos como os psicanalistas e romancistas. Mas o que nos diferencia desse trabalho? Nós, historiadores, nos diferenciamos dos psicanalistas por usarmos a memória escrita. A escrita filtra e ao filtrar efetua um deslocamento, pois retira a memória do seu lugar de oralidade para transpô-la para outra lógica, uma lógica mais racional e normatizada. Distinguimo-nos dos romancistas por 121 lermos e escrevermos dentro de normas acadêmicas bem delimitadas que nos dar o caráter de ciência. Para Paul Ricoeur, a memória não é aleatória, pelo contrário, ela passa por um processo de seleção efetuado por aquele que a enuncia através da fala ou por aquele que a escreve. Tal seleção torna-se dupla, pois quem ouve a memória, papel do psicanalista ou do historiador que faz uso da história oral como método de pesquisa também efetua sua seleção, sua escolha, e quem a lê, também efetua suas múltiplas seleções. Faz cortes, deslocamentos, muda as coisas de lugar, deslocar, é um dos primeiros processos do fazer do historiador. O trabalho do historiador diante da memória não é apenas de resgate, mas de postura crítica e ética, criar espaço para que o não-dito seja pronunciado e perceptível bem como para evitar o silenciamento e a perpetuação de horrores. De acordo com Ricoeur, o historiador trabalha com os sinais encontrados em meios aos documentos, o historiador segue as pistas deixadas pelos rastros deixados pela memória, rastros às vezes visíveis, outras vezes não tão visíveis. Gagnebin também compartilha dessa idéia, para ela, o historiador é um sucateiro, cata os restos, os vestígios deixados pelo passado e partir deles tece sua narrativa, elabora sua escrita. Esse narrador sucateiro (o historiador também é um Lumpensammler) não tem por alvo recolher os grandes feitos. Deve muito mais apanhar tudo aquilo que é deixado de lado como algo que não tem significação, algo que parece não ter uma importância nem sentido, algo com que a história oficial não sabe o que fazer. (GAGNEBIN, 2006, p. 54) (Grifos do autor.) Os sinais, os rastros não nos falam apenas da memória, mas também do que foi esquecido e silenciado. A partir disso podemos nos perguntar o porquê de tais silêncios bem como indagarmos a respeito do que eles produzem e de nossa postura diante deles. ―[...] é necessário lutar contra o esquecimento e a denegação, lutar, em suma, contra a mentira, mas sem cair em uma definição dogmática de verdade.‖ (GAGNEBIN, 2006, p. 44) Pois, enquanto historiadores, não escrevemos somente para produzir livros, artigos e trabalhos acadêmicos. Ao pesquisarmos não estabelecemos uma relação de pesquisa somente com o jornal, com o livro lido, com as fotos analisadas, com os depoimentos coletados, estabelecemos uma relação com indivíduos que estão de algum modo representados em nossas fontes. Lidamos com vidas, com seres, com identidades que alimentam a existência de pessoas, de grupos, de sociedades, de cidades, daí a necessidade de se ter cuidado, de se ter gentileza e ética ao escrever sobre o passado, ao escavar as camadas do passado para produzir um espaço para o presente, para os vivos. Cuidado ao apagar o texto 122 redigido para que em cima se escreva outra história, mas é sempre bom lembrar que toda texto apagado ainda guarda em si traços, vestígios, rastros que se misturam ao novo texto escrito e acaba por criar um terceiro, quarto, quinto texto, n textos. E cada texto abre sempre a possibilidade para a produção de novos textos, produção de novas leituras sobre a cidade e sobre o fazer histórico. REFERÊNCIAS BRAUDEL, Fernand. Escritos sobre a História. São Paulo: Perspectiva, 1989. CASCUDO, Luís da Câmara. Notas e documentos para a história de Mossoró. Coleção Mossoroense, Série ―C‖, Volume 849, maio de 1996. CERTEAU, Michel de. ―A operação historiográfica‖. In: A escrita da história. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1982. pp. 65-119. CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil, 1990. DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. História Oral: memória, tempo, identidades. Belo Horizonte: Autêntica, 2006. DOSSE, François. História e Ciências Sociais. Bauru, SP: Edusc, 2004. GAGNEBIN, Jeanne Marie. Lembrar escrever esquecer. São Paulo: Ed. 34, 2006. FONTE DE PESQUISA: Jornal O Mossoroense.Mossoró/RN. 19 - UM OUTRO OLHAR SOBRE A VIDA ASILAR Carla Gabriela Mendes de Azevedo (UFCG) Thaiany Evangelista da Costa (UFCG) O Asilo é uma Instituição burocrática cuja organização é fundada em normas e regulamentos voltados para atender o idoso razoavelmente confortável. Abrigam idosos que por vontade própria escolhem ali viver e aqueles abandonados por suas famílias, dentre outros motivos. Atualmente, percebemos um aumento do número de pessoas idosas no Brasil. Este crescimento traz consigo grandes desafios para a sociedade. Esta realidade nos mostra que o mundo se encontra num processo de transição e por esse motivo se tem como preocupação organizar políticas públicas para se adequar ao novo perfil demográfico da população. De acordo com as transformações da sociedade, ocorrem, no mesmo sentido, alterações nas relações familiares, pois a família acompanha as mudanças sociais. Porém, pode ocorrer também que 123 transformações dentro da família provoquem modificações de certos padrões sociais. A família é um grupo enraizado da sociedade que tem responsabilidades sociais com todos os seus membros. A Constituição Federal de 1988 apresenta a família como base da sociedade e coloca como seu dever, da sociedade e do Estado ―amparar as pessoas idosas assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem estar e garantindolhes o direito à vida‖. Dessa forma, é dever dos membros da família atender a pessoa idosa em seu processo de vida, modificando sua visão e atitude em relação à velhice colaborando assim para que o idoso mantenha sua posição junto ao grupo familiar e a sociedade. Diante disso faz-se necessário compreender as razões que levam famílias a deixarem seus parentes idosos em asilos ou instituições de longa permanência se a eles é atribuída a responsabilidade e o dever de cuidar da pessoa idosa. Para entendermos o que os leva a tomar essa decisão teremos que investigar o lugar dos velhos na família atual. A família como parte de um universo social que se encontra em constante mudança, torna-se dinâmica e também se modifica, podendo ser definida de acordo com o seu sentido social. Essas mudanças muitas vezes provocam alterações no sentido das relações familiares. Como afirma Áries (1981), as formas históricas da família variam muito em termos de sua estrutura, formas de autoridade, funções, extensão de parentesco integrado e autonomia em relação ao meio social. A inserção do idoso em asilos aumenta principalmente quando esse não possui amparo familiar e por não poder exercer o auto-cuidado encontrando no asilo a melhor opção para seguir sua vida, esses são aqueles idosos que vêem na instituição asilar uma escolha voluntária, para eles o asilo não representa um mal. Comumente os idosos que vivem em asilo são deixados por parentes ou foram por vontade própria, ou por não terem outra opção. Dessa forma não podemos negar a importância que as instituições asilares possui uma vez que elas fornecem proteção e cuidado. Conforme vários estudos sobre o envelhecimento humano o fato de viver em um asilo, para muitos idosos, é uma mudança drástica em seu ritmo de vida. E se considera ser importante uma preparação para a vida asilar. O asilo ao mesmo tempo em que proporciona benefícios como à proteção e o cuidado também representa drásticas mudanças pelas quais os idosos terão que passar para adaptar-se sendo visto por uns asilados como um mal e para outros como um bem, além de ser a única opção que resta a muitos. O asilo acaba sendo um espaço que oferece ao idoso uma nova forma de sociabilidade, de aceitação de si mesmo, bem como de adaptação a sua nova 124 realidade de vida. Segundo Debert ―Para os velhos, estar no asilo é buscar uma vida pública satisfatória.‖ (1991:33). È no asilo que o idoso, que antes se sentia abandonado e solitário, passa a ver uma nova forma de encarar a vida estabelecendo relações amigáveis ou conflituosas com aqueles que dividem o mesmo espaço. O idoso passa a ter uma nova inserção ―social‖ em um ambiente que lhes é restrito. Neste trabalho discutimos o impacto do abandono de idosos por suas famílias, buscando analisar o significado a fragilidade dos laços familiares, bem como perceber como o asilado assimila a distância da vida familiar e social. REFERÊNCIAS ÁRIES, Philippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: Editora Guanabara, 1981. BEAUVIOR, S. de. A velhice: realidade incômoda. São Paulo: Difusão Européia do Livro,1990a. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Estatuto do idoso/ Ministério da Saúde. 1 ed., 2. reimpressão - Brasília. M.S. 2003. Acesso em (20 Out. 2008). DEBERT, Guita Grin. A reinvenção da velhice: Socialização e processos de reprivatização do envelhecimento. São Paulo. Editora da Universidade de São Paulo Fapesp, 1999. DEBERT, Guita Grin. O Envelhecimento em Asilos e Práticas Profissionais para uma Velhice Adequada. Campinas: IFCH UNICAMP - 1. Versão, 1991. 33 p. ELIAS, N. A solidão dos Moribundos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. NERI, A. L. Bem-estar e estresse em familiares que cuidam de idosos fragilizados e alta dependência. In: NERI, A. L. (Org.). Qualidade de vida e idade madura. Campinas: Papirus, 1993. p. 237-85. O papel do idoso na família. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/. Acesso em (20 Out. 2008). SAVOIA, G.M. Org. A interface entre a Psicologia e Psiquiatria: Novo conceito em saúde mental. São Paulo: Rocca. 2006. 125 20 - “O TEMPO DO CATIVEIRO, O TEMPO DA LIBERDADE”: HISTÓRIAS DE VIDA DE TRABALHADORES RURAIS ASSENTADOS José Márcio da Silva Vieira [email protected] José Anchieta Bezerra de Melo [email protected] Este trabalho resulta de uma pesquisa realizada em assentamentos rurais situados no município de Sumé, microrregião do Cariri do Estado da Paraíba. Intenciona analisar relatos orais de agricultores ―ex-sem-terra‖, atualmente assentados da reforma agrária, a partir da oposição entre dois períodos distintos na história de suas vidas: o chamado ―regime de patrão‖ versus ―a vida de assentado.‖ No primeiro caso, os trabalhadores rurais relembram e atribuem significados àquele período, em que trabalhavam na condição de ―parceiros‖, ―meeiros‖, ―moradores‖ de latifundiários da região, época geralmente descrita a partir de expressões do tipo ―tempo do cativeiro‖, ―tempo da sujeição‖ em que se ―trabalhava para os outros.‖ No segundo, por sua vez, os mesmos o vêem como o ―tempo da liberdade‖, em que tudo que se produz ―é para a família.‖ Como embasamento teórico, utilizamos autores como Sidersky, para quem, o camponês se diferencia dos demais trabalhadores assalariados, pelo fato de deter, ainda que de maneira relativa, o controle sobre os instrumentos de produção, o tempo e organização do trabalho. Sendo um fato importante na luta histórica pela democratização do acesso a terra, o estudo dos assentamentos se constitui como de alta relevância para o conhecimento sociológico das transformações ocorridas no mundo rural brasileiro. De acordo com Medeiros & Esterci (1994), traz-se para o centro do debate os dilemas e a viabilidade da pequena produção, em um contexto de hegemonia política da grande produção agrícola empresarial, assim como, o papel do Estado, seu modo de atuar e as políticas implementadas. E, principalmente, discute-se a inclusão social de milhares de famílias camponesas, marginalizadas por uma estrutura fundiária historicamente excludente. A história do assentamento Zé Marcolino, situado no município de Sumé, microrregião do Cariri paraibano, se inicia em 2001, quando a então Fazenda Serrote Agudo entrou em processo de desapropriação para fins de reforma agrária. Uma grande propriedade, com dois mil trezentos e cinqüenta e seis hectares, pertencente a uma família ―tradicional‖ da região. Até meados do século XX, a fazenda chegou a ter mais de vinte famílias de moradores que, entretanto, começaram a ser expulsos principalmente a partir da década de 1960, quando se deu a 126 introdução da pecuária extensiva na região, em substituição dos roçados. Nas palavras de um ex-morador da época: ―saímos porque o dono daqui, ele não quis mais morador, o negócio dele era só criatório, não queria mais morador.‖ Entretanto, a partir da década de 1990, a fazenda começa a experimentar os primeiros sinais da decadência, entre outras razões, pela escassez dos financiamentos a fundo perdido da Sudene (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste), instituição federal cujo projeto político, de caráter ―desenvolvimentista‖ terminou por entrar em falência. Então, na passagem de 2001 para 2002, correu na região a notícia de que a fazenda seria desapropriada pelo Incra. Os interessados em obter lotes de terras no assentamento deveriam efetuar seus cadastros através do preenchimento de formulários nas agências dos Correios das cidades de Prata, Sumé e Amparo. Surgia a possibilidade de, pela primeira vez em suas vidas, agricultores do Cariri conseguir um ―pedaço de terra‖, um ―sonho‖ acalentado por gerações de trabalhadores rurais. Confirmados os nomes, as famílias passaram a mobilizar-se no sentido da ocupação da terra e, levantado o acampamento, experimentaram uma série de coações e ameaças do proprietário, que insistia em permanecer na propriedade. Os sentimentos de medo e insegurança estavam presentes, permeando as ações daqueles que almejavam lugar no assentamento. O medo, por exemplo, de uma reação violenta do fazendeiro, que poderia mandar ―capangas‖, como já ocorrera em casos de ocupações de outras áreas da região. O temor da polícia, vista como a ―serviço‖ de latifundiários e políticos, expressado pelo cuidado no não desaparecimento de nenhum bem da propriedade, fato que poderia servir de pretexto para a prisão dos acampados ou mesmo para a interrupção do processo de desapropriação. Havia também um constrangimento sub-reptício, mas que talvez represente um poder de coerção ainda mais forte: o do comprometimento moral perante a sociedade, representado pela idéia fortemente presente no imaginário coletivo dos camponeses, de aqueles que ocupam terras são ―invasores‖, ―ladrões‘, ―vagabundos.‖ Em outras palavras, aparece implícita uma ética camponesa, caracterizada pela inviolabilidade da honra, associada à ideologia religiosa, em grande medida utilizada para legitimar os interesses dos dominantes, de que, como disse um agricultor,‖ a gente só tem o que Deus quer, se você tem uma roupa mais que outro, é porque Deus te deu.‖ De maneira que, como observou Wanderley (2003), a adesão a uma luta pela terra supõe uma avaliação das chances de sucesso e exige a execução de estratégias eficazes, tendo em vista ser esse um processo tenso e incerto. 127 A saída definitiva do proprietário marca o início da conquista efetiva da terra, permeada, todavia, por situações de precariedade. Inicialmente os assentados abrigavam-se em barracas de lona e palha, embaixo de árvores ou nas dependências da antiga fazenda. Era o momento de expectativa quanto às primeiras ações do Incra, período visto como de muita união, em que ―todo mundo ajudava o outro.‖ O que corrobora a tese de Turner (1974), para quem quando os indivíduos se encontram em momentos de liminaridade, ou seja, de incerteza quanto à posição ocupada socialmente, tendem a formar uma communitas, na qual são fortalecidos os laços de camaradagem e igualitarismo. O Incra, por sua vez, demorou mais de dois anos para construir as casas e parcelar a terra, fato que dificultou sobremaneira a produção, pois, somente com a definição do local pertencente a cada um é que o trabalho de cultivo pode ser realizado com segurança, podem ser construídas as cercas e introduzidos os animais para a criação. Ser titular da parcela significa para o assentado assegurar sua independência relativa, que o faz sentirse dono, estar no que é seu e organizar sua produção devido às incertezas sobre o local pertencente a cada família (Wanderley, 2003). Além da questão da morosidade do parcelamento, havia outro problema, qual seja, a decisão entre construir segundo o modelo ―agrovila‖ ou ―casa no lote‖. A grande maioria dos assentados preferia as casas dentro de cada um dos lotes tocados a cada família. Segundo Caniello & Duqué (2005), este seria o modelo de ocupação do campo que mais se aproxima do modo de vida ―ideal‖ do camponês, no Cariri paraibano, que é aquele onde a família camponesa cultiva o próprio ―roçado.‖ Porém, os técnicos do Incra apresentaram ―de cima para baixo‖, o modelo agrovila, mesmo a contragosto dos assentados. Este exemplo demonstra que as entidades mediadoras, sejam estatais ou não-governamentais, tendem a implementar políticas públicas, por vezes, incompatíveis com os modos de vida tradicionais e a cultura das comunidades assistidas. Apesar dos diversos problemas vivenciados pelas famílias assentadas, todas as pessoas entrevistadas declararam que a vida havia melhorado depois da vinda para o assentamento. Valorizam, sobretudo, a importância de ter uma casa própria e uma área de terra para trabalhar e conviver com a família. Muitos lembraram suas trajetórias de vida. O sofrimento na época que trabalhavam para fazendeiros da região. As sucessivas expulsões das terras. As viagens para São Paulo, marcadas pela saudade da terra onde nasceram e a esperança de um dia voltar. Vicissitudes da vida de camponeses sem-terra e de famílias pobres, que parecem encontrar nos assentamentos da reforma agrária uma possível 128 alternativa de melhoria das condições de existência. De maneira que, o assentamento é visto como um lugar que proporciona uma relativa estabilidade, que possibilita ficar perto da família e que oferece moradia e uma opção de trabalho através do cultivo da terra. Chama a atenção o fato da grande maioria dos entrevistados concentrarem suas falas na comparação entre o modo de vida atual, no assentamento, e o anterior, trabalhando para o ―patrão‖: Muita, muita melhoria, depois que eu cheguei aqui no assentamento. Lá onde eu morava, lá, bem dizer não era meu, né. E eu ia trabalhar e mais de terça para o patrão. E ainda era sujeito a fazer tudo... Não tinha direito de nada. E depois que eu vim pra aqui, achei bom porque tem a liberdade. Quem tiver cuidado, quem quiser trabalhar tem a liberdade. E lá a gente não tinha isso... terra pra trabalhar, né, que a gente, graças a Deus, depois que eu cheguei aqui nunca mais comprei um quilo de milho nem de feijão. Não ser ―mais sujeito‖ a ninguém significa assumir o comando do processo de trabalho. Escolher livremente o que, como e a que tempo produzir, com a certeza de que parte da produção não será mais transferida obrigatoriamente para o patrão. A sensação de liberdade provém de uma situação objetiva de relativa independência. Nesse sentido, os assentados fizeram uma comparação entre o momento atual e o ―regime de patrão‖, este expressado por palavras como ―cativeiro‖, ―exploração‖, ―escravidão‖, etc. São termos que, em todos os significados, definem uma situação de subordinação a alguém de poder, que coage e impõe medo. Referem-se à perda do controle sobre o processo de trabalho, sobre o cálculo que preside as operações produtivas, comerciais e de consumo, sobre a distribuição do tempo ente lazer e trabalho, sobre os limites da vida doméstica e vida produtiva. REFERÊNCIAS CANIELLO, M. & DUQUÉ, G. PDA: a participação subtraída. Anais do XII Encontro de Ciências Sociais do Norte e Nordeste. UFPA, Belém, 2005. MEDEIROS, L. ESTERCI, N. Assentamentos rurais: uma visão multidisciplinar UNESP. São Paulo, 1994. WANDERLEY, M. N. Morar e trabalhar: o ideal camponês dos assentados de Pitanga. In: MARTINS, J.S. (org) Travessias: vivências da reforma agrária nos assentamentos. UFRGS. Porto Alegre, 2003. TURNER, V. O Processo Ritual. Vozes. Petrópolis. 1974. 129 GT2 – Subjetividades, práticas sociais e contemporaneidade - Sala E2 – Setor II Julimar Gonçalves (UFRN); Rejane Guedes (UFRN); Vergas Vitória Andrade (UFRN) [email protected] Ementa: O objetivo do GT é discutir trabalhos que se articulam em torno do tema produção de subjetividades contemporâneas. Partese do pressuposto de que a subjetividade não se reduz apenas a interioridade do sujeito. Trata-se de um fenômeno definido por uma relação particular com o mundo social. É uma convenção cultural na qual não pode ser estudada desarticulada de significados culturais. A subjetividade, portanto, é formada a partir de um conjunto de práticas sociais. Tendo isto em vista, este GT pretende abordar questões relativas às modulações da subjetividade em face às mudanças sociais e históricas por que passam as sociedades contemporâneas. Objetivos: Abordar o tema da subjetividade enquanto questão coletiva, social e histórica; Compreender o processo de produção da subjetividade a partir de práticas sociais; Apreender às maneiras nas quais formações culturais particulares moldam e provocam subjetividades. Isto é, entender como as transformações verificadas no mundo contemporâneo afetaram e afetam o plano do próprio modo de subjetivação. GT2 – Subjetividades, Práticas Sociais E Contemporaneidade Trabalhos Aceitos Resumos Simples 01 - MERCADO RELIGIOSO: UM MERCADO QUE NÃO ENTRA EM CRISE Edivaldo Correia Bastos [email protected] Resumo: Apesar da crise mundial, o mercado de produtos, bens e serviços religiosos não enfrenta dificuldades. Análises de especialistas do setor indicam que o mercado deverá crescer 30% em 2009. Neste mesmo ritmo de expansão está a maior feira de produtos do segmento, a Expo Cristã que acontece anualmente no mês de setembro, no Expocenter Norte (SP). A atividade religiosa hoje vem sendo cada vez mais orientada pela competição em mercado e, por conta disto, o que se oferece como bem simbólico, para conforto e deleite da alma, é consagrado pela eficiência e otimizado para que a resolução de problemas individuais seja imediata. Este trabalho tem como objetivo analisar e avaliar, a partir dessa perspectiva de crescimento, como tem se comportado 130 certos segmentos deste mercado. Esse comportamento abrange fiéis consumidores e agentes produtores especializados com suas atitudes e expressões de linguagens midiatica. Centrando-se na teologia da prosperidade, a significação dos produtos oferecidos para consumo, ancora-se em ―imagens‖ de mercado que passa a alimentar a cada dia, uma forma de libertação de algum mal. 2 - PROJOVEM: CONSTRUINDO E MODELANDO OUTRAS SUBJETIVIDADES Edivalma Cristina da Silva [email protected] Resumo: Subjetividades e práticas sociais. Partindo do pressuposto de Velho (1986) de que o interno/subjetivo é construído a partir da influência de elementos externos aos sujeitos sociais, a exemplo da linguagem, cultura e oralidade, esse trabalho se propõe a analisar a influência do Programa Nacional de Inclusão de Jovens (ProJovem), do Governo Federal, na modulações das subjetividades de seus integrantes. Para a realização desse trabalho, elegeu-se a cidade de Cruzeta/RN enquanto locus de pesquisa e se delimitou como recursos metodológicos a realização de entrevistas presenciais, observações em sala e o acompanhamento das atividades realizadas por membros do Programa. Toda a análise aqui proposta perpassa pela discussão acerca de culturas e produção de subjetividades, a partir dos conceitos de Foucault (1997; 2002), Velho (1986), Ortner (2007), Bosi (1992), Pessanha (1987), entre outros. Essa reflexão é parte integrante de discussões para um futuro projeto de pesquisa de doutorado, pelas quais se afirma que a produção da subjetividade não pode ser pensada sem o estabelecimento de relações com os contextos e grupos sociais, bem como com os discursos que circundam a arte do educar/saber e as práticas sociais. Assim, se pode sinalizar como conclusão preliminar, que o ProJovem atua nas modulações da subjetividade através de mecanismos positivos (FOUCAULT, 2002), a exemplo da disciplina, mas que essa produção também parte das práticas sociais desenvolvidas pelos integrantes do grupo, nas quais, as visões de mundo e as relações sociais incidem na constituição de experiências subjetivas – singulares – dos sujeitos sociais. (Observação: Trabalho não apresentado). 131 3MEMÓRIAS DE LEITURA: REFLETINDO SOBRE A AQUISIÇÃO DA LEITURA Fernanda de Moura Ferreira [email protected] Ester Cavalcanti da Silva Araújo [email protected] Dra. Maria da Penha Casado Alves Resumo: Todos nós temos um percurso de leitura que é construído ao longo da vida, até mesmo aqueles que dizem não saber ler tem um histórico de leitura, por esta não estar exclusivamente ligada ao sistema lingüístico. Adotando esta concepção de leitura, neste trabalho nos propomos a analisar as memórias de leitura de docentes em um curso de formação continuada oferecido pelo departamento de letras da UFRN. Tal análise tem por objetivo observar como se deu a caminhada desses professores enquanto leitores e até que ponto essa história influenciou as escolhas feitas por eles, atentando para o modo como eles confeccionaram suas memórias. Além disso, visa observar a influência desse percurso nas práticas de sala de aula. Os dados nos levaram a perceber que esses percursos interferiram na postura dentro de sala de aula, uma vez que isso, de certa forma, direcionava o modo de ensinar, e também fora dela. Para a realização deste trabalho, recorreu-se às concepções de sujeito de Bakhtin (2003), enquanto dialógico, à visão de Nóvoa (2004, 2007) sobre as práticas docentes (2003), às teorizações sobre leitura de Garcez (2005) e Freitas (2003, 2005) como também a outros teóricos que concebem a leitura como construção e processo intersubjetivo. 4O MUNDO SOCIAL: A RELAÇÃO ENTRE O SUJEITO E A ESTRUTURA Gustavo Henrique Bezerra Petrovich/UFRN [email protected] Resumo: Nesse artigo, problematizam-se os conceitos de Habitus e Campo, conceitos profundamente caro aos estudos que o sociólogo Pierre Bourdieu realiza, ao pensar a relação conflituosa do indivíduo e a sociedade. Assim, tentando fugir da discussão epistemológica entre a dicotomia subjetivismo/objetivismo, Bourdieu nos convida a pensar relacional, refletir em sua análise do social, que os agentes incorporam a estrutura social, ao mesmo tempo em que a produzem, legitimam e reproduzem. 132 5A SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA E A NOVA GERAÇÃO DE IDOSOS Heloísa Muller Marilde Sievert [email protected] Resumo: Este artigo aborda o desenvolvimento de uma comunicação eficaz, dirigida a uma nova geração de idosos, composta por internautas com idade superior a 60 anos. À medida que a pessoa envelhece, surgem transtornos que podem desestimular o uso da Internet deixando-a à margem da sociedade contemporânea (sociedade da informação). Os principais estão relacionados com a perda da capacidade auditiva e visual e com dificuldades de coordenação motora e de concentração. Para amenizar estas limitações, de forma a atrair os idosos e fomentar neles o interesse em navegar, foram aplicados diversos recursos na construção de um blog direcionado a este público. Um começo de reflexão sobre responsabilidade social e cidadania perpassando pela inclusão digital. (Observação: Trabalho não apresentado). 6-GABRIEL TARDE PERTENCIMENTO E A SUBJETIVIDADE ENQUANTO Rodrigo Sérvulo Fernandes Cunha [email protected] Resumo: Pretende-se retomar as teorias neomonadológicas desenvolvidas pelo sociólogo francês Gabriel Tarde (1843-1904), que implicam na idéia de que a subjetividade é aquilo que não está dado a priori, mas que se adquire - ela se produz e é produzida. Partindo desse pressuposto, iremos discutir as implicações tardianas sobre a noção do verbo Ter em oposição à interpretação do real fundada no verbo Ser. (Observação: Trabalho não apresentado). 7-SUBJETIVAÇÃO E TATUAGEM Thassio Martins de Oliveira Dias [email protected] Resumo: Através de nossas experiências com os acontecimentos do dia-a-dia vamos formando aquilo que chamamos de identidade. Podemos até dizer que certos aspectos são do nosso ―gene‖, porém não há como escaparmos da influência das dinâmicas cotidianas 133 para a formação de um caráter. Estas vivências são formadoras de modos de ser, definindo-nos peculiarmente, e tomamos tais modos em certo ponto como imutáveis, ou seja, cremos que a partir de um dado momento das nossas vidas nossos caracteres se tornam firmes o suficiente para denotarmos como uma identidade fundamentada. Mas, será mesmo que nossas identidades são firmes o suficiente para não serem afetadas pelas dinâmicas cotidianas das quais nos encontramos? Esta identidade é produto de processos de subjetivações do mundo em que vivemos e pelo qual todas as pessoas passam, onde elas interpretam e tomam uma posição diante dos fatores da realidade que ocorrem cotidianamente. Em busca de novas maneiras de viver, de pensar e experimentar a realidade os sujeitos acabam por inventar maneiras de se conceber o corpo e a idéia de si enquanto ser. Tomemos como pano de fundo para ilustração de tais idéias uma das práticas mais antigas da vivência humana no que diz respeito ao corpo: a tatuagem. Poderíamos então, desta maneira, encarar a tatuagem como uma tentativa de cristalização de uma identidade escolhida, ou seja, uma tentativa de anestesiar o constante processo de subjetivação do qual se encontram circunscritos os indivíduos, fazendo assim com que sua atual condição lhe sirva de pedra motriz para uma concepção daquilo que ele acredita que venha a ser sua real e imutável identidade. Esta maneira de criação de identidade é uma das inúmeras existentes em todas as sociedades, uma maneira de ser notado, de fazer com que haja um sentimento de existência, mesmo que seja através de uma efêmera identidade impressa na pele. 8-SUBJETIVAÇÃO E DOBRAS DE FORA: TRANSITANDO PELO “FOUCAULT” DE GILLES DELEUZE Jean Henrique Costa [email protected] Resumo: O presente escrito objetiva discutir sucintamente o conceito de ―dobras de fora‖, problematização foucaultiana que auferiu formato singular na obra de Gilles Deleuze durante a década de 80 do século passado. A representação da dobra em Deleuze foi construída a partir das obras dedicadas ao próprio Foucault (1986) e a Leibniz – Le Pli: Leibniz et le barroque (1988) e indica, no imo de sua complexidade semântica, uma vergadura, uma flexão do lado de fora (poder) para a constituição de ―uma relação da força consigo, um poder de se afetar a si mesmo, um afeto de si por si‖, conforme palavras de Deleuze. O conceito de dobra, embora seja um instrumento teórico bastante enérgico para se compreender a realidade subjetiva hoje, é ainda pouco notório. Destarte, faz-se aqui o exercício de apresentá-lo. Tratar-se-á, 134 conforme expressão de Suely Rolnik, de uma ―insólita viagem à subjetividade‖, itinerário cercado pela ―indissociabilidade inconciliável entre o fora e o dentro‖. Pretende-se aqui, deste modo, atingir a aturada tarefa de simplificar tal úbere projeto teórico-filosófico. Palavras-Chave: Subjetividade; mecanismos disciplinares; tecnologias do self; dobra; sujeito. (Observação: Trabalho não apresentado). 9MICHEL FOUCAULT E A SOCIEDADE DE CONSUMO: NOTAS PARA UMA GOVERNAMENTALIDADE LIBIDINAL Alyson Thiago Fernandes Freire [email protected] Resumo: O trabalho em apreço consiste em apresentar uma interface embrionária entre os estudos acerca da sociedade de consumo - mais especificamente segundo as elaborações de Jean Baudrillard - e o pensamento de Michel Foucault. Este trabalho objetiva abordar o tema do consumo a partir das noções de governo e biopoder, isto é, abordá-lo enquanto um problema de governo das condutas de si e dos outros. Inserir o tema do consumo no âmbito do que Foucault caracterizou como governamentalidade implica, não só mapear os conceitos de governo, biopoder e governamentalidade, mas, sobretudo, pensar novas articulações tendo em mira a singularidade das políticas de subjetivação e das práticas sociais deste campo. Para tal tarefa, este trabalho procura abordar a cultura de consumo enquanto um modo de subjetivação singular, que, a partir de um conjunto de signos diferenciais (Baudrillard) e suas técnicas de significação tornam os indivíduos sujeitos – na dupla acepção da palavra. O que, pelo mesmo gesto, coloca-nos diante de possibilidades tentadoras de pesquisa e de prementes questões teóricas relativas à produção contemporânea de subjetividades e suas modulações. 135 GT2 – Subjetividades, Práticas Sociais E Contemporaneidade Trabalhos Aceitos Resumos Expandidos 01 - MERCADO RELIGIOSO: UM MERCADO QUE NÃO ENTRA EM CRISE Edivaldo Correia Bastos [email protected] Prof. Dr. Orivaldo Pimentel Lopes Júnior - Orientador Introdução: A abordagem do fenômeno do consumo que predomina dentro da disciplina da economia é aquela associada à teoria microeconômica da utilidade marginal, sendo a utilidade, aqui, o nome que se dá a essa qualidade intrínseca do item do consumo de que o consumidor extrai satisfação, enquanto se admite que ele, por sua vez, deva sempre comportar-se de maneira a elevar ao Máximo sua utilidade e, em conseqüência, sua satisfação. Nossas considerações, neste trabalho, relacionam-se com o individuo que vive num contexto urbano-industrial. Alguém que sente e vive as transformações que se operam nas metrópoles cada vez mais dominadas pela tecnologia e pelas novas concepções de vida gerada no contexto técnico-industrial. O fenômeno urbanoindustrial não é somente uma mudança das estruturas geográficas e sociais, nem só uma questão de aumento numérico da população. É também uma metamorfose dos espíritos, de sua cultura e de seus valores. Daí que aquilo que se refere, em nossa cultura, ao problema do Sagrado e do Religioso está também sob a influência dessas transformações. Essas novas condições influenciam a própria vida religiosa. Diante dessas transformações, surge um espírito crítico mais aguçado que busca purificar a concepção mágica do mundo e de superstições ainda disseminadas e exige uma aderência à fé cada vez mais individual e produtiva. Por isso, muitos indivíduos se aproximam de uma igreja ou instituição religiosa pra realizar suas aspirações e desejos diante de uma divindade. Objetivos: Propomo-nos, neste trabalho, fornecer alguns aspectos das atitudes e comportamentos do homem-urbano-industrial relacionados com a problemática do Sagrado ou do Religioso. Trata-se, pois, de uma pesquisa que apresenta algumas pistas de reflexão sobre o enigma do mercado religioso, isto é uma mercado que não enfrenta crise. Fazer uma avaliação da importância, influência e manifestações na sociedade brasileira. Material e Métodos: A trajetória que seguimos na pesquisa que apóia o presente trabalho nos dá um certo distanciamento das analises frankfurtianas. Isso porque, como buscamos enfatizar os consumidores de produtos, bens e serviços religiosos e a forma 136 como constroem sentidos e significados no exercício das práticas consumistas. Percebemos na esfera da dinâmica das feiras religiosas – como a Expo Cristã (feira de produtos e serviço dos evangélicos) e a Expo Católica (feira de produtos e serviço dos católicos que o consumo não é somente irracionalidade e comercialização, ou seja, não só gera desejos nos Sujeitos produtores e consumidores, mas eles próprios fazem uma hermenêutica de seus desejos e realizações. Sendo estas exposições como seus produtores e consumidores o material especifico desta pesquisa. Resultados e Discussão: O Desenvolvimento do mercado religioso: Falar em ―Mercado‖ ou ―Consumo Religioso‖ não é necessariamente falar em Religião. Entendemos por este termo de aparência abstrata um filão da história do ocidente cristão, não rigorosamente identificado como um conjunto de crenças econômicas, de mandamentos éticos e organizativos, mas muito mais uma estrutura complexa, um sistema de ações, um comportamento, que caracteriza o perfil que o assume como indicativo de sua identidade própria. Nesse sentido, não deixa de ser relevante uma abordagem do consumismo religioso, a partir das transformações que ocorrem na sociedade contemporânea, movendo os fundamentos e processos centrais das sociedades constituídas e reduzindo os quadros classificatórios que atribuíam aos indivíduos um embasamento sólido no contexto social. Nos últimos cinqüenta anos, o campo religioso brasileiro passou por profundas mudanças com o surgimento de novas igrejas, denominações, instituições pentecostais e neopentecostais, que apresentaram inovações nas concepções teológicas, no sistema doutrinário, na organização eclesiástica, nas ordens litúrgicas e nos códigos éticos eclesiásticos. Conforme Mariano (2003), a secularização do Estado e o fim da religião oficial no Brasil fizeram brotar à liberdade de culto, a expressão e ao pluralismo religioso, o que contribuiu para intensificar a concorrência entre as mais diferentes agências produtoras da fé. Diante da acelerada disputa instaurada no mercado religioso, as igrejas atuam como megaempreendimentos empresariais que utilizam estratégias de marketing e definem metas de produtividade para atrair nova clientela e expandir seus lucros. De acordo com Prandi (1996), a nova relação que se estabelece entre congregações e fiéis nada mais é do que um acordo entre prestador de serviço e consumidor, ambos imersos na lógica do mercado e da livre concorrência. As instituições e igrejas neopentecostais passaram a desenvolver novos produtos, serviços religiosos e bens simbólicos para atender à demanda de consumidores específicos, cada vez mais exigentes com a qualidade do serviço oferecido. Em razão da tolerância a 137 nova formatação de crenças e cultos, da pluralização religiosa e da conseqüente competição por novos nichos de mercado, as instituições e igrejas diversificaram suas ofertas e serviços para contemplar interesses e preferências de clientes que pertencem as mais variadas classes sociais. Nesse contexto competitivo religioso, as organizações eclesiásticas racionalizaram as atividades administrativas, centralizaram as decisões, concentraram o poder do clero, profissionalizaram seus quadros de funcionários e aperfeiçoaram o uso dos mais modernos instrumentos midiáticos para divulgar bens e serviços e comercializá-los a um público específico. Segundo Pierucci (1997), a retirada da religião do espaço público, a privatização das práticas e crenças religiosas, a liberdade de culto e a intensa competitividade pela comercialização do sagrado reforçam a tese da secularização. As denominações neopentecostais rompem com a lógica da fidelidade inexorável à religião tradicional, cuja importância era atribuída ao fato de ser herança familiar, ―linhagem na fé‖, símbolo do compromisso com a origem e os laços de sangue (Pierucci, 2006). Elas se preparam para disputar os clientes/consumidores, um a um, persuadindo-os a aderir à nova confissão religiosa e a ingressar na nova comunidade da fé. A conversão religiosa individual e voluntária implica a quebra dos laços com o passado familiar, das relações comunitárias e dos elos de parentesco. Movidas pela competição, estas instituições e igrejas neopentecostais atacam as instituições, igrejas e congregações tradicionais e difamam crenças e práticas religiosas a fim de conquistar a simpatia das ―almas‖ enraizadas nessas confissões convencionais. Além disso, utilizam mecanismos modernos e ideologias próprias da sociedade de consumo para permanecerem vivas, atuantes e competitivas no mercado da fé. Esses novos movimentos religiosos, por sua vez, para se ajustar às mudanças do mundo moderno, reformularam sua linguagem, tornando-a veículo virtual de transmissão de mensagens tradicionais (Jardilino, 2001). As igrejas neopentecostais adotaram a linguagem eletrônica e virtualizada, própria da sociedade contemporânea, para garantir sua sobrevivência e permanência em meio à racionalidade tecnológica. Recursos técnicos sofisticados, tecnologia altamente avançada, mídia eletrônica, estratégias de publicidade e marketing e produção de imagens fazem parte do sistema simbólico dos novos empreendimentos neopentecostais. Novas técnicas foram desenvolvidas para o gerenciamento da fé e a divulgação dos produtos religiosos. O neopentecostalismo, seguindo a lógica do sistema capitalista, inseriu-se na economia de mercado e utilizou estratégias de marketing para anunciar seus novos artigos na mídia eletrônica. Como agências da fé, as novas igrejas exibem suas mercadorias nas prateleiras das lojas e fazem 138 propaganda delas nas comunidades virtuais para atrair potenciais consumidores. Conforme Jardilino (2001), não havia alternativa às congregações neopentecostais senão aderir aos dispositivos e às regras do neoliberalismo. Nesta sociedade marcada pela padronização dos meios de comunicação, pela tecnologia das informações e pela primazia da imagem, parece imprescindível às organizações religiosas adotar instrumentos mercadológicos e estratégias publicitárias para conquistar novos mercados e sobreviver em meio à concorrência desleal. A religião [...] percebeu que numa sociedade massificada pelo império dos meios de comunicação de massa e extremamente seduzida pelo simulacro, não teria chances de competir com seus diferentes parceiros de mercado, na oferta de seus produtos – os bens religiosos –, se não se lançasse, de corpo e alma, nesta empreitada. Assim, a propaganda e o marketing se constituíram para a religião numa ferramenta de trabalho na concorrência para a venda de seus produtos, como qualquer outro do mercado (JARDILINO, 1997, p. 166). Por esta via, o movimento neopentecostal criou espaços virtuais de interação e gerou meios eletrônicos de divulgação da fé. Segundo Gouveia (1998), apareceram as ―comunidades eletrônicas de consolo‖, formadas especialmente por mulheres que dirigiam suas narrativas ao público feminino. Além de difundir as novidades religiosas, divulgar os milagres, aconselhar o telespectador e procurar convencê-lo a visitar os templos, essas comunidades virtuais orientam e remodelam a conduta feminina na vida diária, produzindo um processo de redefinição da identidade da mulher nas instituições e igrejas pentecostais e neopentecostais. Os meios eletrônicos possibilitam, desta forma, a rápida circulação dos produtos, serviços e bens simbólicos no mercado religioso e a redefinição do espaço do sagrado, reforçando a desterritorialização e virtualização da transcendência. Como se pode perceber, as novas igrejas pentecostais, em virtude das várias mudanças por que passaram, apresentam atualmente uma maior adequação às condições da sociedade moderna. Mostram-se, pois, menos sectárias, não demonstrando repúdio à ideologia do mundo capitalista. Em vez do isolamento intramundano, os grupos neopentecostais esforçam-se para obter prestígio social, respeitabilidade política e poder econômico. Almejam integrar-se ao contexto sócio-político e econômico a fim de receber benefícios e gratificações na vida terrena. Acreditam na vida eterna, porém não estão dispostos a esperar pelo surgimento do paraíso prometido, para realizar seus projetos com sucesso e alcançar a felicidade tão desejada. 139 Considerações Finais: A crise como suporte de crescimento: Uma das transformações importantes na estrutura social da sociedade contemporânea é a mega potencia econômica que exerce, sob o ponto de vista material e religioso, uma imensa influencia sobre a população global. O acelerado conhecimento científico da natureza possibilitou o domínio progressivo da natureza pela tecnologia. A tecnologia industrial transforma a terra e multiplica a produção e a troca de bens e mercadorias de toda espécie. As mútuas relações econômicas foram-se estreitando cada vez mais, os intercâmbios tornara-se inevitáveis e mais freqüentes. Intensificado o desejo de controle sobre a natureza, mas também cresce a consciência da responsabilidade perante os homens e perante a história. Portanto, há um grande interesse da humanidade pelo bem-estar, o consumo, o tempo livre e o luxo numa rapidez fora do comum, surgem sempre mais necessidade. Desejos e responsabilidade que levam a novas realizações tecnológicas e econômicas. Na esfera da religião a situação não foi diferente. A partir da segunda metade do século XX acontece uma explosão religiosa inesperada; antigas religiões adquiriam novo fôlego, e novas formas religiosas foram surgindo. Para espanto dos racionalistas e materialistas que acreditaram que Deus e a religião estavam prestes a desaparecer da vida humana, o que se verificou nestas últimas décadas foi exatamente o contrário, ou seja, a redescoberta do sagrado, após tantos desencantos e frustrações, além de problemas de toda ordem provocados pela Modernidade. Os sujeitos consumidores procuram a religião para satisfazer alguma necessidade, não mais para dar sentido a sua existência. Essa realidade, que pode ser observada como fenômeno nas grandes religiões de salvação (budismo, islamismo, cristianismo, judaísmo), representa uma realidade complexa e uma grande interpelação para as instituições. Hoje se fala em mercado religioso, consumidor cristão e até privatização da religião porque os Sujeitos consumidores fazem da religião uma escolha particular e não mais uma opção dentro de uma coletividade. Os que profetizaram o desaparecimento do Religioso, na era urbanoindustrial, não viram suas previsões realizadas. O fenômeno religioso aí está: ele aparece e ressurge das mais variadas formas e nas mais diferentes classes de nossa sociedade. Rubem Alves observa: [...] o que não se podia prever é que o novo fervor religioso viesse a se manifestar justamente nos centros onde a secularização, a burocratização e as instituições educacionais e cientificas se haviam estabelecido de forma mais forte. Mas, é exatamente isso que parece estar acontecendo. (ALVES, 1974, p.13): 140 Na observação de Alves (1974), não parece isso sugerir que justamente nos limites da consciência do desencantamento do mundo, da exploração de suas possibilidade horizontais e imanentes, esteja o homem-urbano-industrial se dando conta de que talvez haja uma ―insanidade‖ na secularização e uma ―cegueira‖ na ciência? Como K. Mannheim (1972, p. 204) observa, ―[...] nada mais afastado dos acontecimentos reais que o sistema racional fechado. Em certas circunstancias, nada contem impulsos mais irracionais que uma visão do mundo intelectualista e plenamente auto-suficiente‖. Nos grandes centros urbanos de nosso país, cresce de maneira rápida o numero de adeptos que aderem aos cultos neopentecostais e as celebrações da renovação carismática católica, multiplicam-se os centros de Espiritismo e Umbanda, com densas características sacrais, atingindo todos os grupos e classes da sociedade. Os grandes grupos religiosos institucionalizados, Igreja Católica e principais denominações protestantes, embora tenham sofrido profundas crises e transformações de ordem organizacional e mesmo doutrinária, face ao processo de secularização, apresentam aspectos novos, novas liturgias, utilização das artes cênicas, que atraem grande contingente de pessoas nos centros urbanos encontros de casais, grupos de jovens, congressos, marchas etc. Estamos diante de fatos. O progresso econômico contribuiu para o progresso religioso. Essa nova religiosidade não se contenta apenas com ―sermões‖ e estudos doutrinários, ela exige mais e mais. Portanto, é necessário suprir suas carências, e para isso entra em cena o Mercado Religioso com suas produções mirabolantes apresentadas nas Expos Religiosas da atualidade. REFERÊNCIAS ALVES, Rubem. Misticismo: a emigração dos que não tem poder. 7 ed. São Paulo: Vozes, 1974. CAMPBELL, Colin. A Ética Romântica e o Espírito do Consumismo Moderno. Rio de Janeiro, Rocco, 2001. ________. ―Eu compro, logo sei que existo: As bases metafísicas do consumo moderno‖. In: Barbosa, Lívia & Colin Campbell (orgs.). Cultura, Consumo e Identidade. Rio de Janeiro, FGV, 2006. GOUVEIA, E. H. Imagens femininas: a reengenharia do feminino pentecostal na televisão. Tese de doutoramento. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1998. JARDILINO, J. R. L. O Tempo e o Espaço Sagrado na experiência religiosa pós-moderna: alterações do campo religioso brasileiro. In: Santos, G. T. dos & Jardilino, J. R. L. Ensaios de psicologia e religião. São Paulo: Editora Plêiade, 2001. 141 MANNHEIM, K. Liberdade, poder e planificação democrática. São Paulo: Mestre Jou, 1972 MARIANO, R. Neopentecostais: sociologia do novo pentecostalismo no Brasil. São Paulo: Edições Loyola, 1999. ________. ―Efeitos da Secularização do Estado, do Pluralismo e do Mercado Religiosos sobre as Igrejas Pentecostais‖. Civitas, v. 03, nº 1, 2003, p. 111-125. PIERUCCI, A. F. ―Reencantamento e Dessecularização: a proposta do auto-engano em sociologia da religião‖. Novos Estudos CEBRAP, 49, 1997, p. 99-117. ________. ―Religião como Solvente – uma aula‖. Novos Estudos CEBRAP, 75, 2006, p. 111-127. PRANDI, Reginaldo . Religião paga, conversão e serviço. In: PIERUCCI, Antônio Flávio de Reginaldo PRANDI. A realidade social das religiões no Brasil. São Paulo, Hucitec, 1996. 2 - PROJOVEM: CONSTRUINDO E MODELANDO OUTRAS SUBJETIVIDADES Edivalma Cristina da Silva [email protected] (Resumo Expandido não disponibilizado para publicação) 3 - MEMÓRIAS DE LEITURA: REFLETINDO SOBRE A AQUISIÇÃO DA LEITURA Ester Cavalcanti da Silva Araújo (UFRN) [email protected] Fernanda de Moura Ferreira (UFRN) [email protected] Orientadora: Profa. Dra. Maria da Penha Casado Alves [email protected] Ao longo de nossa vivência, construímos nosso percurso de vida. Tal percurso engloba muitos outros que constituem essa trajetória maior, como, por exemplo, o percurso profissional, acadêmico, amoroso, familiar, entre outros. Observar que não temos apenas um percurso, mas vários percursos nos ajudam a perceber que somos formados ao longo de nossa caminhada de vida e por esse motivo nunca estamos acabados. Assim, compartilhamos experiências, fazemos trocas com o meio que nos rodeia e que também nos fazem ser o que somos, não nos tornando submissos a ele, devido ao sujeito ter autonomia sobre si, mesmo que 142 aparentemente ele esteja se submetendo a determinada situação. Portanto, a formação dele se dá de maneira interativa, pois ontologicamente o homem é um ser social e se confirma enquanto tal a partir das relações que estabelece com seu meio e com o outro, seja este a pessoa física ao seu lado ou o mundo que se apresenta para ele como lugar de interações as mais diversas. Dessa forma, o sujeito se forma por meio das diversas relações dialógicas, nas quais está inserido, uma vez que ele está imerso nas relações dialógicas presentes no mundo. Neste, habitam várias vozes que exprimem o posicionamento de um dado grupo social mediante as inúmeras situações, sejam elas mais corriqueiras ou mais profundas. Por já nascer nesse mundo ―pronto‖, com costumes e crenças definidos antes mesmo de sua chegada, o sujeito assimila tudo com que entra em contato para construir socialmente sua consciência, é a partir de sua interação com o mundo e com os outros sujeitos que a consciência vai se formando e se construindo. Essa constituição social é que faz com que a singularidade possa ser constituída e o sujeito possa se posicionar frente às várias situações da vida. Neste trabalho, a leitura é vista como a interação entre subjetividades, também é vista como construção. A leitura é uma troca entre leitor e autor, pelo fato de o sentido do texto não estar totalmente dado, mas ser construído no ato de ler. Assim, a leitura passa a ser um processo complexo que engloba tanto a decodificação do código quanto as exigências que ela faz ao cérebro e a intersubjetividade. Neste trabalho, adotamos uma metodologia qualitativa-interpretativista e utilizamos as considerações feitas por Bakhtin (2003) sobre sujeito, a visão de Nóvoa (2004, 2007) sobre as práticas docentes (2003), as teorizações sobre leitura sistematizadas por Garcez (2005) e Freitas (2003, 2005). Concluímos, assim, que por meio da investigação de um dos percursos, no caso, o de leitura, dos docentes autores dos textos analisados, podemos reconstituir a aquisição da leitura deles e compreender como se formaram leitores na vida ou em situações formais de ensino-aprendizagem. 4 – O MUNDO SOCIAL: A RELAÇÃO ENTRE O SUJEITO E A ESTRUTURA Gustavo Henrique Bezerra Petrovich (PPGCS/UFRN) As Ciências Sociais surge fruto do paradigma do século XIX, período caracterizado pela consolidação do capitalismo e pelo desenvolvimento da tríade ciência-técnica-indústria, entretanto, traz consigo uma relação mal resolvida, a qual consiste a discussão entre sujeito e estrutura; de um lado, parte das pessoas aborda as 143 formações sócio-históricas como se tivessem sido concebidas, planejadas e criadas. Caminho que termina por excluir as estruturas sociais que coagem e socializam as pessoas. Já do outro lado, a sociedade é concebida como uma entidade orgânica supra-individual, onde a estrutura é quem prevalece sobre os indivíduos, ela habilita a ordem social entre as pessoas, coagindo a aceitarmos determinadas normas e valores sociais. Para Nobert Elias (1994),o primeiro campo continua obscuro no estabelecimento de uma ligação entre atos e objetivos individuais nas formações históricas, no segundo, falta clareza em vincular as forças produtoras dessas formações, ás metas e atos dos indivíduos. A questão segundo Antony Giddens(2003), é entender que a ação humana produtora de significados e subjetividades, pode se relacionar com as noções de estrutura e sujeito; já que, as atividades humanas sociais são auto-reprodutoras, elas não são criadas por atores sociais, mas continuamente recriadas por eles, através dos próprios meios pelos quais eles se expressam como atores. O pressuposto de Giddens, de negar a filiação a qualquer uma dessas duas correntes e pensar relacionando estes dois campos, nos leva a pensar e refletir a cerca dos conceitos de habitus e campo proposto pelo sociólogo Pierre Bourdieu. Desta forma, compreender o legado e produção sociológica de Bourdieu como um constante exercício e convite a uma sociologia reflexiva, ao entendimento do mundo social como um jogo de disputas simbólicas entre os agentes sociais; ele nos incita a um novo olhar sociológico, uma revolução mental no entendimento de ler a sociedade e interpreta - lá, nos oferecendo uma teoria do social que ao mesmo tempo, corresponde a um jogo de moeda com duas faces. Antes de destacarmos os conceitos de habitus e campo, como uma forma de relacionar a problemática do sujeito e estrutura, convém entender como se distribui o espaço social e sua relação com os agentes de acordo com a sociologia de Bourdieu. Para ele, o espaço físico definido enquanto uma exterioridade recíproca de posições, pode ser entendido como um espaço social de exclusão mútua ou distinção dos agentes, na estrutura de distribuição de diferentes espécies de capital entre os agentes sociais; no qual as coisas apropriadas pelos agentes, logo são constituídas como propriedades, situados em um lugar do espaço social distinto e distintivo, caracterizado pela posição relativa em relação a outros lugares. O espaço social para Bourdieu tende a se retraduzir no espaço físico, sob a forma de um arranjo de agentes e propriedades, onde as divisões e distinções do social em categorias de alto e baixo, 144 esquerda e direita. Exprime-se real e simbolicamente, no espaço físico apropriado como espaço social reificado. Em linhas gerais, o espaço é um definidor de uma correspondência entre certa ordem de coexistência ou distribuição dos agentes e uma ordem de coexistência ou de distribuição das propriedades; logo para a sociologia bourdieziana, o mundo social é um definidor da condição do agente, no qual não possuir domicílio fixo, significa ser desprovido de existência social. Bourdieu define a sociedade como um espaço, um conjunto de posições distintas e coexistentes, exteriores uma às outras, definidas umas em relação às outras por sua exterioridade mútua e por relações de proximidades, vizinhança ou distanciamento e relações de ordem. A compreensão do jogo social se insere na condição do corpo estar no mundo, ele está ligado a um lugar por uma relação direta, um contato que não é senão uma maneira entre outras, de se relacionar com o mundo; o que determina a posição espacial no campo social? Quais os princípios de diferenciação que condicionam a ocupação do espaço social? Para Bourdieu, nas sociedades desenvolvidas, as alavancas mais eficientes de distinção são as posses de capital econômico e capital cultural; logo, os sujeitos ocuparão espaços mais próximos, quando mais similar for a quantidade e a espécie de capitais que detiverem. Entretanto, os agentes estarão mais distantes no campo social, quanto maior for a discrepância do volume e do tipo de capitais; assim, pode-se dizer que o capital econômico e o capital cultural, geram internalizações de disposições e distinções de espaços sociais ocupados pelo homem. A teoria bourdieziana tem como uma de suas teses, destacar os mecanismos de reprodução social que legitimam as diversas formas de dominação; no qual a sociedade é um espaço de lutas e relações entre agentes que visam impor sua visão de mundo, interesses e referenciais determinados pela posição que ocupam no mesmo mundo, cujo objetivo levam a transformação ou conservação. O agente está ligado a um espaço, o do campo, sendo este um espaço de luta pela posse sobre um determinado capital e sobre o poder de impor os princípios de di-visão; estes que são instrumentos usados pelos agentes e grupos, para observar e classificar a realidade social. O princípio de di-visão, são categorias mentais de percepção do mundo social, referente à incorporação das estruturas objetivas do espaço social; o mundo se faz compreensível, porque o corpo se acha inclinado e apto a praticar condutas que mobilizam um 145 conhecimento pelo corpo, uma garantia de compreensão prática do mundo, a qual difere de um ato intencional consciente. Bourdieu destaca, a ação de estruturas cognitivas incorporada pelos agentes, onde estes por sua vez, produzem e reproduzem as estruturas em sua cotidianidade. Se o agente possui uma compreensão imediata do mundo familiar, isso ocorre porque as estruturas cognitivas aplicadas por ele constituem o produto da incorporação das estruturas do mundo no qual ele age, e também porque os instrumentos de construção empregados para conhecer o mundo são construídos pelo mundo. (BOURDIEU, 2001, p. 166) Este corpo socializado, onde Bourdieu da ênfase no seu livro ―A dominação Masculina‖, caracterizado por uma aprendizagem da masculinidade e feminilidade dos corpos no andar, falar, comportar, dirigir o olhar etc.pode ser entendido como um bom exemplo na prática, das estruturas cognitivas e objetivas que se inscrevem no corpo, datado e situado pela experiência do social. Entendido a ação das estruturas cognitivas e sua incorporação pelos agentes, discutiremos a noção de habitus, cujo valor restitui ao agente, um poder gerador e unificador, construtor e classificador adquirido por uma realidade socialmente construída. A discussão do conceito de habitus proposta por Bourdieu, nos leva de inicio a descarta dois pressupostos, primeiro a de que sua ação constitui o efeito mecânico da coerção de causas externas e a segunda o finalismo, por conta de uma teoria da ação racional, a qual o agente atuaria de maneira livre e consciente. Convém ressaltar, que os agentes sociais são dotados de habitus, por toda uma herança transmitida pelas experiências passadas, o qual nos permite afirmar que o agente nunca é por inteiro o sujeito de suas práticas. Tais sistemas de esquemas de percepção, apreciação e ação ,permite tanto operar atos de conhecimento prático, fundados no mapeamento e no reconhecimento de estímulos condicionados e convencionados a que os agentes estão dispostos a reagir, como também engendrar, sem posição explicita de finalidades nem cálculos racional de meios, estratégias adaptadas e incessantemente renovadas, situadas porém nos limites das construções estruturais de que são o produto e que as definem. (BOURDIEU, 2001, p. 169) O hábitus é uma ordem social que se inscreve nos corpos, por meio de uma confrontação permanente sem distinção objetivante, no mundo e no futuro que se anuncia; ele engendra práticas que se ajustam a essa ordem; a relação entre o habitus e o mundo social (ou o campo), corresponde a coisas que não se pode fazer em certas situações e outras que não se pode deixar de fazer, remete 146 a um conjunto de ações entre si, ajustados aos interesses dos agentes afetados. Para Bourdieu, sendo o produto de uma história, o hábitus pode ser entendido como um arbitrário cultural, ou seja, um conhecimento prático que é constrangido pela estrutura objetiva da configuração de propriedades que o mundo apresenta, como também é estruturado pelo mundo por meio de esquemas de propriedades objetivas. Pode ser interpretado como uma dupla relação, estruturada e estruturante com o ambiente, a qual media os condicionamentos sociais exteriores e a subjetividade dos sujeitos; trata-se de um conceito que, embora visto como um sistema engendrado no passado e orientando para uma ação no presente, ainda é um sistema em constante reformulação. O hábitus proposto por Bourdieu, é uma releitura da noção grega de hexis, nasceu de Aristóteles para designar então características do corpo e da alam adquiridas em um processo de aprendizagem. Vale destacar que existe uma interdependência entre o conceito de hábitus e o campo, o habitus reifica o campo, no qual o campo se caracteriza por um espaço distinto de grupos sociais, na disputa pelo poder; sendo então a maior parte das ações dos agentes sociais produto de um encontro entre um habitus e um campo, as estratégias surgem como ações práticas, inspiradas pelos estímulos de uma determinada situação histórica. É na relação entre o habitus e o campo, entre o jogo e o sentido do jogo, que se engendram os móveis do jogo e que se constituem os objetivos jamais afirmados como tais, potencialidades objetivas as quais, embora não existam fora dessa relação, acabam por se impor, no interior dela, com uma necessidade e uma evidência absolutas. (BOURDIEU, 2001, p. 184) O habitus é um instrumento conceitual que auxilia a aprender uma certa homogeneidade nas disposições, gostos e preferências de grupos ou indivíduos, produtos de uma mesma trajetória social; não vem a ser uma estrutura rígida e sim, um sistema de disposição construído continuamente, aberto e constantemente sujeito a novas experiências. Como uma tatuagem no individuo ou corpo biológico socializado, o habitus se funda na relação dialética entre uma conjuntura e sistema de disposições individuais, em processo de interação constante com as estruturas. O conceito age tanto no coletivo quanto no individuo, desta forma, é que ele está em condições de intervir eficazmente no mundo social ou num campo, ao qual esteja genericamente ajustado; partindo então da noção habitus, visto mais como um senso prático do que um cálculo racional, cujo Bourdieu esclarece como condutas 147 inconscientes e ações automáticas, como seria possível pensar formas de resistência? De modo mais geral, o habitus tem seus fracassados, seus momentos críticos de desconcerto e de defasagem: a relação de adaptação imediata fica suspensa, num instante de hesitação em que pode se insinuar uma forma de reflexão que não tem nada a ver com a do pensador escolástico a qual, por intermédio dos movimentos esboçados do corpo, pemanece voltada para a prática e não para quem realiza. (BOURDIEU, 2001, p. 197) Bourdieu ainda destaca, que a aquisição dos automatismos do senso prático varia de acordo com a posição dos agentes no espaço social e seus domínios de atividade, já que, os agentes que ocupam um lugar de destaque no campo, tem pouco interesse em modificar as regras do jogo, no qual consequentemente se entregará mais facilmente as disposições do habitus. Isto já não ocorre com os desclassificados ou agentes que não ocupam uma posição favorável no campo, estes têm mais chance de tomarem consciência do jogo, pelo fato de se virem obrigados a assimilar as regras do jogo e ter que corrigir conscientemente, um habitus gerador de condutas pouco adaptada ou deslocada. Desta forma, a sociedade para a teoria de Pierre Bourdieu traduz um espaço de disputas simbólicas, o qual o ator social para se reafirma no campo social, faz necessário conhecer e aceitar as regras do jogo dentro do campo disposto a jogar. Portanto, a breve interpretação da teoria do habitus e campo do sociólogo Bourdieu, convida a ―pensar relacional‖, entender que a sociedade como uma maquinaria, atua na socialização das pessoas e também as pessoas são agentes na reprodução dos valores e regras do social. REFERÊNCIAS BOURDIEU, Pierre. Meditações Pascalianas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. _______. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007. ELIAS, Nobert. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Zahar, 1994. GIDDENS, Anthony. A constituição da sociedade. São Paulo: Martins Fontes, 2003. 148 5 A SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA E A NOVA GERAÇÃO DE IDOSOS Marilde Sievert Universidade Regional de Blumenau Heloísa Muller Universidade do Vale do Itajaí O novo mundo on-line dos idosos:Nas últimas décadas, verificase um crescimento acentuado da população de idosos, estimulado pelo aumento da expectativa de vida. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2000), no Brasil existem cerca de 14,5 milhões de pessoas com idade superior a 60 anos, o equivalente a 8,6% do contingente populacional do país. Trata-se de um público cada vez mais ativo e integrado às contemporâneas alternativas de comunicação. Estes dados incitam o interesse em desenvolver estudos que abordem a publicidade na Internet, direcionada a atender às expectativas do consumidor idoso. Parte-se da seguinte pergunta: Como a publicidade, mediada pela Internet, pode atingir a nova geração de idosos? Para respondê-la, importa identificar estratégias adequadas para atrair este público, notadamente aquelas relacionadas ao emprego de recursos audiovisuais e de interatividade, incluindo múltiplos aspectos como design, cor, formas, fontes e disposição destes elementos no layout de home-pages. Outro aspecto relevante é a inserção da publicidade, que deve ser feita de maneira natural, dentro de um contexto envolvente que a torne atrativa e não invasiva. Com base nestas premissas, busca-se desvendar os principais recursos para uma publicidade on-line eficaz, com a intenção de desenvolver um blog dirigido ao público-alvo formado pela nova geração de idosos. Tal propósito requer investigação sobre as dificuldades que este grupo enfrenta para navegar na Internet e as possibilidades de superá-las. Sabe-se que a Internet é uma estrada de informações que conduz o navegador por um caminho de milhões de computadores interligados. Segundo Castells (2006, p. 56), após a década de 1990, quando esta rede tornou-se acessível, a difusão mais rápida e abrangente de seus usos ocorreu sob o domínio dos negócios. Inserida no cotidiano de milhões de usuários em todo o mundo, a Internet está transformando o relacionamento entre fornecedores e compradores. O uso adequado desta ferramenta é considerado uma fonte decisiva de produtividade e competitividade para interações de todo o tipo. De acordo com Chleba (2000, p. 31), ela é um meio eficiente para atingir um público em massa, mas o 149 consumidor prefere a exclusividade, requerendo, portanto, um atendimento personalizado. Segundo Bretzeke (2000, p. 61), a Internet está se consolidando numa mídia viável para a comunicação e relacionamentos, atingindo um público globalizado e altamente qualificado. A essência dos negócios pela Internet, de acordo com Castells (2006, p. 65), ―é a capacidade de interagir, recuperar e distribuir globalmente de maneira personalizada, que está na fonte da redução de custo da qualidade, eficiência e satisfação do comprador‖. A interação com o meio digital tornou-se imprescindível em diversas atividades cotidianas, como sacar dinheiro, votar em eleições e consultar benefícios. Portanto, advertem Raabe et al. (2005, p. 418), aqueles que não dominarem as novas ferramentas de comunicação perderão gradativamente a autonomia. Assim, é fundamental a realização de esforços para evitar a exclusão de pessoas com limitações de uso desta ferramenta de comunicação. Sobre esta questão, Raabe et al. (2005) comentam que o processo do ensino e da aprendizagem faz parte do autodesenvolvimento do indivíduo, porém, a sociedade, por vezes, exclui o idoso desta busca de aprimoramento, por considerá-lo erroneamente como incapaz, perdendo, desta maneira, a grande demanda de cidadãos representada pela nova geração de idosos que ainda têm disposição para aprender e ensinar. Neste contexto, merecem especial atenção as pessoas aposentadas, considerando que elas dispõem de um tempo livre que pode ser preenchido com navegação na Internet. Um dos métodos que contribui para melhorar a desenvoltura das pessoas na Internet é o design de interação que, conforme Preece at al. (2005), mobiliza esforços multiprofissionais. Em meados dos anos 90, muitas empresas perceberam que era necessário expandir novamente suas equipes multidisciplinares de design para que as mesmas incluíssem profissionais treinados em mídia e design, como design gráfico, industrial, produção de filmes e desenvolvimento de narrativas. Sociólogos, antropólogos e dramaturgos foram incorporados ao quadro das equipes, todos com uma atitude diferente dos psicólogos quanto à interação humana. Esse conjunto de pessoas promoveria a combinação certa de habilidades com a compreensão das diferentes áreas de aplicação necessárias para projetar a nova geração de sistemas interativos (PREECE ET AL., 2005, p. 30). Constata-se, então, a necessidade que se tem de estudar a linguagem do público que deseja atingir para obter sucesso na implementação de suas estratégias. Por exemplo, desenvolver um guia interativo para visitantes de uma galeria de arte requer que se 150 avalie como as pessoas agem e se movimentam em espaços públicos. Além do design de interação, as formas e cores que mais atraem o público idoso devem ser levadas em consideração, assim como limitações visuais que possam atrapalhar a navegação pela Internet. Abordando estas dificuldades e o perfil do público, Farina (1990) analisa a preferência manifestada por determinada cor. Ele indica como mais relevantes o lilás, na faixa entre 50 e 60 anos, e o roxo, preferido pelas pessoas com mais de 60 anos – idade relacionada ao saber, à experiência e à benevolência. Portanto, seria interessante usar estas tonalidades em sites e na comunicação virtual voltada a este público. À medida que o indivíduo envelhece, notam-se diferenças não somente no seu corpo, mas também na sua mente e na vivência. Estudo desenvolvido por Raabe et al. (2005) aponta que grande parte dos idosos apresenta dificuldades de manuseio do teclado e do mouse. Além da limitação física, importa também considerar a forma com que os idosos se relacionam com a tecnologia, visto que são comuns os episódios em que a sensação de incapacidade provoca perda da auto-estima. Ao analisarem esta questão, Raabe et al. (2005, p. 420) salientam que ―a pessoa com auto-estima baixa, em geral, não se lança à exploração do meio, tem pouca imaginação, é conformista, evita auto-análise e costuma se auto-anular com freqüência, adotando uma atitude passiva que dificulta a IHC‖ (interação homemcomputador). Com base nos argumentos até aqui reunidos, infere-se que, para atender as necessidades específicas deste público, tendo em vista o aumento da expectativa de vida da população, é preciso promover a conscientização do profissional de comunicação sobre os cuidados na escolha dos recursos a serem aplicados nas páginas da Internet. Tais constatações justificam trabalhos, como o relatado neste artigo, que se ocupam de analisar o tema e desenvolver produtos direcionados à nova geração de idosos. Para fundamentar este estudo, foi realizada pesquisa bibliográfica que, segundo Marconi e Lakatos (1996), tem o objetivo de colocar o pesquisador em contato direto com tudo o que foi escrito, dito ou filmado sobre determinado assunto. Empregou-se o método de abordagem indutivo e a técnica de pesquisa com documentação indireta. A partir dos pressupostos científicos reunidos na fundamentação teórica, foi desenvolvido um blog dirigido ao público idoso, com aplicação dos recursos estudados e que visam a atender as necessidades e expectativas deste grupo de internautas. O blog contém facilitadores visuais e auditivos, conteúdos interativos de interesse deste público e alternativas para estabelecer relacionamento com outros visitantes. 151 Cabe salientar que a escolha de um blog, e não de um site convencional, foi orientada por dois aspectos: a interatividade que esta página oferece e a praticidade para nela inserir conteúdos de maneira informal. A terminologia ―nova geração de idosos‖ se refere aos indivíduos de idade superior a 60 anos que navegam na Internet e tem como sinônimos ―terceira idade‖ e ―idade da maturidade‖. Comunicação na Internet: A publicidade, segundo Farina (1990), adapta-se ao estilo de vida e reflete no comportamento humano. As restrições na transmissão de determinadas imagens se devem a uma das características relevantes da publicidade, que é a de não salientar os aspectos negativos da sociedade. Nesta perspectiva, a publicidade pode ser considerada ilusória, por retratar apenas pontos positivos como alegria e satisfação. Os profissionais da área trabalham no sentido de continuamente estimular o consumidor a satisfazer ―necessidades artificiais, como compensação de desejos insatisfeitos, informá-lo pela motivação da existência de bons produtos e serviços merecedores de sua aquisição‖ (FARINA, 1990, p. 170). Na opinião de Pinho (2000), a publicidade tem importância fundamental no processo econômico exatamente por estimular a demanda de um produto, permitindo que as empresas expandam a sua atividade e conquistem mais consumidores. O autor destaca que ela é a mais popular ferramenta do marketing e pode ser entendida como qualquer forma remunerada de apresentar ou promover produtos, serviços e marcas nos meios de comunicação como rádio, televisão, cinema revista e outdoor. Em síntese, a publicidade informa, convence, anima, motiva atitudes e comportamentos, com objetivos de curto, médio e longo prazos, adotando métodos em constante evolução. Dentre os vários meios utilizados pelos profissionais de comunicação para conquistar o receptor, ganha ênfase a Internet e as novas oportunidades de interações que ela representa, ao permitir contato direto com a pessoa. A Web, a parte multimídia da Internet, apresenta, de acordo com Pinho (2000) numerosas vantagens em relação aos materiais veiculados em meios de comunicação tradicionais, pois nela pode ser explorada a convergência de meios. Daí a proliferação de empresas exclusivamente voltadas para esta mídia, as chamadas ―agências digitais‖. De acordo com levantamento feito pela consultoria Gartner e divulgado pelo jornal O Globo (2008), o total de computadores pessoais vendidos em 2007 foi de 271,1 milhões de unidades, representando uma alta de 13,4% em relação ao ano anterior no mercado mundial. A explicação para este fato, segundo os pesquisadores desta empresa, é que está cada vez mais fácil 152 comprar um computador, principalmente nos mercados emergentes, que representam cerca de 50% de negócios fechados em 2007. Pesquisa do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística – Ibope (2008) revela que 12,2 milhões de brasileiros visitaram sites de comércio virtual em dezembro de 2007, total que corresponde a 50% dos internautas residenciais ativos. Estes números são históricos, pois, pela primeira vez, desde setembro de 2000, a categoria de comércio eletrônico ultrapassa a barreira dos 12 milhões de visitantes únicos residenciais. A dinâmica do e-commerce mostra que a tecnologia, como afirma Pinho (2000), traz constante inovação na maneira com que a comunicação é usada e que a publicidade on-line se transformou em uma valiosa ferramenta de comunicação persuasiva, interativa e com possibilidade de ser dirigida de modo personalizado, valorizando cada indivíduo. A nova geração de idosos: Segundo Barros (1998), há um significativo aumento da população idosa, conjugado a um efetivo declínio da população jovem. De acordo com Rosa (2005), este aumento do número de idosos é conseqüência de um conjunto amplo de melhorias na vida do ser humano, incluindo alimentação, higiene e saneamento, acompanhadas da evolução da medicina, que permite prevenir, diagnosticar e curar. Neste contexto, configura-se uma nova visão sobre os idosos, que experimentam uma etapa de vida caracterizada como um tempo de oportunidade e reinvenção, ao invés do descanso. Em todo o mundo, mais pessoas querem que suas aposentadorias incluam períodos de trabalho, educação e lazer. Estudos citados por Rosa (2005) revelam que, em sete países, este é considerado o modelo ideal e que o Brasil apresenta a maior preferência por este estilo de vida, seguido de França e Japão. Isto, segundo o autor, é um importante indicativo de mudanças comportamentais entre os idosos. Estas transformações precisam ser analisadas, pois representam oportunidades. É preciso reconhecer que os jovens, os adultos e os mais velhos não cultivam os mesmos interesses. No entanto, muitas vezes acabam por consumir determinados produtos ou serviços, não por desejo, mas sim por falta de opção. A respeito desta questão, Blecher (2005) comenta que até os anos 1970, os idosos ainda não despertavam interesses como uma categoria diferenciada de consumo. Mas nos últimos vinte anos, o que vem se delineando de forma consistente é uma visão mais realista do idoso, de seu comportamento, hábitos, atitudes de compra, desejos e expectativas. Esta tendência, revelada nos anos 1990, proporciona, de acordo com Blecher (2005), um novo fôlego na busca cada vez mais 153 segmentada por novos nichos de consumo. Este fenômeno, nomeado pelo autor de ―revolução da longevidade‖, envolve previsões de um contingente cada vez maior de idosos em contraste com uma população jovem mais reduzida. As projeções mais conservadoras relatadas por Blecher (2005) apontam que em 2025 o Brasil terá por volta de 32 milhões de pessoas acima dos 65 anos, ou seja, 15% da população total do país. Para Barros (1998), este prognóstico estatístico é um contínuo desafio para pesquisadores e profissionais que atuam em mercados das mais diferentes áreas. Além do aumento significativo no número de pessoas idosas, o censo do IBGE (2000) sinaliza mudanças significantes nos rendimentos desta faixa etária, apontando um crescimento de 63% em dez anos. Na avaliação de Blecher (2005), estes valores podem ganhar uma dimensão muito mais ampla se posicionados num contexto de um país com enormes desigualdades sociais e econômicas. Blecher (2005) argumenta que não há consenso entre os pesquisadores sobre uma faixa etária para definir quem pertence a esta nova geração de idosos. O autor afirma que esta categorização serve para facilitar a aplicação das leis, porém, ainda hoje no Brasil, há confusões para determinar este público. A Constituição considera idosas as pessoas com idade superior a 60 anos. Já para a Política Nacional do Idoso, integram este grupo os brasileiros com mais de 65 anos, e no Código Civil, a idade aumenta para 70 anos. De acordo com Barros (1998), as etnografias mostram que em todas as sociedades é possível observar a presença de grades de idade, entretanto, elas são diferentes em cada cultura. A determinação de categorias e grupos de idade implica uma visão de mundo social que contribui para manter ou transformar as posições de cada um em espaços sociais específicos. Os critérios e normas de idade cronológica são, portanto, conforme Barros (1998), impostos nas sociedades, não por estas disporem de um aparato cultural que domina a reflexão sobre os estágios de maturidade, mas por exigência das leis que instituem os deveres e direitos do cidadão. Nesta perspectiva, Blecher (2005) assevera que os publicitários precisam tomar cuidado ao fazer campanhas voltadas para este público, porque os idosos geralmente se consideram espiritualmente mais jovens do que a sua idade cronológica possa indicar e podem se sentir ofendidos com a imagem retratada pela mídia do tradicional ―vovô e vovó‖ tomando um chá, por exemplo. Pode-se partir de várias perspectivas para estudar a linguagem dos idosos e Petri (1991) destaca três aspectos. O primeiro envolve uma questão cultural que se relaciona aos papéis desempenhados pelo idoso na sociedade em que vive. O segundo, de caráter social, 154 refere-se à postura da sociedade em relação aos idosos, e por último, a de caráter psicológico individual: uma pessoa é tão velha quanto imagina ser. Segundo Pretti (1991), existe uma margem de julgamento pessoal sobre o conceito de velhice, sendo que alguns idosos ainda se consideram jovens, ou seja, não assumem a condição reservada ao velho na sociedade, contrapondo-se a outros casos em que o indivíduo se considera velho precocemente. Em geral, a partir dos 80 anos é mais freqüente a conscientização da velhice. Ao tratar do tema, Barros (1998) ressalta que o idoso sofre por solidão, por sentir-se incapaz e por depender muitas vezes economicamente da sua família. Mas as noções de velhice e envelhecimento vêm se modificando e ganhando novos contornos; exemplo disto é a popularização do termo ―terceira idade‖. Este reconhecimento, segundo Barros (1998), faz com que o signo do envelhecimento seja invertido e assuma outras designações, como ―nova juventude‖ e ―idade do lazer‖, que são expressões que podem ser aproveitadas pela mídia. Da mesma forma, transforma-se a imagem da aposentadoria, que deixa de ser um momento de descanso e recolhimento para tornarse um período de atividade, lazer, realização pessoal. Portanto, assevera Barros (1998), não se trata apenas de resolver os problemas econômicos dos idosos, mas de proporcionar cuidados psicológicos e culturais, oferecendo um espaço para integrar socialmente uma população antes tida como marginalizada. Considera-se que os idosos dependem da ajuda dos jovens para lidar com a tecnologia e a comunicação digital e, por causa disto, adverte Widemann (2008), o mercado publicitário perde a oportunidade de prover serviços para pessoas idosas que poderiam se beneficiar da tecnologia. Os pessimistas poderiam dizer que esse mercado vai acabar, porque eles um dia se vão. Mas quando isso chegar (e olha que teríamos de qualquer jeito 20 anos de mercado para explorar, contando com as pessoas que estão com 60 anos hoje), já teríamos integrado três gerações, e provido serviços para milhões de pessoas, gerando empregos, desenvolvendo software, etc. Sem contar que as tecnologias sempre se desenvolvem e, daqui a 30 anos, podemos ser nós mesmos os estrangeiros digitais! (WIDEMANN, 2008, p. 67). Assim, os profissionais da área de comunicação precisam ficar atentos para desenvolver recursos e inserir os idosos neste universo digital. Fazer com que a tecnologia ande a favor do social sem desperdiçar os receptores valiosos, como os idosos, é uma atitude inteligente. No ―Mídia Dados 2007‖, um painel de informações e análises sobre a mídia brasileira, o Grupo de Mídia São Paulo (2007) revela que a 155 Internet atinge 18% do público com idade superior a 50 anos e que este grupo corresponde a 9% da população de internautas brasileiros. O número de idosos conectados à rede se mantém estável desde 2006, mas há estimativa de crescimento para os próximos anos, a partir do ingresso de usuários que formarão a nova geração de idosos. Internet para o público idoso: Nunes (1999) descreve o envelhecimento como o conjunto de fenômenos físicos muitas vezes associados a limitações e fragilidades, com maior prevalência de artrose, osteoporose, perda de audição, perda de visão, doenças cardíacas e diminuição da memória imediata. Tais limitações precisam ser consideradas ao se elaborar ações publicitárias na Internet, voltadas para internautas da nova geração de idosos. Além de disponibilizar recursos para facilitar a navegação no universo virtual, os sites também podem oferecer informações sobre como amenizar as doenças que atingem com mais freqüência o idoso, como a artrose que, segundo Keiserman (2008a), é a doença degenerativa com maior freqüência entre público idoso. As dificuldades que esta doença acarreta nas articulações podem ser tomadas como um empecilho ao usuário da Internet. A doença torna-se evidente a partir dos 30 anos de idade. Segundo Keiserman (2008a), estima-se que 35% das pessoas já tenham artrose nesta idade em alguma articulação, sendo a grande maioria sem sintomas. Aos 50 anos aumenta a prevalência e a partir dos 70 anos, 85% dos indivíduos terão esta alteração na cartilagem. Keiserman (2008a) observa que localização da artrose que mais limita o manuseio do computador pelos idosos – notadamente as mulheres – é nos dedos das mãos, em muitos casos atingindo a articulação abaixo do polegar. Há casos de deslocamento do polegar para a região palmar que causa dor forte ao segurar os objetos. O recurso adequado para diminuir o desconforto do portador desta doença ao navegar pela Internet seria a redução na quantidade de cliques. Deste modo, o idoso não forçaria tão intensamente suas articulações nas mãos. Neste sentido, Ávila (2008) recomenda que o programador deve facilitar ao máximo o acesso do internauta às informações dentro do site, a começar pela visibilidade dos principais assuntos com um breve resumo na página inicial, linkando as palavras-chaves ao endereço no qual se encontra o assunto abordado. Como procedimento auxiliar, Ávila (2008) sugere a inserção de um mapa/resumo da estrutura do site, quando houver conteúdos diversificados na página e a quantidade de seções for muito grande. O mapa do site deve ser desenvolvido de maneira simples e objetiva, cooperando para o entendimento imediato de como estão dispostas as informações. 156 Outro fator que dificulta a navegação do idoso na Internet – e também uma das mais importantes doenças associadas ao envelhecimento – é a osteoporose, definida por Keiserman (2008b) como a patologia que provoca a diminuição da quantidade de osso e a desestruturação da sua micro-arquitetura, levando a um estado de fragilidade que pode resultar em fraturas após traumas mínimos. Não foram identificados, nesta pesquisa, recursos para amenizar o desconforto do idoso na navegação da Internet em relação a esta doença, mas é coerente sugerir inserções, nos sites, de dicas de saúde e textos de médicos discorrendo sobre esta e outras doenças que afetam os idosos. Dentre os problemas que causam sofrimento aos idosos, a perda de audição é o que menos dificulta a navegação na Internet; pelo contrário, muitas vezes ela pode conduzir à preferência deste meio, já que ele não exige grande capacidade auditiva. Audição fraca e surdez podem prejudicar o recebimento de sons como alarmes (bips) que avisam sobre algum problema na página. Isto pode ser resolvido com ―piscas‖ nas janelas da Internet que chamam a atenção do idoso para algum problema presente na página em que ele está navegando. Admite-se, neste caso, a possibilidade de inserir publicidade de aparelhos para surdez e implante coclear que podem, segundo Pretti (1991), ser úteis no tratamento de problemas de audição leves a profundos. Já a perda da acuidade visual é bem mais problemática. De acordo com Farina (1990), à medida que o indivíduo envelhece, o cristalino do olho vai perdendo a elasticidade e se torna relativamente sólido, o que reduz sua capacidade de retomar progressivamente a forma esférica e o poder de acomodação de luz. Quando esta capacidade se torna praticamente nula, geralmente entre os 45 e os 50 anos de idade, diz-se que o indivíduo está sofrendo de presbitia, ou seja, dificuldade de visão a distâncias inferiores a 30 centímetros. A dificuldade de visão é um dos maiores empecilhos para a interatividade na navegação, mas há soluções para este caso. Queiroz (2008) enfatiza que o acesso de uma pessoa portadora de deficiência visual acentuada ou total às páginas da Internet é proporcionado por softwares conhecidos como "ledores de tela" (screanreaders) associados a outros, denominados sintetizadores de voz. Ao elaborar um site para o público idoso, é necessário também levar em conta que este público pode ter dificuldade de concentração e acabar ―se perdendo‖ na página. De acordo com Pretti (1991), esta debilidade é notada principalmente após os 80 anos e verificada freqüentemente no diálogo de um idoso. 157 Portanto, importa ponderar que o envelhecimento interfere no relacionamento social pela linguagem, porque, como coloca Pretti (1991), costuma envolver dificuldades na organização de tópicos e na continuidade dos discursos. Tal situação exige, do interlocutor, um maior grau de atenção para perceber as relações tópicas da conversação com um idoso. Estudos realizados por Pretti (1991) indicam que o idoso, principalmente acima dos 80 anos, utiliza estratégias para compensar problemas de fluência no discurso, como repetição e autocorreções. Estes mecanismos permitem sustentar a continuidade da conversação. Outro aspecto observado consiste na abordagem rememorativa no discurso do idoso, que recorre à memória para lembrar de pessoas, lugares e outras informações cujos referentes, não raro, estão comprometidos com o tempo passado e, portanto, são desconhecidos da audiência mais jovem. Segundo Pretti (1991), parece uma tendência natural do homem, por ocasião de seu envelhecimento, agarrar-se a valores do passado para marcar sua posição em um tempo presente, no qual se sente marginalizado. Na luta para encontrar uma posição social, o idoso, na maioria dos casos, acaba por acomodar-se aos padrões sociais impostos pelos mais jovens. Mas isto não significa diminuição das práticas comunicativas; muito pelo contrário, quando há oportunidade de interagir naturalmente com outras pessoas, o idoso tende a falar muito. As dificuldades de concentração que o idoso encontra em um diálogo podem refletir no uso da Internet, desmotivando a navegação. Para amenizar este transtorno, Ávila (2008) recomenda simplificar o texto, incorporando-o ao layout da página, e reter a atenção do internauta. Um recurso sugerido para alcançar este objetivo é a divisão do texto por assuntos, associada à criação de colunas e de boxes de cores diferentes para destacar determinadas informações. Outra recomendação de Ávila (2008) consiste em explorar o recurso de ilustrações para facilitar a navegação, já que o uso adequado de imagens confere maior nitidez referencial ao site e favorece o desempenho do idoso. O blog como ferramenta: A Internet revolucionou o relacionamento entre pessoas e empresas. Inúmeras maneiras de relacionamentos virtuais surgiram desde os primeiros anos existência da rede. Uma das grandes revoluções do final do século XX foi o e-mail, cujo papel na sociedade, segundo Persona (2005, p. 56), ―foi de um impacto que só não podemos aliviar em sua totalidade por estarmos habituados a ele‖. Outra inovação referida por Persona (2005) é o blog, que consiste num histórico ou diário publicado na Internet, com ênfase em algum assunto organizado cronologicamente. ―Na verdade, o blog é simplesmente uma página de internet muito fácil de implementar e 158 colocar no ar. Alia-se a isso o fator de que possui uma interface agradável e simples de usar, o que abre as portas para qualquer pessoa que não saiba os segredos da programação web‖ (CIPRIANI, 2006, p. 28). Esta ferramenta se popularizou inicialmente entre os jovens. Na avaliação de Cipriani (2006), o blog foi e continua sendo muito usado por adolescentes como um diário virtual, no qual eles podem expor momentos de sua vida para se auto-afirmarem ou simplesmente trocar experiência, utilizando-o também como passatempo. Mais recentemente, o blog passou a ser usado como uma séria e importante ferramenta de comunicação de profissionais e organizações, capaz de mediar a realização de pesquisas, a exposição de críticas e principalmente o marketing das empresas. Cipriani (2006) define o blog como um catalisador de notícias da Internet, considerando-o um canal de marketing semelhante ao ―boca-a-boca‖, pois ambos divulgam produtos ou serviços espontaneamente e com rapidez. Em outras palavras, os blogs corporativos podem aproximar as empresas do cliente, já que eles estabelecem comunicação bidirecional instantânea e imprimem velocidade às interações. Ao abordar esta questão, Cipriani (2006) assevera que uma visão focada no cliente é componente obrigatório na estrutura organizacional de empresas que desejam se tornar bem-sucedidas e, neste contexto, ganha ênfase a introdução de blogs de negócios voltados para uma potencial clientela composta por idosos. Cabe salientar que o blog tem grande valor agregado, notadamente no que se refere às seguintes características listadas por Cipriani (2006): favorece uma leitura agradável e cronológica; é fácil desenvolvê-lo e mantê-lo; tem baixos custos; a sua navegação é intuitiva e simples; oferece espaço para comentários dos visitantes; disponibiliza a troca de links; é personalizado; faz parte de um nicho especializado; demonstra o conhecimento da empresa; permite a criação de uma comunidade. Estes itens colocam o blog em posição de vantagem em relação aos meios de comunicação tradicionais, principalmente em se tratando de interatividade e maior familiaridade do público com a empresa. Os referenciais aqui reunidos corroboram a ideia, defendida neste estudo, de que o blog constitui suporte eficiente para a comunicação na Internet voltada aos idosos, porque abre espaço para compreender as necessidades deste público e alinhar pontos de contato com ele, proporcionando uma experiência interativa agradável tanto para os internautas quanto para os anunciantes. Interessa ainda observar que o blog pode ser aplicado na gestão de relacionamento com clientes a partir de uma proposta educativa, 159 desenvolvida com o objetivo de ensinar os internautas a usar determinado serviço ou produto que a empresa oferece. A facilidade de operacionalização, a rapidez na comunicação e os custos relativamente baixos são atributos que dinamizam a utilização de blogs, sem, contudo, garantir aumento no número de leitores. Cipriani (2006, p. 56) confirma esta constatação ao afirmar que ―o uso de blogs está em contínuo crescimento, mas o número de leitores não acompanha esse ritmo. Esta situação mudará com o tempo assim como o uso de comércio eletrônico está mudando atualmente, alcançando níveis de venda e uso cada vez maiores‖. O autor acrescenta que a idéia de desenvolver um blog não implica substituir as ferramentas já existentes de suporte ao consumidor, mas sim atuar paralelamente para fazer transitar informações importantes. No entanto, se a empresa não possui um canal de suporte, o blog pode cumprir perfeitamente esta função. Como exemplos de blogs usados como suporte de grandes empresas para a divulgação de notícias, podem ser citados os da Folha de São Paulo (www1.folha.uol.com.br/folha/blogs) e do jornal O Globo (http://oglobo.globo.com/online/blogs), o Noblat do jornal O Estado de S. Paulo (http://noblat1.estadao.com.br/noblat), Bastidor da Editora Abril (http://www.abril.com.br/blog) e o blog do Programa Pânico, da Rede Jovem Pan (http://www.jovempanfm.com.br/blog). O sucesso destes blogs, segundo Cipriani (2006), deve-se ao fato de que, apesar de serem escritos profissionalmente, mantêm uma característica informalidade e o público se identifica com essa nova modalidade de divulgação. Recursos utilizados no blog para a nova geração de idosos: As informações levantadas nesta pesquisa foram aplicadas na construção de uma proposta de blog capaz de tornar a publicidade na internet eficaz no relacionamento com o público idoso. Ele representa um portal de propaganda com capacidade para comportar um número significativo de inserções publicitárias. Cumpre informar que são vários os endereços eletrônicos que trabalham com serviços de hospedagem de blogs, mas nenhum deles oferece suporte para inserir recursos que facilitem a navegação pelo público idoso. Portanto, o blog desenvolvido como resultado do estudo aqui relatado representa um novo serviço de hospedagem de blogs. Os recursos utilizados seguem as recomendações e sugestões dos autores consultados e citados neste relatório e são enumerados para facilitar a localização e o entendimento de cada item. O perfil de público que este blog visa enaltecer é o do idoso moderno e arrojado, que pratica esporte (como mostrado no item 4), cuida da saúde e da alimentação, tem anseios e deseja se relacionar com outras pessoas (ver imagem no item 10). Além de 160 atingir a nova geração de idosos, pretende-se atrair aqueles mais retraídos e sedentários, fomentando neles o interesse em experimentar uma nova maneira de ver e viver a ―melhor idade‖. Para amenizar o desconforto causado por dificuldades visuais, aplicam-se dois recursos: um deles consiste no aumento o tamanho da letra quando se passa o mouse sobre os textos e o outro é uma ferramenta de som (item 6) para que o idoso possa escutar ao invés de ler o texto. Também se privilegia um espaço para relacionamento (item 5). Este link visa oferecer ao idoso a possibilidade de trocar informações com outros visitantes do blog, fazer amizades e até mesmo manter encontros amorosos no ambiente virtual. Neste aspecto, procura-se reverter um possível estado de solidão do idoso e reaproximá-lo do convívio social. O espaço para relacionamentos constitui um dos principais recursos para atrair o idoso ao blog, aproveitando para expor produtos e serviços de empresas patrocinadoras. Para obter sucesso nesta estratégia, a página estimula o internauta a criar o seu próprio blog. Ao clicar o link ―E aí, vovô. Vamos navegar?‖ (item 2), o idoso visualiza um manual com orientações para a criação do seu blog. Após criado o blog pessoal, sugere-se que, toda vez que o idoso efetuar o login, apareça a expressão ―Bem-vindo‖, seguida do nome do usuário, como mostrado no item 1 da figura do blog (―Bem-vindo, João‖). Esta estratégia se sustenta na premissa de que a publicidade on-line pode ser personalizada, de forma a valorizar cada indivíduo. Além de possibilitar a visualização de outros blogs, no link de relacionamento, propõe-se divulgar sites de empresas patrocinadoras (item 12), voltados para as áreas de saúde, esporte, cultura, viagens e outros temas de interesse do público idoso. O link ―agenda de eventos‘ (item 11) oferece informações atualizadas sobre festas organizadas e freqüentadas pelos idosos, como os famosos ―encontros da terceira idade‖. É mais uma forma de incentivar o interesse em relacionar-se. Para dar cor ao blog foram escolhidas tonalidades de roxo e lilás, por serem elas as preferidas do público. No link ―opções‖ (item 9), o internauta pode mudar as cores e as imagens, selecionando, por exemplo, a versão feminina. Vale mencionar que o recurso de mudança de cor é usado pelo site Yahoo, para tornar a página agradável para os mais diversos perfis de clientes. Também importante é a abertura para críticas e comentários no link ―comente aqui‖ (item 7). A respeito dos principais links do blog (item 3), os botões são grandes para facilitar a visualização. O link ―início‖ remete ao texto de apresentação (item 8) que sintetiza as principias informações 161 contidas no blog – estas linkadas às páginas correspondentes –, de forma a poupar cliques e não cansar o internauta. Sugere-se inserir, no link ―saúde‖, matérias de profissionais da área, que podem divulgar serviços e produtos relacionados às doenças mais freqüentes em idosos, a exemplo de aparelhos auditivos e tratamentos para artrose. Para o link ―dicas‖, propõe-se a inserção de assuntos variados, como opções de viagens, eventos, livros, tecnologia e teatro. Neste aspecto, está previsto o patrocínio de agências de viagens e turismo, hotéis, livrarias, promotores de cursos e de eventos, dentre outras empresas que atuam em setores afins. Já o link ―mapa‖ foi formulado com base em recomendações técnico-científicas que enfatizam a necessidade de facilitar ao idoso a busca por assuntos desejados. Considerações finais: Estamos cientes da importância que o público idoso representa na economia; no entanto, nota-se que a maioria dos produtos criados especificamente para esta população desconsidera a complexidade da comunicação envolvida. São necessários estudos sobre os consumidores que compõem a nova geração de idosos, com ênfase em fatores psicológicos, físicos, sociais e culturais. O público ―da terceira idade‖ não se identifica mais com a imagem tradicional de um idoso utilizando determinado produto. A publicidade deve ir além, explorar inovações, provocar impactos, causar entusiasmo. Os profissionais da área de comunicação precisam estar atentos principalmente para duas tendências distintas: ou o idoso se imagina mais jovem do que realmente é ou se reconhece num processo mais avançado de envelhecimento que envolve fragilidades e limitações. Cabe salientar que o problema que mais inibe o idoso em relação ao hábito de navegar pela Internet é a dificuldade de visão. Mas a tecnologia já encontrou soluções, representadas por recursos sonoros que possibilitam suplantar este transtorno. Outros aspectos a serem considerados se relacionam o sentimento de incapacidade e a solidão referida pelos idosos. Para estes casos, a solução pode estar na possibilidade de relacionamento com outros internautas e no acesso a informações que estimulem uma visão otimista da vida e do processo de envelhecimento. Importa, então, adotar estratégias que favoreçam a interação entre indivíduos e destes com a tecnologia, de forma a socializar ainda mais o uso da Internet num cosmo pautado por constantes avanços nas áreas de comunicação e informática. Evidencia-se a importância do uso de recursos audiovisuais e de interatividade adequados ao público idoso e colocados num contexto envolvente, atrativo, não invasivo. Inclui-se aqui a preocupação com o design de páginas, com a linguagem de textos e imagens e com as formas de inserção da propaganda. 162 Os estudos realizados apontam o blog como a ferramenta que mais agrega valores e recursos necessários para uma boa desenvoltura do idoso na internet, oportunizando a interação de uma maneira natural com o público. Em resposta à pergunta: ―Como a comunicação, mediada pela Internet, pode atingir a nova geração de idosos?‖, os resultados da pesquisa aqui relatados sinalizam que a comunicação, nesta direção, deve aplicar recursos diferenciados para atrair a atenção desta clientela e, ao mesmo tempo, facilitar a navegação pela rede mundial de computadores, num exercício de inserção e cidadania. REFERÊNCIAS ÁVILA, BRUNO de Araújo. Acessibilidade. Disponível em: http://www.brunoavila.com.br/blog. Acesso em 12 abr. 2008. BRETZEKE, Miriam. Marketing de relacionamento de competição em tempo real. São Paulo: Atlas, 2000. BLECHER, Maria Augusta. Velho, esse desconhecido. Revista da ESPM, maio/jun. 2005, p. 36-48. CASTELLS, Manuel. A galáxia da Internet. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006. CHLEBA, Márcio. Marketing digital. 3. ed. São Paulo: Futura, 2000. CIPRIANI, Fábio. Blog corporativo. São Paulo: Novatec, 2006. FARINA, Modesto. Psicodinâmica das cores em comunicação. 2. ed. 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Estas vivências são formadoras de modos de ser, definindo-nos peculiarmente, e tomamos tais modos em certo ponto como imutáveis, ou seja, cremos que a partir de um dado momento das nossas vidas nossos caracteres se tornam firmes o suficiente para denotarmos como uma identidade fundamentada. Mas, será mesmo que nossas identidades são firmes o suficiente para não serem afetadas pelas dinâmicas cotidianas das quais nos encontramos? Em busca de novas maneiras de viver, de pensar e experimentar a realidade os sujeitos acabam por inventar maneiras de se conceber o corpo e a idéia de si enquanto ser. Tomemos como pano de fundo para ilustração de tais idéias uma das práticas mais antigas da vivência humana no que diz respeito ao corpo: a tatuagem. Veremos sua história até desaguarmos nos dias atuais desta prática, que é uma forma de circunscrever um algo (identidade?) específico, ou pelo menos, faz com que se pense se a identidade é algo tão ―eterno‖ como uma tatuagem, impressa na pele/ alma das pessoas. Uma história tatuada na memória: A tatuagem é uma das formas mais conhecidas de modificação corporal, juntamente com a perfuração de partes do corpo denominada piercings. A tatuagem se trata da inserção de tinta sob a pele com o auxilio de uma agulha, que é friccionada sobre ela até a introdução da tinta sob a mesma. Não se conhece uma época específica em que a tatuagem tenha surgido, nem a razão pela qual começou-se a utilizá-la. Algumas hipóteses apontam que desde a pré-história marcas corporais adquiridas em lutas e caças eram utilizadas como sinais de coragem, e estas marcas foram motivos para diferenciação de status. A múmia mais antiga já encontrada no mundo, que ficou conhecida por vários pseudônimos como Iceman, Glacierman ou Ötzi, foi descoberta congelada em 1991 na região da Itália, e possui uma data aproximada de 5.300 anos antes de Cristo. Foram encontradas tatuagens ao longo de sua espinha dorsal e em outros lugares do corpo, além de uma cruz em uma de suas coxas e vários desenhos tribais por toda a perna, contabilizando um total de 57 tatuagens. Descobertas arqueológicas revelam que no antigo Egito já havia o uso tatuagem, principalmente por sacerdotisas e princesas, que segundo especialistas eram utilizadas de maneira simbólica em rituais de fertilidade, proteção durante a gravidez etc. Em geral estas tatuagens eram encontradas nas regiões do abdômen das múmias. A tatuagem em mulheres egípcias era tida como uma 165 maneira utilizada por eles no passado de embelezamento, e visava realçar o encanto relativo ao sexo feminino. Vários outros povos ao longo da história também tiveram a tatuagem envolvida nas suas vidas, como os povos orientais. Na China por exemplo, as tatuagens eram vistas como amuletos de proteção contra inimigos espirituais, desta forma eles tatuavam labirintos tortuosos no corpo para confundi-los. Já no Japão feudal a tatuagem era uma forma de punição encarada muitas vezes pior do que a morte, símbolo de criminalidade. Na era Tokugawa, marcada por intensa repressão da parte do governo, a criminalidade se tornou sinônimo de resistência, força, e neste cenário surgi a Yakuza, máfia japonesa, onde os integrantes deste grupo tinham o corpo completamente marcado como sinal de sacrifício e lealdade à organização, tendo como significação a oposição ao regime vigente. Em escritos antigos de Heródoto há citações de um povo bastante antigo do norte da Europa que possuíam o costume de imprimir desenhos em definitivo em seus corpos, esse povo era denominado de Pictus. Este povo acreditava que as tatuagens lhe davam força, e que os desenhos ficavam impressos no espírito fazendo-se assim com que após a sua morte seus antepassados pudessem os identificar. Os guerreiros obtinham tatuagens após realizarem atos que demonstrassem bravura. As linhas utilizadas nos desenhos eram entrelaçados complexos, que serviam, segundo seu povo, para distrair os inimigos, além de representarem a interconexão com todas as coisas sobre a Terra. A partir de uma expedição realizada pelo capitão James Cook ao Taiti e a costa da Nova Zelândia que começou a descrição da técnica utilizada no processo de tatuagem. Os passos eram anotados de forma detalhada no diário de bordo do capitão, talvez podendo ser considerado como uma etnografia da tatuagem. Os relatos contidos descreviam a técnica utilizada pelas tribos dos determinados locais e se constituía a partir de vários elementos semelhantes como alguns instrumentos utilizados, dentre eles um fragmento de osso bastante afiado preso a uma estaca de madeira, tinta extraída de vegetais (sementes, raízes etc.), e algum objeto que era utilizado como uma espécie de martelo (pedras, pedaços de madeira etc.). A ponta de osso era molhada com a tinta e então pressionada contra a pele, em seguida começava-se a bater na estaca com o outro objeto. Esta tribo utilizava tatuagens como ritos para diversas ocasiões assim como também para diferenciação de status dentro da tribo, assegurando através de determinados símbolos o papel exercido por alguns de seus integrantes. O nome tatuagem é uma onomatopéia utilizada pelo capitão Cook para o som que era produzido quando se estava tatuando alguém, um som parecido com tatau onde o capitão substituiu por tattow, 166 que depois de um certo tempo foi substituída pela palavra em inglês tattoo. Com a disseminação da técnica, várias pessoas passaram a se tatuar nas áreas portuárias da Europa pois, eram os locais mais freqüentados por marinheiros que por sua vez, eram os indivíduos que usualmente se tatuavam. Outros freqüentadores das áreas portuárias como prostitutas, ex-presidiários e ladrões também começaram a utilizar tatuagens em seus corpos. A tatuagem chegou a sua maior difusão em meados da década de 1920, se tornando comercializável, se popularizou principalmente nos Estados Unidos e na Europa. A partir de então, surgiu uma gama considerável de tatuadores com habilidades artísticas ambiciosas. Nos anos seguintes, mais especificamente nas décadas de 1950 e 1960, a tatuagem se popularizou mais ainda nos Estados Unidos, porém, era vista como sinal das classes sócio-econômicas mais desfavorecidas, dos militares e marinheiros, das prostitutas e dos criminosos. A tatuagem chegou ao Brasil em Junho de 1959 por intermédio do dinamarquês "Knud Harld Likke Gregersen", que logo ficou conhecido pelo apelido de ―Lucky Tattoo‖, pois dizia que as tatuagens feitas por ele davam sorte a quem as carregassem em seus corpos. Esta figura ficou bastante conhecida na época, e em pouco mais de seis meses já era notícia de jornais. O Desejo (Subjetividade): Ao falarmos de tatuagem nos remetemos diretamente ao corpo, porém, primeiramente temos que ter consciência de que corpo falamos, para não correr o risco de cairmos na ambigüidade semântica que esta palavra nos provoca. ―Nunca se viu um corpo: o quê se vê são homens e mulheres. Não se vê corpos‖ (LE BRETON, 2006). O corpo em si é um grande aglomerado biológico, que exerce suas funções vitais, porém, quando falamos de homens e mulheres temos algo para além dos fatores biológicos, e com essas palavras construímos de inicio uma outra visão, não vemos apenas o corpo desfalecido cercado em si próprio, mas agora temos a idéia de que existe uma subjetividade em jogo, peculiaridades, maneiras únicas de se ver e conceber o mundo. A subjetivação é entendida como um processo pelo qual todas as pessoas passam, onde elas interpretam e tomam uma posição diante dos fatores da realidade que ocorrem cotidianamente. Esta subjetividade, ou melhor, interpretação da realidade culmina em um ponto maior: a identidade. Esta palavra denota um entendimento de algo circunscrito, talvez mesmo acabado, formando a maneira de agir do ser. Todo este processo se dá no entrelaçar de acontecimentos do diaa-dia. Assim dito, nossas vivências são um ―entrelaçar‖, um constante jogo de laços que são feitos e desfeitos, mas não 167 entendamos esses laços como relações estabelecidas entre indivíduos, mas sim como a vida sendo o próprio fio, que é dobrado, desdobrado e redobrado para se ter, enfim, o laço. Com esta idéia nas nossas cabeças podemos observar que não se tem uma coisa firme, estática, como se costuma pensar. Se a vida é o fio que forma o laço, que por sua vez é feito, desfeito e refeito, como afirmar que nossas identidades são imutáveis? A idéia de modo de ser que temos põe em oposição às concepções de externo e interno na vivência do ser, separando-as de forma a uma não pertencer à outra, pensando-as como imutáveis, ou seja, tanto os fatores externos quanto os fatores internos de uma vivência não teriam nenhuma mudança significativa a ponto de ―interferir‖ uma na outra. Chega-se então a hora de atentarmos estas idéias, procurando mudar nosso olhar para poder enxergar com mais clareza algo tão turvo como a subjetivação. Temos que ter em mente de que existe uma constante relação entre o externo e o interno, onde ambos são vivos, moveis, e que não são opostos, mas sim mutuamente possíveis. Esta constante dinâmica existente se dá entre uma atração e repulsão continua, são indissociavelmente inconciliáveis. O interno (ou o dentro) é uma desintensificação das forças (uma dobra) do externo (ou o fora), que temporariamente cristaliza-se em um ―diagrama que ganha corpo numa figura com seu microcosmo‖ (RULNIK). O externo por sua vez é uma agitação constante de forças que acabam por desfazer a dobra, diluindo a figura da atual subjetividade até que outra dobra se perfile. ―O movimento de forças é o fora de todo e qualquer dentro, pois ele faz com que cada figura saia de si mesma e se torne outra. O fora é um ―sempre outro do dentro‖, seu devir‖ (RULNIK). Este lado de fora se faz ao sabor do acaso, lançando linhas de tempo. Cada linha de tempo lançada é uma dobra, que se concretiza, se especializando num território de existência, ou seja, seu dentro. Este fora é ilimitado, enquanto que o dentro sempre é limitado. Vemos que o constante entrelaçar do fio faz os lados de dentro e fora, tornando possível a subjetivação. Mas ―não há subjetividade sem uma cartografia cultural que lhe sirva de guia; e reciprocamente, não há cultura sem um certo mundo de subjetivação que funcione segundo seu perfil‖ (RULNIK). Marcas do Desejo: Vimos que o processo de subjetivação se dá em uma constante relação de atração e repulsa, e de que não existe uma separação dos universos esternos e internos. Devido a esta relação é possível nos colocar em posição perante o mundo, ou seja, de criamos nossa identidade. 168 Vimos também que a tatuagem é uma das práticas mais antigas que o homem conhece no que diz respeito ao corpo, logo, também esta ligado ao modo qual vemos o mundo e o interpretamos, sendo assim também ligado a identidade. A tatuagem é uma maneira de expressar um desejo latente, uma maneira de ―se ter‖. Nas palavras do antropólogo francês David Le Breton: O corpo tornou-se a prótese de um eu eternamente em busca de uma encarnação provisória para garantir um vestígio significativo de si. Inúmeras declinações de si pelo folhear diferencial do corpo, multiplicações de encenações para sobre-significar sua presença no mundo, tarefa impossível que exige tornar a trabalhar o corpo o tempo todo em um percurso sem fim para aderir a si, a uma identidade efêmera, mas essencial para si e para um momento do ambiente social (2003, p. 29). Poderíamos então, desta maneira, encarar a tatuagem como uma tentativa de cristalização de uma identidade escolhida, ou seja, uma tentativa de anestesiar o constante processo de subjetivação do qual se encontram circunscritos os indivíduos, fazendo assim com que sua atual condição lhe sirva de pedra motriz para uma concepção daquilo que ele acredita que venha a ser sua real e imutável identidade. O processo de subjetivação não é algo que seja dotado de um fim, desencadeando em uma identidade fixa. Isso pode até ser concebível ao senso comum, porém, devemos estar cientes de que a realidade e sua vivência são como um ―tecido vivo e móvel, feito de forças/ fluxos que compõem os meios que habitam a subjetividade: meio profissional, familiar, sexual etc.‖ (ROLNIK). Esta maneira de criação de identidade é uma das inúmeras existentes em todas as sociedades, uma maneira de ser notado, de fazer com que haja um sentimento de existência, mesmo que seja através de uma efêmera identidade impressa na pele. REFERÊNCIAS LE BRETON, David. Adeus ao corpo: Antropologia e sociedade. Campinas, SP: Papirus, 2003. LE BRETON, David. A sociologia do corpo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006. BERGER, Peter L.. A construção social da realidade: tratado de sociologia do conhecimento. Petrópolis, RJ: Vozes. 1985. DELEUZE, Gilles. As Dobras ou o lado de dentro do pensamento (subjetivação) In: Foucault/ Gilles Deleuze. Tradução Claudia Sant‘ Anna Martins. 1. Ed. São Paulo: Brasiliense, 1988. 169 ROLNIK, Suely. Uma insólita viagem à subjetividade fronteiras com a ética e a cultura. Dias, Thassio Martins O. Olhe em mim o eu: a tatuagem e sua subjetivação no cenário underground de Mossoró / Thassio Martins O. Dias. – Mossoró, RN, 2008 8-SUBJETIVAÇÃO E DOBRAS DE FORA: TRANSITANDO PELO “FOUCAULT” DE GILLES DELEUZE Jean Henrique Costa [email protected] (Observações: Trabalho não apresentado. Resumo Expandido não disponibilizado pelo autor para publicação). 9 - MICHEL FOUCAULT E A SOCIEDADE DE CONSUMO: NOTAS PARA GOVERNAMENTALIDADE LIBIDINAL Alyson Thiago Fernandes Freire Este trabalho se inscreve sob os riscos e as possibilidades de pensar o regime de práticas da cultura de consumo sob o viés de algumas ferramentas do aparato conceitual do filósofo francês, Michel Foucault. Trata-se de um trabalho ainda em andamento o qual visa explorar algumas possibilidades de reflexão e lances de interpretação acerca da chamada sociedade de consumo, que segundo uma gama de autores como Jean Baudrillard, Frederic Jameson e Zygumnt Bauman se instaura, mais enfaticamente na segunda metade do século XX até os dias que correm. O recorte na obra foucaultiana é realizado, sobretudo, a partir dos conceitos de biopoder e governo. Estes são os conceitos norteadores do presente trabalho. Isto significa abordar o campo do consumo enquanto um problema de governo das condutas de si e dos outros, o que implica não só uma discussão teórica desses conceitos no pensamento de Foucault, mas, principalmente, elaborar novas articulações tendo em mira a singularidade das políticas de subjetivação e das práticas sociais da cultura do consumo. Para tal tarefa, este trabalho procura abordar a cultura de consumo enquanto um modo de subjetivação singular, que, a partir de um conjunto de signos diferenciais (BAUDRILLARD, 1995) e suas técnicas de significação tornam os indivíduos sujeitos – na dupla acepção da palavra. O que, pelo mesmo gesto, coloca-nos diante de possibilidades tentadoras de pesquisa e de prementes questões teóricas relativas à produção contemporânea de subjetividades e suas modulações. As influências e desdobramentos dos trabalhos de Foucault podem ser observados e sentidos em um gama considerável de campos do 170 conhecimento; gênero e sexualidade, territorialidades, corpo e tecnologias da saúde e etc. Todavia, muito pouco se ver sobre a temática do consumo e as tecnologias, práticas e espaços a ele correlacionados. De alguma maneira como já foi exposto, este trabalho persegue incitar uma abertura desse domínio de pesquisas ao pensamento foucaultiano. Se assumirmos o diagnóstico de que as práticas de consumo assumem um importante e crescente papel nas sociedades contemporâneas a partir do pós-guerra. Ao ponto de, conforme nos diz Baudrillard (1995), ocuparem um lugar central no mundo do século XX, enquanto um modo ativo de relação mediado não só pelos objetos/bens e pelos signos, mas com a realidade mesma, o mundo da vida – Lebenswelt –, com o universo de expectativas e projetos dos indivíduos, enfim, como um modo de relação ativo com o mundo, uma atividade sistemática que serve como uma importante base à nossa experiência e nossa constituição. A penetração e a força dessa atividade estão intimamente ligadas aos dispositivos e saberes que participam da construção imagética do mundo, onde diversas tecnologias de poder cumprem um papel importantíssimo na proliferação do culto à imagem, às aparências, às modas, às marcas, aos objetos e narrativas que estetizam a realidade com belas simbologias e mitificações: o mundo da publicidade, da propaganda, das estrelas do entretenimento, os artistas, os intelectuais, os famosos e etc. Se em História da Loucura e em Vigiar Punir, temos a constituição da sociedade moderna, como sociedade da produção e acumulação das energias, sociedade da razão e do trabalho que disciplina os excessos, os gastos, os dispêndios inúteis de energia econômica e libidinal, o freio das paixões imediatas e sua concentração em direção a um porvir; o combate aos perigos dos contágios, das associações e fluxos desejantes que venham a minar a ordem disciplinada dos poderes. Creio, por sua vez, que em A vontade de saber, temos um outro movimento, o qual reinscreve aquelas conclusões sobre um outro funcionamento e uma nova ênfase, a saber; a exacerbação discursiva sobre a sexualidade e o sexo, a estimulação para produzir corpos sujeitados e sempre prontos para a confissão, escavação de si e para falar sobre a verdade de seu desejo. Em História da sexualidade, a produtividade do poder é cada vez mais positiva e constituinte, e não mais assentada em categorias negativas do tipo delinqüência, loucura, os anormais. A parcimônia e pudicícia da sociedade produtivista são deixadas um pouco de lado em favor e para dá passo a potencialização, ao poder que estimula, disponibiliza e que é cada vez menos negativo e coercitivo. A ortopedia social da disciplina já não parece mais suficiente e tão eficaz no controle dos espaços e das populações, em virtude da 171 velocidade e acúmulos das informações, imagens, dos fluxos de signos da realidade instantânea. A produção de identidades, que assegura o funcionamento da sociedade e, por conseqüência, seu controle, entra em um novo jogo de relações de poder, novas práticas e saberes, e, talvez, novos fins são alçados tenazmente a serviço de um novo regime de subjetivação. É sobre esse poder de estimulação que cada vez mais procede por formas heterogêneas, ligado à exacerbação discursiva e a aparelhos de saber profícuos, a uma mobilização incansável da fala, de nossa sexualidade, do testemunho e do lidar com o nosso próprio desejo que a sociedade de consumo se ergue paulatinamente em seu funcionamento discursivo. Não seria justamente esse funcionamento do discurso agravado, excessivo e de mobilização incansável de nossos desejos, expectativas, afetos e atenção sobre nós mesmos - e ao que outros vêem em nós drasticamente estendidos pelo cotidiano de nossas vidas e em seus espaços por mecanismos outros, uma das principais estratégias da sociedade de consumo? E, se assim for ao menos um pouco, não teria a obra de Foucault muito a nos dizer como um importante referencial teórico para trabalharmos o funcionamento do discurso e a produção da subjetividade na sociedade de consumo? Desde meados do século XVIII, os dispositivos de poder e de saber incidem sobre os ―processos da vida‖ e a possibilidade de controlálos, modificá-los e organizá-los. A medicina, a psiquiatria, a política, a sociologia, a demografia, estatística e a economia, todos esses saberes biopolíticos contribuiriam de distintas maneiras para um mesmo propósito: trazer a vida biológica e os fenômenos das populações para o centro dos investimentos epistemológicos, políticos e culturais modernos (FOUCAULT, 1990). Á essa racionalidade política Foucault cunhará o nome de biopolítica, tendo em vista o seu principal objetivo político; a vida. A biopolítica é formada pelos cruzamentos entre as estratégias adotadas pelo Estado e os procedimentos ligados às ciências humanas e outros saberes de gestão das populações. Ela define-se sob o cruzamento entre dois movimentos; primeiro, uma anátomo-política cujo objetivo é disciplinar os gestos e as habilidades para a formatação de corpos economicamente úteis e politicamente dóceis; segundo, um conjunto de investimentos normativos de regulação e otimização da vida da população através da quantificação reguladora e de políticas intervencionista acerca dos seus aspectos inerentes; mortalidade, morbidade, natalidade, longevidade, crescimento, e etc. Neste segundo movimento o interesse é construir uma população produtivamente saudável e um corpo social apto e seguro. Em conseqüência dos objetivos, campos de inscrição e mecanismo distintos, Foucault denominará o 172 segundo movimento, para distingui-lo do poder disciplinar, de biopoder (FOUCAULT, 1999). A expansão do consumo, das imagens, do entretenimento a partir da segunda metade do século XX, abriu um novo campo de experiência, de afetação dos corpos e de constituição do sujeito, exageradamente polimorfo e disperso. O ―poder de fazer viver e deixar morrer‖ se aplicará a novos âmbitos da experiência dos indivíduos. A experiência do consumo está ligada ao aparecimento de novas práticas nos domínios e gestão da vida, dos desejos, do trabalho e do corpo. Seria, então, no interior das práticas de estimulação ao gozo, a auto-realização, a constituição de estilos de vida via o consumo que deveríamos buscar compreender possíveis novos desdobramentos da racionalidade biopolítica moderna. Na sociedade de consumo, os saberes das ciências humanas e os procedimentos biopolíticos adotados pela Razão de Estado se entrelaçam a outros saberes de menos nobreza e mais instantâneos; a publicidade, a cinematografia, cultura de massa e suas modalidades de entretenimento e sedução. As virtuais relações entre biopolítica e os dispositivos midiáticos do consumo envolvem questões novas, complexas, heterogêneas e transversais. Com isto, queremos chamar a atenção para o seguinte problema: re-posicionamento e alargamento da biopolítica – tendo mira à intensificação e surgimento de novos dispositivos e tecnologias de poder ligadas às novas formas de subjetivação expressas nas relações entre os indivíduos, seus desejos e as práticas e narrativas do consumo. Considero a sociedade de consumo como um complexo biopolítico erguido graças a novos investimentos de poder que parecem desenhar um novo diagrama de relações do mercado com os indivíduos, seus desejos, expectativas e a com a própria vida, definindo através dos choques e embates dessas relações um poder sobre a vida. O que está em disputa nesse universo do consumo é um possível modo de subjetivação e objetivação do sujeito o qual vige tenazmente em nossos corpos na contemporaneidade. Trata-se de abordar a chamada sociedade de consumo enquanto um modo de experiência historicamente singular no qual os indivíduos, por meio de uma congeneridade de signos diferenciais capazes de significação e comunicação, objetivam-se como sujeitos para si e para os outros. Isto é, de maneira análoga ao tratamento que Foucault lançou sobre a sexualidade, trata-se de pensar o consumo como um âmbito contemporâneo, no qual os indivíduos são transformados em sujeitos, subjetivados em suas atitudes, gostos, e etc.; por um lado, sujeitados a uma forma de subjetivação e seus procedimentos de poder – publicidade, 173 marketing, mass media e etc. – codificadores do desejo. O desejo é codificado em um sistema de signos capaz a um só tempo de distinguir socialmente, reforçar o ―eu‖, conferir identidade e lugar no mundo; por outro, o consumo, ou melhor, suas práticas consistem também naquilo que Foucault (ano e obra) intitulou de ―técnicas de si‖ ou ―tecnologias do eu‖, isto é, práticas que proporcionam técnicas de ajuste e construção de modos de relação de si para consigo através das quais o indivíduo se constitui a si próprio como sujeito de sua experiência. Os signos do consumo quando desejados ou adquiridos são formas através das quais os indivíduos olham a si mesmos, se avaliam para constituírem-se a si mesmos como sujeitos. As práticas consumo são uma das vias de possibilidade contemporânea na qual os indivíduos enxergam sua realização enquanto tais. Ou seja, possibilita descrições de si que, relacionadas a uma complexa rede de signos, objetos e narrativas, articula o que pensamos, dizemos e fazemos. Em outros termos, as práticas de consumo, em virtude de suas próprias características na modernidade tardia, implicam e fomentam aquilo que Giddens chama de reflexividade do ―eu‖, elas constituem mecanismos de elaboração da auto-identidade nos quais o self é mobilizado enquanto projeto de auto-formação e definidor, em boa medida, de estilos vida. Poderíamos pensar o consumo, apoiando-nos nas elaborações do sociólogo britânico, como uma dimensão do que este chama ‖política-vida‖, isto é, uma política de auto-realização que liga - devido a inserção e participação em um domínio ordenado reflexivamente – as subjetividades, o self e o corpo à sistemas globais, no caso o consumo enquanto um sistema global de signos (GIDDENS, 2002). Com Foucault, podemos pensar a produção das subjetividades como algo contingente, histórico, relacionado às práticas sociais e às redes de relações e significações nas quais o sujeito está engendrado e situado. Com Giddens, colocamos a trajetória, a experiência do self nessas redes ressaltando o papel destas, na contemporaneidade, para a elaboração da reflexividade, no reforço do self, na busca por estilos de vida e etc. A nosso ver, o âmbito do consumo é um campo contemporâneo demasiado relevante para examinarmos a produção das subjetividades nos dois movimentos que aqui mencionamos. Para tratarmos dessas questões e indagarmos qual o lugar e o papel do consumo, seu funcionamento e suas implicações com a biopolítica e a política-vida, neste contexto analisado por Baudrillard e outros, da sociedade de consumo, é necessário abordá-las em termos do governo das políticas de subjetividade e gestão da vida; de um poder sobre os seres humanos como seres viventes e desejantes e de um poder que mobiliza reflexivamente o 174 self enquanto projeto. O poder se apossa do gozo, codifica o desejo e a reflexividade através da codificação pelos signos midiáticos dos estilos de vida. Á essa densidade de individuação via codificação do desejo, característica da sociedade de consumo, eu gostaria de definir como governamentalidade libidinal. Por governamentalidade, utilizo a definição de Foucault (1979), um conjunto de procedimentos, táticas, mecanismos enfim, racionalidades políticas cujo objetivo consiste em governar as condutas dos outros e de si mesmo. Governar, para Foucault (1995: 245) é estruturar o campo de ação possível dos outros e de si mesmo. A governamentalidade é a racionalidade através da qual se estrutura o campo de condutas. Governamentalidade em Foucault não se restringe a instituição governo, embora esteja fortemente ligada em suas obras ao Estado, ou ao que o filósofo francês chama da governamentalização do Estado ocorrida no final do XVIII e no decorrer do XIX. Com o conceito de governamentalidade libidinal ou governo libidinal almejo tratar o campo do consumo e suas práticas como um governo dos comportamentos, das expectativas, dos desejos, das disposições, gostos, enfim, estruturação do campo de ação dos indivíduos via a codificação do desejo e da subjetividade pelos signos, ou que Baudrillard (1972) intitula ―valor-signo‖. Este governo das condutas se dá mediante a exposição dos indivíduos e das populações às forças ficcionais das tecnologias de poder da sociedade de consumo, em outras palavras, às forças do mercado e seus aparatos; a publicidade, cinema, revistas de celebridades e etc. Essas tecnologias de poder intensificam pelo seu poder de ficção, isto é, de figurar o real, a facticidade do sistema de signos do consumo através do qual os sujeitos são fisgados e subjetivados. Portanto, dois movimentos; primeiro, sujeição ao sistema de signos do consumo, portanto, governo da condutas dos outros, e segundo, o governo de si através desses mesmo sistema em sua ênfase na auto-formação de si, elaboração do self, tendo mira estilos de vida ofertados, produzidos pelo consumo. Não se trata de liberdade ou liberação das potências criativas dos sujeitos, trata-se, antes, de subjetivação em relação aos valores e objetos-signos, aos recursos constitutivos que o mercado, que a sociedade de consumo oferece e disponibiliza. As questões do poder disciplinar ou da tecno-governamentalidade consistiam em como controlar as forças, como torná-las rentáveis ao menor custo. As questões da biopolítica ou da biogovernamentalidade concentravam-se em cuidar da população, tratá-la, observá-la, medi-la e corrigi-la se necessário. O governo das condutas na sociedade de consumo, ao contrário da sociedade disciplinar, não se interessa apenas pelos corpos e suas forças 175 econômico-políticas ou pela unidade enquanto população. A sua preocupação não é o que homens e mulheres podem fazer com os seus corpos, contra si mesmos e contra os outros. O seu interesse é se aponderar da subjetividade, de sua constituição. O controle e o governo das subjetividades se instalam como desejo. REFERÊNCIAS BAUDRILLARD, Jean. Para uma crítica da economia política do signo. São Paulo. Martins Fontes. 1972. _______. A Sociedade de consumo. Lisboa: Edições 70. 1995 FOUCAULT, Michel. ―A governamentalidade‖. In: Microfísica do poder. Org. Roberto Machado. Rio de Janeiro, Graal. 1979, PP. 277-293. _______. História da sexualidade I – A vontade de saber. Rio de Janeiro. Graal, 1990. _______. ―O Sujeito e o Poder‖. In: DREYFUS, H.; RABINOW, P. Michel Foucault, uma trajetória filosófica: para além do estruturalismo e da hermenêutica. Rio de Janeiro, Forense Universitária. 1995, p. 231-249. ________. ―Aula de 17 de março de 1976‖. In: Em defesa da sociedade. São Paulo, Martins Fontes. 1999, 285-315. GIDDENS, Anthony . Modernidade e Identidade. Rio de Janeiro. Zahar. 20002. GT3 – Momento de reflexão: pesquisas realizadas ou em andamento - Sala F2 - Setor II Gilcerlândia Pinheiro Almeida Nunes – Mestranda do PPGCS-UFRN Maria Lúcia Bastos Alves – Profª Drª. Docente PPGCS-UFRN Rainolenes Melo Silva – Mestrando do PPGCS-UFRN [email protected] Ementa: O processo de construção do conhecimento demanda muito de nosso intelecto, muitas vezes em momentos de profundo isolamento. Entretanto, sendo o conhecimento como uma das várias formas de construção social, o momento de isolamento reflexivo apenas precede o processo de discussão teóricametodológica imanentes ao avanço científico. A proposta deste Grupo de Trabalho é convidar os alunos sejam da graduação em Ciências Sociais ou integrantes do PPGCS e outras áreas para 176 apresentarem seus projetos de pesquisa em qualquer fase de andamento, ou ainda a síntese de pesquisas concluídas. Objetivos: a) Fomentar a interação social dos alunos da graduação e pós-graduação em Ciências Sociais; b) divulgar as linhas teórico-metodológicas que estão sendo utilizadas; c) buscar possíveis articulações entre projetos e objetos de pesquisa, para além de suas especifidades, como meio de desenvolver vínculos entre os pesquisadores. GT3 – Momento de reflexão: pesquisas realizadas ou em andamento - Trabalhos Aprovados Resumos Simples 01- A SABEDORIA DO INSTANTE: memórias, saberes e visões de mundo dos poetas repentistas de Mossoró-RN Ênio Érico Freire Segundo (bolsista/PIBIC/CNPq) Ailton Siqueira de Sousa Fonseca (Orientador) Jucieude de Lucena Evangelista (Co-orientador) Resumo: Esse projeto está diretamente relacionado às linhas de pesquisa do Grupo de Pesquisa do Pensamento Complexo do curso de Ciências Sociais da UERN. O projeto está já está em andamento e pretende compreender como os diferentes saberes se articulam e compõem o imaginário dos poetas repentistas de Mossoró-RN a partir das histórias de vida e da história oral desses poetas e demais sujeitos do universo da poesia popular desse município. Trata-se, assim, de compreender qual o sentido que os repentistas dão a sua vida e a sua ―arte do repente‖ e até que ponto por meio desses ―repentes‖ ou dessa ―intuição do instante‖ é possível se vislumbrar outros arranjos societais, outras formas de viver, conhecer e criar. Como metodologia estamos empregando a história de vida, a história oral e observações de campo. Mesmo em sua fase inicial essa pesquisa já aponta para a possível arte de se pensar em termos de dialogia: dialogar saber erudito e saber popular, ciência e consciências do mundo, poesia do instante e os instantes de vida carregados de significados que merecem ser conhecidos, estudados, analisados, compreendidos. A pesquisa já está contribuindo imensamente para o fortalecimento do grupo de pesquisa, para a formação dos alunos envolvidos e para o conhecimento de nossa realidade circundante com seus diversos sujeitos e vozes societais. 177 02 - UMA ANÁLISE DOS “DISCURSOS DE MODA” NAS REVISTAS ANA MARIA E ESTILO DE VIDA Gilcerlândia Pinheiro Almeida Nunes (UFRN/PPGSC-Mestranda) Resumo: Este trabalho pretende estudar o sentido do consumo de moda feminina, através de uma análise dos discursos de moda contidos nas revistas Ana Maria e Estilo de Vida ambas da Editora Abril. Tentar-se-á entender como os discursos são pensados e construídos de forma que possam ser eficientes na sedução dos grupos de mulheres a que cada exemplar escolhido se direciona para conseguir produzir e consolidar tipos de gostos adequados e aceitáveis naqueles meios. Para o norteamento dessa pesquisa, no sentido de trabalhar alguns conceitos caros ao estudo de moda, autores como Pierre Bourdieu, Gilda de Souza Melo, Georg Simmel entre outros serão de fundamental importância. Palavras Chaves: Consumo de Moda, Vestimenta, Mulher, Mídia Impressa. 03-“MÃE É TUDO IGUAL”: estratégias de deslegitimação moral de mulheres com filhas em uma instituição abrigo Gilson Rodrigues (UFPE) Resumo: A presente pesquisa é fruto da elaboração da dissertação de mestrado, que tem como foco pensar sobre as estratégias de deslegitimação, quando não legais, morais, que estigmatizam algumas mulheres que com filhas (crianças e adolescentes) assistidas por uma ONG de orientação católica – Escola Profissional Lar de Nazaré (LN)- em caráter de abrigo. Neste sentido, busquei manter conversas informais com os diferentes atores que compõe este universo: equipe que coordena o LN, juiz e promotor da infância e juventude, técnicos sociais (psicólogos, pedagogos, assistentes sociais), conselheiros tutelares, e algumas das referidas mulheres. Isto tem permitido pensar sobre a construção da cidadania moderna enquanto parte de um ―processo civilizador‖, que não ocorrendo de forma homogênea, exaltará certos indivíduos em detrimento de outros. Neste trabalho específico as crianças e adolescentes são percebidos como os principais alvos desse processo, a partir de uma gramática moral naturalizada, enquanto as mulheres, quando não correspondem aos ideais de ―eterno feminino‖ e ―amor materno‖, são rebaixadas socialmente, passando por um tipo de processo ―descivilizador‖. 178 04-DESAFIOS DE APRENDIZAGEM NO SISTEMA DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS. Hylana Maressa de Souza Câmara (UFRN) Resumo: Levando-se em contar que fazer pesquisa significa aprender a pôr ordem em nossas próprias idéias. Assim, entendo que, a construção do conhecimento é uma ação fundamentalmente relacional entre os sujeitos envolvidos nesse processo. O presente projeto pretende analisar os ―desafios da aprendizagem‖ no contexto Educação de Jovens e Adultos, com enfoque central, na relação dialogal para pensar a relação educador e educando. Em razão disso, o trabalho apresentará uma breve análise sobre a situação histórica da Educação de Jovens e Adultos-EJA, e sobre o ensino-aprendizagem dos sujeitos inseridos nesse sistema educacional. Através de um trabalho reflexivo que enfatiza a necessidade de restabelecer o aceso e a continuidade do ensino a esses alunos que tem histórias escolares e de vida marcadas por rupturas e descontinuidades. Palavras-chave: Educação, Educação de Jovens e Adultos, Relação dialogal. 05 - CELEBRAÇÃO DO AVESSO: O Niilismo-utópico em Augusto dos Anjos Iara Maria Carvalho Medeiros dos Santos Prof. Dr. Derivaldo dos Santos (Orientador) Resumo: A pesquisa em andamento intitulada ―Celebração do Avesso: o niilismo-utópico em Augusto dos Anjos‖, vinculada ao Curso de Mestrado em Literatura Comparada, constituinte do Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem, da UFRN, objetiva realizar uma leitura da obra anjosiana Eu (1912), de modo a identificar, no teor dialético de seus versos, uma atitude crítica do poeta frente à realidade instituída, assumindo, para tanto, uma postura utópica que o faz vislumbrar outras possibilidades de existência. Como fundamentação teórica, apóia-se em Nietzsche, em cuja obra Vontade de Poder (1884-1888) toma de empréstimo uma concepção de niilismo díspar do fatalismo e da resignação, porque voltada para uma negação das verdades instituídas; também baseia-se no pensamento de Benjamin, em suas Teses sobre o conceito de história (1940), de onde é possível enxergar no desvio revolucionário pelo passado, uma oportunidade de construir um futuro diferente do agora. O estudo analisa alguns poemas de Augusto dos Anjos, tomando-os como realidade criadora que mantém pontos de contato com a realidade imediata do poeta. Até o presente momento, deteve-se à análise interpretativa dos poemas ―O Lázaro da Pátria‖, ―A Árvore da Serra‖ e ―Debaixo do Tamarindo‖, nos quais identificou uma abordagem lírica rasgadora de normas, a qual, seja no campo ou na 179 cidade, legitima a voz dos oprimidos como digna de ser recordada no espaço sempre emblemático do texto literário. 06- PEDAGOGIA DO BORDADO NARRADA PELAS MULHERES DA COMUNIDADE QUILOMBOLA MATIAS DE SERRA REDONDA – PB Janaina Bezerra de Queiroz – UEPB Maria Lindaci Gomes de Souza – UEPB Patrícia Cristina de Aragão Araújo – UEPB Resumo: Essa pesquisa é um fragmento de uma pesquisa maior desenvolvido na Comunidade Quilombola do Matias, Serra Redonda – PB, que estuda as práticas-culturais afro-brasileiras. Esta tendo como importância o fato de que a tradição do bordado ser uma construção coletiva, no qual esta prática, atualmente, está desaparecendo e que são poucas as que dominam a pedagogia do bordado. Nesse sentido, o registro desses fazeres se faz necessário, tendo a necessidade da releitura de tal prática. Para a tessitura metodológica iremos abordar a história oral, no objetivo de analisar as falas das mulheres matriarcas aquelas que fizeram do bordado uma produção social de sustentação econômica para a família, como também, são as mulheres da terceira idade que ainda preservam na memória lembranças de momentos significativos do processo de construção do labirinto que conservaram essa prática passando o conhecimento de geração para geração através da oralidade. Após as entrevistas com as mulheres bordadeiras dessa comunidade constatamos um fato significativo, sendo as mulheres mais antigas que concebe o ato de bordar como uma prática social significativa para a comunidade. Esse fato é decorrente da desvalorização econômica porque passam os trabalhos manufaturados do trabalho atual. Essa desvalorização é sustentada por tais fatores: a exploração da mão-de-obra das mulheres bordadeiras, que apesar de o produto final, ser o bordado do labirinto passou por um processo de produção de trabalho coletivo, o mesmo é fragmentado em etapas individualizadas quando se trata do pagamento para cada especialidade que faz parte do bordado: desenhar; desfiar; encher; torcer; prefilar; lavar e colocar goma para vender. Além deste fator, ainda, existem os atravessadores que por meio de lucros exorbitantes acabam por explorar a referida prática comercial artesanal dos quilombolas, já que esses não repassam a quantidade devida para tal desempenho, ou seja, os lucros exorbitante advindos de tal processo comercial, para os que realmente produzem. Palavras-chave: Mulheres, Economia, Pedagogia do Bordado 180 07 HANNAH AREDNT E ROSA LUXEMBURGO: CONFABULAÇÕES SOBRE A AÇÃO POLÍTICA José Cleyton Neves Lopes Graduando em Ciências Sociais – UFRN Bolsista do Programa de Educação Tutorial RESUMO: O ensaio biográfico de Rosa Luxemburgo no livro ―Homens em tempos sombrios‖, escrito por Hannah Arendt, já se tornou referencial para os estudos sobre Luxemburgo. Não por acaso, a vida dessa revolucionária fascinava Arendt que, por sua vez, também encantou tantos outros. A defesa intransigente da liberdade, a preocupação com a despolitização das massas e a manutenção da esfera pública, foram certamente elementos-chave para o desenvolvimento do conceito de ação política para ambas. Todavia, o fato de serem mulheres, judias e causticamente críticas de seus oponentes e até companheiros intelectuais, tornaram-nas mártires de seus respectivos contextos históricos e sobrepujadas, em certa medida, pelas principais correntes teóricas da política ao longo do Século XX. O presente trabalho tem como objetivo sistematizar o conceito de ação política, isto é, seu significado e respaldo existente nas obras das duas autoras. A metodologia empregada será de modo eminente bibliográfica, constituída por leituras, produção de fichas, resenhas e resumos do arcabouço teórico das duas autoras. Espera-se, com isso, que a relação proposta entre Arendt e Luxemburgo clareie a originalidade teórica de duas mentes que respectivamente ―iluminaram‖ os ―tempos sombrios‖ que marcaram o século passado. Palavras-Chaves: Hannah Arendt; Rosa Luxemburgo; Ação Política 08 A TRADIÇÃO E A REPRESENTAÇÃO DA POLÍTICA NO MUNICÍPIO DE ANGICOS/RN Karla Danielle da Silva Souza Dalliva Stephani Eloi Paiva Resumo: O presente trabalho trata-se de uma pesquisa inicial que visa compreender as relações que sedimenta a política partidária presente no Município de Angicos/RN. Partindo-se de uma observação in loco do discurso dos eleitores e políticos locais como forma de apreender o significado imbricado nas relações sociais existentes no município no que tange a política local. Além de estar ancorado em diversos estudos bibliográficos, objetivando-se, sobretudo, apreender os significados das práticas locais – o Coronelismo, e por sua vez, a reciprocidade que envolve essa prática. As reflexões iniciais provenientes da pesquisa assinalam para uma sociedade pautada em práticas intrinsecamente ligadas a determinados interesses e valores sociais no tocante à micro-política do referido município. 181 Palavras-Chave: Angicos/RN, Política Partidária, Coronelismo. 09 EDUCAÇÃO ESPECIAL: UMA ANALISE PARCIAL DAS ESCOLAS PUBLICAS DA CIDADE DE CAICÓ RN. Kelly Cristina Silva de Brito (UFRN) Resumo: A ação educacional inclusiva visa à transformação de uma sociedade mais justa, valorizando a integração, indistintamente, de todos os cidadãos, e uma participação eqüitativa na melhoria das condições de vida. Ela envolve um processo com inúmeros impasses e resistências, relacionados a uma prática educacional historicamente segregacionista, geradora de exclusão, que, ao invés de buscar melhorias sociais insistia na discriminação e na exclusão de indivíduos com necessidades especiais. O Ministério da Educação orienta a organização dos sistemas educacionais inclusivos, que supera a organização de sistemas paralelos de educação especial, investindo na articulação entre a educação regular e a educação especial. Este projeto busca estudar o avanço e proliferação da modalidade de educação especial e suas formas de implicação na rede municipal de ensino da cidade de Caicó no estado do Rio Grande do Norte, tendo como foco de analise alunos inseridos em três escolas de ensino médio. A perspectiva é traçar um perfil demonstrando as principais dificuldades nestas instituições em se adequar as normas de ensino para jovens com necessidade especiais. A pesquisa foi realizada através de estudo descritivo exploratório de método quantitativo e qualitativo, levando em consideração a coleta de dados, analise de documentos internos a escola, a legislação nacional e o estudo de autores, tais como, Gomes (2005), Mendes (2004), Lima (2006), que tratam Educação inclusiva e igualdade social. Para alcançar o objetivo proposto realizaram-se visitas a três escolas que apresentam a inclusão de alunos com necessidades especiais, através de um processo de levantamento da estrutura física das unidades de ensino e do o currículo escolar em função do tipo de adequação na perspectiva da inclusão. Constatamos em analises preliminares que 54% dos alunos já estavam matriculados na rede publica do país. Consideramos a luta pelo direito a diferença marcado pelos regimentos dirigidos as instituições de ensino, transforma a escola na principal ferramenta para a inclusão social. Fundamentada pela lei percebemos indícios avanços na pratica de inclusão na educação especial na cidade de Caicó, especificamente em três maiores instituições de ensino médio, a Escola Estadual Calpúrnia Caldas de Amorim; o Centro Educacional Jose Augusto e a Escola Estadual Antonio Aladim. 182 10 A ESTRELA DO SERTÃO: O feminino encontrado em Macabéa Kenia Almeida Nunes (UFRN) Resumo: Este trabalho tem por objetivo deixar transparecer o que se é pretendido trabalhar na monografia, onde se almeja fazer uma discussão teórico-empírico acerca da construção do feminino do sertão nordestino, através de uma reflexão em torno da obra literária A Hora da Estrela de Clarice Lispector. Desse trabalho dentre os muitos objetivos desejados é preciso deixar límpido que a idéia central dele funda-se na tentativa de abordar a construção do feminino do sertão nordestino a partir de uma personagem (Macabéa) presente na obra acima citada. A pergunta de partida diante do que já foi exposto é: que tipo de mulher é a Macabéa? Pensando isso a partir dos vários imaginários que circunscrevem a mulher nordestina e sertaneja. E, partindo desse pressuposto de que há várias idéias de feminino, tem-se nesse trabalho, de certa forma, a mulher como construção do processo migratório, dessa forma a personagem de Macabéa do livro aqui estudado, talvez represente uma imagem produzida no Sudeste do Brasil. Verificado isto, a partir de leituras sobre o Nordeste, surge o problema principal desse trabalho que se configura na compreensão de como funciona e a serviço de que relações de poder é produzida essa imagem do feminino no sertão nordestino. Palavras-Chaves: Mulher; ―A Hora da Estrela‖; produção do feminino; relações de poder 11 CAPACITAÇÃO DE RECURSOS HUMANOS NA SESAP/RN Raimunda de Medeiros Germano e-mail: [email protected] Lenina Lopes Soares Silva (UFRN) e-mail: lenina @natal.digi.com.br Thalita da Silva Costa (UFRN) e-mail: [email protected] Resumo: Propõe-se a apresentar os resultados de um estudo diagnóstico das capacitações, cursos e eventos promovidos, organizados e apoiados pela Secretaria de Estado da Saúde Pública do Estado do Rio Grande do Norte (SESAP/RN), no ano de 2006, bem como das participações de seus profissionais em eventos e cursos. O estudo objetivou mapear as informações, no sentido de fornecer dados para a implementação de uma política de capacitação de recursos humanos na área da saúde na Secretaria. A problemática básica questionou se a fragilidade gerada pela falta de uma política de capacitação de recursos humanos em saúde, na SESAP/RN, e de um plano institucional de capacitação colaboravam para a promoção de capacitações de forma fragmentada e pontual? A pesquisa desenvolveu-se através de análise documental e de reuniões na Coordenação de Recursos Humanos da SESAP/RN, de julho a dezembro de 2007. Os resultados apontam as áreas nas quais houve maior e menor concentração e participação de profissionais em eventos, sinalizando para a 183 emergência de um plano institucional de capacitação efetivo e contínuo de recursos humanos na SESAP/RN, bem como para a criação de uma política de capacitação dos servidores em saúde da SESAP/RN. Palavras-chave: Capacitação de recursos humanos; política de capacitação em saúde; plano institucional de capacitação. 12 O CONCEITO DE DEMOCRACIA COMO VALOR UNIVERSAL NA OBRA DE CARLOS NELSON COUTINHO Leonardo Guedes Lins (UFRN) Resumo: Este projeto de pesquisa pretende problematizar o conceito de democracia, presente na obra ―A democracia como valor universal‖ de Carlos Nelson Coutinho, analisando as suas implicações para o desenvolvimento do programa político do partido dos trabalhadores e também as reações a estas concepções por parte de líderes de grupos de esquerda mais ortodoxa, procurando compreender que pontos centrais da obra de Coutinho se contrapunham a este pensamento mais ortodoxo. Palavras-Chaves: Democracia, Esquerda, Socialismo, Valor. 13 A IMAGEM DO OUTRO: o consumo da revista Contigo! pelo público feminino Marlla Suéllen de Melo Dantas (UFRN) Resumo: O desenvolvimento dos meios de comunicação alterou de modo indiscutível a relação do indivíduo com a sociedade, tendo em vista o poder de coerção que exerce, determinando gostos, comportamentos e modos de vida. Os recursos midiáticos como o jornal, a televisão e a revista, desde o início, passaram a ser consumidos de forma descomunal e ainda hoje é assim. Diante dessa abordagem, o projeto de pesquisa pretende investigar uma revista que desde o seu surgimento, em 1963, vem sendo consumida pelo público, e destaco em especial o público feminino, que é a revista Contigo!. Buscarei relacionar o aparecimento da revista com a televisão, pelo fato de esta ser a principal e a mais popular das mídias e, além disso, pretendo destacar as idéias de visibilidade e espetacularização para mostrar o quanto a imagem na sociedade atual, obteve um valor agregado à vicariedade, ou seja, existir através da imagem do outro para, então, chegar ao meu objeto que é o consumo da revista Contigo! na atualidade. Palavras-chave: Mídia, Revista Contigo,Consumo, Visibilidade 184 14 PROSTITUIÇÃO MASCULINA: As relações afetivo-sexuais entre michês e suas clientes na cidade de Natal Mikelly Gomes da Silva (UFRN) Resumo: Este trabalho tem como objetivo fazer uma pesquisa no campo da prostituição masculina na cidade de Natal, na tentativa de identificar quais as relações afetivo-sexuais estabelecidas entre estes homens e as suas clientes. A pesquisa tentará responder que homem é esse que faz do seu corpo ―mercadoria‖ assim como quem é essa mulher que procura por sexo. Palavras-chave: Mercado do sexo; Sexualidade; Natal; Identidade; Michê; Cliente 15 CAUSAS SOCIAIS DO NOVO MARRANISMO Nestor Medeiros Filgueira Burlamaqui Bacharel em Comunicação Social (UFRN) e aluno especial de mestrando do PPGCS-UFRN Resumo: Mais de quinhentos anos após a conversão forçada dos judeus ao catolicismo, em Portugal, algumas pessoas estão atualmente se reaproximando do judaísmo como uma forma de adquirir a religião e a cultura de seus antepassados judeus que foi esquecida, ao menos parcialmente, com o passar dos séculos. Desde o início da historiografia do Brasil os pesquisadores já sabiam a respeito da vinda dos cristão-novos portugueses ao Brasil durante o período colonial, mas somente após recentes pesquisas antropológicas – inclusive no Rio Grande do Norte – é que eles começaram a constatar a existência de indivíduos que ainda praticavam vestígios de uma cultura judaica, mas que não sabiam a respeito dessa origem. A princípio, podemos deduzir que a divulgação da ―nova origem‖ – proporcionada por essas pesquisas recentes, aliada ao poder de disseminação de informações exercido pelos atuais meios de comunicação de massa - fez com que o interesse sobre o assunto surgisse em algumas pessoas, mesmo naquelas sem uma família com vestígios judaicos evidentes. Porém, isso não explica satisfatoriamente a existência desse ―novo marranismo‖. Afinal, saber que se descende de judeus – mesmo que a plena certeza de tal situação nem sempre seja possível – não significa que alguém irá querer tornar-se um deles. Mesmo assim, eles clamam serem judeus ao mesmo tempo em que evitam uma conversão formal junto às instituições judaicas oficiais, pois suas famílias teriam carregado tal condição através dos séculos. Esse tipo de atitude representa claramente um inconformismo em relação à sua atual situação diante da sociedade ou, em outras palavras, à imagem social que carregam: nordestinos não-judeus. Eles pretendem romper com as leis judaicas atuais e serem reconhecidos como judeus pelos próprios judeus mesmo sem possuírem autoridade dentro do judaísmo oficial para tal empreendimento. Essas pretensões implicam efeitos tanto nas esferas sociais judaicas quanto nas esferas sociais não- 185 judaicas, pois ao adquirirem condição de judeus eles elevam-se sobre sua identidade de nordestinos comuns. Tornam-se diferentes e superiores. Também tornam-se diferentes e superiores aos próprios judeus por possuírem poder/direitos de ingressar no judaísmo sem consentimento deles. Trata-se de uma identidade antiga que atualmente já não tem o mesmo sentido, mas cujo valor simbólico continua forte: o valor do judaísmo e de toda a sua história de sobrevivência milenar às perseguições. Assim, nos resta procurar o que esse tipo de valor possui de importante para tais indivíduos ao ponto de exigirem tal reconhecimento social e se empenharem nessa busca. Devemos verificar se o sentido de ser judeu é realmente esse ou se há outros significados para eles. Por exemplo, o sociólogo Bernardo Sorj afirma que o Brasil, apesar de ser um país racista, não inclui os judeus na discriminação social, pois eles são considerados integrantes da população branca e, consequentemente, vistos como a parcela que pode contribuir com a ideologia do branqueamento da população, segundo a qual o negro, através da mistura racial, pode passar a ser parte do mundo branco, melhorando seu status social. Dessa forma, a aquisição – por parte de ―nordestinos miscigenados‖ – da identidade social judaica seria uma forma de ascensão social. 16 ESTUDANDO A SEGREGAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL NA CIDADE DO NATAL: REFLEXÕES INICIAIS. Thayanne Érica Torres de Assis (UFRN) Ozaias Antonio Batista (UFRN) Resumo: Um fenômeno urbano que marcou a constituição dos modelos citadinos brasileiros no início do século XXI foi o crescimento dos loteamentos e condomínios fechados. Isto se deu, em sua maioria, pela preocupação que as pessoas detinham com a segurança, designando o conforto como aspecto secundário na aquisição de um bem imobiliário. Diante desta realidade, o presente estudo, em seu estágio inicial, objetiva abordar o aparecimento dos condomínios fechados – horizontais - na Região Metropolitana de Natal, refletindo sobre as conseqüências sociais, espaciais e econômicas do aparecimento desta forma de moradia na vida de alguns natalenses. A princípio, tomando como base as leituras iniciais, se pode identificar o aparecimento de áreas segregacionais (ocupadas pelos condomínios fechados), as quais determinam a participação de um determinado público. Antes formado unicamente por pessoas de alto poder aquisitivo, agora composto por pessoas de classe média baixa. Entretanto, outras reflexões e conceitos podem estar sendo agregados ao presente estudo, tais como: os condomínios fechados como detentores de barreiras físicas e simbólicas; a fragmentação urbana aliada à segregação social; a condição de moradia atrelada ao status. Considerações finais não podem estar sendo apresentadas, uma vez que a pesquisa está em seu estágio inicial. Pretende-se, com este trabalho, apenas expor algumas impressões iniciais a fim de partilhar o conhecimento já detido. 186 Palavras-chave: Condomínios horizontais fechados; Região Metropolitana de Natal; segregação sócio-espacial; sociabilidade. 17 “ONDE VOCÊ MORA?”: uma pesquisa a respeito dos discursos sobre a expansão da fronteira imobiliária na cidade do Natal, como forma de acumulação e reprodução do capital mercantil fundiário Rainolenes de Melo Silva (UFRN) Resumo: Este trabalho, tem caráter de anotações preliminares e introdutórias à reflexão a ser desenvolvida em dissertação de mestrado, que versa sobre os discursos dos agentes políticos, econômicos e sociais, que estiveram envolvidos no processo de expansão urbana, através do mercado imobiliário na cidade de Natal, entre a segunda metade dos anos de 1960 e fim dos anos 1980. Preliminarmente foram escolhidos dois bairros da cidade de Natal como campo a serem estudados. A escolha dos bairros de Cidade da Esperança e Capim Macio se deve sobremaneira, a forma como representaram momentos distintos do processo de expansão urbana capitalista, e como o Estado através das políticas habitacionais e o Capital, através do processo de acumulação fundiária, induziram a um processo de urbanização de forma desigual e excludente. A metodologia a ser utilizada estará pautada em pesquisas a meios de comunicação impressa a ser escolhida no momento oportuno e tendo como referencial teórico, leituras pertinentes ao assundo. Palavras-chaves: Urbanização, Expansão Urbana, Mercado Imobiliário, Especulação Fundiária. 18 A VALORIZAÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL AFROBRASILEIRA NO CONTEXTO DA SALA DE AULA DO ENSINO MÉDIO Ramon de Alcântara Aleixo (UEPB) Patrícia Cristina de Aragão Araújo (UEPB) Resumo: Este estudo visa à elucidação acerca do patrimônio cultural imaterial afro-brasileiro no contexto da sala de aula do ensino médio, de forma a possibilitar a efetivação de uma educação inclusiva, equânime e significativa, onde os diversos sujeitos educativos possam sentir-se representados nas práticas de leitura e escrita, bem como nos discursos veiculados pelos livros didáticos utilizados em algumas escolas paraibanas, mais especificamente na cidade de Campina Grande-PB, lócus de nossas análises. Sendo assim, objetivamos, ao longo do referido texto, tecer visões acerca das representações em que se inserem as práticas culturais afrobrasileiras, bem como os discursos que permeiam os currículos educacionais do ensino médio vislumbrando, assim, a tessitura de um processo de (re) significação e valorização identitária acerca dos patrimônios culturais imateriais de negros e negras em nível nacional e estadual. Para tal, nos aportamos no referencial teórico trilhado por CHARTIER (2004), 187 BHABHA (1998), HALL (2001), LOPES (2005), bem como no método investigativo indiciário, GUINZBURG (1989), onde se torna possível perceber, através de fragmentos discursivos, sinais que apontam para a tessitura das tramas políticas e sociais que permeiam as escritas curriculares. Os resultados preliminares nos permitem afirmar a importância de se efetivarem políticas de inclusão racial, de forma a possibilitar a tessitura de zonas de diálogo entre as diversas etnias que povoam cotidianamente o espaço-tempo da escola, bem como a inserção de seu legado cultural na historiografia nacional e local, contribuindo, dessa forma, para evocarmos os fragmentos de memória e cultura que necessitam serem (re) significados sob pena de se esmaecerem nas sinuosas curvas ofertadas pela escrita da História. Palavras-chaves: Educação Básica; Identidade Afro-brasileira; Patrimônio imaterial negro; Práticas de leitura e escrita. GT3 – Momento de reflexão: pesquisas realizadas ou em andamento - Resumos Expandidos 01-A SABEDORIA DO INSTANTE: memórias, saberes e visões de mundo dos poetas repentistas de Mossoró-RN Ênio Érico Freire Segundo (bolsista/PIBIC/CNPq) Ailton Siqueira de Sousa Fonseca (Orientador) Jucieude de Lucena Evangelista (Co-orientador) (Resumo Expandido não disponibilizado pelos autores para publicação) 02-UMA ANÁLISE DOS “DISCURSOS DE MODA” NAS REVISTAS ANA MARIA E ESTILO DE VIDA Gilcerlândia Pinheiro Almeida Nunes(UFRN/PPGSC-Mestranda) Esse trabalho vem sendo desenvolvido no campo do consumo de moda e, mais especificamente a vestimenta feminina como produto de moda. A partir de uma perspectiva histórica, mais precisamente datada do período de nascimento e desenvolvimento do capitalismo no Ocidente, o tema moda está sendo discutido como um fenômeno capaz de ao mesmo tempo estimular a imitação e propor elementos distintivos. Ou seja, por um lado, as classes sócio-econômicas menos favorecidas tem na moda uma possibilidade de aproximação das classes superiores – aos espaços desejados – através da aquisição de produtos simbolicamente representativos de status superior. Por outro lado, os grupos superiores criam e recriam novas modas logo que sejam necessárias para se distanciarem paulatinamente dos ―invasores‖ vindos das classes sócioeconomicamente inferiores. Dessa forma, produzem elementos distintivos 188 capazes de resguardar, seja através dos gestos, das maneiras, do vestir ou do agir coletivo em qualquer situação uma posição privilegiada. Sendo assim, a moda será entendida nesta pesquisa como um fenômeno de massa cíclico, que ao nascer já traz consigo uma sentença de morte, mas que nem por isso tem menos força nos espaços sociais por onde adentra. Os indivíduos a ela se submetem sem um nível de reflexão capaz de descortiná-la e percebê-la como criação humano-social, assim como acontece com outros produtos sociais. Destarte, essa é a principal característica dos produtos das relações humanas o fato de não permitir grandes espaços para reflexividade e colocar-se praticamente como natural. Todavia, mesmo compreendendo que a relação dos indivíduos com a moda e com os meios que fazem com que ela se difunda – as mídias, por exemplo – e se torne tão irresistível não é de nenhuma forma de igualdade, não se nega totalmente que haja reflexão ou mesmo interação. Quem consome supostamente possui uma explicação para o seu interesse em tal ou qual produto, mas ainda há a própria construção social dos gostos e que permite as diferentes escolhas. Saber que se quer consumir uma devida marca, produto com uma assinatura específica, é dizer ao mundo que o espaço das relações – estilo de vida – a que pertence ou gostaria de pertencer está prédeterminado. Vivenciar suas experiências estéticas e sensoriais através do consumo de tais objetos é mais um elemento que o assegura em sua posição diante dos seus pares. Tentar-se-á aqui entender como se dá a formação dos gostos no consumo de vestimentas femininas, pensando-os como um interesse comandado, em primeira instância, pelo fator externo mídia como formadora de subjetividades. Pretende-se entender como se dar a criação e divulgação do que será chamado de discurso de moda na mídia impressa, ou seja, o discurso que diz aos propensos consumidores o que é ―certo‖ ou ―errado‖ nas maneiras aceitáveis socialmente de vestir. Dessa forma, para responder a questão de como são construídos esses discursos na comunicação midiática, especialmente, serão pesquisados dois títulos de revistas direcionadas às mulheres. Tendo em vista a formação das representações de moda e a padronização dos gostos das leitoras pensouse numa análise detalhada dos discursos existentes no interior dessas revistas, além disso, os próprios exemplares permitem a checagem de sua eficácia em relação aos supostos direcionamentos de gostos quando publica cartas de leitoras falando de suas dúvidas ou identificação com o que é escrito e publicado. Pensando apenas o discurso de moda contido nessas revistas como um discurso construído com o intuito de persuadir as leitoras a serem ou continuarem sendo consumidoras de determinados produtos de moda, é que escolheu-se fazer análise de discurso textual. Os exemplares selecionados fazem parte da mídia impressa brasileira, ambas publicadas pela Editora Abril e são distribuídos em âmbito nacional tendo como foco a moda feminina. Interessa saber como esses discursos são construídos para que seja eficiente tanto no que diz respeito a sedução da leitura como na persuasão que induz tipos de gostos capazes de separar os grupos de classes de possuidores e não possuidores de possibilidades objetivas de cumprir tais ou quais expectativas sociais. Entretanto, não deixando 189 indivíduos soltos à própria sorte, mas enquadrando-os em subgrupos ávidos pelo consumo de bens que os tornará aceitos por si mesmos e pelos seus pares. Já que é no âmbito coletivo que a consolidação dos gostos se dá, ou seja, no encontro com o outro. Dessa forma, o termo consumo será pensado nesse trabalho como algo que está ligado ao desejo de possuir, a sedução dos objetos, ao prazer hedonista em muitos momentos, mas que é dependente do olhar do outro para sua consolidação no meio social como objeto dotado de sentido e possibilidades de identificação e formação de identidades. Estas, por sua vez, apresentando uma flexibilidade característica da contemporaneidade, dando oportunidade para vários caminhos, várias escolhas de acordo com a plasticidade percebida no espaço social atual. Ainda sobre o sentido do consumo, pensa-se não como algo dado, mas construído, como já foi sugerido no texto, pela pesquisa e criação do marketing e pela divulgação das mídias, sejam elas quais forem. A mídia impressa direcionada para o público feminino que está sendo privilegiada nesta pesquisa é representada pelos títulos: Estilo de Vida e Ana Maria, ambas publicações da Editora Abril como fora mencionado anteriormente. A primeira é uma publicação que faz parte da corporação da revista In Style americana, sua primeira edição no Brasil foi em outubro de 2002. Ela Inclui artigos sobre moda, beleza, entretenimento entre outros e é do tipo mensal. O padrão de apresentação dessa primeira é visivelmente diferente da segunda em relação aos tratos dados aos assuntos, os materiais gráficos utilizados, o papel, as chamadas, os anunciantes, as mulheres que fazem as capas, as cores utilizadas nas capas – a aparência limpa e despoluída visualmente. O preço cobrado, por sua vez, parece reforçar um diferencial e constituir uma forma de seleção das leitoras. O discurso que permeia a revista é a construção ou mesmo a manutenção de um estilo de vida específico, como sugere o próprio título da revista. A revista Ana Maria, por sua vez, é oferecida semanalmente em bancas de bairro a um preço mais acessível e ainda trazem informações sobre os capítulos das novelas que serão exibidos durante a semana. As formas de abordagens dos temas ―femininos‖ também são bastante diferentes na estrutura textual de ambas as revistas. As reportagens da revista Ana Maria são em sua maioria curtas e em linguagem simples, as discussões são comuns a cotidianidade da mulher, e sempre privilegiam a idéia de beleza, do cuidado com o corpo, cabelos, unhas, pele, o que vestir em que ocasiões. Receitas culinárias também são oferecidas além de discussões sobre sexo entre outras informações direcionadas àquele ―mundo feminino‖. Sobre moda, geralmente, trazem imagens de atores e atrizes com os figurinos utilizados na ficção. Ainda sobre a revista Estilo de Vida, por ser direcionada a uma camada social diferente da revista Ana Maria trás em suas páginas referências a grifes conhecidas e reconhecidas pelo grupo a quem se dirige. Toda a revista dedica-se a tratar do tema moda, mas como apenas sugestão, leitura ou discussão de uma posição social seleta. Vários figurinos são mostrados para que de acordo com as identificações de cada leitora sejam utilizados. Desfiles de marcas famosas são também encontradas além de tratar não apenas do que é conhecido dentro das fronteiras nacionais, mas dos 190 grandes encontros mundiais de moda. Entretanto, essa revista como diz o próprio título fala de uma possibilidade de ―estilo de vida‖. Ser é o ponto de partida. Existe também uma versão da revista eletrônica, onde podem-se ver parte da revista on-line e alguns links que permitem descobrir o próprio estilo a partir de alguns clicks. Entretanto, para entender como a formação das representações de moda e a padronização dos gostos se dão nas mulheres leitoras das revistas acima citadas será feita uma análise de discurso textual e imagético apenas nas páginas que tratem de moda feminina tratando-se das vestimentas. Com isso, espera-se encontrar elementos na linguagem utilizada nos discursos textuais e visuais de cada título pontos que suponham padronização dos gostos do vestir para os grupos a que cada revista se direciona. Para a feitura desse trabalho serão selecionados exemplares de cada um dos títulos publicados no período de um ano entre junho de 2008 e junho de 2009. A intenção é avaliar o que e como foram noticiados os eventos sazonais: outono/inverno e primavera/verão, períodos que marcam mudanças de comportamento nos hábitos de vestir. Esse espaço temporal permitirá o contato com as construções textuais e visuais sobre moda que marcaram um ciclo de acontecimentos e lançamentos. Portanto, será possível uma leitura minuciosa, mas não definitiva dos aspectos dos discursos que foram apresentados como forma de dizer às leitoras o que é socialmente aceito no ato do vestir, tendo em vista categorias sociais como gênero, faixa etária, tempo (dia/noite) e espaço (público/privado) e até onde vai a consistência desses discursos, no sentido de conseguir ou não atingir suas propostas. Essa leitura deverá ser entendida não apenas como uma decodificação de um texto escrito ou de imagens, mas principalmente, será considerado a mensagem direcionada a um receptor e vice-versa. A partir dessa leitura e organização dos dados, o segundo momento será acionar um conjunto de teorias para dar suporte analítico à pesquisa. A visão bourdiesiana estará diluída em toda a construção teórica da dissertação através da articulação dos dados e análise dos conteúdos das revistas pesquisadas. Para dar suporte à análise de discurso textual a que serão submetidas as revistas está sendo estudado também o linguista José Luís Fiorin que acredita-se trazer riqueza tanto à leitura dos discursos quanto a feitura posterior dos textos. Entretanto, mesmo que as maneiras de ler/interpretar os discursos dos títulos pesquisados esteja permeado pelos termos e conceitos da lingúistica é imprescindível lembrar que este trabalho tem um cunho sociológico, em primeira instância, todavia, isso não impede que os conhecimentos de áreas afins se encontrem e componham um todo com sentido, mas mantendo a direção estrutural no campo das Ciências Sociais. Portanto, não pretende-se, de forma alguma, fazer um trabalho de cunho lingüístico, embora o conhecimento produzido por essa área seja de extrema relevância para a realização dessa pesquisa. Pois, será possível detectar os tons dos discursos enunciados, as intenções, os direcionamentos, como se dirigem aos receptores, enfim como se dá a interação entre o corpo editorial das revistas e o seu público alvo. 191 REFERÊNCIAS BOURDIEU, Pierre. Gostos de classe e estilos de vida. In: Ortiz, Renato (org.) - BOURDIEU. Coleção Grandes Cientistas Sociais. no. 39. Ática, São Paulo, 1983. ______. Razões práticas: sobre a teoria da ação. Campinas(SP): Papirus, 2001. _______. A economia das trocas simbólicas. 2. ed. São Paulo: Perspectiva, 1987. _______. Sobre o poder simbólico. In:_O poder simbólico. 2. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1998(Tradução Fernando Tomaz). ______. A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo: Edusp; Porto Alegre, RS: Zouk, 2007 LIPOVETSKY, Gilles. O império do efêmero: a moda e seu destino nas sociedades modernas. 8. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1989 (Tradução: Maria Lúcia Machado). LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. LIPOVETSKY, Gilles; ROUX, Elyette. O luxo eterno: da idade do sagrado ao tempo das marcas. São Paulo: Companhia das Letras, 2005. MELO, Gilda de Souza. O espírito das roupas: a moda no século dezenove. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. SIMMEL, Georg. Filosofia da moda e outros escritos. Lisboa: Edições texto e gráfica, 2008. ______. A metrópole e a vida mental. In: VELHO, Otávio G. O fenômeno urbano. Rio de Janeiro, Kahar, 1967. 03-“MÃE É TUDO IGUAL”: estratégias de deslegitimação moral de mulheres com filhas em uma instituição abrigo Gilson Rodrigues(UFPE) (Resumo Expandido não disponibilizado pelo autor para publicação) 04-DESAFIOS DE APRENDIZAGEM NO SISTEMA DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS Hylana Maressa de Souza Câmara (Graduanda em Ciências Sociais UFRN) [email protected] Introdução: Levando-se em contar que fazer pesquisa significa aprender a pôr ordem em nossas próprias idéias, segundo Mirian Goldenberg (1999). Assim, entendo que, a construção do conhecimento é uma ação fundamentalmente relacional entre os sujeitos envolvidos nesse processo. O presente projeto pretende analisar os ―desafios da aprendizagem‖ no 192 contexto educação de jovens e adultos, com enfoque central, na relação dialogal para pensar a relação educador / educando. Em razão disso, o trabalho apresentará uma breve análise sobre a situação histórica do ensino de Jovens e Adultos - EJA, e sobre o ensinoaprendizagem dos sujeitos inseridos nesse sistema educacional. Uma vez que no contexto histórico do Brasil, a educação de jovens e adultos é acompanhada pela história da educação em si. No entanto as primeiras iniciativas com relação à educação de jovens e adultos se estabeleceram sistematicamente a partir do ano de 1930, onde a educação, tido aqui como a oferta de ensino público primário gratuito e obrigatório, se torna direito de todos. Após um breve percurso pelas décadas de 1930 a 1980 tendo nesta ultima a constituição de 1988, o contexto educacional de maior relevância e destaque na sociedade brasileira, no que se refere à Educação de Jovens e Adultos – EJA. Entendo que, a construção do conhecimento é uma ação fundamentalmente relacional, entre os sujeitos envolvidos, neste caso professor e aluno. Desta forma, o novo projeto e este relatório, pretende analisar os ―desafios da aprendizagem‖, no contexto educação de jovens e adultos, enfocando diretamente na relação dialogicial para pensar as relações educador/ educando. O direito a educação: No contexto histórico do Brasil, a educação de jovens e adultos é acompanhada pela história da Educação em si. Foi a partir da Revolução de 1930, que a educação elementar no país iniciou seu período de consolidação, através de mudanças políticas e econômicas, uma dessas mudanças foi o processo de urbanização e industrialização que ocorria no Brasil, processos que exigiam a ampliação da escolarização para jovens e adultos. Temos na década de 1940, a concretização de algumas iniciativas política e pedagógicas, como: a criação do INEP, que incentivava os estudos na área; o surgimento das primeira obras dedicadas ao n sino supletivo; o lançamento da CEAA – Campanha de Educação de adolescentes e adultos; dentre outras iniciativas. A década de 50 é caracterizada pela necessidade de mão de obra em vista do crescimento das industrias. Por isso tinha a necessidade de promover a educação e qualificação das pessoas. Mas foi nos anos de 1960 que o Brasil presenciou de fato uma verdadeira efervescência no campo da educação de adultos e da alfabetização. Foi em meados de 60 que se realizou o II Congresso Nacional de Educação de Adultos, neste congresso, já apontava ideais de pratica educativa baseada no diálogo como forma de diminuir barreiras invisíveis das relações educador/educando. Nesse contexto temos as idéias de Paulo Freire, constituem uma proposta de mudança radical na educação e nos objetivos de ensino, onde a compreensão de que o aluno sabe e tem o poder de transformação da sua realidade. Portanto, o pensamento de Paulo Freire constitui uma prática que entendia a relação entre a problemática educacional e social. Temos na constituição de 1988, aspectos de extrema importância para a educação de jovens e adultos, pois com a aprovação da mesma a educação 193 passa a ser um direito assistido a todos, independentemente da idade, sexo, cor ou condições sócio-econômicas. Foi no artigo 208 da constituição de 1988, que o governo reconhece que a sociedade foi incapaz de garantir escola básica para todos na idade adequada. ―O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: I – ensino fundamental obrigatório e gratuito, assegurado, inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria‖. (Constituição Federal, 1988). O Universo Da Educação De Jovens E Adultos (EJA): O universo do aluno da Educação de Jovens e Adultos - EJA tem grande heterogeneidade de público, imersos em situações sociais e culturais as mais variadas possíveis desta forma observam-se que é de extrema importância a abordagem sobre o processo dialogicial entre os professores e alunos. Assim ensinar e aprender se torna uma prática pedagógica muito mais relacional o que facilitaria o processo de ensino- aprendizagem. Após, a contextualização e compreensão do tema, a pesquisa realizada com alunos e professores da escola pesquisada e acompanhada, através da observação do universo escolar e de entrevistas informais com os sujeitos pesquisados, pôde-se constatar que o desemprego, os baixos salários e as péssimas condições de vida (moradia, saúde, alimentação, etc.) comprometem os seus processo de alfabetização. Alem do que os déficits no ensino fundamental resultaram ao longo dos anos, num grande número de jovens e adultos, que não tiveram acesso ou não concluíram o ensino fundamental. O analfabetismo é a expressão maior desse pressuposto, por esse motivo acredito que a educação de jovens e adultos devem está condicionada as possibilidades de uma transformação real das condições de vida do aluno. Para tanto a linguagem usada pelos professores deve se de fácil acesso aos alunos havendo uma aparente comunicação dialética entre professores e alunos, além do que os professores devem respeitar as condições culturais do jovem e do adulto analfabeto diminuindo assim a verticalização das relações pedagógicas. Paulo Freire já nos advertiu: [...], o diálogo é uma exigência existencial. E se ele é o encontro em que se solidarizam o refletir e o agir de seus sujeitos endereçados ao mundo a ser transformado e humanizado, não pode reduzir-se a um ato de depositar idéias de um sujeito no outro, nem tampouco torna-se simples troca de idéias a serem consumidos pelos permutantes. (FREIRE, 2005, p.91). Vejo que, as idéias de Paulo Freire constituem uma proposta de mudança radical na educação e nos objetivos de ensino, onde a compreensão de que o aluno sabe e tem o poder de transformação da sua realidade. Portanto o pensamento de Paulo Freire constitui uma prática que entendia a relação entre a problemática educacional e social. Uma vez que o desenvolvimento da educação se dar ao longo de toda a vida, inicia-se com a alfabetização, no entanto não basta apenas ensinar a ler e a escrever. No exercício pleno da cidadania o educando tem que ter a oportunidade de melhorar sua condição de vida. Esse aspecto é de extrema importância no contexto de educação de jovens e adultos, visto que o projeto de Freire sobre o processo educativo deveria partir sempre de um exame crítico da realidade em que o aluno estar 194 inserido, possibilitando conseqüentemente a identificação da origem de seus problemas e a possibilidade de superá-los. Desafios da Educação de Jovens e Adultos: O analfabetismo é a face mais perversa e recorrente nessa problemática, ele está diretamente ligado aos desequilíbrios econômicos, estruturais e históricos da sociedade brasileira, desse modo à educação parra erradicação do analfabetismo deve está voltada para a conquista de uma cidadania que vai muito além de ensinar a ler e escrever uma vez que o desenvolvimento afetivo, intelectual, social e cultural deve está presente. Desse modo é indispensável pensar em um processo contínuo de alfabetização que inclua o reconhecimento de características afetivas, sóciopolíticos, culturais de cada grupo. Assim, a educação deve fundamenta-se na participação da educando em sua situação de aprendizagem, sendo assim um sentido de processo de ensino e aprendizagem que contribua para a construção de um sujeito cognoscente. É indispensável pensar o mundo do trabalho dentro do universo educacional EJA, pois é fato que seu público está interagindo com esse mundo, uma vez que os alunos almejam entrar no mercado de trabalho. Desse modo, o nível de escolaridade é fator determinável para o exercício de uma ocupação profissional, ou seja, o grau de escolaridade é pré-requisito para a conquista do emprego na sociedade contemporânea. Outro desafio e a heterogeneidade de público, estes imersos em situações sociais e culturais as mais variadas possíveis, na sua maioria desfavorável. A EJA tem uma função permanente de qualificação, pois quando voltada para o mercado de trabalho, o sujeito tem que se qualificar e se re-qualificar visto que são exigências das sociedades contemporâneas. Também existe a função reparadora uma vez que indivíduos que por quais quer natureza tenha se desvinculado se sua formação educacional visa com a entrada no sistema de ensino de Jovens e Adultos, como uma reentrada no ‗jogo da sociedade‘, ou seja, busca restabelecer sua trajetória na sociedade enquanto cidadão. Considerações Finais: Nas sociedades contemporâneas que se afirmam politicamente democráticas e cada vez mais recorrentes a busca por qualificações educacionais e profissionais, não esquecendo que uma está diretamente ligada à outra, sendo assim a escola passou assumir a função de educar para a vida e para a aprendizagem do trabalho. No universo da Educação de Jovens e Adultos não é diferente, os participantes desde universo busca restabelecer suas funções enquanto cidadãos pertencentes a uma sociedade. Desta forma, a educação que com a constituição de 1988 passa a ter um caráter universalizaste, pois afirma que ―educação é direito de todos não importando sexo, condição sócioeconômica ou cor‖ deve se entendida como uma prática à liberdade e igualdade dos sujeitos, pressupostos estes fundamentais para a educação de Jovens e Adultos. REFERÊNCIAS BEISIEGEL, Celso Rui. Questões de atualidade na educação popular. 195 Caxambu: ANPED, 1999, (mimeo). _____. Estado e Educação popular: Um estudo sobre a educação de adultos. São Paulo: Pioneira, 1974. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF:Senado,1988. CUNHA, L. A.; GÓES, M. O golpe na educação. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985. FALSARELLA, Ana Maria. Formação continuada e prática em sala de aula: os efeitos da formação continuada do professor. Campinas, SP: Autores associados, 2004. FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967. ______. Pedagogia do oprimido. 2 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1975. GADOTTI, Moacir, RAMÃO, José.(0rg.) Educação de jovens e adultos: teoria e prática e proposta.3 ed. São Paulo: Cortez. 2001. HADDAD, Sérgio. Estado e educação de adultos (1964 - 1985). São Paulo: Faculdade de Educação da USP, 1991. PINTO, A. Vieira. Sete lições sobre educação de adultos. São Paulo: Cortez, 2000. 05 - CELEBRAÇÃO DO AVESSO: O Niilismo-utópico em Augusto dos Anjos Iara Maria Carvalho Medeiros dos Santos Prof. Dr. Derivaldo dos Santos (Orientador) (Resumo Expandido não disponibilizado pelos autores para publicação). 06- PEDAGOGIA DO BORDADO NARRADA PELAS MULHERES COMUNIDADE QUILOMBOLA MATIAS DE SERRA REDONDA – PB DA Janaina Bezerra de Queiroz – UEPB Maria Lindaci Gomes de Souza – UEPB Patrícia Cristina de Aragão Araújo – UEPB Essa pesquisa é um fragmento de uma pesquisa maior desenvolvido na Comunidade Quilombola do Matias, Serra Redonda – PB, que estuda as práticas-culturais afro-brasileira. Esta tendo como importância o fato de que a tradição do bordado ser uma construção coletiva, no qual esta prática, atualmente, está desaparecendo e que são poucas as que dominam a pedagogia do bordado. Esta sendo uma atividade manufaturada, geralmente transmitida de geração para geração, possuindo grande valor histórico e sócio-cultural. Nesse sentido, o registro desses fazeres se faz necessário, 196 tendo a necessidade da releitura de tal prática. Para a tessitura metodológica iremos abordar a história oral, no objetivo de analisar as falas das mulheres matriarcas aquelas que fizeram do bordado uma produção social de sustentação econômica para a família, como também, são as mulheres da terceira idade que ainda preservam na memória lembranças de momentos significativos do processo de construção do labirinto que conservaram essa prática passando o conhecimento de geração para geração através da oralidade. Aqui tomamos como história oral sendo uma ―história construída em torno de pessoas. Ela lança a vida para dentro da própria história e isso alarga seu campo de ação. Admite heróis vindos não só dentre os líderes, mas dentre a maioria desconhecida do povo. Estimula professores e alunos a se tornarem companheiros de trabalho. Traz a história para dentro da comunidade e extrai a história de dentro da comunidade. Ajuda os menos privilegiados, e especialmente os idosos, a conquistar dignidade e autoconfiança. Propicia o contato – e, pois, a compreensão – entre classes sociais e entre gerações. E para cada um dos historiadores e outros que partilhem das mesmas intenções, ela pode dar um sentimento de pertencer a determinado lugar e a determinada época. Em suma, contribui para formar seres humanos mais completos. Paralelamente, a história oral propõe um desafio aos mitos consagrados da história, ao juízo autoritário inerente a sua tradição. E oferece os meios para uma transformação radical no sentido social da história.‖ (THOMPSON,1992, p. 44) Após as entrevistas com as mulheres bordadeiras dessa comunidade constatamos um fato significativo, sendo as mulheres mais antigas que concebe o ato de bordar como uma prática social significativa para a comunidade. Cientes de que o trabalho artesanal deveria ser visto como uma importante fonte de renda, quer dizer, o artesanato é uma atividade econômica diretamente relacionada com a identidade e cultura local. Esse fato é decorrente da desvalorização econômica porque passam os trabalhos manufaturados do trabalho atual, pois o artesanato não encontra um mercado garantido para seus produtores em decorrência de algumas questões ainda sem resolução como a variedade dos produtos de acordo com as demandas do mercado atual envolvendo o design, a modelagem, e um diferencial no que se refere a inovação e criatividade. Essa desvalorização é sustentada por tais fatores: a exploração da mão-de-obra das mulheres bordadeiras, que apesar de o produto final, ser o bordado do labirinto passou por um processo de produção de trabalho coletivo, o mesmo é fragmentado em etapas individualizadas quando se trata do pagamento para cada especialidade que faz parte do bordado: desenhar; desfiar; encher; torcer; prefilar; lavar e colocar goma para vender. Além deste fator, ainda, existem os travessadores que por meio de lucros exorbitantes acabam por explorar a referida prática comercial artesanal dos quilombolas, já que esses não repassam a quantidade devida para tal desempenho, ou seja, os lucros exorbitante advindos de tal processo comercial, para os que realmente produzem. 197 07 HANNAH AREDNT E ROSA LUXEMBURGO: CONFABULAÇÕES SOBRE A AÇÃO POLÍTICA José Cleyton Neves Lopes Graduando em Ciências Sociais – UFRN Bolsista do Programa de Educação Tutorial (Resumo Expandido não disponibilizado pelo autor para publicação). 08 A TRADIÇÃO E A REPRESENTAÇÃO DA POLÍTICA NO MUNICÍPIO DE ANGICOS/RN Dalliva Stephani Eloi Paiva [email protected] Karla Danielle da Silva Souza [email protected] Esse trabalho é fruto de reflexões iniciais atribuídas em torno das disciplinas de graduação ―Oficina I de Métodos Qualitativos‖ e ―Planejamento de Pesquisa social‖ ofertadas na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Que em síntese busca a construção de objeto e a elaboração do projeto de pesquisa, através de métodos qualitativos de análise. Nessa perspectiva, a presente pesquisa foi realizada no município de Angicos/ RN que está localizado na região central do Rio Grande do Norte. Sendo mais um entre muitos que tem em suas raízes uma formação cultural relacionada às questões políticas. Desse modo, a cidade tem características próprias, por ser terra de conhecidos representantes políticos do estado, como também por possuir aspectos peculiares a uma cidade interiorana, tais como, exercício de poder de uma classe dominante, relação profunda com a tradição, troca de favores na esfera política. Nesse estudo, visamos a análise e a compreensão das relações que sedimentam a política partidária presente no município, mais especificamente, o Coronelismo. Buscando identificar as características da referida cidade, relacionando Coronelismo com a esfera pública e privada no que se refere às práticas locais. A referida pesquisa intitulada ―A Tradição e a Representação da Política no Município de Angicos/RN‖ tem como método de pesquisa o estudo de bibliografias como forma de compreensão e desenvolvimento da temática, dentro elas destaca-se Leal (1997), que aborda as questões pertinentes ao Coronelismo e suas formas de manifestação do poder privado. Mas que ao mesmo tempo, significa uma troca de favores entre o poder público em ascensão e os chefes locais, reciprocidade entre representantes e eleitores. Outro destaque é Goldman (2006), que faz uma análise acerca das relações entre eleitores e políticos, através de fatos do cotidiano. Acontecimentos que aparentam ser banais, mas que ele consegue traçar uma etnografia política do Brasil. E por fim, Palmeira e Barreira (2006), cujos estudos apresentam a idéia de que a vida política no país é constituída através das relações estabelecidas no espaço público da política. Dentro desses dois últimos autores, a idéia é analisar como o público e os privados se confundem, tanto 198 entre as famílias, como também no processo de construção de carreiras políticas e a procura por eleitores. O estudo também está sendo desenvolvido através da observação in loco da fala dos eleitores e políticos locais captadas através de entrevistas, como forma de se compreender como se dão as relações no que se refere à política local e discorrer a respeito da concepção dos eleitores e dos próprios políticos sobre Política, objetivando apreender todo o discurso ideológico que envolve todo esse processo. O que vem se observando ao longo desta pesquisa é que o cargo político é tido como um instrumento de poder. Assim, a questão do público e do privado muitas vezes se confundem. Pois o candidato eleito acredita que obteve um poder para usar em benefício próprio: em alguns casos ele tem um cargo público, que deveria visar o bem comum, mas que isso não ocorre. Exemplo que pode ser visto na construção de um espaço de lazer privado construído no município. Ou no próprio eleitor, que acredita que determinadas benfeitorias são provenientes da figura carismática do candidato, ao invés, de sua obrigação política. Torna-se importante destacar que a política partidária de Angicos não está ligada diretamente ao partido, mas sim, ao ―lado‖, que é definida pelas cores, uma linha que vem sendo seguida há muitos anos. Atualmente as principais disputas estão entre as cores vermelha e verde. Analisando a história local, pode-se afirmar que essa prática teve uma grande representatividade na época de Aluízio Aves (filho da terra), este introduziu no estado do Rio Grande do Norte uma forma de fazer política que predominou fortemente no interior e que perdura até os duas atuais, mesmo que não seja tão fortemente como antes. Sempre que há uma nova administração, o gestor muda as cores da maioria dos prédios públicos, de acordo com o ―lado‖ em que está. Fato que fica bastante evidente no prédio da prefeitura. Outra questão relevante diz respeito a uma certa prática coronelista. Destaca-se aqui que o Coronelismo não diz respeito ao observado durante a República Velha (1889-1930) que é analisado por Nunes Leal (2006), pois as práticas políticas tomam transformações ao longo do tempo e espaço, possuindo configurações específicas. De qualquer maneira, é possível observar no município de Angicos esse exercício político sob determinada forma, pois existe uma relação de poder ligada ao prestígio social intrinsecamente relacionada ao fator econômico. Nesse sentido, tem-se notado que a grande maioria das pessoas entrevistadas não está preocupada com o bem comum, no público ele vota em troca de emprego, de uma casa, de alimentos, ou qualquer outro tipo de ―auxílio‖. É então, que surge o espaço para que os representantes políticos façam uso das práticas coronelistas, das trocas de favores. Dessa forma, há uma falta de posicionamento crítico em relação à política por parte do eleitorado e um exercício de dominação por parte dos representantes políticos. Todas as informações aqui apresentadas consistem em reflexões prévias, por se tratar de um trabalho inicial. Mas ao longo dos dados obtidos, vemos que existe uma forte relação entre ocupação de um cargo político, aquisição de poder e troca de favores. Há por trás de toda essa prática, uma tentativa por parte dos dominantes de manter determinadas oligarquias no comando da política local. Ou seja, percebemos elementos constituintes do 199 coronelismo na configuração política no município aqui referenciado que ao longo da realização dessa pesquisa, poderão melhor ser aprofundados. REFERÊNCIAS GOLDMAN, Marcio. Como funciona a democracia: uma teoria etnográfica da política. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2006. LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997. 3º ed. PALMEIRA, Moacyr; BARREIRA, César (orgs.). Política no Brasil: visões de antropólogos. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2006. 09 EDUCAÇÃO ESPECIAL: UMA ANÁLISE PARCIAL DAS ESCOLAS PÚBLICAS DA CIDADE DE CAICÓ-RN Kelly Cristina Silva de Brito Graduanda em Ciências Sociais (UFRN) [email protected] Introdução: A ação educacional inclusiva visa à transformação de uma sociedade mais justa, valorizando a integração, indistintamente, de todos os cidadãos, e uma participação eqüitativa na melhoria das condições de vida. Ela envolve um processo com inúmeros impasses e resistências, relacionados a uma prática educacional historicamente segregacionista, geradora de exclusão, que, ao invés de buscar melhorias sociais insistia na discriminação e na exclusão de indivíduos com necessidades especiais (GOMES, 2005). Devido a essa forma de pensamento minimizado a sociedade tende a subjugar aqueles que não se enquadram na mesma perspectiva da maioria, visando essa reação foi criada e sancionada do art. 60 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que trata sobre a inclusão da educação especial nas instituições regulares de ensino. Tomando como base as noções básicas de educação que diz que toda criança deve freqüentar uma instituição regular de ensino, a adaptação destas para o recebimento de alunos com necessidade especiais se torna cada vez mais evidente. O Ministério da Educação orienta a organização dos sistemas educacionais inclusivos, que supera a organização de sistemas paralelos de educação especial, investindo na articulação entre a educação regular e a educação especial. A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, de 2008, traduz em seus objetivos e diretrizes essa orientação, ou seja, a garantia do acesso à escolarização na sala de aula comum do ensino regular e a oferta do atendimento educacional especializado complementar, aos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades / superdotação. (MEC/2008) Segundo o Ministério da Educação, a escola sujeita as adaptações para o recebimento desses alunos, devera se mostrar preparada, possuindo mais estrutura para o profissional e o desenvolvimento social dos alunos, tendo também acompanhamento de profissionais especializados atentos ao 200 atendimento de alunos e professores, por isso se vê necessário não somente uma adaptação do corpo acadêmico, mas também de toda a estrutura escolar, como está descrito no art. 60 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Baseada nesses dados, espera-se que a escola, ao oferecer oportunidades para alunos com necessidades especiais, informe-se e oriente-se com profissionais especializados da Educação e da Saúde sobre as especificidades e instrumentos adequados para que o aluno encontre ali um ambiente adequado e que lhe proporcione o maior e melhor aprendizado possível. (RAMOS E ALVES) Tendo essa política de protecionismo educacional o estudante com necessidades especiais vê uma nova forma de encarar o processo de ensino pedagógico, porem visando tornar a aplicação desse estudo mais claro e conciso, nos desapegando da teoria imposta pelo Ministério da Educação, voltaremos nossos olhares para a pratica do ensino nessas instituições, que segundo o decreto deveriam ter suas estrutura modificada para o recebimento dos alunos. A realidade vivenciada na cidade de Caicó – RN, onde tais mudanças e objetos de adequação do ensino não fazem parte da grande maioria das instituições de ensino lá existentes, carregando o estigma da falta, as escolas do interior do estado do Rio Grande do Norte, se mostram incapacitadas ate para receber os alunos regulares da rede de ensino, esquecida pelo programa de adequação do MEC, elas se mostram incapazes de adaptar sua grade curricular para o recebimento de alunos com necessidade de ensino especial. Baseando-se nos fatos apresentados nas instituições de ensino, as dificuldades de adaptação, formação de profissionais e estrutura do próprio prédio; percebe-se que a implantação desse projeto na realidade acadêmica é um pouco mais complexa do que a imposta pelo Ministério da educação, já que nela não estão apenas os alunos envolvidos, mas todos os profissionais que trabalham na área da educação. Com a aparente negligência educacional apresentadas por algumas escolas, elas se vêem incapazes de se adaptarem as normas do MEC que dizem respeito a educação especial, através da pesquisa campo, com caráter exploratório, pode-se enxergar as dificuldades enfrentadas pelas instituições de ensinos e sua coordenação, a má preparação dos docentes e a ineficácia da secretaria de educação na busca de melhoras da educação especial, são um dos fatores mais graves no defasamento do ensino. Justificativa: Segundo o MEC, a inclusão de alunos com necessidades especiais está sendo feita de modo que seja pensada não a deficiência do aluno, mas sim os espaços a serem ocupados por estes, tendo o todo o material desenvolvido voltado para sua educação, sendo este com direcionado para que o aluno dito como excluído seja integrado ao grupo como participante ativo das atividades acadêmicas. Na era em que as transformações das estruturas curriculares se mostram cada vez mais evidentes o ministério da educação transmite as escolas a missão de transformarem sua realidade caminhando assim para uma lado mais social, onde a escola deve se adaptar ao aluno, não o aluno a escola. 201 No Censo realizado pelo MEC em 2008, indicou que 54% dos alunos com deficiência já estavam matriculados na rede de ensino publica do país o que acabou ganhando destaque como uma forma de mostrar que os responsáveis pela escola buscam que esse complemento acadêmico. Esse processo que implica a luta pelo direito a diferença marcado pelos regimentos dirigidos as instituições de ensino, transforma a escola na principal ferramenta para a inclusão social. Fundamentada pela lei apresentada pelo ministério da educação e motivada por motivos de observação cognitiva, admito a devida importância direcionada para pratica da educação especial em alunos do ensino médio na cidade de Caicó, usando como objeto de estudos as três maiores instituições de ensino publico da cidade, a Escola Estadual Calpúrnia Caldas de Amorim; o Centro Educacional Jose Augusto e a Escola Estadual Antonio Aladim, sendo estás referencia em ensino publico na cidade de Caicó, será observado a estrutura da escola, os pontos principais abordados em seu projeto político pedagógico e se este detém de alguma forma uma mobilização para as melhoras de acessibilidade e implantação da lei. Recorrente a esta analise, será realizada uma visita a secretaria de educação referente as escolas da cidade onde respostas mais esclarecedoras referente a questão da educação para jovens com necessidades especiais. Partindo da idéia que o processo de educação e adaptação dos órgãos escolares se torna algo de suam importância para o meio acadêmico, trago de forma serie e sucinta a seguinte questão, por que no interior do estado do Rio Grande do Norte a adaptação do estudo para jovens com necessidade especiais ainda se encontra em estagio de experimento, ate então por dados levantados nas referidas escolas, entre elas existem poucos profissionais preparados para realizar a referida demanda. Tomando como base esses principais questionamentos, procuraremos não agir de forma investigativa, mas buscas nessa determinada região do estado a realidade vivenciada pelas instituições de ensino. Metodologia: Para efetivação dos objetivos propostos, a pesquisa será realizada através de estudo descritivo exploratório de método quantitativo e qualitativo, o qual as formas de abordagem será realizada nas escolas sobre o ensino da educação especial em alunos de ensino médio. Para alcançar o objetivo proposto serão realizadas visitas aos respectivos campos de ensino, nas escolas citadas no projeto, onde haverá não só um levantamento base da estrutura apresentada pela escola para atender alunos com necessidades especiais, como também apresentará as principais dificuldades que esta encontra para conseguir incluir esse tipo de adequação na grade curricular. Com o material recolhido será analisado sob metodologia quantitativa e qualitativa para serem apresentados em forma de tabelas e de forma descritiva. Conclusão: Constatamos em analises preliminares que 54% dos alunos já estavam matriculados na rede publica do país. Consideramos a luta pelo direito a diferença marcado pelos regimentos dirigidos as instituições de ensino, transforma a escola na principal ferramenta para a inclusão social. Fundamentada pela lei percebemos indícios avanços na pratica de inclusão 202 na educação especial na cidade de Caicó, especificamente em três maiores instituições de ensino médio, a Escola Estadual Calpúrnia Caldas de Amorim; o Centro Educacional Jose Augusto e a Escola Estadual Antonio Aladim. REFERENCIAS CANDAU, V.M. Direitos humanos, educação e interculturalidade as tensões entre igualdade e diferença, São Paulo, 1996. CARNEIRO, C. T.; MARQUES, L. P.; ANDRADE, J. S.; MARTINS, N. T.; GONÇALVES, R. M. Analisando as pesquisas em educação especial no Brasil. Disponível em: GOMES, C. Necessidades educacionais especiais: concordância de professores quanto à inclusão escolar. Temas sobre Desenvolvimento, São Paulo, v. 14, n. 79, p. 23-31, 2005. LIMA, P.A. Educação inclusiva e igualdade social. São Paulo: Avercamp, 2006. MENDES, E. G.; ALMEIDA, M. A.; WILLIAMS, L. C. A. (Org.) Temas em educação especial: avanços recentes. São Carlos: EdUFSCar, 2004. PADILHA, A. M. L. Práticas educativas: Perspectivas que se abrem para a Educação Especial. Disponível em: RAMOS, A. S.; ALVES, L. M. A fonoaudiologia na relação entre escolas regulares de ensino fundamental. Disponível em: 10 A ESTRELA DO SERTÃO: O feminino encontrado em Macabéa Kenia Almeida Nunes(UFRN) ―O que é ser um homem? O que é ser uma mulher?‖ (GIDDENS, 2005, p. 102). As mudanças que são colocadas ao sexo se deparam com algumas complicações, devido às diferenças sexuais terem uma grande influência sobre a vida dos indivíduos, onde normalmente sequer percebe-se, pois essa influência se configura em pequenas ações que ocorrem no desenrolar cotidiano. ―Socialmente reproduzimos - fazemos e refazemos - o gênero em milhares de pequenas ações no decorrer da vida‖ (2005, p.102), e assim fazendo com que se produza e reproduza uma verdade tida como única sobre o sexo e consequentemente sobre o gênero, categoria esta que paira sobre a visão de produto do que se diz que o sexo é. Essa ―verdade‖ de que existem dois corpos diferentes radicalmente e, que devido a isto as explicações acerca dos comportamentos dos gêneros serem diferentes estarem nesses corpos, necessitou empreender uma luta contra outra visão sobre os corpos na renascença, o isomorfismo. O isomorfismo pregava a existência de um único corpo, ou seja, o corpo da mulher era igual ao corpo do homem, concebendo dessa forma a vagina como sendo um pênis invertido, com isso a idéia central desse modelo era de continuidade entre os sexos e não de oposição. Havia um único sexo e pelo menos dois sexos sociais com direitos e obrigações distintos. E, a partir disso temos na concepção de Berenice Bento: 203 Antes de nascer o corpo já está inscrito em um campo discursivo determinado. Ainda quando se é uma ‗promessa‘, um devir, há um conjunto de expectativas estruturadas numa complexa rede de pressuposições sobre comportamentos, gostos e subjetividades que acabam por antecipar o efeito que se supunha causar (BENTO, 2006, p. 87). A história do corpo não pode ser separada ou deslocada dos dispositivos de construções do biopoder. O corpo é um texto socialmente construído, um arquivo vivo da história do processo de produção-reprodução sexual (BENTO, 2006, p. 87). Autores como Judith Butler (2003) e Berenice Bento (2006) travam uma discussão sobre as relações de gênero buscando demonstrar que não há uma categoria de mulher homogenia e estável. Ora, a cultura que cria em conjunto com as manifestações e ações dos sujeitos é passível de mudanças, e o gênero que é construído e mantido pala cultura também se configura em ser maleável, sendo que toda e qualquer estrutura construída culturalmente só é passível de mudanças no momento que os sujeitos as questione e lute para que ocorram mudanças. A categoria mulher não representa o que alguém é, pois dentro dessa categoria há outras noções constitutivas pelas estruturas como raça, classe, religião, etnia. ―Resulta que se tornou impossível separar a noção de ‗gênero‘ das interseções políticas e culturais em que invariavelmente ela é produzida e mantida‖ (BUTLER, 2003, p. 20). São as estruturas como raça, classe, etnia, religião dentre outras, que produzem novas noções do que é ser mulher, em outras palavras, a idéia de mulher não é algo para ser pensado de forma generalizante. E, embora se questione determinadas ações dentro do que é mulher, há construções fortes, que agem como uma marca, como algo natural. Essa é uma visão decorrente da incorporação de um habitus construído sobre alicerces fortes para não serem quebrados tão facilmente (BOURDIEU, 2003). ―A construção da identidade de gênero é um processo de longa e ininterrupta duração‖ (BENTO, 2006, p. 95). Isso ocorre em primeiro caso através da estruturação das disposições duráveis (porque é anterior ao indivíduo e não construído por ele) na socialização primária, o que Bourdieu denominará de habitus. Vejam-se: Ainda que Bourdieu ao propor o conceito de habitus não o faça vinculando-o diretamente à produção de gênero, parece-me possível falar de um ‗habitus de gênero‘, construído na socialização primária, encontrará nas instituições familiares, escolares e religiosas os responsáveis por este processo de reprodução das verdades que, pouco a pouco, vão se naturalizando e sendo incorporadas (BENTO, 2006, p.96). A mulher traz em si uma longa história de obstruções e repressão diante de pensamentos conflitantes, que se emaranham para além do ―que é ser mulher‖ . Dessa maneira, a mulher não é uma categoria generalizante, a mulher são categorias que se fixam e se fundamentam a partir das relações sociais. Em outras palavras, é no desenrolar e na ação em determinadas situações que a idéia de mulher foi sendo construída. É a partir dessa idéia diversificada do que é ser mulher, que esse trabalho se dará. Será através de uma relação de análise entre a Sociologia e a Literatura, que se tentará fazer uma investigação teórica e bibliográfica. Para isso será utilizado a obra 204 literária A hora da estrela de Clarice Lispector, no intuito de trabalhar sobre a construção do feminino do sertão nordestino, já que ela se utiliza da personagem de Macabéa como um retrato de uma visão de mulher nordestina, a qual por muitas vezes se encontra incorporada em diversos discursos propagados pela mídia falada e escrita, o que acaba se fixando nas mentes daqueles que pensam o sertão nordestino. A obra literária A hora da estrela de Clarice Lispector deixa aos olhos e ouvidos de quem a lê uma imagem da mulher presente no sertão nordestino. Fazendo surgi dessa maneira, questões a serem pensadas, verificadas e dissertadas sobre essa imagem percebida na obra. Então, de que forma se apresenta a construção da personagem Macabéa no livro? Qual a relação entre espaço (Nordeste) e gênero na produção da imagem feminina presente no sertão nordestino, representado na obra? Ora, a categoria gênero é fonte de uma série de difusões de idéias que produzem o que é ser homem e o que é ser mulher. E nesse emaranhado de idéias há também uma série de outras construções que incidem sobre cada um dos gêneros, sendo que essas construções que se fixam nos corpos através de uma longa história, são tratadas aqui como uma produção do feminino através da relação entre espaço e gênero, ou seja, a mulher sertaneja é pensada como produto do esquadrinhamento que o espaço e o gênero em conjunto produzem, construindo corpos homens e corpos mulheres com base em categorias espaciais, como por exemplo, o sertão nordestino, que será aqui tratado como um espaço de construção de uma realidade de gênero, o feminino sertanejo. Sendo visto o feminino sertanejo presente na personagem Macabéa, sob diversos ângulos, apresentando-se na seguinte hipótese: como produto de seu encontro ou da relação como um outro. E esse outro se apresenta no livro através de dois personagens, a Glória (loira, farta de carnes, carioca e etc.) o avesso de Macabéa (pobre, feia, amarela, ―assexuada‖, analfabeta, nordestina e etc.), aquela é vista como a mulher moderna e urbana e, a Macabéa personagem sertaneja pensada como o outro da personagem carioca Glória. Ou ainda, Macabéa como o outro do macho, transfigurado no personagem de Olímpico, um homem brabo do sertão da Paraíba. ―Olímpico era macho de briga‖, e Macabéa é produto inverso da força masculina sertaneja, o que lhe dá status de mulher submissa em relação ao homem detentor da força que protege aquela que é passível de proteção. O principal problema desse trabalho está na forma como é produzida essa imagem de feminino no sertão nordestino, uma construção que mantém relação direta com as categorias espaciais, que em conjunto com as categorias de gênero produzem uma idéia de feminino presente no sertão nordestino dentro da obra literária. Afinal, o Nordeste é uma invenção (ALBUQUERQUE JÚNIOR, 1999), e sendo assim a mulher do sertão nordestino também o é? E como pensar essa invenção? O Nordeste não representa uma existência natural, algo que sempre existiu da forma como se concebe, na verdade existe toda uma série de discursos políticos por trás dessa idéia que paira no senso comum. O Nordeste é uma construção social, logo não está situado fora da sociedade e, nem muito menos é um acontecimento que ocorre ou se encontra fora da história. A noção de região é sempre ligada diretamente a uma divisão natural de espaço, mas embora aja essa concepção bem fundada nas 205 mentes, é necessário pensar que região está diretamente ligada às relações de poder, pois a visão estratégica desse espaço leva a um recorte analítico que envia o sujeito a um espaço sob o domínio de um discurso que comanda todo o pensamento, ou seja, o esquadrinhamento do espaço produz certo tipo de saber. Dessa forma, o Nordeste faz parte de um campo de discurso que o aprisiona como um espaço que produz relações afetivas com maior intensidade, e que também se encontra às margens da influência do capitalismo, pois nesse discurso ele é fundado em experiências précapitalistas. A ―região nos põe diante de uma política de saber, de recorte espacial das relações de poder‖ (ALBUQUERQUE JÚNIOR, 1999, p.25). E é em paralelo a essa visão de Nordeste construído, inventado que se põe a visão do feminino aqui exposto a ser pesquisado e estudado teoricamente. Em o livro A hora da estrela, a personagem Macabéa respira e transpira uma visão de mulher do sertão nordestino: pobre, feia, suja, analfabeta, submissa, amarela, ―assexuada‖ dentre outras características, as quais nem ela mesma sabia, mas que a coloca sem encanto, infeliz, incompetente. Ela não era uma flor, ela era capim. Desse entrelaçamento de características doado e fixado nos corpos e nas mentes daqueles que pensam sobre o Nordeste e sobre a nordestina através do esquadrinhamento do pensamento, é que parte esse trabalho, como o objetivo de pensar sobre os poderes que constrói essa imagem do feminino no sertão nordestino, desnaturalizando-a, problematizando a sua invenção através da Literatura, representada aqui como um discurso produtor de realidade e, ao mesmo tempo produzidos em determinadas condições históricas. O que me interessa com esse trabalho sobre a idéia de mulher nordestina fixada no sertão é entender como funcionam e a serviço de que relações de poder se produzem essa imagem do feminino. Não se trata de buscar uma verdadeira representação do que é a mulher nordestina, mas tentar entender a produção dessa mulher, que se encontra no sertão nordestino, e como ela funciona, seja dentro ou fora de suas fronteiras. 11 - CAPACITAÇÃO DE RECURSOS HUMANOS NA SESAP/RN Raimunda de Medeiros Germano e-mail: [email protected] Lenina Lopes Soares Silva e-mail: lenina @natal.digi.com.br Thalita da Silva Costa e-mail: [email protected] Introdução: O desenvolvimento tecnológico e a irrupção de doenças epidêmicas têm exigido da administração pública, especialmente em países como o Brasil, investimentos em políticas públicas de saúde. Estas políticas muitas vezes efetivadas em forma de campanhas sazonais tentam minimizar os impactos das transformações sociais e econômicas ocorridas nas sociedades, em particular a demanda por atendimento e melhorias no 206 campo da saúde, intensificadas pela divisão social e técnica no mundo do trabalho e pela crescente incorporação de tecnologias sofisticadas no atendimento da saúde. Tudo isto, vindo aliado à diversificação e à especialização dos profissionais dos serviços da saúde, tem provocado preocupações em relação aos recursos humanos, no tocante não apenas ao treinamento e aperfeiçoamento de servidores da área, mas também à preparação e formação permanente. Todas essas transformações são geradoras de necessidades que requerem profissionais cada vez mais capacitados e preparados para lidar com novos instrumentos técnicos e tecnológicos. Este trabalho resulta de um estudo diagnóstico das capacitações, cursos e eventos promovidos, organizados e apoiados pela Secretaria de Estado da Saúde Pública do Estado do Rio Grande do Norte (SESAP/RN), no ano de 2006, bem como das participações de seus profissionais em eventos e cursos. O estudo integra a Agenda de Pesquisas do Observatório de Recursos Humanos em Saúde, do Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (NESC/UFRN) e foi desenvolvido por pesquisadores vinculados ao NESC. No sentido de atender ao objetivo fundamental do estudo buscou-se mapear as informações, no sentido de fornecer dados para a implementação de uma política de capacitação de recursos humanos na área da saúde. Os estudos preliminares apontaram para que se questionasse sobre a fragilidade gerada pela falta de uma política de capacitação de recursos humanos em saúde, na SESAP/RN e também sobre a não existência de um plano institucional de capacitação de pessoal colaborando para a promoção de capacitações de forma fragmentada e pontual? A pesquisa desenvolveuse através de estudos sobre capacitação de recursos humanos em saúde, em Santana (2006); Castro (2006; 2007); Cavalcante (2007); Ceccim (2005) e Castro e Santana (1999) entre outros. A análise documental e reuniões na Coordenação de Recursos Humanos da SESAP/RN, de julho a dezembro de 2007, bem como uma coleta de dados na SESAP/RN sobre eventos e cursos formaram a base empírica da pesquisa. Os dados foram tratados quali/quantitativamente e foram discutidos à luz dos estudos que fundamentaram o projeto. Resultados e Discussões: Os resultados apontam as áreas nas quais houve maior e menor concentração e participação de profissionais em eventos, sinalizando para a emergência de um plano institucional de capacitação efetivo e contínuo de recursos humanos na SESAP/RN. Recomenda-se observar, no entanto, que na capacitação de recursos humanos de saúde são inseridos aspectos diversificados de natureza social, cultural, técnica, científica e tecnológica para a inserção dos servidores às novas necessidades institucionais e administrativas de acordo com a literatura consultada. Sendo assim, sugere-se que os planos e políticas 207 devem ser projetados tendo como parâmetro o avanço na formação dos profissionais de todos os níveis de escolaridade, objetivando-se não apenas a capacitação, mas formação avançada, treino e aperfeiçoamento qualificados em nível superior e médio. Assim, no Brasil nos últimos anos, algumas políticas governamentais de incentivo à formação profissional em saúde vêm se destacando, dentre as quais o Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (PROFAE) que foi implantado entre 1999-2000 e a Política de Educação e Desenvolvimento para o SUS: caminhos para a Educação Permanente, em 2003 (BRASIL, 2006). Esta última visa implementar estratégias de formação, atenção, gestão, formulação de políticas e participação da sociedade nas decisões do setor saúde, intensificando a formação dos profissionais dos serviços de saúde através de práticas de ensino e de aprendizagem direcionadas ao atendimento público em saúde. Observa-se que a SESAP/RN tem participado ativamente dessa Política. O Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES), a Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (ABRASCO), a Associação Brasileira de Economia da Saúde (ABRES), a Rede UNIDA e a Associação Nacional do Ministério Público de Defesa da Saúde (AMPASA), em 2005, manifestando o compromisso pela saúde dos brasileiros reafirmaram seus compromissos em defesa de ―uma agenda renovada e ampliada de mobilização social, política e institucional pelos direitos fundamentais e pela Saúde dos brasileiros.‖ Há no Manifesto, no item VI uma expressa preocupação com a capacitação de pessoal conforme o que preconiza a Reforma Sanitária Brasileira. Hoje, mais do que nunca, é necessário resgatar os conceitos de ‗servidor público‘ e de ‗serviço público‘, desgastados nos anos 90, para alargar e fortalecer as bases sociais do SUS. Urge o estabelecimento de Plano de Carreira e de Cargos e Salários para o SUS, com administração descentralizada e incentivos inversamente proporcionais às vulnerabilidades sociais; multiplicação das oportunidades de capacitação, progressão funcional e educação permanente; proteção social do trabalho e regulação dos vínculos laborais, eliminando todas as formas precárias de emprego; adequação do aparelho formador e regulação pública das especialidades a partir das necessidades de saúde da população e do SUS; estabelecimento de modalidades de cooperação entre trabalho profissional em saúde e ações de entidades privadas não lucrativas, de caráter publico e sob controle da direção do SUS e da sociedade civil, em benefício da população, buscando por todos os meios evitar a desvinculação e precarização ocupacional. (BOLETIM INFORMATIVO DA REDE UNIDA Nº 52, 13/112/2005, grifo dos autores). 208 Isto reforça o previsto na Constituição Brasileira de 1988: saúde como direito numa perspectiva valorativa de atendimento público e estatal à cidadania; consagrado na criação do Sistema Único de Saúde (SUS) e na legislação que o regulamenta, bem como, nas políticas públicas para sua implementação. É o caso da Política Nacional de Saúde atual que propõe dentre outras diretrizes a capacitação dos diversos seguimentos que compõem o SUS dentre os quais as Secretarias Estaduais de Saúde. Desse modo, a partir dos achados deste estudo a SESAR/RN poderá iniciar a implantação de uma política de capacitação para seus profissionais sedimentada em dados concretos como aqueles que apontam os níveis de escolarização de seus servidores sinalizados na pesquisa. Considerações Finais: Ressalta-se que, da maneira como são implementadas as capacitações na SESAP/RN são pouco resolutivas, colaborando para que sejam promovidos e financiados eventos e cursos que pouco contribuem para melhoria da formação dos profissionais e do atendimento à saúde da população. Aponta-se para a emergência da criação de um plano de capacitação de pessoal ao mesmo tempo em que, fornece informações relevantes para a implementação de uma política de capacitação de recursos humanos na SESAP/RN. REFERÊNCIAS BRASIL. Diretrizes operacionais dos Pactos pela Vida, em defesa do SUS e de Gestão. Ministério da Saúde, Secretaria Executiva, Departamento de Apoio à Descentralização, Coordenação-Geral de Apoio à Gestão Descentralizada. – Brasília, 2006. BRASIL, Ministério da Saúde. Secretaria de gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Cadernos RH Saúde. – v. 3, n. 1 (mar. 2006),m Brasília: Ministério da Saúde, 2006. CASTRO, Janete Lima de; FORMIGA, Jacinta Maria Moraes Formiga; VILAR, Rosana Lúcia Alves de (Orgs.). Política e gestão em saúde: reflexões e estudo. Natal: Observatório RH NESC/ UFRN, 2006. CASTRO, Janete Lima de; SANATANA, José Paranaguá de (Orgs.). Capacitação em Desenvolvimento de Recursos Humanos de Saúde – CADRHU. Natal: EDUFRN, 1999. CASTRO, Janete Lima de (Org.) Gestão do trabalho no SUS: entre o visível e o oculto. Natal: Observatório RH NESC/UFRN, 2007. CAVALCANTE, Elisângela Franco de Oliveira. A educação no processo de trabalho de enfermagem: o caso do hospital de ensino – Natal, RN. 99f. Dissertação (Mestrado): Departamento de enfermagem – Programa de PósGraduação em enfermagem: Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2007. 209 CECCIM, Ricardo Burg. Educação permanente em saúde: um desafio ambicioso e necessário. Revista Interface comunicação, saúde, educação, v.9, n. 16 p.161-17, set. 2004/fev.2005. REDE UNIDA: www.redeunida.org.br/inrede/inreden54. SANTANA, José Paranaguá de. A função de desenvolvimento de recursos humanos do INAMPS/MPAS. Cadernos RH Saúde. – v. 2, n. 1 (0ut.dez. 1986), Rio de Janeiro: Ministério da Saúde, 2006. 12 O CONCEITO DE DEMOCRACIA COMO VALOR UNIVERSAL NA OBRA DE CARLOS NELSON COUTINHO Leonardo Guedes Lins(UFRN) (Resumo Expandido não disponibilizado pelo autor para publicação) 13 A IMAGEM DO OUTRO: o consumo da revista Contigo! pelo público feminino Marlla Suéllen de Melo Dantas (UFRN) (Resumo Expandido não disponibilizado pela autora para publicação). 14 PROSTITUIÇÃO MASCULINA: As relações afetivo-sexuais entre michês e suas clientes na cidade de Natal Mikelly Gomes da Silva (Graduanda Ciências Sociais-UFRN/bolsista PET) A cidade de Natal, capital do Rio Grande do Norte, de lindas praias e noites confortáveis é uma das principais atrações turística nordestina, o fluxo de pessoas a passeio por Natal é alto, férias, carnaval enfim a cidade é boa para quem quer descansar assim como para quem procura diversão. Pesquisas e reportagens apontam o sexo como um elemento inerente a atividade turística, mas atividade sexual na cidade não se restringe a população flutuante. A prostituição masculina embora mais velada que a feminina se faz presente na cidade, bares, boates, saunas entre outros são encontrados em jornais e publicidades na internet como território definidos para socialização de homens e mulheres que procuram pelo serviço. Mas o que é prostituição? A prostituição é normalmente chamada da mais antiga profissão do mundo ―Comércio habitual das relações sexuais; uso degradante do corpo; 210 desmoralizar; sacrificar a sua honra‖ (AMORA, 1998). Enfim, consiste em oferecer prazer sexual em troca de remuneração, porém, o termo tem mudado, agora chamamos de mercado do sexo, e nesse ―jogo‖ de prazeres nem sempre o dinheiro é a moeda de ―troca‖, hoje mediadas por trocas simbólico-materiais. A prostituição como vimos nasce com o surgimento das grandes cidades, o modelo judaico-cristão de família monogâmica e do conceito de normalização da fidelidade. É na figura da prostituta onde a sexualidade insubmissa pode acontecer associada às representações da impureza, da sujeira sexual, ―Boca de Lixo‖ , e é nestes locais onde homens vivem os prazeres irrealizáveis, as fantasias e desejos ―proibidos‖ no território do lar. E a mulher onde os seus desejos são realizados? O sexo na sociedade moderna sofre sanções, vive sobre o encalce da punição dos corpos e sob vigilância da sociedade, e é neste quadro que a prostituição o ―prazer pago‖ sucinta degradação e desmoralização. O sexo e a sexualidade têm sido bruscamente vigiados, censurados e reprimidos pela sociedade moderna, segundo Foucault (1998) a sociedade capitalista tem imprimido uma vontade de saber sobre a sexualidade, como instrumento fundamental de controle do indivíduo. Produz uma sexualidade não apenas ―normal‖ heterossexual, familiar, mas figura do desviante sexual seja ele mastubador, pervertido, homossexual ou garoto de programa/michê/prostituto. O sociólogo francês Pierre Bourdieu, em sua obra ―A dominação masculina‖, deixa claro como o comércio do sexo continua a ser estigmatizado, tanto na consciência comum quanto no Direito, que literalmente excluí que as mulheres possam escolher dedicar-se à prostituição como um trabalho. ―Ao fazer intervir o dinheiro, certo erotismo masculino associa a busca do gozo ao exercício brutal do poder sobre os corpos reduzidos ao estado de objetos e ao sacrilégio (...)‖ (BOURDIEU, 2003, p.26). Mas, se as mulheres são excluídas do direito de escolher e dedicar-se à prostituição como trabalho, o que dizer quando são elas a procurarem por este serviço? Como diz Bourdieu, a divisão entre os sexos parece estar ―na ordem das coisas‖, como se diz por vezes para falar do que é normal, natural, a ponto de ser inevitável. Mas no universo masculino sua virilidade é colocada à prova em ―bons momentos‖, uma armadilha que encontra sua contrapartida na tensão e contensão permanentes que impõem uma afirmação em toda e qualquer circunstância, na medida em que ele tem um coletivo submetendo-se às exigências permanentes na ordem simbólica, na realidade um ideal. A virilidade compreendida como capacidade reprodutiva, sexual e social, e também como capacidade ao combate e ao exercício da violência. Baby! 211 Dê-me o seu dinheiro que eu quero viver Dê-me seu relógio que quero saber Quanto tempo falta para lhe esquecer Quanto vale um homem para amar você Minha profissão é suja e vulgar Quero pagamento para me deitar Junto de você estrangular o meu riso Dê-me seu amor que dele não preciso... (Garoto de aluguel- Zé Ramalho) Durante muito tempo a atividade sexual foi limitada discursivamente a função reprodutiva. Na modernidade o sexo deixa de ter como função eminente a reprodução da espécie para se tornar fonte de prazer que envolve sentidos antes ignorados como gostos, afetos, sonhos, gestos, humor, tristezas enfim fantasias e desejos antes reprimidos pela sociedade. O interesse pelo seguinte tema, prostituição masculina, surgiu após assistir ao evento denominado ―Semana de gênero, sexualidade, identidade e homossexualidade‖ realizado pela base de pesquisa Gênero e Sexualidade, coordenada pelo professor Carlos Guilherme do Valle, na UFRN no início do ano de 2008, onde as expositoras em comum consenso abordaram o turismo sexual e prostituição sob discurso feminino. A fim de identificar o perfil destas mulheres e os motivos pelos quais levaram a esta função/ profissão. Então me veio à pergunta, e o homem não faz parte deste universo? O homem só se serve desta mulher (prostituta), ou também é servido enquanto prostituto? Senti falta da academia a qual pertenço o interesse pela pesquisa do tema, diante desta ausência decidi percorrer este universo masculino tão pouco explorado. Diante disto, se faz necessário identificar as representações que a prostituição masculina suscita a partir das seguintes perguntas: Quem são esses prostitutos? O que o levou fazer do seu corpo objeto de trabalho sexual? Necessidade (física, biológica, financeira), prazer (físico psíquico) ou desejo (imaginação, simbolização). Para que com essas possa identificar o perfil destes homens. O estudo propõe aprofundar a compreensão sobre as relações afetivosexuais estabelecidas entre esses agentes no contexto do mercado do sexo na cidade de Natal. O corpo e as relações sexuais como fato sociológico do produto sexual. A temática gênero é muito abrangente, se faz necessário um recorte, inclusive metodológico, os trabalhos sobre prostituição parecem sempre apresentasse através do discurso feminino, como se esta fosse uma prática absolutamente feminina,e quando se fala em prostituição masculina tendese a pensar no corpo masculino através dos travestis (VITELLO,2001). Mas homens também usam os seus corpos como ―mercadoria‖, eles também 212 recorrem ao financeiro, psíquico, o prazer, o simbólico para que os outros usufruam do seu corpo. O trabalho trará um olhar etnográfico em especial, idas a campo para observação de perfil físico tanto de homens quanto de mulheres, mas quando se procura traçar o perfil, revelar uma construção do masculino se faz necessário delimitar uma proposta teórica para que possamos através dela ter fundamentos para averiguar como esse ato (prostituição) é significado por eles. Autores como Perlongher e Parker se mostram interessantes a medida que estudam a cultura sexual, a prostituição em suas variáveis, corpo, prazer, ―sexo pago‖. Perlongher (1987) traz sobretudo a imagem do prostituto viril para diferenciar esta variante de prestação de serviços sexuais em troca de uma retribuição econômica, de outras formas vizinhas de prostituição homossexual, tanto da exercida pelo travesti, quanto de outros dois gêneros francamente minoritários: homossexual efeminado que vende o seu corpo (chamado michê-bicha) e um tipo de transição, que parece estar emergindo ainda timidamente: o michê-gay. O termo michê tem dos sentidos. Um alude ao ato mesmo de se prostituir, sejam quais forem os sujeitos desse contrato... Numa segunda acepção, o temo michê é usado para denominar uma espécie sui generis de cultores da prostituição: varões geralmente jovens que se prostituem sem abdicar dos protótipos gestuais e discursivos da masculinidade em sua apresentação perante o cliente. (PERLONGHER, 1987, p.17). A partir de Michel Foucault (1998), identificamos a sexualidade como controladora do indivíduo e a priori é sob esta perspectiva que ele se fará presente na pesquisa, trará todo o arcabouço histórico da história da sexualidade identificando como os prazeres sexuais e a busca por um verdadeiro sexo, um sexo absoluto caminhou até o presente século. A atividade sexual como objeto de uma preocupação moral, o indivíduo sendo levado a se reconhecer como um sujeito moral da conduta sexual. Foucault analisa as práticas pelas quais os indivíduos foram levados a prestar atenção a eles próprios, a se decifrar se conhecer e confessar-se como sujeitos de desejos, onde possam descobrir no desejo a verdade do seu ser. O indivíduo, durante muito tempo, foi autenticado pela referência dos outros e pela manifestação de seu vínculo com outrem ( família, lealdade, proteção) ; posterior passou a ser autenticado pelo discurso de verdade que era capaz de ( ou obrigado a) ter sobre si mesmo. A confissão da verdade se inscreveu no cerne dos procedimentos individualização do poder. (FOUCAULT, 1988, p. 67). Em Badinter (1993) será atribuído a pesquisa uma perspectiva relacional. Ela trará para a pesquisa um olhar sob a identidade masculina, respondendo que homem é esse, a fim de trazer embates teóricos da ―crise do masculino‖, recorrerei a autora para identificar como a identidade de gênero interfere nos 213 efeitos da representação da prostituição. Assim como em Giddens (1993) o tipo de sentimento que estes homens têm a oferecer as suas clientes intercalando ou identificando estes sentimentos com os modelos de homens que Badinter vai nos oferecer. Pretendo também trabalhar com Francisca Souza Ilnar, ―O cliente: o outro lado da prostituição‖, para incorporar na pesquisa os discursos deste cliente sob análise prévia do discurso do michê. Desta forma a pesquisa pretende identificar os motivos pelos quais esses homens disponibilizam o seu corpo para práticas sexuais, a fim de analisar quais as relações afetivo-sexuais estabelecidas entre estes e suas clientes com objetivo de identificar o perfil destes agentes, refletindo que ao construir-se a masculinidade a partir das práticas dos michês constrói-se também (uma nova) feminilidade. REFERÊNCIAS BADINTER, E. XY: Sobre a identidade masculina. Tradução Maria Ignez Duque Estrada. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993. FOUCALT, Michel. História da sexualidade I: a vontade de saber, tradução de Maria Thereza da Costa e J. A. Guilhon Albuquerque. Rio de Janeiro: Graal, 1998. ________. História da sexualidade 2: o uso dos prazeres, tradução de Maria Thereza da Costa e J. A. Guilhon Albuquerque. Rio de Janeiro: Graal, 1984 GIDDENS, Anthony. A transformação da intimidade. Tradução de Magda Lopes. São Paulo: EDUNESP, 1993. PARKER, R. Corpos, prazeres e paixões: A cultura sexual no Brasil contemporâneo. São Paulo: Best Seller, 1991. PERLONGHER, Nestor. O negócio do michê: a prostituição viril em São Paulo. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1987. SOUZA, Francisca Ilnar de. O cliente: outro lado da prostituição. Fortaleza: Secretária da Cultura e do Desporto, 1998. 15 CAUSAS SOCIAIS DO NOVO MARRANISMO Nestor Medeiros Filgueira Burlamaqui Bacharel em Comunicação Social (UFRN) Mestrando (aluno especial) do PPGCS-UFRN. Em 1497 os judeus portugueses foram convertidos ao catolicismo, à força, por um decreto real, como forma de tornar todo Portugal cristão, uma política imposta pela coroa espanhola. Os judeus, inclusive, foram impedidos de saírem do reino, sendo os portos fechados na ocasião, pois a saída de 214 tantos judeus de Portugal acarretaria um colapso econômico sério; e a conversão forçada, juntamente com o fechamento dos portos resolveu essa questão política entre Portugal e Espanha. A maioria desses judeus (a partir de então conhecidos como cristão-novos), seria obrigada a freqüentar igrejas e praticar demais atos cristãos, pois, ao serem batizados, mesmo que forçadamente, teriam que cumprir as conseqüências desse batismo sob pena de serem denunciados para a inquisição. Dessa forma, tais pessoas passaram a ter um comportamento duplo, com uma vida privada, e secreta, judaica e outra pública cristã. Iam à igreja, mas em casa recitavam as bênçãos hebraicas. O fato é que muitos dos descendentes desses judeus conseguiram finalmente sair de Portugal, e da rigidez inquisitorial, chegando ao Brasil, e ajudando no processo de colonização do país logo nos primeiros anos do século XVI. Atualmente, mais de quinhentos anos após a conversão forçada dos judeus ao catolicismo, algumas pessoas estão atualmente se reaproximando do judaísmo como uma forma de adquirir a religião e a cultura de seus antepassados judeus que foi esquecida, ao menos parcialmente, com o passar dos séculos. Desde o início da historiografia do Brasil os pesquisadores já sabiam a respeito da vinda dos cristão-novos portugueses ao Brasil durante o período colonial, mas somente após recentes pesquisas antropológicas – inclusive no Rio Grande do Norte – é que eles começaram a constatar a existência de indivíduos que ainda praticavam vestígios de uma cultura judaica, mas que não sabiam a respeito dessa origem. A princípio, poderia se deduzir que a divulgação da ―nova origem‖ – proporcionada por essas pesquisas recentes, aliadas ao poder de divulgação de informações exercido pelos atuais meios de comunicação de massa - fez com que o interesse sobre o assunto surgisse em algumas pessoas, mesmo naquelas sem uma família com vestígios judaicos evidentes. Porém, tais dados não explicam satisfatoriamente a existência desse comportamento atual de aquisição de uma identidade judaica, ou do que chamaremos aqui de novo marranismo. Afinal, saber que se descende de judeus – mesmo que a plena certeza de tal situação nem sempre seja possível – não significa que alguém irá querer tornar-se um deles. Mesmo assim, eles clamam serem judeus ao mesmo tempo em que evitam uma conversão formal junto às instituições judaicas oficiais, pois suas famílias teriam carregado tal condição através dos séculos. Alguns trabalhos tentaram elaborar uma explicação sobre o fenômeno, mas se limitaram a relatá-lo sem pretensões de análises e, quando muito, abordaram o pano de fundo histórico do marranismo sem aprofundar-se em relação às suas causas sociais nos dias atuais. Logo, o objeto de nossa pesquisa é justamente a análise das causas atuais de ordem social. Para realizar tal empreendimento, primeiramente verificaremos, com base em pesquisa bibliográfica e por meio de questionário, o que chamaríamos de identidade atual dessas pessoas ou, em outros termos, qual sua autoimagem. Em seguida, analisaremos, usando o mesmo método, que tipo de identidade judaica é essa que tais pessoas estão procurando, de forma a realizar comparações entre as duas, pois esse tipo de atitude pode representar um inconformismo em relação à sua atual situação diante da sociedade ou, em outras palavras, à imagem social que carregam. Paralelo 215 a essa pesquisa, veremos qual a imagem do judeu na sociedade, supondo que a identidade que essas pessoas buscam possui uma relação direta com essa imagem, geralmente estereotipada, do que seria um judeu. Como visto em trabalhos anteriores, é sabido que eles pretendem romper com as leis judaicas atuais e serem reconhecidos como judeus pelos próprios judeus mesmo sem possuírem autoridade dentro do judaísmo oficial para isso, o que indica que eles não desejam ingressar dentro do mundo judaico e tornar-se como eles, mas, ao contrário, desejam ser judeus diferentes. Essas pretensões implicam efeitos tanto nas esferas sociais nãojudaicas quanto nas esferas sociais judaicas, pois ao adquirirem condição de judeus eles diferenciam-se de sua identidade de nordestinos comuns, situação que pode gerar conflitos dentro de seus antigos grupos sociais de amigos, familiares etc. Também se tornam diferentes dos próprios judeus ao adotarem um título de diferenciação (marranos) e ao possuírem poder/direitos de ingressar no judaísmo sem consentimento deles. Assim, trata-se de uma identidade única a ser analisada. Logo, nos resta procurar o valor que essa identidade possui para tais indivíduos ao ponto de exigirem tal reconhecimento social e se empenharem nessa busca. Devemos verificar se o sentido de ser judeu é realmente esse ou se há outros significados para eles. Para realizar o levantamento do que seria o atual valor de ser judeu, procederemos pela pesquisa bibliográfica em relação à imagem e ao estereótipo judaico na sociedade brasileira e, em especial, na sociedade nordestina, já que esse movimento ocorre principalmente nessa região; também será verificado se tal movimento pode ser, ao menos, caracterizado como algo real ou se seu aspecto – e aparente intensidade - restringe-se à mera adoção de identidades situacionais, geralmente exibidas no ambiente virtual das redes de relacionamento pela Internet. Ao fim desse levantamento sobre os valores culturais e normativos relevantes em relação ao caso, aplicaremos a teoria do comportamento econômico, partindo da premissa de que os indivíduos agem de forma mais econômica, para analisar os pontos positivos e negativos em relação ao valor que a identidade judaica teria diante das preferências, necessidades ou objetivos dos indivíduos envolvidos. Por exemplo, o sociólogo Bernardo Sorj nos indica que a sociedade brasileira, apesar de ser um país racista, não inclui os judeus na discriminação social, pois eles são considerados integrantes da população branca e, consequentemente, vistos como a parcela que pode contribuir com a ideologia do branqueamento da população, segundo a qual a parcela negra, através da mistura racial, pode passar a ser parte do mundo branco, melhorando seu status social. Dessa forma, a aquisição – por parte de ―nordestinos miscigenados‖ – da identidade social judaica seria simplesmente uma forma eficaz de ascensão social? No entanto, há ainda a questão mais óbvia, a religiosa. O judaísmo – junto com suas normas e simbolismos – seria mais adequado para essas pessoas? O que o judaísmo ou o ―novo marranismo‖ pode oferecer para elas? REFERÊNCIAS 216 BONDER, Nilton; SORJ, Bernardo. Judaísmo para o século XXI. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001. FILHO, Severino Barbosa da Silva. Marranos na ribeira do Paraíba do Norte. Campina Grande: Gráfica Agenda, 2005. KOLATCH Alfred J. Livro judaico dos porquês. São Paulo: Editora e livraria Sêfer, 2001. KOLATCH Alfred J. 2º Livro judaico dos porquês. São Paulo: Editora e livraria Sêfer, 1998. MEDEIROS, João Fernandes Dias. Nos passos do retorno. Natal: Edição do autor, 2005. NOVAIS, Fernando. História da vida privada no Brasil: cotidiano e vida privada na América portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. OLSON, Steve. A história da humanidade: desvendando 150 mil anos da nossa trajetória através dos genes. Rio de Janeiro: Campus, 2003. WIZNITZER, Arnold. Os judeus no Brasil colonial. São Paulo: Livraria Pioneira Editora, 1966. 16 - ESTUDANDO A SEGREGAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL NA CIDADE DO NATAL: REFLEXÕES INICIAIS. Thayanne Érica Torres de Assis [email protected] Ozaias Antonio Batista [email protected] Introdução: As reflexões deste trabalho estarão voltadas para o aparecimento dos condomínios horizontais fechados como um fenômeno urbano que interfere na constituição ―geoespacial‖ da cidade, uma vez que o formato citadino vai se (re) configurando a partir do surgimento deste tipo de moradia. Essa modificação na constituição urbana gera uma série de implicações no convívio social dos sujeitos, pois novos espaços restritos de sociabilidade, gerados pela construção dos condomínios, são destinados a uma limitada parcela da população. Os embasamentos teóricos iniciais do presente estudo leva em consideração os desdobramentos analíticos erigidos por D´ottaviano (2008) em sua tese de doutorado. A mesma adotou como campo empírico a Região Metropolitana de São Paulo, em especial o concernente ao aparecimento dos condomínios residenciais fechados. D´ottaviano se refere aos condomínios fechados como um tipo de moradia acessível a pessoas de classe média, e não somente para indivíduos possuidores de um alto poder aquisitivo. Nesse sentido, a autora abordará constantemente aspectos voltados para o fenômeno da segregação espacial. Separação esta não somente relacionada com o plano físico – grades, muros, sistemas de segurança – ou simbólico, através do status atrelado as condições de moradia. Mas também, a segregação espacial como um processo que possibilita o domínio econômico, político e social de uma determinada classe sobre outra, via monopólio do espaço. 217 Esse domínio espacial pode ser visto na constituição dos diferentes bairros de uma cidade. Geralmente na Zona Sul concentra-se moradores com alto poder aquisitivo, enquanto na Zona Norte os indivíduos pertencem à classe média-baixa. Aspectos sócio-urbanos do Fenômeno dos Condomínios Fechados: As barreiras simbólicas, impostas pelas condições econômicas, são importantes para manter a aglomeração de uma mesma classe social em uma determinada área da cidade. Assim, os ‗iguais‘ poderão se relacionar, e com a manutenção de certo padrão de inquilino, o valor do imóvel continuará rentável. Porquanto, a autora afirma ser imprescindível, para o entendimento do fenômeno da segregação espacial, explorar elementos relacionados com as desigualdades sociais e econômicas, ―e a segregação residencial urbana‖ (D´OTTAVIANO, 2008, p. 53) Os impedimentos físicos e simbólicos, impostos pelos condomínios horizontais fechados, auxiliam na compreensão da desigualdade social, porque as grades e muros separam os indivíduos espacialmente próximos, mas distantes, em detrimento das diferenças econômicas e sociais. O ―life style‖ (D´OTTAVIANO, 2008, p. 62), ‗modelo de vida‘ norte-americano importado pelo padrão cultural brasileiro também pode ser caracterizado como um aspecto de diferenciação simbólica, pois se remete apenas para sujeitos que residem em condomínios residenciais fechados. Desse modo, a segregação espacial também está relacionada com a questão da globalização, levando em consideração adesão de um modo de vida eminentemente europeu pelos indivíduos brasileiros. Com o desenvolvimento das grandes metrópoles houve o adensamento de determinados aparelhos sociais em algumas áreas da cidade. Esse fato também é em decorrência da segregação urbana, porque a separação espacial gera certa concentração de pessoas em localidades denominadas como centros comerciais. Surgindo, dessa forma, necessidades econômicas, sociais, culturais, em decorrência desta congregação humana. Desta conjectura se pode pensar a constituição dos grandes centros urbanos. Como, por exemplo, a cidade de São Paulo, metrópole estudada pela autora do trabalho em questão. Sendo neste contexto sócio-urbano presente, sobretudo a partir do século XX, que D´ottaviano explicita o desejo de muitos inquilinos adquirirem um bem imobiliário capaz de trazer principalmente segurança para suas posses e familiares. Porque o conforto, em outros contextos históricos sempre desejado ao se adquirir um imóvel, foi suplantado pela angústia de estar sempre se protegendo da violência de outrem. Dessa forma, a segurança se tornou uma mercadoria que estará agregando valor ao imóvel desejado. Ou seja, o fator segurança está aliado a ―criação de enclaves fortificados‖ (D´OTTAVIANO, 2008, P. 90) - os condomínios horizontais fechados. Nesse sentido, elementos que contribuem para privatizar a segurança pública acabam surgindo, transformando também idéias referentes à noção de público e privado. Porque, assim como os condomínios se apropriam de uma área, cercando-a e restringindo a entrada na mesma por um determinado público, a proteção, que deveria ser oferecida pelo Estado, passa a ser responsabilidade dos cidadãos. Especialmente os localizados 218 nos condomínios residenciais fechados, que contratam algum tipo de segurança privada. Não obstante, esta organização condominial interna, voltada para a questão da segurança, traz consigo um problema referente à ―... organização das diferenças sociais no espaço urbano.‖ (D´OTTAVIANO, 2008, p. 90). Uma vez que as áreas periféricas, na conjuntura atual, estão sendo gradativamente ocupadas por pessoas de poderio aquisitivo médio. Antes a periferia era estadia apenas para pessoas desprovidas economicamente, mas em decorrência do novo modelo de urbanização contemporâneo, pautado na ―... briga darwiniana por espaço urbano...‖ (D´OTTAVIANO, 2008, p. 44) as diferentes classes sociais acabam se chocando. Mesmo que os indivíduos estejam separados direta ou indiretamente (ou seja, por imposições físicas e simbólicas). A autora defende que o fenômeno de segregação espacial não pode ser explicado unicamente estabelecendo a distinção entre o centro rico e a periferia pobre. Há uma série de elementos que podem contribuir para a compreensão da constituição do espaço citadino, especialmente no tocante ao aparecimento dos condomínios residenciais fechados. Para pesquisar as unidades residenciais da Região Metropolitana de São Paulo, D´ottaviano adotou como dado empírico o ―... número de banheiros, o número de quartos e a área útil das unidades.‖ (D´OTTAVIANO, 2008, p. 134). Porque, dessa forma, se pode associar a quantidade de cômodos com a renda familiar. Ademais, segundo D´ottaviano (2008) ―Para identificar a tipologia residencial mais presente na RMSP, foi feito o cruzamento de banheiros nas unidades residenciais por lançamento e por unidade...‖ (p. 144) Consequentemente, com o tipo de amostragem escolhida pela autora para analisar os condomínios fechados na RMSP, se pode conjecturar que a estrutura física diz muito sobre a realidade sócio-econômicas dos moradores em questão, pois as residências simples – ou seja, os apartamentos que possuem uma área interna menor – estão localizados nas proximidades das áreas periféricas. Enquanto os imóveis mais bem estruturados estão alocados em localidades centrais dos espaços Considerações Finais: As etapas da pesquisa desenvolvida por D´ottaviano consistiram na análise dos anúncios de propaganda de empresas que erigiam condomínios fechados; identificar quem são os moradores de condomínios fechados, abarcando características sociais, culturais e econômicas dos mesmos; e por fim a realização de entrevistas com as construtoras. A segregação espacial é um fenômeno social e urbano que está em constante mudança, devendo ser analisado em várias perspectivas. Entretanto, na realidade sócio-urbana vigente, os condomínios fechados consistirem em ―... uma tipologia especial de moradia que indica status e um estilo de vida contemporâneo e atual...‖ (D´OTTAVIANO, 2008, p. 213). REFERÊNCIAS D´OTTAVIANO, Maria Camila Loffredo. Condomínios Fechados na Região Metropolitana de São Paulo: fim do modelo centro rico versus periferia 219 pobre? 2008 Tese (Doutorado) – Universidade de São Paulo, Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo. ANDRADE, Luciana Teixeira de. ―Estudos de Vida nos Condomínios Residenciais Fechados.‖ IN: JUNIOR, Heitor Frúgoli; ANDRADE, Luciana Teixeira de; PEIXOTO, Fernanda Arêas (org). As Cidades e seus Agentes: práticas e representações. Belo Horizonte: Ed. PUC Minas; EDUSP: 2006. 17 ONDE VOCÊ MORA?: uma pesquisa a respeito dos discursos sobre a expansão da fronteira imobiliária na cidade do Natal, como forma de acumulação e reprodução do capital mercantil fundiário Rainolenes de Melo Silva(UFRN) Introdução: O modo de produção capitalista que se consolida no século XIX, é marcado pelo processo de industrialização das nações do núcleo central do capitalismo mundial a saber: Inglaterra, França, Bélgica, EUA e Alemanha (SANTOS, 1982). Neste cenário, a cidade industrial, passa a representar o paradigma a ser seguido a nível nacional, regional e local, capaz de propugnar o progresso e o desenvolvimento aos países que gradativamente, mas de formas e com funções muito distintas, vão sendo integrados ao capitalismo mundial. No Brasil, essa integração passar a se consolidar, através de uma industrialização restringida (MELLO, 1986), tendo o Estado como o principal agente econômico a partir dos anos de 1930. Entretanto a estruturação de uma nova base produtiva industrial, não significou a superação das pretéritas relações de produção mercantis agro exportadora, que passaram a coexistir com o modo de produção capitalista. A expansão da rede urbana brasileira foi marcada segundo CLEMENTINO (1995) por uma ― heterogeneidade estrutural‖ que resultou em processos de urbanização bastante distintos entre as regiões brasileiras. As especificidades do processo de urbanização, apresentada pela região Nordeste, decorrem não apenas do momento e da maneira desigual, como se deu o processo integração da região a expansão do capitalismo brasileiro, uma economia nacional de caráter capitalista ―sub desenvolvida‖ e ―retardatária‖ (FURTADO, 1983; MELLO, 1986), mas em grande medida, das formas como as frações de capitais primeiramente mercantis/endógenos e a partir dos fim dos anos de 1960, os capitais industriais/exógenos, se articularam entre si, ―produzindo vários focos de expansão e várias burguesias e oligarquias regionais‖(TAVARES,1999). Dentre os Estado da região Nordeste, o processo de urbanização no Estado do Rio Grande do Norte-RN, e mais precisamente a expansão urbana da cidade de Natal, será abordada por este trabalho de maneira mais específica. A pergunta inicial da presente pesquisa é, quais foram os discursos dos agentes políticos, econômicos e sociais, que estiveram envolvidos no processo de expansão urbana, tendo no mercado imobiliário, a expressão materializada do discurso dominante na cidade de Natal, entre a segunda metade dos anos de 1960 e fim dos anos 1980. 220 Preliminarmente foram escolhidos dois bairros da cidade de Natal como campo a serem estudados. A escolha dos bairros de Cidade da Esperança e Capim Macio se deve sobremaneira, a forma como tais bairros representaram momentos distintos do processo de expansão urbana capitalista, e como o Estado através das políticas habitacionais, o capital mercantil, através do processo de acumulação fundiária e o capital industrial através da manutenção das taxas de lucro, induziram a um processo de urbanização.(CLEMENTINO, 1995). A metodologia a ser utilizada estará pautada em pesquisas a meios de comunicação impressa a ser escolhida no momento oportuno e tendo como referencial teórico, leituras pertinentes ao tema urbanização brasileira e do Rio Grande do Norte em espacial a obra da professora Maria do Livramento Miranda Clementino (1995). Para tanto, é necessário retomar de maneira sucinta os processos de integração comercial a partir dos anos de 1930 e integração produtiva a partir dos anos de 1960, propostos pelo Estado brasileiro e seus desdobramentos no processo de urbanização da Região Nordeste, e posteriormente nos anos de 1970 no Rio Grande do Norte-RN. O Nordeste brasileiro crescimento econômico e urbanização: O processo de urbanização brasileiro tem aspectos de um país ―subdesenvolvido‖ e de ―industrialização periférica‖, temporalmente fragmentada e ―desigual‖.(FURTADO, 1883; MELLO, 1886; SANTOS, 1982). Tal processo está ligado a fenômenos históricos que marcaram a formação econômica, política e social da sociedade brasileira, em decorrência das formas como se articularam as diversas frações de capital, e como estes se materializaram nos espaços urbanos nacional, regional e local, durante o processo de expansão do modo de produção capitalista no Brasil. Segundo Clementino (1995) ―no capitalismo o processo de desenvolvimento econômico por si só, determina o processo de urbanização‖. Com o crescimento do excedente social, resultado do modo de produção capitalista, e nó urbano que as relações comerciais e produtivas alcançam seu ápice na modernidade. Dessa forma o processo de urbanização Brasileiro foi profundamente marcado pelas estruturas sócio-culturais encontradas em cada região. Sendo assim, a região Nordeste, foi fortemente influenciada por sua matriz rural, oligárquica, latifundiária e mercantil, tanto quanto, pela forma como essas estruturas se articularam com a expansão do modo de produção capitalista, deixando marcas indeléveis e materializadas em sua formação urbana. A partir dos anos 1930 até a década de 1960, a região sudeste passa progressivamente por uma transição de uma economia agroexportadora a uma economia em vias de industrialização e adensamento de sua rede urbana. Nesse momento a constituição de um mercado interno tem no Sudeste o centro irradiador dos processos e relações econômicas em âmbito nacional, se transformando no principal mercado produtor e consumido do país. Ao mesmo, tempo a região Nordeste passa a se integrar a uma divisão regional do trabalho, como fornecedora de produtos primários, assim como, de mão de obra à estrutura produtiva localizada em São Paulo. Em (CLEMENTINO, 1995, p.126) ―O período que vai de 1930-1961 corresponde ao momento final do processo de constituição do capitalismo no 221 Brasil, ou seja, culmina com a formação plena de bases técnicas indispensáveis a auto-determinação da acumulação capitalista‖. Daí decorre um forte processo de concentração produtiva até a segunda metade do século XX, sendo que, as relações de produção em especial no Nordeste se mantiveram praticamente inalteradas. O processo de integração nacional entre os anos de 1930 a 1960, fica configurado como ―integração via circulação de mercadorias‖(CANO Apud CLEMENTINO. 1995, P.127), isso significa, que tal integração não foi além das relações de trocas comerciais do tipo centro periferia em âmbito nacional. É somente na década de 1960, com as políticas desenvolvimentistas de integração nacional pós 1964, como meio concluir o projeto burguês de Estado, através da expansão da base produtiva e do mercado consumidor, que passa a se estruturar o processo de descentralização da produção. Segundo Milton Santos(1994), o processo de urbanização brasileiro, não deve ser entendido apenas como processo de implementação de um parque industrial, mas sim, como o produto de uma correlação de forças econômicas, política e sociais que são travadas em momentos distintos no espaço territorial nacional . ―O termo industrialização não pode ser tomados em seu sentido estrito, mas em sua mais ampla significação como processo social complexo, que tanto inclui a formação de um mercado nacional, quanto os esforços de equipamento do território para torná-lo integrado com a expansão do consumo de formas diversas (...) e ativa o próprio processo de urbanização‖ (SANTOS, 1994, p. 27). A modernização das economias locais nordestina e a criação de pólos industriais, forneceram as bases materiais necessárias a uma transformação nas relações de produção. Destarte o processo de modernização econômica e urbanização através da industrialização, foi heterogêneo e incompleto devido aos caráter tardio e complementar da região Nordeste em um cenário nacional . Sobre a industrialização e a rede urbana do RN: A rede urbana do Rio Grande do Norte, atualmente é composta por 167 municípios por onde se distribui uma população de 3.013.740 habitantes, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística- IBGE(2007). Seu território ocupa 3,41%, do território nordestino, onde vivem 5,5%, da população regional, sendo esta 73% urbana e produzindo 10,3% da produção industrial regional (CLEMENTINO, 2003). Sua rede urbana é caracterizada por uma concentração econômica e produtiva em duas regiões, a micro região metropolitana de Natal, Leste Potiguar, composta pela capital do Estado e municípios adjacentes, e a micro região de Mossoró, no Oeste Potiguar. Mas quais foram os fenômenos econômico e sociais pretéritos,que marcaram o processo de concentração produtiva da rede urbana do RN? Até que ponto o advento da industrialização se manifestou na configuração da rede urbana? E como as relações contraditórias entre as classes sociais ficou materializa na ―tecitura urbana‖ da Cidade do Natal, através do mercado imobiliário? Segundo (CLEMENTINO, 1995. p. 36), ―o Estado através de uma ação mediadora e ao mesmo tempo contraditória[...], permitiu a convivência pacífica do setor industrial com outras formas produtivas arcaicas‖, tendo 222 como resultado a formação de uma rede urbana desarticulada, concentrada e excludente. As relações de produção e divisão social do trabalho continuaram a se dar no setor primário e a operar no interior da grande propriedade, de forma que a supremacia do campo sobre a cidade. A principal alteração apresentada nesse período aconteceu de forma pontual na capital do Estado, e sob a influencia da Segunda Guerra Mundial, que proporcionou a cidade de Natal um considerável volume de recursos devido aos esforços de Guerra que foram aplicados na estrutura viária da cidade. (CLEMENTINO, 1995). É apenas a partir da década de 1970, que o Estado do RN, passa por um processo integração produtiva em escala nacional como parte dos projetos da SUDENE. Com uma política de reorientação regional da divisão social do trabalho na obtenção do produto nacional, através da modernização de atividades regionais e locais já consolidadas; na desconcentração industrial em âmbito nacional; e na expansão dos serviços do Estado. Considerações Finais: As impressões preliminares a respeito do objeto de pesquisa, ou seja, expansão da rede urbana do RN, e mais precisamente do ―tecido Urbano‖ OLIVEIRA(1978), da cidade de Natal, nos dão pistas de que houve a dominação do capital mercantil, através da fronteira imobiliária como forma de reprodução do capital. Mas também de como se deram os processos de articulação entre o capital mercantil, o capital industrial e o ―Estado capturado‖(OLIVEIRA, 1978), que manteve intacta a estrutura fundiária e concentradora dos interesses da fração mercantil do capital local. O capital mercantil de caráter reacionário, subsumiu o capital industrial vindo de fora, e através da ascensão de sua elite agro-mercantil ao controle do Estado, este pode manter os seus interesses econômicos rentistas. O desenvolvimento econômico, político e social do Estado, poderia representar para as elites locais a possibilidade de manifestações de contradições latentes entre interesses antagônicos das classes sociais imanentes ao modo de produção capitalista. Dessa forma, o Estado a medida que representou o principal agente econômico no processo de integração e expansão econômica, ao mesmo tempo, representou os interesses das elites locais de tradição mercantil, cedendo o espaço territorial à valorização e reprodução do capital industrial externo, desde que não alterasse a estrutura política e social local. Tal fenômeno fez com que o RN, no decorrer dos anos de 1980, mesmo com os esforços de uma política de integração produtiva e comercial nacional, não atingisse a maturação das relações produtivas que engendrariam uma rede urbana mais densa, estável economicamente e desenvolvida social e politicamente. REFERÊNCIAS BRANDÃO. Carlos. A dimensão espacial do sub desenvolvimento: uma agenda para os Estudos Regionais e Urbanos. Campinas: Editora Unicamp, 2003. CASTELLS. Manuel. A questão urbana. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983. CLEMENTINO, Maria do Livramento M. Economia e Urbanização: o Rio Grande do Norte nos anos 70. Natal: UFRN-CCHLA. 1995. 223 FARIAS. Vilmar E. Cinqüenta anos de Urbanização no Brasil: tendências e perspectivas. Revista Novos Estudos CEBRAP. n. 29, São Paulo, 1991. FURTADO. Celso. Teoria e politica do desenvolvimento econômico. 8 ed. São Paulo: Editora Nacional, 1983. FURTADO. Celso. O mito do desenvolvimento econômico. 6 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983. MELLO. João Manuel Cardoso de. O capitalismo tardio. 5 ed. São Paulo:Brasiliense, 1986. OLIVEIRA. Francisco. Acumulação monopolista, Estado e Urbanização: a nova qualidade do conflito de classes. In: MOISES, José Álvaro. Contradições urbanas e movimentos sociais. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 1978. SANTOS, Milton. A urbanização desigual: a especificidade do fenômeno urbano em países subdesenvolvidos. Petrópolis: Vozes, 1982. SANTOS, Milton. A urbanização brasileira. 2. ed. São Paulo. Ed. Hucitec, 1994. TAVARES. Maria da Conceição. ―Imperio, Territòrio Dinheiro‖_In: FIORI, José Luiz. Estado e Moedas no desenvolvimento da Nações. Petrópolis: Ed Vozes. 1999. 18 A VALORIZAÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL AFROBRASILEIRA NO CONTEXTO DA SALA DE AULA DO ENSINO MÉDIO Ramon de Alcântara Aleixo. (Universidade Estadual da Paraíba-UEPB) Patrícia Cristina de Aragão Araújo. (Universidade Estadual da Paraíba-UEPB) Introdução: Em meio às discussões que versam sobre as políticas de conservação patrimonial torna-se de primaz importância tecer discussões com vistas a elucidar a tessitura das noções de patrimônio histórico, bem como a sistematização de políticas de preservação que sugerem em seus quadros estruturais uma lógica concernente à sustentação da(s) memória(s) individual e/ou coletivas a que se pretende salvaguardar. Dessa forma, propomos, ao longo de nossas análises, tecer discussões que nos permitam compreender a gestação da noção de patrimônio, bem como a sua disseminação ao longo do período histórico caracterizado sob o jugo da modernidade, adentrando, por sua vez, nas novas formas de preservação propostas pelas Convenções da Organização das Nações Unidas para Educação Ciência e Cultura (UNESCO), observando, dessa forma, a sua inserção nas atuais políticas curriculares em voga no processo educativo nacional. Justificativa: Compreender a gestação das noções do patrimônio no bojo de uma sociedade pluriétnica e intercultural torna-se de primaz importância, tendo em vista a busca de políticas de inclusão étnico-afirmativas que possam permear os espaços-tempo sócio-educativos, dentre estes a própria sala de aula. Metodologia: Buscando uma sistematização mais eficaz do nosso propósito investigativo nos aportamos no referencial teórico trilhado por CHARTIER 224 (2004), BHABHA (1998), HALL (2001), LOPES (2005), bem como no método investigativo indiciário, GUINZBURG (1989), onde se torna possível perceber, através de fragmentos discursivos, sinais que apontam para a tessitura das tramas políticas e sociais que permeiam as escritas curriculares. Desenvolvimento: Ao analisar as origens atinentes às conceitualizações acerca do termo Patrimônio Histórico ao longo da tessitura do processo histórico torna-se de fundamental importância atentar para a concepção da História como ciência, bem como a percepção da vivência humana a partir da lógica tripartite passado, presente e futuro, contrapondo-se, assim, ao paradigma dual escatológico característico do período historicamente denominado como Idade Média. Dessa forma, observa-se no significado semântico da palavra patrimônio certa associação entre os conceitos de herança, elucidando, assim, uma espécie de transmissão de legados dos ancestrais, de forma a possibilitar a manutenção da memória de um dado grupo social. O próprio conceito de monumento advém de uma modificação do termo latim monumentum, que por sua vez, deriva de monere ―advertir, lembrar‖, ou seja, ―trazer à lembrança de alguma coisa‖ (CHOAY, 2001). Da íntima relação que o termo monumento resguarda de sua origem latina, observar-se o ―despertar‖ da preocupação com as práticas materiais e culturais das sociedades clássicas greco-romana, emergindo, assim, como práticas ao longo da cultura instituída no período renascentista. No que concerne à realidade brasileira, observa-se a gestação de políticas de preservação patrimoniais a partir dos anos iniciais do século XX. Todavia, a estruturação em torno da necessidade de se pensar uma identidade nacional que viesse referendar as disposições políticas do governo Vargas ao longo do período político denominado como Estado Novo ocorro com a criação do Serviço do Patrimônio Artístico Nacional (SPHAN) na década de 1930 sobre a chefia do então Ministro da Cultura Mario de Andrade. Desde então, o referido sistema, a partir da década de 1970 designado como Instituto do Patrimônio Histórico Nacional (IPHAN) vem atuando da estruturação de políticas públicas que visam à preservação não apenas de fachadas de casarões antigos, mas na manutenção da memória de uma dada organização social. Ao adentrar dos anos 2000, observa-se a estruturação do conceito de Patrimônio Imaterial, expresso através de expressões culturais, gastronômicas, literárias, musicais, dentre outras que abarcam em suas manifestações as representações de diversos segmentos sociais. Dessa forma, propomos ressaltar a importância de diversos segmentos étnico-culturais na tessitura do processo de identidade coletiva, de forma a possibilitar a preservação em torno do patrimônio imaterial cultural atinente às práticas representativas da cultura afro-brasileira que durante muito tempo tiveram, e infelizmente, ainda têm sua condição histórica negada em vista de m projeto escriturário que se pretende ―oficial‖ a partir da observação de sua representação CHARTIER (2004) nos currículos escolares de circulação, evidenciados, nesse caso, pelo livro didático e a sua inserção como importante ferramenta no trabalho a ser trilhado pelo docente em sala de aula. 225 Considerações Parciais: Os resultados preliminares nos permitem afirmar a importância de se efetivarem políticas de inclusão racial, de forma a possibilitar a tessitura de zonas de diálogo entre as diversas etnias que povoam cotidianamente o espaço-tempo da escola, bem como a inserção de seu legado cultural na historiografia nacional e local, contribuindo, dessa forma, para evocarmos os fragmentos de memória e cultura que necessitam serem (re) significados sob pena de se esmaecerem nas sinuosas curvas ofertadas pela escrita da História. REFERÊNCIAS BAUMAN, Zygmunt. Comunidade: a busca por segurança no mundo atual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003. BHABHA, Homi. O local da cultura. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1998. CHARTIER, R. As práticas da escrita. In: ARIÉS, P.; CHARTIER, R. (Orgs.), 2002. História da vida privada: da renascença ao século das luzes. São Paulo: Companhia das Letras, v. 3, 1997. CHOAY, Françoise. A alegoria do patrimônio. Tradução de Luciano Vieira Machado. São Paulo: Estação Liberdade; Editora da UNESP, 2001. DAMATTA, Roberto. O que faz o Brasil Brasil? 2 ed. Rio de Janeiro: Rocco, 1986. FOUCAULT, Michel. As Palavras e as coisas. São Paulo: Martins Fontes, 1999. GUINZBURG, Carlo. Prefácio à edição italiana. In: O queijo e os vermes. São Paulo: Companhia das Letras, 2005. HALBWACHS, Maurice. Memória individual e Memória Coletiva. In: A Memória Coletiva. São Paulo: Centauro, 2006. HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 3 ed. Rio de Janeiro: DP &A, 1999. LOPES, Alice Casimiro. O livro didático nas políticas de currículo. In: Políticas e Práticas Curriculares. Impasses, Tendências e Perspectivas. PEREIRA, Maria Zuleide da Costa; MOURA, Arlete Pereira (orgs.). João Pessoa, Idéia, 2005. ORLANDI, Eni P. Análise do discurso: princípios e procedimentos. Campinas: Pontes, 2002. RUSSEN, Jorn. Razão Histórica: teoria da História. Fundamentos da ciência histórica. Brasília, UNB, 2001. SEVCENKO. Nicolau. O prelúdio republicano, astúcias da ordem e ilusões do progresso. In: NOVAIS, Fernando A. (Coord.) / SCHWARCZ, Lília Moritz (Org.). História da vida privada no Brasil República: contraste da intimidade contemporânea. v. 4, São Paulo, 1998. GT4 – Segurança Pública com enfoque no sistema penitenciário brasileiro – Sala F3 – Setor II Profª. Ms. Hilderline Câmara de Oliveira – UFRN/FACEX Email: [email protected] 226 Ms. Eduardo Franco C. Cruz – UFRN/PMRN [email protected] Profª. Ms. Joseneide S. Pessoa dos Santos – UFRN/FACEX [email protected] Ementa: Este Grupo de trabalho em sua primeira edição tem por finalidade discutir e socializar estudos, pesquisas e experiências profissionais voltados para as áreas temáticas em relevo, visando enriquecer o debate sobre política de Segurança Pública no âmbito brasileiro, e em especial, trazer problematizações e contribuições sobre a realidade da população carcerária. Procura refletir sobre a Política de Segurança Pública Brasileira, tendo como foco central, as questões sobre o sistema penitenciário, abordando questões inerentes a temas como direitos humanos e cidadania relacionados à população carcerária. Busca, portanto, evidenciar as relações envolvidas nessa temática no atual contexto do Estado e da sociedade, devido a vários aspectos, mais precisamente a três fatores principais: a situação de violência que atravessa amplos setores da sociedade civil; a fragilidade da política pública em atenção à segurança e a precariedade da condição da população carcerária no Brasil. São aspectos de difícil compreensão, mas que requerem urgentemente alternativas por parte do conjunto da sociedade, no sentido, de fortalecer as bases jurídica/legais já existentes, que em muitas dimensões são fragilizadas e até mesmo negadas, não podendo ser incorporadas à democraticidade da vida social. Assim, este GT, inaugura uma temática que não é nova, mas é pouco explorada no âmbito da Sociologia. Pode-se até considerar que existe uma lacuna de estudos e pesquisas nesta área nas universidades brasileiras. Objetivos: Possibilitar aos participantes uma discussão crítica sobre as condições da população carcerária em suas dimensões jurídicas, legais, socioeconômicas e culturais. GT4 – Segurança Pública com enfoque no sistema penitenciário brasileiro – Trabalhos Aprovados Resumos Simples 01 - UM ESTUDO DA REALIDADE DO SISTEMA PENITENCIÁRIO DO RIO GRANDE DO NORTE Aelma Oliveira da Silva - FACEX - [email protected] Karla Patrícia de Oliveira Macedo - FACEX Francisca Francimeire da Costa Sena – FACEX [email protected] Joana Maria Dionísio - FACEX Marílian dos Santos Ferreira – FACEX [email protected] 227 Sinézia R. da Silva Dantas- FACEX Resumo: O referente trabalho aborda a Segurança Pública no Brasil e no RN, enfatizando o sistema prisional do Rio Grande do Norte. O embasamento teórico e metodológico para elaboração do conteúdo aqui exposto foi norteado por pesquisa de campo no Presídio Estadual de Parnamirim-PEP, visita e entrevista com a Assistente Social do estabelecimento, revisão bibliográfica entre outras pesquisas. Desse modo, partimos de uma realidade macro, contextualizando a Questão Social inerente a sociedade para visualizarmos a atual condição da segurança pública em nível de Brasil e do RN. Objetivando, portanto, possibilitar uma visão panorâmica dessa expressão social. A problemática da segurança pública vem se tornando cada vez mais conflitante atualmente tendo em vista o desdobrar de novas conjunturas, o que agrava a situação do sistema prisional. A omissão do Estado diante disso, contribui e muito para o alargamento, visto que aquele não se preocupa com o processo de fiscalização e implantação de projetos, programas e políticas sociais no âmbito profissional para buscar a regeneração do indivíduo que está submetido ao sistema como apenado. Palavras-cheve: Sistema penitenciário. Apenado. Segurança Pública. 02 - REINCIDÊNCIA CRIMINAL: UM ESTUDO DO COMPLEXO PENAL DR. JOÃO CHAVES Laudilene Gomes Davi -UFRN [email protected] Resumo: O presente trabalho é fruto da experiência do Estágio Curricular Supervisionado do Curso de Serviço Social da Faculdade de Ciências, Cultura e Extensão do RN-FACEX, realizado no Complexo Penal Dr. João Chaves-Natal/RN, que após estudarmos a realidade institucional de forma criteriosa e cuidadosa, podemos perceber que, entre as mais diversificadas e graves problemáticas que perpassam o sistema prisional, particularmente o CPJC, está a reincidência criminal. Diante dessa problemática, elaboramos nosso projeto de pesquisa, visando investigar e analisar os determinantes que contribuem para a reincidência criminal dos apenados do sexo masculino que cumprem pena em regime fechado e semi-aberto. Para tanto, utilizamos os seguintes procedimentos metodológicos: levantamento e revisão bibliográfica; pesquisa e análise documental; observação sistemática e assistemática registrada no Diário de campo; aplicação de entrevista semiestruturada e, por fim a análise e interpretação dos dados coletados que foi de cunho qualitativo e quantitativo. Percebemos a partir desse estudo que, dentre os determinantes que levam um apenado a reincidir, estão às precárias condições do atual sistema prisional, que vive um processo de decadência e abandono, principalmente por parte do próprio Estado, que nem a legislação brasileira proporcionando amplas garantias para o seu bom funcionamento, não dispõe dos meios necessários para o processo de reinserção da população carcerária. Palavras-chave: Reincidência criminal. Sistema Prisional. Reinserção. 228 03 - SAÚDE E TRABALHO DO AGENTE PENITENCIÁRIO: OS TRANSTORNOS COMPORTAMENTAIS Maria Luiza Tomaz Tavares Resumo: O enfoque desta pesquisa mostra os impactos sofridos pelos agentes penitenciários decorrentes da atividade laboral nas prisões. O texto evidencia a execução de um trabalho calcado nos grandes descasos existentes nas instituições prisionais. Mostra as peculiaridades de um sistema desorganizado, onde as pessoas confinadas em seu espaço sofrem as conseqüências do abandono por parte do poder público e do estigma social. O estudo buscou conhecer e apresentar as possíveis causas dos transtornos comportamentais apresentados pela categoria trabalhadora. A metodologia foi articulada a partir de pesquisas à referenciais teóricos como, Goffman, Dejours, Adorno, Minayo & Souza, entre outros. Além dos dados pesquisados nos campos das instituições prisionais na cidade de Mossoró/RN e em alguns órgãos da administração penitenciária do Estado do Rio Grande do Norte. Os resultados alcançados pelas pesquisas mostraram que a classe destes profissionais não recebem a menor assistência ou apoio profissional. Os dados quantitativos sobre esta categoria evidenciam muitos problemas, apesar de ter apenas sete anos de atividade funcional. O contato com o cotidiano prisional provoca muitas mudanças no comportamento dos agentes penitenciários por ser um trabalho árduo e penoso. Os impactos são inevitáveis, mas surgem em conformidade com a personalidade de cada profissional. Contudo, o ponto mais crucial deste quadro de descasos reside na negligência por parte do Estado. Palavras-chave: Transtornos comportamentais. Saúde. Trabalho. GT4 – Segurança Pública com enfoque no sistema penitenciário brasileiro – Resumos Expandidos 01 - UM ESTUDO DA REALIDADE DO SISTEMA PENITENCIÁRIO DO RIO GRANDE DO NORTE Aelma Oliveira da Silva Karla Patrícia de Oliveira Macedo Francisca Francimeire da Costa Sena Joana Maria Dionísio Mraílian dos Santos Ferreira Sinézia R. da Silva Dantas No Brasil, uma das ―expressões‖ da Questão Social que tem se ampliado cada vez mais é a Segurança Pública que, marcada pela insegurança, surge e se desenvolve a partir de questões mais profundas como: falta de investimentos nas periferias dos grandes centros urbanos seja na geração de trabalho e renda, seja na qualificação profissional; além da precariedade 229 da educação e da falta de acesso da população a serviços adequados de saúde pública e habitação. Tais desigualdades, hoje, ampliam-se com a nova roupagem da política liberal (neoliberalismo) cujas propostas no campo das políticas sociais são claras: um Estado que se exime cada vez mais frente as suas responsabilidades sociais e o agravamento dos serviços sociais. A política de Segurança Pública em nosso país, embora esteja se desenvolvendo aos poucos, de acordo com Santin (2004) sempre teve um papel secundário em ações e programas do governo, o que contribui para níveis alarmantes no índice de criminalidade. Em nível estadual não é diferente, de acordo com a pesquisa divulgada pela Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana (Ritla), em parceria com o Instituto Sangari e os ministérios da Justiça e Saúde, o Rio Grande do Norte é o terceiro Estado menos violento do País e Natal a capital mais segura do Nordeste, a pesquisa norteia-se pelos atestados de óbito dos 5.564 municípios do país e informações fornecidas pelo Ministério da Saúde. Por outro lado a população carcerária do RN atualmente está estimada em 4.400 presos e as condições do sistema penitenciário estão sendo consideradas em estado grave necessitando de soluções rápidas. E para o corregedor geral da justiça, o desembargador João Batista Rebouças, uma possível solução seria que o Poder Executivo decretasse estado de calamidade publica no sistema prisional, com o objetivo de vencer a burocracia estadual existente e construir cadeias públicas num tempo máximo de 120 dias. Além da superlotação e má infra-estrutura nos presídios, um outro problema torna-se grave, não há local adequado para os apenados com distúrbios mentais, já que o Hospital de Custodia não oferece infra-estrutura satisfatória. O Infopen (Sistema Nacional de Informação Penitenciária) registra que no RN existem 1.600 vagas no sistema prisional estadual e uma população carcerária de 4.400 presos, porém, de acordo com o Desembargador Rebolças, esses números são relativos e poderia ser ainda pior se todos os mandatos de prisão fossem cumpridos. Para solucionar esta situação de precariedade no sistema prisional, está sendo construída a Cadeia Pública de Nova Cruz que abrigará 300 presos, e será inaugurada em junho, e as de Macau e CaráMirim estão aguardando a liberação de licitações; com isso a governadora Wilma de Faria garante que acabará com a permanência de presos em delegacias. O Secretário Estadual da Justiça e Cidadania Leonardo Arruda, apresentou ainda no Ministério da Justiça, projetos de construção de cadeias públicas em Parelhas e em Lajes o que deve diminuir a falta de cadeias no interior. Outras medidas estão sendo tomadas pelo Poder Judiciário, que está acelerando o julgamento de processos criminais e projetos para a ressocialização do apenado com objetivo também de conter a violência. No 1° Encontro Potiguar sobre Execução Penal e Sistema Penitenciário foi apresentado o plano Apac (Associação de Proteção ao Apenado) vinculado ao Programa Novos Rumos. Neste projeto os presos passam por um trabalho de ressocialização através de ações interdisciplinares com diversos profissionais – psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais – e também participam de cursos profissionalizantes. Diante do exposto, vê-se que o que deveria ser um ambiente de reeducação e de reinserção se traduz num processo de exclusão e desumanização do ser. Essa realidade notória deveria ser pensada, pois ainda existe preconceito por parte da sociedade 230 contra aqueles que já foram presidiários, e que por isso, passa a ser excluído do convívio social, pois ter praticado um delito (mesmo que este já tenha sido punido) é sempre considerado um perigo.A omissão do Estado diante dessa problemática contribui e muito para o alargamento dessa situação, visto que aquele não se preocupa com o processo de fiscalização e implantação de projetos, programas e políticas sociais no âmbito profissional para a regeneração do apenado é preciso que o sistema carcerário seja um espaço que disponibilize atividades sócio-educativas, laborais e de lazer. Nos dias atuais a questão da segurança pública passou a ser considerada problema fundamental e principal desafio aos gestores do país. A segurança ganhou grande destaque em noticiários e jornais sendo que jamais, em nossa história recente, esteve tão presente nos debates tanto de especialistas como do público em geral. E vários fatores, como o aumento da sensação de insegurança, a violência policial, a ineficiência preventiva de nossas instituições, a superlotação nos presídios, rebeliões, fugas, corrupção, entre outros, contribuem para que a segurança pública esteja sempre sendo enfatizada e para que as autoridades envolvidas estejam buscando possíveis soluções para este caos, com o objetivo de garantir o mínimo de segurança a sociedade civil. REFERÊNCIAS BEHRING, Elaine Rossetti. BOSCHETTI, Ivanete. Expressões da questão social e política social no Brasil. In: Política Social: fundamentos e História. 3 ed. São Paulo: Cortez, 2007. (pág. 184-190). _________. Radar Social. Brasília, IPEA, 2005b. IAMAMOTO, Marilda Villela. Questão Social e Serviço Social. In: O Serviço Social na Contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 13 ed. São Paulo, Cortez, 2007. (pág. 27-42). Sistema Prisional Estadual. Disponível em: http//tribunadonorte.com.br/noticias/ 110052.html . Acesso em 11/06/2009 às 14h 35min. Violência no RN. Disponível em: http://www.nominuto.com/noticias/policia/mesmo-satisfeitos-vamoscontinuar-combatendo-a-violencia-no-rn-diz-castim/11526/ Acesso em 11/06/2009 às 14h 49min. Prisões. Disponível em: www.ctorio.org.br/textosparaapagina/prisoes/clipping/ RN, %20NOTICIAS.pdf – Acesso em 11/06/2009 às 15h. 02 - REINCIDÊNCIA CRIMINAL: UM ESTUDO DO COMPLEXO PENAL DR. JOÃO CHAVES Laudilene Gomes Davi -UFRN [email protected] (Resumo Expandido não disponibilizado pela autora para publicação). 231 03 - SAÚDE E TRABALHO DO AGENTE PENITENCIÁRIO: OS TRANSTORNOS COMPORTAMENTAIS Maria Luiza Tomaz Tavares (Resumo Expandido não disponibilizado pela autora para publicação). GT5 – Balcão TCC REUNI: práticas e experiências na elaboração da monografia em Ciências Sociais – Sala G1 – Setor II Violeta Maria de Siqueira Holanda – UFRN [email protected] Ementa: Nossa proposta de GT destina-se aos alunos do Curso de Ciências Sociais/UFRN que participaram e/ou participam dos balcões/plantões de apoio ao TCC, atividade desenvolvida desde o segundo semestre de 2008, pelas bolsistas REUNI/PPGCS, junto à disciplina Monografia DAN 0019 e demais interessados. Objetivamos fomentar um espaço de discussão sobre os processos de elaboração e desenvolvimento da monografia acadêmica, que envolve a definição e delimitação do tema, a justificativa e problematização, os procedimentos metodológicos e os possíveis modelos de análise. Portanto, o enfoque será projetado sobre os aspectos formais envolvidos na produção da monografia. O GT se revela também como um espaço de sociabilização e discussão para alunos que não estão necessariamente ligados a projetos de pesquisa institucionais, incentivando-os a produção científica. Nesta perspectiva, acreditamos que ações dessa natureza contribuem para a formação do discente nas instâncias operativas, procedimentais, atitudinais e reflexivas na dinâmica que constitui o processo de ensino-aprendizagem. (Observação: Este GT foi cancelado pela coordenadora) GT6 – Educação e Diversidade – Sala H7 – Setor II Simone Cabral Marinho dos Santos (Mestre em Sociologia UFRN/UERN) Ana Maria Morais Costa Especialista em Antropologia UFRN/UERN [email protected] [email protected] Ementa: A sessão de comunicação oral reunirá trabalhos concluídos e/ou em andamento, resultantes de atividades de pesquisa, ensino e extensão que tratem da temática da educação sob a ótica da diversidade. Entendendo a prática educativa em suas várias formas de concretização, esta sessão, pretende garantir espaço para a discussão sobre gênero, meio ambiente, sexualidade, geração, campo, direitos humanos e diversidade étnico-racial na educação. Consideram-se, ainda, relatos de experiências de práticas educativas escolares e não escolares realizadas por movimentos sociais e/ou organização da sociedade civil nessas áreas. 232 GT6 – Educação e Diversidade – Trabalhos aprovados Resumos Simples 01 - ESTADO E COMUNIDADES TRADICIONAIS: REVENDO OS CONTORNOS DE ALGUMAS RELAÇÕES CONTEMPORÂNEAS Paulo Santos Dantas – UERN/USP Doutorando em Antropologia – USP e professor da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN. 02 - EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS EM ESPAÇOS ESCOLARES E NÃO ESCOLARES: A EXPERIÊNCIA DO PROJETO DE EXTENSÃO DIREITOS HUMANOS EM TEMPOS DE DESUMANIZAÇÃO Josefa Aldacéia Chagas de Oliveira Ana Maria Morais Costa Simone Cabral Marinho dos Santos 03 - ORGANIZAÇÃO DAS MULHERES E O RESGATE CULTURAL E PRODUTIVO DOS QUINTAIS Antônia Mábia Z. de Oliveira [email protected] Rejane Medeiros [email protected] Centro Feminista 8 de Março Relata-se uma experiência desenvolvida no projeto11 ―Igualdade de Gênero e Soberania Alimentar: assistência técnica à mulheres trabalhadoras rurais das comunidades dos Territórios Açu/Mossoró e do Sertão do Apodi,‖ no Estado do Rio Grande do Norte/Brasil, coordenado pelo Centro Feminista 8 de Março, em comunidades e projetos de assentamentos rurais das cidades de Mossoró, Apodi e Governador Dix-sept Rosado. O objetivo do projeto é desenvolver de forma participativa com as mulheres, um resgate cultural e o melhoramento dos quintais de suas residências, redescobrindo e reconhecendo esse espaço como de experiências, de diversificação da produção: local sagrado de manutenção das sementes e plantas nativas; encontro da família, das brincadeiras, do descanso, e principalmente como mais um dos espaços de trabalho produtivo das mulheres, pouco, ou quase não visto pela sociedade. Este espaço é gerador de diversificação da alimentação e da renda para completar o orçamento da família. As atividades realizadas são assessorias técnicas à produção e a organização das mulheres, capacitações no manejo, produção e comercialização do excedente nas feiras da agricultura familiar e solidária, intercâmbio de experiências e articulação com movimentos sociais locais, nacionais e internacionais. Espera-se 11 Projeto financiado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) sob coordenação da Assessoria Especial de Gênero, Raça e Etnia (AEGRE). 233 que este acompanhamento contribua com as mulheres rurais para que estas se organizem em uma luta coletiva de transformação da realidade de desigualdade social e submissão. Trata-se, portanto, de uma experiência que busca o reconhecimento do trabalho produtivo das mulheres, para que elas sejam protagonistas de suas próprias vidas e que os quintais trabalhados por elas sejam melhorados e fortalecidos, na perspectivada da diversificação de produtos que atendam as necessidades emergenciais da existência, promovendo a soberania alimentar da família. Palavras-chave: organização de mulheres; quintais produtivos; diversificação da produção alimentar. 04 O LUGAR DA CIDADANIA NA SOCIABILIDADE CONTEMPORÂNEA Ana Maria Morais Costa – mestranda do PPGCS/UFRN e-mail: [email protected] Dr. José Willington Germano – orientador e-mail: [email protected] 05 - ESCOLA DE FORMAÇÃO POLÍTICA E PROFISSIONAL PARA A JUVENTUDE DO CAMPO: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA NO MUNICÍPIO DE APODI/RN Elielma de Sousa Pereira [email protected] Orientadora: Simone Cabral Marinho dos Santos [email protected] 06 - GEOGRAFIA E GÊNERO: UMA EXPERIENCIA EM SALA DE AULA Flávia Spinelli Braga Professora de Geografia do CAMEAM/UERN [email protected] 07 - A SEXUALIDADE EM EXPERIÊNCIAS DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA – OU POR UMA OUTRA EDUCAÇÃO SEXUAL Jéssica Cássia Barbosa (estudante da Graduação em Ciências Sociais/UFRN) Resumo: Partindo do pressuposto de que o corpo, na sua essência de memória própria, ainda é bastante desconhecido pelos indivíduos, chegando ao ápice com o pensamento de Michel Serres de que o inconsciente é o corpo – atos que já nos são encarnados, ou prazeres que se pedem repetição pelo próprio corpo, pretende-se contribuir com o GT através do relato de duas tentativas de abordar o tema da sexualidade – ou de outra 234 forma de educação sexual – no programa de extensão Trilhas Potiguares (UFRN), nos anos de 2008 e 2009. A atividade foi intitulada ―educação sexual começa com poesia‖, na primeira experiência. Tendo na segunda experiência ganhado um caráter interdisciplinar – o corpo na língua sociológica, psicológica, nutricional e médica. Sendo o corpo historicamente apropriado por diversos discursos, a educação sexual, possui, portanto, escolas bastante polares: o cristianismo, a ciência médica e a poesia. Palavras-chave: Corpo; Conhecimento; Sexualidade; Educação Sexual. 08 - OS PARADIGMAS EMERGENTES DA EDUCAÇÃO FÍSICA E O DESAFIO DO PARADIGMA EDUCACIONAL EMERGENTE Osvaldo Nonato dos Santos FACULDADES INTEGRADAS DE PATOS – FIP [email protected] Resumo: A pesquisa bibliográfica embasado em fundamentos teórico científico analisa as tendências emergentes da Educação Física e o paradigma emergente que ao poucos vem consolidando na cultura da civilização contemporânea. Este novo paradigma aqui estudado, entendido também como holístico provoca profundas transformações no comportamento individual e coletivo que se observa nos atuais tempos de paradigmáticas crises, validado por um complexo de teorias que vêm se desenvolvendo nas últimas décadas que formam o arcabouço científico para uma nova visão de mundo – pensamento complexo, de modo a transcender a visão de newtoniana-cartesiana construída durante os séculos XVII, XVIII e XIX – a metáfora do universo máquina que moldou a era industrial e que continua a determinar o modelo de vida da humanidade atualmente. Dentro deste modelo civilizatório de natureza excludente, predatória, autodestrutiva não há qualquer possibilidade de emancipação humana. Numa perspectiva de um paradigma emergente constituído de corpo, mente, sentimento e espírito. Um novo modelo de educação – Construtivista, interacionista, sociocultural e transcendente preocupada em formar indivíduos autônomos, criativos, críticos, cooperativos, solidários e fraternos considerando as diversas dimensões do fenômeno educativo em seus aspectos físicos, biológico, mental, psicológico, cultural e social. Palavra-chave: Tendências Pedagógicas; Educação Física: Paradigma Emergente. 09 - A RELAÇÃO ENTRE TENDÊNCIA E PRÁTICA PEDAGÓGICA DOS PROFESSORES DE EDUCAÇÃO FÍSICA DO 6º A0 9º ANO CICLOS DO ENSINO FUNDAMENTAL DA REDE MUNICIPAL DE IPANGUAÇU-RN Osvaldo Nonato dos Santos Faculdades Integradas de Patos – FIP [email protected] 235 Resumo: O presente artigo surgiu a partir das reflexões feitas durante o curso de Especialização do Programa de Pós-Graduação da Faculdades Integradas de Patos – FIP. Durante o curso foram apresentadas as diversas abordagens pedagógicas que surgiram após a "crise" intelectual que passou a educação Física no início de 1980, afrontando os conteúdos aplicados pelas disciplinas em sua intervenção social, na escola, buscando a construção de um grupo de conhecimentos específicos para a área a fim de identificar e objetivar a mesma, para que ganhasse maior caráter cientifico e respeito social. Porém, a apresentação dessas novas abordagens, cada uma lutando pela hegemonia do conhecimento da educação física, colaborou para ampliar as dificuldades dos professores de Educação Física que atuam no quadro efetivo da Secretaria Municipal de Ipanguaçu, no momento em que os mesmos se perdem entre inúmeras teorias distintas que pouco apresentam de exemplo para facilitar a prática do professor. É assim se que se construiu este artigo, uma tentativa de apresentar, através de pesquisa de campo, as discussões e as principais abordagens que dela surgiram, culminando em uma discussão sobre o que acredito ser a especificidade da Educação Física Escolar sua prática educativa, Pedagógica e Didática. Palavra-chave: Educação Física escolar; Prática Pedagógica; Tendência. 10 - AVALIAÇÃO DO NÍVEL DE ESTRESSE DOS PROFESSORES DO MUNICÍPIO DE IPANGUAÇU - RN Osvaldo Nonato dos Santos Faculdades Integradas de Patos – FIP [email protected] Resumo: O século XXI ressalta a importância de revermos a nossa práxis para que possamos atuar realmente como gestores educacionais comprometidos com as mudanças sociais. Sendo a saúde entendida como um bem estar físico, mental, espiritual e social e a gestão numa visão mais humanizada. Controlar o estresse do dia-a-dia vai aumentar o rendimento dos professores e ajudá-los na preparação do organismo pra lidar com as situações que se apresentam, sendo então uma resposta do mesmo a um determinado estímulo, a qual varia de pessoa a pessoa.(OBJETIVO GERAL) Este trabalho tem como objetivo contribuir, através da implantação de um programa preventivo na área de saúde física e mental comunitária, para um melhor desempenho do gestor de acordo com o perfil o século XXI, os fatores que interferem neste perfil entre o estresse, a auto-estima, a importância do trabalho corporal como estratégia e contribuição para minimizar estes fatores.(METODOLOGIA) A pesquisa foi realizada através da aplicação de entrevistas com os dozes professores/as da Escola Municipal de Ipanguaçu – RN e através de estudos bibliográficos. (RESULTADOS) A pesquisa apresentou à seguinte análise: nenhum dos/as professores/as entrevistados apresentaram grau de estresse alto; 46,23% dos entrevistados possuem um grau de estresse médio e 35,18% dos 236 entrevistados apresentaram de estresse baixo. (CONCLUSÃO) Além do desafio de controlar a classe, eles enfrentam pressões dos alunos, dos pais, dos colegas, dos políticos e dos administradores, São afetados pelos sucessos e fracassos de seus alunos e pelas próprias exigências. O nível de estresse médio demonstra que a necessidade dos professores/as aproveitarem para repensar seu modo de vida e enquanto no nível de estresse baixo pede um maior envolvimento dos professores/as no trabalho sem se abalar pelas pressões do dia-a-dia na sala de aula. Palavras-chaves: Estresse; Trabalho corporal; saúde; auto-estima; Qualidade de vida 11 - DA EDUCAÇÃO RURAL À EDUCAÇÃO DO CAMPO: UMA ABORDAGEM INTRODUTÓRIA 12 Simone Cabral Marinho dos Santos José Willington Germano-Orientador 12 - EQÜIDADE SOCIAL E IGUALDADE RACIAL: HORIZONTES DE UMA EDUCAÇÃO DEMOCRÁTICA Ana Maria Morais Costa Paulo Santos Dantas [email protected] Resumo: Dentre os diversos problemas crônicos que envolvem o debate acadêmico e político sobre a educação escolar, encontra-se o acesso e a permanência nos sistemas de ensino superior dos segmentos populacionais com histórico de escassez de recursos econômicos, preconceitos e estereótipos raciais. Esse trabalho apresenta reflexões sobre o projeto de extensão desenvolvido pela UERN por meio do programa UNIAFRO – SESU/MEC, no ano de 2007, com a participação de 20 estudantes dos diversos cursos ofertados pela instituição. A experiência desenvolvida mostra que a natureza da complexidade da problemática situa-se para além das iniciativas de renovação metodológica, adaptação curricular, inovação nas práticas pedagógicas e formação/capacitação dos/as profissionais do ensino e da educação. No debate político/acadêmico, sobre as políticas de reconhecimento e reparação das desvantagens acumulativas da população afrobrasileira, é ainda comum perceber uma generalização com relação às desigualdades existentes no país e os diversos grupos que 12 Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, da UFRN e Professora do Departamento de Educação- CAMEAM/UERN. 237 sofrem discriminação. A visibilidade que o cenário desse debate conquistou nos últimos anos, ampliado pela construção e implementação de políticas públicas sociais de promoção da cidadania e inclusão social nem sempre é recebido de forma positiva. Tal perspectiva justifica atitudes conformistas e despolitizadas, e fortalece o discurso ideológico, conservador e imobilista, mantendo às estruturas políticas, econômicas e sociais de reprodução das desigualdades sociais e raciais historicamente presentes na sociedade brasileira. GT6 – Educação e Diversidade – Resumos Expandidos 01 - ESTADO E COMUNIDADES TRADICIONAIS: REVENDO OS CONTORNOS DE ALGUMAS RELAÇÕES CONTEMPORÂNEAS Paulo Santos Dantas – UERN/USP Doutorando em Antropologia – USP e professor da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN. O movimento por reparação política que marcou a década de 1990 no Brasil, e problematizou as relações entre o Estado e as comunidades tradicionais, tanto fez emergir novos grupos e sujeitos, como produziu a revisão do lugar da política por direitos. A história do país passava por um momento privilegiado, na medida em que novos sujeitos de interesses entravam em cena. Se de um lado tivemos o crescimento e a potencialização de ―lutas‖ já existentes, como no caso do Movimento dos Sem-Terra, de outro, tivemos a criação de novas figuras legais, os chamados ―direitos insurgentes‖ (SILVA, 1994), os quais penetraram ―nosso direito positivo através dessas rachaduras hermenêuticas que são os ‗direitos difusos‘‖. É a partir deles que as ―populações tradicionais‖ ganham espaço, sobretudo aquelas descritas como ―comunidades remanescentes de quilombos‖, às quais se refere o ―Artigo 68‖. (ARRUTI, 1996: 1). É curioso notar que o ―Artigo 68‖ foi aprovado (sem maiores discussões) como uma das disposições constitucionais transitórias, mais como um item a ser incorporado nas festividades pelo centenário da abolição da escravatura, que pelo seu valor intrínseco. Até 1995, o ―Artigo 68‖ ficou sem qualquer proposta de regulamentação, quando ganha importância e passa a ser alvo de debates e reflexões em âmbito nacional, contexto no qual é então associado às festividades pela memória de Zumbi dos Palmares. (ARRUTI,1996: 8-9). Note-se que a despeito da insistência dos nossos legisladores em conceituar as ―terras de 238 pretos‖ como ―remanescentes de quilombos‖, é esta última impressão/interpretação que prevalece entre aqueles interessados nessas discussões, seja ONGs, as próprias comunidades, antropólogos, juristas ou o Estado. Até o final da década de 90 diversas direções poderiam, portanto, ser tomadas, a fim de explicar o contexto do surgimento das comunidades de quilombos como fenômeno político-social. Discussões mais recentes sinalizam para os modos como a cultura tem sido utilizada como recurso capaz de ser mobilizado por comunidades, grupos sociais, instituições diversas (nacionais e internacionais) e mesmo pelo Estado. Todos eles estariam dispostos a conquistar benefícios, lucros e dividendos políticos diversos. A isso Yudice (2004) chamou de ―poder cultural‖, ou seja, uma forma a partir da qual grupos e comunidades construíram suas reivindicações junto às esferas públicas. O poder cultural se constitui, então, como um instrumento com o qual comunidades tradicionais ou emergentes podem negociar com outros sujeitos políticos, inclusive com o Estado. Um dado importante neste processo é que o próprio Estado tem instrumentalizado a arte e a cultura, ora para produzir um efeito positivo acerca da tolerância multicultural e a participação cívica, ora para estimular o crescimento econômico através de projetos de desenvolvimento cultural. Nesse contexto de instrumentalização simbólica da arte e da cultura como recurso, é delas solicitado algum tipo de retorno da política cultural, o qual diz respeito não somente às exigências de desempenho por parte de empresas, do Estado e de instituições financiadoras, mas também a pressões sobre grupos ou mesmo indivíduos pertencentes a minorias políticas. Esses grupos e indivíduos devem adotar determinada identidade em função de recursos e reconhecimento. A este desempenho exigido, Yudice (2004) chamou de ―imperativo social do desempenho‖. Tal imperativo descreve uma idéia de força performativa que, quando posta em movimento por artistas e produtores culturais, produz um efeito a partir do qual a arte e a cultura são vistas como interessadas em ganhos econômicos e privilégios diversos. Deste modo, na medida em que esta ―força performativa‖ pode ser experimentada de diferentes maneiras e em sociedades distintas, não é o ―caráter nacional‖ que produz as distinções, mas ―um campo diferente de forças gerado por relações dispostas diferentemente entre as instituições estatais e a sociedade civil, o judiciário, a polícia, as escolas e universidades, a mídia, os mercados de consumo etc.‖ (YUDICE, 2004, pp. 69-70, apud BENEVIDES, 2009). No Rio Grande do Norte, basicamente nesta primeira década do século 21, a Prefeitura Municipal, a partir da cidade de Parelhas e da Comunidade Boa Vista dos Negros, vem construindo um discurso que, podendo ser proferido lado a lado 239 com as comunidades tradicionais, parece produzir uma idéia de sintonia política. Como é possível a produção simétrica de discursos por parte de sujeitos cujas experiências e interesses são historicamente distintos? Ou será a distinção discursiva um registro interessado do analista? Recorrendo a discursos de membros de Secretarias de Estado, de representantes da referida comunidade, bem como através de observações empíricas realizadas na cidade de Parelhas durante o mês de setembro de 2009, este texto pretende tomar como objeto o contexto contemporâneos que produziu uma prática discursiva complexa capaz de colocar em xeque a idéia de dicotomia entre Estado e Sociedade Civil. Pretende-se ao mesmo tempo considerar a hipótese segundo a qual está em processo uma transformação do lugar político e simbólico dessas novas/antigas comunidades tradicionais. Como esses novos discursos estão se formando e para aonde eles apontam será, portanto, o objetivo central do texto em pauta. Palavras - chave: Estado; Comunidade Boa Vistas/Rio Grande do Norte; Reparação Política. REFERÊNCIAS ARRUTI, José Maurício A. A emergência dos “remanescentes”: notas para o diálogo entre indígenas e quilombolas. Texto apresentado na reunião da ABA, em Salvador, 1996. BENEVIDES, Rubens de Freitas. ―O ethos nacional - entre as políticas da identidade e as políticas da diferença‖. In: XIV Congresso Brasileiro de Sociologia 28 a 31 de julho de 2009, Rio de Janeiro (RJ). SILVA, Dimas S. da. 1994. ―Direito Insurgente do Negro no Brasil: Perspectivas e Limites no Direito Oficial‖. In: S. Donizete Chagas (org.), Lições de Direito Civil Alternativo. São Paulo: Ed. Acadêmica. YÚDICE, George. A conveniência da cultura. Usos da cultura na era global. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2004. 02 - EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS EM ESPAÇOS ESCOLARES E NÃO ESCOLARES: A EXPERIÊNCIA DO PROJETO DE EXTENSÃO DIREITOS HUMANOS EM TEMPOS DE DESUMANIZAÇÃO Josefa Aldacéia Chagas de Oliveira Ana Maria Morais Costa Simone Cabral Marinho dos Santos Introdução: A Educação em Direitos Humanos pela amplitude de conteúdos teóricos e práticos é um dos instrumentos mais eficazes no combate à violação dos Direitos Humanos na medida em que sendo essa perspectiva da educação, herdeira da educação popular, carrega uma vocação explicita 240 de construção de um projeto histórico, de uma vontade mobilizadora definida por uma opção orientada à mudança estrutural e ao compromisso com os setores populares, educando na/para a valorização da dignidade e nos princípios democráticos, mediante processos em que se materializam interações com todas as áreas do conhecimento, facilitando a explicação, compreensão e a intervenção, marcando discrepâncias com visões educativas neutras. Portanto, uma educação que subjaz uma visão crítica e política, na qual permeia o potencial crítico e transformador da realidade pedagógica, social e institucional da realidade, a construção de novos hábitos, valores e atitudes e, essencialmente, a formação de sujeitos de direitos. Essa perspectiva educacional vem, paulatinamente, se intensificando no debate nacional na atualidade. Ações e atividades vêm sendo desenvolvidas, não só por organizações governamentais, mas principalmente não-governamentais. Nesse horizonte, o Projeto Direitos Humanos em Tempos de Desumanização, enquanto ação extensionista universitária, através do convênio 284/2007 entre a Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República – SEDH/PR e Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN, através do Departamento de Educação – DE, Campus Avançado Profª Maria Elisa de Albuquerque Maia – CAMEAM, numa parceria com o Comitê Estadual de Educação em Direitos Humanos do Rio Grande do Norte, buscou destacar o papel estratégico da educação em direitos humanos, tida como espaço privilegiado pelos atores e atrizes sociais e agentes institucionais que incorporam a promoção dos direitos humanos como princípio e diretriz. Descrevemos, aqui, os processos de desenvolvimento do referido projeto, enfatizando as atividades desenvolvidas, resultados e contribuições sociais e uma breve avaliação. Atividades do Projeto: A continuidade do Projeto Direitos Humanos em Tempos de Desumanização (primeiro convenio foi realizado em 2006 e 2007), em 2008, mediante convênio com a Secretaria Especial de Diretos Humanos da Presidência da República – SEDH/PR, foi viabilizada pela continuação da parceria com o Comitê Estadual de Educação em Direitos Humanos - CEEDH e, particularmente, pelas demandas de ampliação dos processos de formação contínua de profissionais da educação e agentes sociais que atuam ou têm interesse na área da educação em direitos humanos, dada a emergência e a importância do tratamento dessa temática na sociedade atual, marcada por profundas desigualdades sociais e resistências à promoção desses direitos, mais nas regiões oeste e alto-oeste do Rio Grande do Norte, as quais apresentam baixos níveis de acesso aos direitos fundamentais, o que desafia a necessária problematização e reflexão sobre a garantia dos direitos humanos. Essas demandas manifestaram-se nas articulações e mobilizações vivenciadas no percurso de desenvolvimento do projeto anterior, mediante convênio com o MEC/SECAD, particularmente nos municípios de Pau dos Ferros, Patu, Mossoró e Caicó, através dos Grupos de Trabalho, que se formaram, em 2007, os quais congregam representantes de movimentos sociais, Universidade, poder público e instituições públicas e sociais, realizando-se, mediante discussões acerca da realidade local no que tange às problemáticas locais, às condições de violação dos direitos humanos e sob a 241 coordenação de sujeitos locais, uma formação preliminar na área da educação em direitos humanos. Em sintonia com essas demanda e embasados numa perspectiva da extensão universitária enquanto ação que exerce função complementar na dinâmica da vida universitária, constituindose, portanto, um elo significante das demais funções - ensino e pesquisa- e, por sua vez, inserindo-se como atividade imprescindível à formação universitária, o projeto, cuja vigência se deu no período de dezembro de 2008 a abril de 2009, foi conduzido, em todas as suas fases, por uma equipe de trabalho, formada por docentes e funcionários dos Campi de Pau dos Ferros, Mossoró, Apodi e Patu, membros do Comitê Estadual de Educação em Direitos Humanos, discentes do Curso de Pedagogia (Departamento de Educação/CAMEAM/UERN), Comunicação Social e Ciências Sociais (Campus Central), bem como por lideranças comunitárias dos vários municípios em que foram desenvolvidas as ações, com vistas à ampliação e à consolidação das ações desenvolvidas na/pela UERN, no campo dos Direitos Humanos. Nesse percurso, foram desenvolvidas ações distintas, porém interdependentes. Ações mais diretamente ligadas à qualificação em Educação em Direitos Humanos de profissionais da Educação Básica Pública e Lideranças Comunitárias, ao fortalecimento do CEEDH, bem como à produção de materiais educativos. No desenvolvimento dessas ações objetivou-se, de uma forma geral, oferecer condições concretas para o fortalecimento institucional do Comitê Estadual de Educação em Direitos Humanos, dar continuidade às ações de capacitação em educação em direitos humanos voltados para trabalhadores (as) da Educação Básica, e ainda, a ampliar a ação de capacitação para beneficiar lideranças comunitárias, membros da sociedade civil e militantes na área dos direitos humanos na ação de capacitação. E, de forma mais específica: a) Capacitar na área da educação em direitos humanos os (as) integrantes do Comitê Estadual de Educação em Direitos Humanos; b) Realizar reuniões com vistas a elaborar e executar um Plano Anual de Ações do CEEDH; c) Articular os atores sociais na construção do PEEDH; c) Fomentar a participação do CEEDH no NUEDH para fortalecer e dar continuidade às ações de educação em direitos humanos no estado; d) Dar continuidade ao Cadastro Institucional de experiências de educação em direitos humanos no Estado, realizadas por instituições registradas com 5 (cinco) anos ou mais de atuação na área; e) Produzir um catálogo com cadastro das experiências exitosas em direitos humanos no Estado; e) Contribuir com o fortalecimento da formação continuada dos trabalhadores (as) da Educação Básica da rede municipal e estadual de ensino; f) Ampliar a ação de capacitação para as lideranças comunitárias e membros atuantes da sociedade civil; g) Publicar e disponibilizar em meio eletrônico todo material produzido durante as oficinas de capacitação. Resultados/Benefícios Alcançados: O trabalho desenvolvido, no período da vigência do projeto, expressa significativo amadurecimento da prática extensionista no interior da UERN, além da perspectiva manifesta, através do processo de organização de Grupos de Trabalho por eixos temáticos de construção do Plano Estadual de Educação em Direitos Humanos – PEEDH, de formação de uma rede de Instituições de Ensino Superior (IES) no Estado 242 Potiguar, de modo a agregar as Instituições de Ensino Superior -IES públicas e privadas. Se for possível medir o impacto social desse projeto, imprescindível remetermo-nos ao processo de institucionalização da extensão como prática acadêmica que potencializa e possibilita o acesso ao conhecimento que o ensino regular e a pesquisa ainda não realizam. Partindo dos objetivos propostos para realização do projeto Direitos Humanos em Tempos de Desumanização, apontamos os seguintes resultados: a) Continuidade da divulgação do Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, através das atividades de formação realizadas: cursos, seminários temáticos, audiências públicas; b) Formação de, aproximadamente, 360 (trezentos e sessenta) profissionais da Educação Básica Pública em Cursos de Educação em Direitos Humanos, sendo que destes foram formados como formadores/multiplicadores dos demais; c) Inclusão, nos espaços de formação, mais precisamente nos Cursos, de lideranças comunitárias e militantes da sociedade civil e política, mediante a formação de mais de 50 (cinqüenta) lideranças comunitárias e membros atuantes da sociedade civil em Cursos realizados em municípios, como: Mossoró, Pau dos Ferros, Patu , Apodi e Campo Grande. d) Fortalecimento do Comitê Estadual de Educação em Direitos Humanos; e) Continuidade da realização do cadastro de instituições sociais que atuam ou tem interesse em direitos humanos no RN; f) Mobilização do Estado do RN para a elaboração do PEEDH; f) Contribuição nas discussões de inserção na perspectiva da educação em direitos humanos como eixo norteador dos projetos políticos pedagógicos das escolas.; g) Contribuição nos processos de formação continuada de professores/as e gestores/as da rede pública, no desenvolvimento de abordagens teóricas e metodológicas h) Institucionalização do Núcleo de Estudos e Práticas Extensionistas em Educação em Direitos Humanos –NUEDH vinculado ao Departamento de Educação (Campus Pau dos Ferrros). i). Articulação permanente com a Unidade de Processamentos de Dados da UERN visando a atualização de informações referentes às ações desenvolvidas no âmbito da Educação em Direitos Humanos no Estado. j) Realização, mediante ação conjunta entre UERN e CEEDH, de seminários temáticos, em conformidade às áreas temáticas do PNEDH :Educação Básica; Educação Superior; Educação Não-formal; Educação dos Profissionais de Justiça e Segurança; Educação e Mídia. l) Construção/formação, no processo ora vivenciado de construção do Plano Estadual de Educação em Direitos Humanos, de uma possível rede de Instituições de Ensino Superior (IES) no RN, de modo a agregar IES públicas e privadas, em favor da defesa, promoção e difusão da Educação em Direitos Humanos – EDH. m) Produção e veiculação de materiais educativos como: Vt para televisão, micro jornal do PEEDH/RN; 243 n ) Ampliação das articulações, em nível de UERN, no campo da extensão universitária,com instituições da sociedade política e civil,dentre outros atores sociais que atuam no campo da EDH. 0) Maior estreitamento nas relações acadêmico-científicas e nas ações, no campo da EDH, com os grupos de pesquisa e de extensão no campo das Letras e das Artes, vinculados ao Departamento de Letras dos Campi de Mossoró e de Pau dos Ferros. Tecendo conclusões para iniciar o debate: Em articulação com o ensino e a pesquisa, a extensão universitária no campo dos Direitos Humanos tem se manifestado como uma prática acadêmica universitária imprescindível, na medida em que suas ações são direcionada a questões sociais do país e do Estado, bem como àquelas demandadas pelas comunidades regionais e locais, na forma de relações com os setores da sociedade civil e política e na contribuição para a construção de um projeto de mudança social. Trata-se de processos em que se articula Universidade e sociedade civil organizada em ações que valorizam a transmissão e construção do conhecimento através da participação e de ações coletivas, tanto em espaço de educação formal quanto não-formal. Assim, avaliamos como aspectos positivos dessa atividade: - A articulação com segmentos organizados e o reforço do papel social da universidade; - Excelente material produzido durante as oficinas: poemas, músicas, textos, planejamento de aulas, desenhos etc; - Articulação entre os municípios do Alto-Oeste Potiguar participantes do Projeto; - Perspectiva entre integrantes do projeto e participantes do curso de dar continuidade às ações em EDH. Quanto às dificuldades, destacaram-se: a) Burocracia no repasse de recursos e pagamento de despesas; b) Não-disponibilidade de alguns dos formadores/multiplicadores para facilitarem oficinas nos cursos realizados em novembro e dezembro/2008, nos municípios de Apodi, Campo Grande, Mossoró, Patu e Pau dos Ferros que participaram do Curso, em agosto e setembro/2008, com vistas O que nos condicionou a buscar contribuições de muitos docentes da UERN que têm atuação no campo da EDH, discentes do Curso de Especialização em Direitos Humanos, dentre outros. c) .Excesso de atividade e ações para serem executadas, em curto tempo, no que se refere ao prazo do convênio. d) Ausência, ainda, de uma cultura de planejamento por parte do CEEDH; e) Dificuldades nas relações com o CEEDH no processo de execução financeira. Nesse contexto, diante de tudo o que vivemos e conseguimos construir/realizar com esse Projeto, sentimos que devemos dar continuidade às ações, buscando fortalecer as iniciativas que temos desenvolvido na área de educação em diretos humanos em nossa Universidade. Entretanto, o fortalecimento do Núcleo de Extensão Universitária em Educação em Direitos Humanos – NUEDH, enquanto grupo de estudos e práticas extensionistas, vinculado ao Departamento de Educação, do Campus Avançado Profª Maria Elisa de Albuquerque Maia (CAMEAM), da 244 Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), dentre outros pontos, nos é posto como um grande desafio. Daí a importância de novos editais e de novos convênios na área que incentivem tais ações no campo dos Direitos Humanos, dentre outras ações extensionistas, que , cada vez mais, devem ser tidas como atividades de caráter permanente e institucional e não apenas de forma pontual e residual. REFERÊNCIAS BRASIL. Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos. Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos. Brasília-DF: Secretaria Especial dos Direitos Humanos; Ministério da Educação, 2003. 52 p. CANDAU, Vera Maria F.; SACAVINO, Susana. Educação em Direitos Humanos. In: CANDAU, Vera Maria F.(Org.). Magistério: construção cotidiana. Petrópolis-RJ: Vozes, 2003 CANDAU, Vera Maria et all. Tecendo a cidadania: oficinas pedagógicas de direitos humanos. Petrópolis, RJ: Vozes, 19995. CANDAU, Vera Maria et all. Oficinas pedagógicas de direitos humanos. 2. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995. CANDAU, Vera Maria. Educação em direitos humanos: desafios para a formação de professores. In:______. Nuevamerica, n. 78, Rio de Janeiro, julho, 1998 CARVALHO, José Sérgio et all. Formação de professores e educação em direitos humanos e cidadania: dos conceitos àsações. In: ______. Educação e Pesquisa, v. 30, n. 3, São Paulo, set/dez. 2004. p. 435-445. DORNELLES, João Ricardo W. O desafio de educar para os direitos humanos: os 50 anos da declaração universal das Nações Unidas. In:______. Nuevamerica, n. 78, julho, 1998. MELLO, Laura Cristina Campello do Amaral. O movimento de educadores em direitos humanos como espaço de formação de professores. In:______. Nuevamerica, n. 102, Rio de Janeiro, junho, 1998. 03 - ORGANIZAÇÃO DAS MULHERES E O RESGATE CULTURAL E PRODUTIVO DOS QUINTAIS Antônia Mábia Z. de Oliveira [email protected] Rejane Medeiros [email protected] Centro Feminista 8 de Março Introdução: A realidade vivenciada pelas mulheres trabalhadoras rurais na região oeste potiguar é marcada por grandes dificuldades. Uma delas é provocada pela divisão sexual do trabalho, que define na sociedade o que são papéis masculinos e femininos, nos quais aos homens é destinado o mundo público e as mulheres o privado. Nessa estrutura se estabelecem relações de poder dos homens sobre as mulheres. Na região existe experiências em curso protagonizadas por mulheres rurais que decidiram construir uma luta coletiva de transformação dessa realidade de desigualdade e submissão. Pode-se dizer que, a partir dessa luta, foi 245 possível conquistar o crédito específico, a titularidade conjunta, documentação, lei de combate à violência contra a mulher e a experiência com projetos produtivos, entre outras conquistas. Relata-se uma experiência desenvolvida no projeto13 ―Igualdade de Gênero e Soberania Alimentar: assistência técnica à mulheres trabalhadoras rurais das comunidades dos Territórios Açu/Mossoró e do Sertão do Apodi,‖ no Estado do Rio Grande do Norte/Brasil, coordenado pelo Centro Feminista 8 de Março, em comunidades e projetos de assentamentos rurais das cidades de Mossoró, Apodi e Governador Dix-Sept Rosado. O objetivo do projeto é desenvolver de forma participativa com as mulheres, um resgate cultural e o melhoramento dos quintais de suas residências, redescobrindo e reconhecendo esse espaço como de experiências, de diversificação da produção: local de manutenção das sementes e plantas nativas; encontro da família, das brincadeiras, da tranqüilidade, e principalmente como mais um dos espaços de trabalho produtivo das mulheres, pouco, ou quase não visto pela sociedade. Este espaço é gerador de diversificação da alimentação e da renda para complementar o orçamento da família. Portanto, se destina a expandir experiências de movimento social, contribuindo com a organização de novos grupos de mulheres trabalhadoras rurais e o fortalecimento da sua produção nas comunidades e assentamentos rurais. O projeto é desenvolvido diretamente junto a 150 mulheres trabalhadoras rurais dos municípios de Mossoró e Apodi, se expandindo para o município de Governador Dix-sept Rosado, assessorando novos grupos de mulheres. É importante salientar que esse trabalho é direcionado mais para mulheres das comunidades rurais. As mulheres dessas comunidades têm maiores dificuldades quanto a organização, quando comparado com as áreas de assentamentos rurais. Pois, esses espaços originados da reforma agrária têm maior acesso as políticas públicas, como assistência técnica, crédito e os incentivos em geral voltados para a agricultura familiar, possibilitando um maior processo de organização e luta coletiva. Esse trabalho, também, dar acompanhamento sistemático aos grupos, tanto relacionado ao movimento feminista, através da Marcha Mundial da Mulheres14, como ao produtivo. Com a produção, é realizado um trabalho de melhoramento e fortalecimento dos quintais, com a diversificação de produtos para a soberania alimentar das famílias, com base nos princípios da economia solidária e da agroecologia. Os quintais representam uma unidade agrícola, e hoje estão sendo discutidos e pensados, como uma forma de resgate cultural das práticas agrícolas realizadas em tempos passados. Essas práticas são comuns nas famílias sertanejas, pensando o Brasil como um país rural; é também uma 13 Projeto financiado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) através da coordenação da Assessoria Especial de Gênero, Raça e Etnia (AEGRE). 14 A Marcha Mundial das Mulheres é um movimento feminista, que surgiu em 2000 com uma grande ação que reuniu mulheres de 165 países, em uma campanha contra a pobreza e a violência sexista. 246 alternativa de convivência com o semi-árido. O trabalho no quintal realizado pelas mulheres não pode ser visto apenas como uma extensão do trabalho doméstico, reprodutivo, pois garante a diversificação da alimentação da família, da renda extra, e demonstra que as mulheres participam da economia local. Realizar esse trabalho nos quintais tem possibilitado para as mulheres, redescobrir e reconhecer os seus valores. Tem permitido ao Centro Feminista 8 e Março um contato mais direto com as mulheres, em função de ser o prolongamento de suas casas, seu espaço de trabalho, do cuidado, de experiências, de diversificação da produção. Metodologia: Os métodos utilizados são ações participativas, respeitando acima de tudo, o conhecimento e a sabedoria popular de cada localidade. Assim, busca-se contribuir com processos de formação em acompanhamento sistemático nas comunidades participantes do projeto, participando da construção e organização de grupos de mulheres, fortalecendo os já existentes em suas necessidades através de visitas, reuniões e oficinas. Essa forma favorece o acompanhamento da produção nos quintais, na perspectiva de iniciar o trabalho onde ainda não tem nenhuma atividade, ou fortalecer as já existentes. Através de capacitações, visitas de intercâmbio a experiências consolidadas, trocas de experiências entre os grupos, cursos de ampliação da produção nos quintais na perspectiva agroecologica e conhecimentos de novas tecnologias de produção acessíveis a agricultura familiar. Existem atividades individuais com cada mulher, onde plantam e criam pequenos animais em seus quintais, a partir de sua vontade, experiência, espaço e disponibilidade. Um caso interessante, problematizado entre muitas mulheres é o fato de acharem que é impossível unir a atividade de plantar com a de criar, principalmente para quem cria aves (galinha, guiné, patos). No decorrer das visitas, conversas e as trocas de experiências, as mulheres têm percebido que é possível criar e plantar nos quintais. Assim, vários quintais estão sendo trabalhados e onde se encontrava a dificuldade entre o plantar e o criar, esta sendo resolvida de diferentes formas, proteção com telas, faxinas feitas de estacas de algumas plantas nativas e talos de carnaúbas. Os intercâmbios são momentos ricos de trocas de saberes e a oportunidade de visitar uma experiência consolidada. É um momento de mostrar que é possível criar técnicas de convivência com as diversidades, dificuldades e semelhanças encontradas no semi-árido. Os intercâmbios vão além das trocas de experiências, pois, acontecem trocas de plantas nativas e medicinais, modos de comercialização, receitas e técnicas saudáveis que respeita o ambiente e as pessoas, como também, de informações, culturas, boas energias, alegrias e estímulos que fortalecem a organização política das mulheres e o trabalho que essas vivenciam no seu dia-a-dia. Resultados e Discussão: É grande o interesse por hortaliças, principalmente o coentro e a cebolinha, as quais já são cultivadas em alguns quintais, nas mais diferentes situações, em caixas de geladeiras, bacias, pneus, canteiros suspensos e na forma tradicional que são os canteiros no chão. 247 Esclarecimentos sobre as formas de plantio são feitos durante as visitas como também nos cursos e oficinas nos quais são distribuídas sementes das mais variadas hortaliças como coentro, cebolinha, beterraba, cenoura, alface, berinjela, pimentão, tomate entre outras. Outro incentivo feito é para o plantio de plantas medicinais, tentando formar em cada quintal, uma pequena farmácia viva, com plantas nativas medicinais da região, para que possam ser utilizadas em eventuais ―doenças‖ como dor na cabeça, febres, diarréias, enxaqueca, gripes e inflamações. Entre as mulheres é comum a troca de plantas medicinais nos intercâmbios, como também de conhecimentos sobre determinadas plantas. Conclusão: O período de trabalho nos grupos permite perceber que já aconteceram algumas mudanças substâncias nessas comunidades e assentamentos, como formação de novos grupos de mulheres rurais discutindo e reivindicando seus direitos, conhecendo as políticas públicas voltadas para as trabalhadoras rurais, com capacidade de intervenção e proposição para seu aprimoramento e acesso de acordo com suas demandas. O trabalho nos quintais é uma realidade, uma conquista e reconhecimento do trabalho das mulheres. Algumas já estão produzindo para o consumo da família, economizando para empregar o recurso que antes era voltado para comprar hortaliças em outras necessidades. O excedente dessa produção está sendo vendido nas feiras da agricultura familiar e solidária em seus municípios, e na Rede Xique – Xique15 de comercialização solidária. Trata-se, portanto, de uma experiência que busca o reconhecimento do trabalho produtivo das mulheres, para que elas sejam protagonistas de suas próprias vidas e que os quintais trabalhados por elas sejam melhorados e fortalecidos, na perspectivada da diversificação de produtos, promovendo a soberania alimentar da família. REFERÊNCIAS CENTRO FEMINISTA 8 DE MARÇO. Práticas feministas na região Oeste: um olhar a partir da auto-organização das mulheres. Cadernos de 8 Março – n° 8. IGRAMOL, 2008. MARCHA MUNDIAL DAS MULHERES. Cadernos n° 1 Junho/2008. IGRAMOL, 2008. ANAMURI – Associação Nacional de Mulheres Rurais Indígenas (Chile); REDES/AMIGOS DA TERRA – Programa Uruguai Sustentável (Uruguai); SOF – Sempreviva Organização Feminista (Brasil); PROGRAMA CONE SUL SUSTENTÁVEL. Soberania Alimentar: uma resposta às mudanças climáticas. Janeiro/2009. Maxprint Editora, São Paulo, 2009. 15 A Rede Xique-Xique é uma rede de comercialização e economia solidária, formada por grupos produtivos de mulheres e mistos (reúnem homens e mulheres) da agricultura familiar, dos vários municípios do Estado do Rio Grande do Norte, e realiza diversas atividades de formação e articulação, através de seminários, oficinas e intercâmbios. 248 04 O LUGAR DA CIDADANIA NA SOCIABILIDADE CONTEMPORÂNEA Ana Maria Morais Costa – mestranda do PPGCS/UFRN e-mail: [email protected] Dr. José Willington Germano – orientador e-mail: [email protected] Introdução: A cidadania parece visitar todos os espaços da sociabilidade contemporânea. Transita livremente nos vários discursos: dos grupos políticos (de qualquer agremiação e setor social), dos empresários, dos grupos populares, nas pautas de reivindicações dos movimentos sociais, nos meios de comunicação de massa, nas elaborações dos planejamentos e projetos políticos pedagógicos, nas diretrizes do Banco Mundial, ONU/UNESCO, na proliferação de espaços locais de participação popular e controle democrático, na produção intelectual. No entanto, quando pensamos em cidadania relacionada à noção de participação na esfera política registramos aspectos de uma crise revelada no desencanto com as instituições políticas e seus integrantes, insatisfação e denúncia de corrupção, esvaziamento dos movimentos sociais etc. Ausência e exaltação de cidadania paradoxalmente encontram-se. Ao mesmo tempo em que se percebe a frágil e incompleta cidadania dos (das) brasileiras (as), percebe-se também diversas instâncias de decisões, de mecanismos e canais de participação, numa estranha combinação de espaços políticos formais ocupados por representantes da população e esvaziamento político da noção de cidadania. A presença da noção cidadania nos diferentes discursos sobre o social, o econômico, o político, o cultural, lhe confere um status de categoria universal, com valor comum a todo o grupo social, independentemente de classe, gênero e etnia, e de posições teóricas, políticas, culturais e ideológicas. Essa forma de apresentação da noção de cidadania é presente desde a sua origem burguesa. A cidadania relacionada ao surgimento das cidades e organização da vida social na Polis Grega, tendo por base o exercício da liberdade, e a capacidade dos homens livres16 exercerem seus direitos e deveres de cidadão, é recuperada como categoria universal nos ideais da burguesia. Com as revoluções burguesas, torna–se presente nas cartas constitucionais, dando origem ao Estado de Direito, no qual todos os homens são iguais ainda que perante a lei. Principio afirmado nas constituições norte americana (1776) e francesa (1798) e reorganizado e ratificado pela ONU em 1948, na Declaração Universal dos Direitos do Homem. 16 Não estavam incluídos na condição de homens livres: as mulheres, as crianças, os camponeses pobres e os escravos. 249 Embora o princípio de que todos os homens são iguais, ainda que perante a lei, represente uma conquista importante para a cidadania universal, representa também, de certa forma, a legitimidade da desigualdade social. Ao expressar que os homens são iguais diante da lei, os burgueses revelam (pela omissão), que eles não são iguais em capacidade e potencialidade de produção dos bens econômicos e culturais, e, consequentemente, nas condições de acesso às riquezas econômicas, políticas e culturais. A visão de mundo burguesa é expressa inicialmente nesse silêncio, quando institui a definição da noção de cidadania como categoria universal. Se os homens não são iguais socialmente, a conquista de bens econômicos e culturais pertence à esfera da individualidade e depende da capacidade de concorrência e disputa das idéias em torno das quais se organiza a noção de cidadania burguesa, atualizada de acordo com as exigências de cada sociedade e período histórico e social. Para GOHN (1994, p. 11-14), a cidadania burguesa associada à noção dos direitos naturais e imprescritíveis do homem (liberdade, igualdade perante a lei e direito à propriedade) é definida a partir da idéia de propriedade como bem supremo, que garante a independência econômica, a liberdade e a cidadania, e só o proprietário tem plena liberdade e plena cidadania. ―A igualdade natural entre os homens seria desfeita no plano real pela desigualdade entre cidadão-proprietário e o não-cidadão e o nãoproprietário‖. (op. cit., 12). Para a autora, esse cenário é modificado no século XVIII. A ênfase na razão e na história constrói o sonho de modificar a ordem social e política, os não proprietários passam a ser concebidos como classes populares – sujeito de direitos, que através da instrução e da consciência conquistam o estágio de sujeitos políticos, capazes de modificar a realidade. A conquista da cidadania é intrinsecamente relacionada a uma questão educativa. Dessa forma, a cidadania construída no processo de ascensão do capitalismo e consequente dominação e exploração tem a sua evolução inscrita nas lutas políticas e sociais. O seu conteúdo é resultado de conquistas processadas em muitos embates envolvendo diversos grupos sociais e culturais. As infinidades de carências sofridas são transformadas em demandas e reivindicações coletivas, e também em sistematizações teóricas do papel do Estado e da sociedade civil, no dialético jogo do desenvolvimento histórico. Neste sentido, afirma MANZINE-COVRE (2001, p. 10): Quem detém o poder cuida de encaminhar as coisas na direção que atenda basicamente aos seus interesses, e não ao interesse de todos, apesar da aparência contrária (...). Só existe cidadania se houver a prática da reivindicação, da apropriação de espaços, de pugna para fazer valer os direitos de cidadão. Neste sentido, a prática de cidadania pode ser a estratégia, por excelência, para a construção de uma sociedade melhor. Mas o primeiro pressuposto dessa prática é que esteja assegurado o direito de reivindicar, e que o conhecimento desses direitos se estenda cada vez mais a toda a população. 250 Para SEN (2000), a cidadania é um dos aspectos constitutivos do desenvolvimento social, este relacionado à condição de agente 17 das pessoas, construído e conquistado pela expansão da liberdade como elemento primordial para o desenvolvimento social. Para o autor, os diversos tipos de liberdade apresentam-se inter-relacionados e interdependentes. O exercício de um tipo de liberdade promove outros tipos de liberdade. Desse modo, a condição da cidadania se alicerça na conquista das liberdades substantivas, compreendidas como capacidades de evitar todas as formas de privações, desde a condição de escolha de viver do modo como desejarem à participação política e liberdade de expressão. Por outro lado, a condição de agente de cada um é inescapavelmente restrita e limitada pelas oportunidades sociais, políticas e econômicas de que dispomos. Existe uma acentuada complementaridade entre a condição de agente individual e as disposições sociais: é importante o reconhecimento simultâneo da centralidade da liberdade individual e da força das influências sociais sobre o grau e o alcance da liberdade individual. Para combater os problemas que enfrentamos, temos que considerar a liberdade individual um comprometimento social. (SEN, 2000, p. 10). Compreende-se, diante disso, que a idéia de cidadania não é abstrata. Como motivação e resultado da ação política, é passível de uma multiplicidade de significados políticos e ideológicos que orientam as práticas educativas e sociais dos grupos envolvidos na ação política/reinvidicativa, e também, os estudos, análises e ação educativa dos intelectuais, que em cada momento histórico e cultural buscam apreender o significado da realidade social a partir de recortes teóricos e metodológicos adotados. A discussão ganha maior relevância no debate educacional no Brasil a partir da LDB 9394/96 que apresenta a formação dos professores e das professoras como condição democrática e o exercício da cidadania e como um dos indicadores da mudança para um ensino de qualidade. Para DEMO (2000) é a formação do profissional formador de profissionais que permite pensar no encontro da qualidade formal e da qualidade política como processo interdepende da qualidade do ensino. Cremos que é essa perspectiva que possibilita pensar a educação para a cidadania no espaço escolar. No entanto destacamos que a produção acadêmica precisa avançar na construção de respostas a algumas questões, tais como: Que significações assumem a formação do profissional, formador dos profissionais? Quais conteúdos e espaços de vivência e construção da cidadania oportunizam a renovação das suas práticas educativas? Quais suportes teórico-metodológicos devem estar presentes na formação do 17 SEN (2000) define agente como o indivíduo membro do público e participante de ações econômicas, sociais e políticas. Alguém que age e ocasiona mudanças e cujas realizações podem ser julgadas de acordo comeus próprios valores e objetivos, independentemente de as avaliarmos ou não também segundo algum critério externo. 251 professor e da professora para que estes possam contribuir com a recuperação do significado político da noção de cidadania? Assumindo a perspectiva de que a aprendizagem cidadã envolve como pressuposto a incorporação de valores como a igualdade, democracia e justiça social e considerando a existência de várias instituições de socialização, surge um questionamento: é a escola o espaço especializado para a formação de valores? Se a educação para a cidadania exige a construção de uma cultura cidadã alicerçada em valores que orientam as atitudes e práticas, é preciso reconhecer à multiplicidade de espaços na sociedade contemporânea que socializam e culturalizam as pessoas, como as religiões, as famílias, a mídia, os partidos políticos e os movimentos sociais. Ressalta-se que os setores populares têm construído diversos espaços de formação da cidadania coletiva, e são experiências que, pulverizadas em todo o país, formam atores sociais, constroem identidades plurais e personalidades democráticas, reconstruindo e reapropriando os espaços da vida cotidiana como alternativa aos modelos de desenvolvimento social e político, construindo novas formas de ser e viver em sociedade. Cremos que a educação para a cidadania precisa considerar essas experiências como espaços por excelência de formação cidadã e aproximar tais experiências do cotidiano escolar, alimentando a reflexão teórica e sendo alimentada por ela, num permanente exercício de construção e reconstrução do conhecimento. Neste sentido, apontamos o espaço dos movimentos sociais: das ONGs, dos conselhos, das experiências comunitárias de autogestão e cooperação, das práticas econômicas alternativas, da participação nos espaços formais de definição das políticas públicas, do orçamento participativo, do controle dos gastos públicos, dentre tantos outros. Compreendemos que estes, são espaços especializados de educação para a cidadania. São espaços da práxis, da convivência com a diferença, da formulação e condução das reivindicações, da (re) organização do discurso, da transformação das carências sociais dos setores excluídos em direitos, da construção de estratégias que acionem a capacidade provedora do Estado. São espaços permeados pela presença ativa e postura crítica com relação ao público, e pelo sentimento da necessidade de extensão dos conhecimentos dos direitos a camadas mais amplas da população, ensaiando a educação para a cidadania como um novo aprendizado socioeducativo em permanente construção. Porém, se a educação não é o único espaço, nem talvez o mais especializado para formar a pessoa cidadã, ela é indispensável na construção da cidadania coletiva, conforme destaca Paulo Freire (1995, p. 74): Não dá para dizer que a educação crie a cidadania de quem quer que seja. Mas sem a Educação, é difícil construir a cidadania. A cidadania se cria com presença ativa, crítica, decidida, de todos nós com relação à coisa pública. Isso é dificílimo, mas é possível. A educação não é a chave para a transformação, mas é indispensável. A educação sozinha não faz, mas sem ela também não é feita a cidadania. 252 Do mesmo modo, podemos dizer que não são os/as professores/as os principais formadores/as da cidadania, porém sem a atuação cidadã na sala de aula e no espaço escolar a cidadania não chegará ao estudante. Para que ocorra tal mecanismo é necessária uma construção teórica e uma atuação prática, apoiada nos princípios da justiça social, democracia e compromisso social, como horizontes de uma noção de cidadania indispensável à educação brasileira. Ou seja: a educação para a cidadania só estará presente na formação do/a estudante se estiver presente no professor e na professora. Presença como discurso teórico sistematizado a partir das experiências vividas, mas principalmente como uma atitude cidadã, que propicie o contato do estudante com a comunidade e com os atores sociais envolvidos na construção da cidadania, do manejo crítico do conhecimento, numa perspectiva teórica crítica e integradora das várias abordagens que possibilitam a emancipação da pessoa humana e a democratização da sociedade. REFERÊNCIAS AZEVÊDO, Alessandro Augusto de. Sem medo de dizer não: o PT e a política do Rio Grande do Norte – 1979 – 1990. Dissertação de Mestrado em Ciências Sociais, Natal: UFRN, 1996. BRENSTEIN, Basil. Poder, Educación y Conciencia – sociologia de la transmissión cultural. Barcelona: El Roure Editorial, S. A., 1990. BOURDIEU. Pierre, O Poder Simbólico. 3. ed. Rio de Janeiro: Bertrad Brasil, 2000. DEMO. Pedro. A NOVA LDB – ranços e avanços. 10. ed. Campinas, SP: 2000. FREIRE, Paulo. Construção de uma nova cultura política. IN: Poder Local, Participação Popular, Construção da Cidadania. São Paulo: Fórum Nacional de Participação Popular nas administrações municipais, 1995 (N.01). GOHN, M.G.M. Movimentos Sociais e Educação. São Paulo: Cortez, 1994. GIROUX, Henry. Teoria Crítica e Resistência em Educação. Petrópolis: Vozes, 1986. MANZINI-COVRE, Maria de Lourdes, O que é cidadania. São Paulo: Brasiliense, 2001 (primeiros passos). SEN, Amartya Kumar. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo, Companhia das Letras: 2000. 05 - ESCOLA DE FORMAÇÃO POLÍTICA E PROFISSIONAL PARA A JUVENTUDE DO CAMPO: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA NO MUNICÍPIO DE APODI/RN Elielma de Sousa Pereira [email protected] Orientadora: Simone Cabral Marinho dos Santos 253 [email protected] Introdução: No debate sobre a juventude têm–se diversas orientações: as que são dirigidas ao controle social juvenil, à formação de mão-de-obra e as que aspiram à realização dos jovens como sujeitos de direitos. Os jovens ora são vistos como problemas ora como setores que precisam ser objeto de atenção. Como a juventude tem sido considerada uma fase de vida marcada por certa instabilidade associada a determinados "problemas sociais‖, tem se tornado objeto de estereótipos negativos, como a delinqüência e a violência. Para a construção de uma verdadeira política pública de juventude é preciso criar ambientes mais propícios e necessários para o surgimento de uma cultura de participação e cooperação capaz de criar novos paradigmas para o desenvolvimento da juventude. Para isso, é necessário promover uma efetiva inserção dos jovens na sociedade e fomentar uma ampla participação juvenil no processo de desenvolvimento local. Foi sob essa perspectiva que surgiu o Projeto de Extensão Escola de Formação Política e Cidadã realizado pela Pró-Reitoria de Extensão (PROEX), da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), em parceria com o Projeto Dom Hélder Câmara (PDHC-RN). Fundamentado nas construções identitárias e nos processos emancipatórios de pessoas e/ou grupos que buscam a sua construção e ampliação da autonomia, respondendo assim as necessidades de realização pessoal e coletiva, esse Projeto foi realizado através de um curso de Formação Política e Profissional para Jovens, especialmente, os vivem do ou no meio rural, que atuavam em organizações sociais, políticas e religiosas nos municípios de Campo Grande, Caraúbas e Apodi, localizados na região oeste do estado, no período de julho de 2007 a fevereiro de 2009. Particularmente, relataremos a experiência desenvolvida no município de Apodi-RN. O objetivo deste curso foi fomentar a participação juvenil no processo de desenvolvimento local sustentável, a partir de uma formação política e profissional. É, portanto, objetivo deste texto, relatar o processo de formação política da juventude a partir de uma ação educativa, que tentou se firmar numa abordagem para além da reprodução conteudista das temáticas trabalhadas, através de uma formação pautada no exercício da cidadania e na compreensão do fortalecimento político e na organização social juvenil.. Seguindo uma orientação que primasse por uma formação cujos conteúdos e temáticas abordados tratassem não só da dinâmica profissional, mas política, que o Projeto de Formação Política e Cidadã procurou atender as especificidade de seu público alvo da seguinte forma: os que tinham interesse ou atuavam no campo, agregar o conhecimento técnico sobre as questões rurais à vivência no mundo do trabalho e do campo, vez que a qualificação profissional tem sido estratégica no enfrentamento da exclusão social e diferencial no mundo do trabalho do campo; aos que se interessavam pela vida urbana, estimular o potencial formativo de inserção concreta do jovem no processo econômico, voltado para uma perspectiva empreendedora da sua vida pessoal e sócio-econômica. Contudo, o diferencial dessa formação era possibilitar e estimular lideranças juvenis, cujas ações estivessem baseadas em estratégias de desenvolvimento 254 pessoal e social compatível com a vida prática do sujeito e de valorização do trabalho. O Projeto de Extensão Escola de Formação Política e Cidadã para Jovens teve início em junho de 2008 em Apodi-RN, com financiamento do MEC/SESu/DEPEM, firmando o Convênio Nº 161/2007. A estratégia era, então, promover ações integradas de desenvolvimento local, formação política da juventude e valorização dos recursos humanos, de forma que permitisse um nivelamento das informações e respeito às diversidades produtivas, culturais e regionais dos jovens e suas formas de organização. Soma-se a isso, a parceria estabelecida entre a UERN e o PDHC na realização da atividade, fortalecendo a cooperação mútua e o comprometimento social das instituições e organizações da sociedade civil, de forma a potencializar o trabalho, em todos os seus sentidos, e exercitar os exigentes desafios que a cooperação implica. Além da parceria com o PDHC, havia parceiros locais a fim de garantir a descentralização de decisões e informações, distribuição de tarefas e exeqüibilidade das ações. Em Apodi as parcerias locais eram: COOAFAPI, COOPAPI, Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR's), Associações, PDA Santa Cruz, SEAPAC e Terra Viva. A UERN e o PDHC eram responsáveis pelo transporte, reprografia, material didático e ministrantes das oficinas e as parceiras locais, com transportes dos alunos, alimentação, parte dos ministrantes das oficinas, material didático e infra-estrutura. Contou-se também com o apoio de gestores de escolas públicas desses municípios, pois, na maioria das vezes, o curso acontecia em estabelecimentos de ensino. A meta era capacitar 40 jovens entre 15 e 29 anos integrantes de organizações juvenis rurais e urbanas, propiciando um ambiente de aprendizagem para serem responsáveis de forma ativa por suas decisões e comprometidos com a organização e o fortalecimento dos grupos e das comunidades onde estão inseridos. O Projeto foi realizado através de um curso de formação política e profissional para jovens com uma carga horária inicial de 116 h/a, ministrado através de oficinas e seminários temáticos, por uma equipe multidisciplinar, composta por membros das instituições proponente e parceiras. Os ministrantes eram docentes, técnicos administrativos e discentes da UERN e militantes e educadores sociais das instituições parceiras. Inicialmente o curso foi dividido em duas etapas: a de formação geral, com carga horária de 60 h/a, destinada à formação na área da participação política, cidadania, direitos humanos e metodologia de práticas sociais, e o de formação específica, dividida em dois blocos temáticos, com carga horária de 56 h/a, destinada à formação mais voltada para as questões do meio rural e a de empreendedorismo. Nessa etapa da formação, o jovem poderia optar por um dos dois blocos ou compor o próprio bloco temático, tomando como referência as temáticas definidas. A idéia era envolver grupos do meio rural e do meio urbano, de forma simultânea, uma vez que um dos pressupostos do curso era estimular a aproximação e a criação de possibilidades de se constituírem relações de complementaridade e troca de experiências entre os jovens. 255 Tomando por base esses referenciais, o curso discutiu no bloco de formação geral as seguintes temáticas: Juventude e participação política, Políticas Públicas para Juventude, Movimentos Sociais, Metodologia Popular de Trabalho de Base, Formação de Liderança Juvenil e Educação Popular. Na formação específica, além dos Seminários Temáticos, o bloco I era composto pelos seguintes temas: Modelo Agrícola Brasileiro, Plano Camponês (MST) e o Plano de Desenvolvimento Rural Sustentável (CONTAG), Agroecologia e Soberania Alimentar, Gênero e Agricultura Familiar, Educação do Campo, Mística Popular, Custos de Produção e Comercialização e Espaço de Produção e Consumo Solidários. E no bloco II: Empreendedorismo, Associativismo e cooperativismo, Tecnologias Sociais, Custos de Produção e Comercialização e Espaço de Produção e Consumo Solidários. Em Campo e Caraúbas essas temáticas não sofreram modificações. Mas em Apodi, não só foram acrescidas outras temáticas como os cursistas não tiveram que optar por um dos blocos. Os parceiros locais decidiram por unificá-los, garantindo uma formação mais ampla e diversificada para os jovens. Assim, foram acrescidas ao bloco de formação geral as temáticas Cidadania e Direitos Humanos e Aprender a Aprender, ficando o curso com uma carga horária total de 128 h/a. Quanto à procura pelo ingresso no curso, houve 152 inscritos, majoritariamente, jovens advindos do meio rural. Tendo em vista essa demanda, foram selecionados 80 jovens, formando-se duas turmas. Destes, 51 concluíram, quando o projeto foi encerrado em fevereiro de 2009. A sua conclusão não dependia apenas da assiduidade e da pontualidade, mas de uma participação efetiva nas atividades do curso que incluía não só atividades práticas individuais e coletivas, mas a permanência em grupos e/ou organizações. No que se refere aos desafios de sua realização, estava a garantia de regularidade do cronograma de atividades, a freqüência dos alunos e a dinamicidade das oficinas, não se restringindo apenas à reprodução de conteúdos, mas de troca de saberes e experiências. Além disso, havia dificuldades no acompanhamento individualizado no que era proposto para as oficinas, apesar do esforço dos ministrantes em garantir uma interlocução entre os temas e o planejamento das atividades, e mesmo tendo havido reuniões regulares entre os membros da equipe do projeto nos municípios para tratar de encaminhamentos e das adversidades que ocorriam durante a sua execução. Obviamente, surgiram outras dificuldades e outros desdobramentos que merecem ser avaliados no que diz respeito aos aspectos pessoais, técnicos e didáticos do ponto de vista do aluno. Dado ao recorte e objetivo deste texto, não trataremos, especificamente, destes aspectos. Mas podemos concluir, que, de um modo geral, o curso significou uma oportunidade de aproximar a Universidade do seu entorno social, por meio de uma ação extensionista, articulando o saber técnico com o saber popular e desconstruindo estereótipos de negação e distanciamento da relação academia e movimentos sociais, com possibilidades de novas parcerias na realização de projetos. Para a equipe, significou um canal aberto à novas escutas sensíveis às demandas e problemas sociais. E para os alunos, 256 perspectivas de fortalecimento das organizações sociais juvenis, estímulo para o ingresso no ensino superior, através da elevação da auto-estima e da busca de superação da condição de elitização do ensino superior, bem como, perspectivas para a continuidade de projetos sociais que possam dar visibilidade aos jovens e suas demandas emergentes. REFERÊNCIAS BORDENAVE, Juan E. Diaz. O que é participação. São Paulo: Brasiliense, 2007. (Coleção Primeiros Passos). CARNEIRO, Maria José. O ideal rurbano: campo e cidade no imaginário de jovens rurais. Disponível em: www.bibliotecavirtual.clacso.org.ar. Acesso em: 03/04/2007. CESAP. Qualificação Comunitária e Geração de CidadaniaSistematizando uma Metodologia. Brasília: MET, PPE, DEQ, 2007. DALLARI , Dalmo de Abreu. O que é participação política. São Paulo: Brasiliense, 1999. (Coleção Primeiros Passos; 104) GOHN, Maria da Glória. Teoria dos Movimentos Sociais. São Paulo: Loyola, 1997. 06 - GEOGRAFIA E GÊNERO: UMA EXPERIENCIA EM SALA DE AULA Flávia Spinelli Braga Professora de Geografia do CAMEAM/UERN [email protected] Introdução: A ciência geográfica se destaca entre poucas que consegue ter um dinamismo que acompanhe a velocidade das transformações do mundo capitalista, isto se dá pelo perfil do profissional que está saindo das instituições de formação como pelo seu avanço do conhecimento científico dos fenômenos sociais e ambientais. Em todas as áreas que esta ciência atua é visível o quanto sua reflexão se faz necessária. Afinal, esta necessidade de reflexão é o mecanismo de manutenção do pensamento sobre as transformações no mundo que são cada vez mais complexas e que faz da geografia uma ciência dinâmica, social e popularizada. Nas instituições de formação do profissional em geografia uma das maiores preocupações que tenta se discutir é justamente o equilíbrio entre a teoria, ou seja, a base conceitual, o método analítico que se adquiri e a realidade de sua aplicação. Sendo que, um dos maiores problemas é a formulação da teoria que se pretende aproximar da prática e assim corresponder às funções da ciência geográfica para com o desenvolvimento e reais necessidades da sociedade. Diante disso, o curso de Geografia do CAMEAM/UERN tenta se qualificar cientificamente a partir de um ideário que vislumbre a Totalidade Geográfica, ou seja, uma formação mais holística e menos fragmentada do conhecimento geográfico, filosófico e da educação. E foi justamente com este intuito que a disciplina de Geografia da População teve um processo diferenciado e particular de desenvolvimento no decorrer do semestre 2008/2. Esta disciplina foi ministrada aos alunos do 3º período de geografia e tinha como um dos conteúdos de sua ementa a questão da ―Composição de Gênero‖, da qual o principal viés que foi norteado pela 257 professora e monitora seria a desconstrução dos mitos da fêmea e da mulher do capitalismo, para tanto, sabia-se que um embasamento teórico e muita disposição para o debate se fazia necessário, pois o teor do tema remete a rupturas, choques e muitas vezes, define transformações morais e filosóficas. Como a disciplina se desenvolve em seis meses, durante os dois primeiros meses foram orientadas leituras mais genéricas sobre as temáticas que norteiam o estudo da população e sua dinâmica. Discutidas estas leituras iniciou-se a apresentação da obra ―Mulheres: o gênero nos uni, a classe nos divide” de Cecília Toledo. Os alunos foram orientados a tentar responder duas questões chave durante o processo de leitura e debate, A diferença entre exploração e opressão? E o porquê da afirmação: Mulher termômetro da Sociedade! O debate sobre a leitura da obra se apresentou processualmente crescente e motivante, pois partindo de um método de ensino dialético, estabeleceu-se uma identidade da turma para com o tema e com a Geografia. Entre as discussões mais envolventes e polêmicas estiveram: a demonstração da importância da mulher na sociedade, à maneira como ela vem sendo tratada ao longo do tempo, o modo como o sistema capitalista se aproveita de um fator cultural para aumentar a sua exploração e a maneira como essa temática vem sendo tratada pelo marxismo. Outra polêmica discutida a partir da obra de Cecília Toledo foi como a mulher no sistema capitalista é vista como um ser subalterno e submisso, onde tal concepção foi sendo construída culturalmente ao longo de nossa história e transmitida de forma natural justificada pelo fator biológico e sustentada pela família, religião, educação e mídia. O estereótipo da mulher como um ser inferior por natureza serviu para justificar a sua opressão e exploração pelo sistema capitalista. Porém, as mulheres vêm lutando para modificar essa realidade e já conseguiram realizações significativas como o direito ao voto, trabalhar fora e etc. Se a opressão é algo imposto pode ser superada, por isso as mulheres devem continuar lutando por sua emancipação, porém essa luta segundo Toledo deve ser uma luta de classe (não de gênero), contra o sistema capitalista. Outra polêmica tomada pelo debate em sala de aula era sobre a entrada da mulher no mercado de trabalho que por um lado contribuiu para a sua ―libertação trabalhista‖, alem de uni-la à classe trabalhadora, mas por outro lado, aumentou sua exploração e opressão duplicando a sua jornada de trabalho, pois a mulher teve que trabalhar na fábrica e realizar as tarefas domésticas. Além disso, a entrada feminina no sistema capitalista contribuiu para aumentar o exército de reserva das fábricas, divisão sexual do trabalho, estimulando a competição entre a classe trabalhadora, aumentando a produção e rebaixando os salários. Abaixo estão citados os trechos do livro que absorveu boa parte da polemização do debate. Marx apud Cecília Toledo (2008, p. 41) [...] a força de trabalho da mulher é uma forma de extração de mais valia absoluta, um recurso usado pelo capital para aumentar diretamente o lucro, assim como quando elevada a jornada de trabalho, e, por outro, que a expansão do trabalho feminino pode 258 corresponder a uma expansão da demanda por artigos prontos, ampliando o processo de circulação de mercadoria. Ao longo de sua história, a corrente marxista vem se preocupando com a situação da classe trabalhadora. No tocante a mulher, o marxismo prega que sua opressão é um fenômeno sócio-cultural e pode ser superada. Marx apud Toledo (2008, p. 10). [...] a opressão da mulher está vinculada à propriedade privada dos meios de produção e somente poderá ser superada com uma radical transformação, capaz de eliminar a propriedade privada e a divisão da sociedade de classes. E, no entanto, quando se caminhava para o final desta atividade, o debate sobre o Gênero e a Mulher começou a transcender as paredes do 3º período que ao término da disciplina propôs junto a professora e monitora a possibilidade de um evento que conclamasse mais a sociedade acadêmica do CAMEAM à discussão e ao debate, visando uma maior e mais socializada leitura sobre a questão de Gênero e suas relações culturais, porem o mais interessante foi que a proposta feita pelos alunos tinha como foco de análise e reflexão a Mulher do Sertão Potiguar, pois eles justificaram a necessidade de conhecerem mais suas origens enquanto gênero e o nível de opressão e exploração que suas mães, irmãs, vizinhas e amigas sentem. Objetivos: Os objetivos deste trabalho desenvolvido na disciplina Geografia e População eram inicialmente o de fomentar a discussão sobre Geografia e Gênero; a reflexão e análise dirigida sobre uma obra literária e suas posturas; o desenvolvimento da análise através de leituras conjuntas e debates em sala de aula e a possibilidade da desconstrução de alguns mitos e doutrinas que impossibilitam o profissional da educação ser mais holístico no processo de ensino aprendizagem. Metodologia: Para o desenvolvimento da atividade proposta em sala de aula a principal conduta metodológica se pautou na dialógica e dialética, com leituras dirigidas e coletivas, com produções textuais e seminários individualizados. Para tanto, foram desenvolvidos três momentos, da qual o primeiro consistia em uma apresentação dos conceitos gerais da teoria demográfica, este momento tomou em média seis aulas, com a elaboração de uma resenha como aferição de aprendizagem; o segundo momento tratou de apresentação da obra e leitura conjunta em sala de aula, com espaços dirigidos de discussões; e o terceiro momento tratou da apresentação individual dos seminários da qual os alunos do 3º período escolhiam por afinidades os temas e como processo de avaliação final foram enumerados os pontos positivos que seriam as fortalezas e oportunidades deste tipo de estudo disciplinar e os pontos negativos, ou seja, as fraquezas e ameaças desta proposta de trabalho em sala de aula. Resultados: Os resultados desta atividade proposta na disciplina de Geografia da População ministrada no decorrer do semestre de 2008/2 tiveram como a maioria das disciplinas planejadas resultados tanto positivos como negativos, entre os positivos, pode-se identificar a disposição dos alunos no desenvolver dos procedimentos metodológicos como os debates 259 abertos e aprofundados, já que as leituras eram feitas em loco; outro ponto positivo foram os seminários individuais que salutou a habilidade de cada um em mediar uma discussão e até mesmo falar em público; alem disso, vale salientar que os temas foram escolhidos aleatoriamente beneficiando a todos tanto que a atividade extrapolou as fronteiras da Geografia, pois os alunos chegaram a propor um espaço de debate mais ampliado e que tivesse como sujeito as mulheres do Sertão Potiguar no âmbito de todo o campus universitário. Já os pontos negativos passam desde a falta de logística da própria instituição e do calendário com diversas alterações à falta de tempo para realizarmos o proposto seminário ampliado de debate, que até tema já tem: Gênero e Geografia no Sertão Potiguar. Considerações Finais: Considerando aqui as questões levantadas pode-se notar a importância do estudo de Gênero na Geografia referendando sua organização e compreensão da sociedade e do espaço geográfico. Também se verificou a contribuição que o Marxismo deu a esta temática ao longo do tempo e a maneira como o sistema capitalista embutiu um fator cultural para explorar a mão de obra feminina promovendo uma segregação mais evidente entre homens e mulheres, aumentando assim, a competição entre eles e favorecendo na acumulação de capital pelo sistema. Diante disso, os alunos do 3º período de Geografia do CAMEAM/UERN, ao longo da disciplina Geografia da População, puderam aprimorar seus conhecimentos sobre esta temática e desmistificar alguns mitos e doutrinas referentes às questões de gênero. Isto se deu em três etapas, foram elas: aulas expositivas e dialogadas sobre a Dinâmica Populacional; leitura coletiva em espaços de diálogos dirigidos com debates; apresentação individual de seminários. Isso foi fundamental para que os alunos construíssem o seu próprio pensamento sobre o tema. É importante salientar que a discussão dessa temática no ensino de geografia contribuiu para uma melhor capacitação do futuro profissional da educação geográfica, os tornando mais conscientes e atuantes na sociedade. Assim, fica evidente que o debate sobre gênero aprofunda o entendimento da realidade espacial, social, política e econômica, por isso foi trabalhado com tanta ênfase na disciplina acima mencionada. Alem do mais, é um tema amplo e complexo, envolvendo desde conhecimentos filosóficos a econômicos, caracterizando a formação deste profissional da geografia num educador de visão mais abrangente e ontológica. REFERÊNCIAS DEMO, P. Educar pela pesquisa. Campinas: Editores Associados, 2003. DEMO, P. Pesquisa: princípio científico e educativo. São Paulo: Cortez, 2005. KAERCHER, N. A. Desafios e utopias no ensino de Geografia. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2001. LENIN, Vladimir I. Sobre a emancipação da mulher. São Paulo: AlfaOmega, 1980. 260 MARX, Karl. ―Manuscritos econômicos e filosóficos: o trabalho alienado e a superação positiva da auto-alienação humana”. In Marx Engels, org. Florestan Fernandes, Coleção Grandes Cientistas Sociais. São Paulo: Ática, 1989. MELO, Adriana A. S. A Mundialização da Educação: consolidação do projeto Neoliberal na América Latina. Maceió. EDUFAL. 2004. MORIN, E. Os setes saberes necessários á educação do futuro. 2 ed. São Paulo: Cortez, 2000. TOLEDO, Cecília. Mulheres: o gênero nos uni, a classe nos divide. 2ª Ed. São Paulo: Sundermann, 2008. 07 - A SEXUALIDADE EM EXPERIÊNCIAS DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA – OU POR UMA OUTRA EDUCAÇÃO SEXUAL Jéssica Cássia Barbosa (estudante da Graduação em Ciências Sociais/UFRN) Introdução: Sexo é coisa simples. É como se iniciou a temática da sexualidade com jovens dos municípios de Vera Cruz e Pureza (RN), no projeto de extensão Trilhas Potiguares; nos anos de 2008 e 2009, respectivamente. O Programa Trilhas Potiguares, desde 1996, tem por objetivo propor novas formas de aplicação do conhecimento gerado na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), a partir do contato com as demandas da comunidade externa, buscando a construção sólida do saber, voltado para o desenvolvimento sustentável das comunidades; com a visão interdisciplinar sobre a realidade que se insere. Este projeto de extensão possui, portanto, grande abrangência no Rio Grande do Norte e importância para UFRN, posto que hoje abrange 17 municípios deste estado. A atividade foi intitulada ―educação sexual começa com poesia‖, na primeira experiência; com auxílio de recursos lúdicos (poesia e música), pode-se falar um pouco de corpo e sexualidade. Tendo na segunda experiência ganhado um caráter interdisciplinar – o corpo e a sexualidade na língua sociológica, psicológica, nutricional e médica –, a proposta que deveria assemelhar-se com a primeira, reduz-se, modifica-se, tornando-se, no mais, interessante. O fato é que as experiências de extensão instigam, ainda mais, a reflexão teórica; posto que de repente se é obrigado a reconstruir as propostas teóricas pré-concebidas. Mas, para se compreender o sexo, o que mais se percebe, é o pouco conhecimento sobre o próprio corpo humano. Todo o seu poder de metamorfose. O corpo é essencial, ou melhor, indispensável na gênese do conhecimento. Antes mesmo de mostrar ações conscientes, o bebê imita as ações corporais dos indivíduos que o circunda. Na verdade, vemos uma necessidade universal de se falar de sexo. O que Foucault chama de ―monarquia do sexo‖. Enquanto em uma geração antiga dir-se-ia ―é preciso colocar a roupa‖, hodiernamente a juventude diz ―é preciso tirar a roupa‖, num sentido de ruptura e de liberdade sexual. No 261 entanto, até que ponto estes discursos são mesmo libertários? Foucault ressalta, ―olhe o que ocorre em relação às crianças‖: Muito bem, você tem certeza de que este tipo de discurso é efetivamente libertador? Você tem certeza de que ele não aprisiona as crianças em um tipo de insularidade sexual? (...) Se a liberdade de não ser adulto consistisse justamente em não estar dependente da lei, do princípio, do lugar comum – afinal de contas tão entediante – da sexualidade? Se fosse possível estabelecer relações às coisas, às pessoas, aos corpos relações polimorfas, não seria isto a infância? Este polimorfismo é chamado pelos adultos, por questões de segurança, de perversidade; que assim o colorem com os tons monótonos de seu próprio sexo. (FOUCAULT, 1979, p. 235-236) Aliás, falar de liberdade é falar do corpo. O conceito de liberdade sempre teve de ser reelaborado pelos diversos discursos filosóficos e políticos; como nos fala Michel Serres, que como comumente nos esquecemos ou desconhecemos: Para livrar-se desse labirinto, basta partir do corpo e da singularidade da vida. Em qualquer circunstância, todo poder deve ser contido em benefício de sua integridade; com as mãos e os braços livres, o corpo tem o direito de se mover de acordo com sua vontade, deve dispor de sua natureza e de sua capacidade. Sua virtualidade se opõe a qualquer poder. A liberdade se define pelo corpo e este por sua potencialidade. (SERRES, 1930, p.52) Para Michel Serres, pouco se entende do corpo humano. Só este possui flexibilidade, poder de superação, extraordinária fluorescência de formas. Os animais conhecem o limite dos instintos. O corpo humano possui memória própria; não mente. Portanto eu posso conhecer muito mais o outro através do corpo, do que pela palavra; esta é persuasiva. Serres comenta sobre todo esse caráter de poder, e, ao mesmo tempo, fala do corpo silencioso. Para a paz é preciso uma harmonização universal; para o caos é necessário um único diabólico. O corpo sadio não diz uma palavra; a dor única é capaz de dominar todo o ser. Deus se define como uma totalidade; o Diabo como individualidade. A saúde é divina; a dor é diabólica. O que para Foucault fica bem claro é que a sexualidade serviu como uma coberta obscura. Porque no Ocidente, através da sexualidade, foram cobertas as mais profundas verdades do indivíduo. Como no exemplo em seu livro Microfísica do poder quando pontua que, a partir do século XVIII, de repente se dá uma enorme atenção à masturbação infantil; a qual será tomada com grande perseguição e como grande peste que assola a sociedade. Mas o objetivo não era a pura proibição sexual. ―O fim era constituir, através da sexualidade infantil, tornada subitamente importante e misteriosa, uma rede de poder sobre a infância‖ (FOUCAULT, 1979). É importante agora deter-se, após estas reflexões, sobre o porquê do título deste escrito. É igualmente importante, expor o porquê da escolha de dois autores. Portanto, esses dois momentos – uma análise da educação sexual e a proposta de algo mais ―verdadeiro‖; e, um breve descrito sobre Michel Serres e Michel Foucault – dividir-se-ão em dois takes. Na verdade, a própria apresentação inicial, faz-se explicar bem, com relação ao primeiro ponto. Posto que oferece instrumentos para uma análise pontual do imaginário do corpo e sexo, que se desenvolve hoje. 262 Os autores, utilizados em cena principal, são dois. Michel Serres, filósofo francês, nascido em 1930. Cursou a Escola Normal Superior de Paris, licenciando-se em matemática, letras clássicas e filosofia; entretanto, considera-se um autodidata. Possui uma grande lista de produções intelectuais, donde, dentre seus livros publicados, está Variações sobre o corpo; do qual o discurso embasa este escrito. O segundo autor a se pontuar é Michel Serres. De nome já bem renomado, não só nas trincheiras das ciências sociais, como nas das outras ciências humanas e filosofia, Foucault, também foi filósofo francês (embora, por vezes, não se autodenominasse desta maneira), com formação em filosofia na Universidade de Sorbonne e psicologia. Dentre toda sua produção intelectual vastíssima, reconhece-se seu interesse pela questão do poder. Rompe com as concepções clássicas deste, e busca uma espécie de genealogia através, por exemplo, de preceitos como o da sexualidade. Outros autores que, por ventura, apareçam, são invocados apenas ocasionalmente. Sobretudo a idéia de que entender a genealogia da sexualidade é ter a apreensão da ―verdade‖ profunda humana, é fundamental para se pensar ―uma outra educação sexual‖. Ou como mesmo se interroga Foucault: ―Como se explica que, em uma sociedade como a nossa (ocidental), a sexualidade não seja simplesmente aquilo que permita a reprodução da espécie, da família, dos indivíduos? Não seja simplesmente alguma coisa que dê prazer e gozo?‖ (FOUCAULT, 1979). Se produzir conhecimento é, antes de tudo, admitir a ignorância humana, Rubem Alves, confessa ignorar a razão pelas quais o sexo e suas funções (reprodução, prazer) se tornaram motivo de vergonha pelos homens. É a essa inquietação que Foucault busca explicações. Michel Serres inova bastante com seu entendimento do corpo. Apenas a dedicatória do seu livro, Variações sobre o corpo, é de tom bastante provocador, aqui cabe sua apresentação: ―A meus professore de ginástica, a meus treinadores e a meus guias de montanhismo que me ensinaram a pensar‖ (SERRES, 2004). A idéia é de que, justamente, enquanto não se tomar o corpo como inteligível, os homens se desconhecerão. Como o tempo fica gravado no corpo do mundo, posturas e experiências se encarnam no corpo humano, sendo reproduzidas mais rapidamente do que assimiladas. ―Quem pode computar o enorme tesouro de posturas que traz consigo? (...) Quanto mais se dilata esse capital, esse reservatório inconsciente – pois o inconsciente é o corpo –, menos ele pesa e mais ele se torna leve e aéreo em virtude das adaptações conquistadas‖ (SERRES, 2004). Indubitavelmente, uma reflexão importante para se construir parâmetros à uma outra educação sexual. Mas ao que se opõe verdadeiramente? Verdadeiramente, não se propõe aqui expor algo novo. Este escrito possui apenas caráter reflexivo e, caso caiba, preâmbulos analíticos. O interessante é que a sexualidade é permeada por muitos discursos. Discursos estes que pretende recomendam e condicionam variações do corpo e modelos de educação sexual. Podemos pontuar a ―escola‖ médica. Os tratados médicos, por serem científicos, não conseguem falar de prazer e alegria. Pode-se correlacionar este caso, com alguns filósofos acadêmicos que desconsideram o Friedrich Nietzsche quanto pertencedor desta 263 categoria – por ser poético demais. A educação sexual não pode começar com anatomia e fisiologia. Nesta perspectiva o corpo humano tende a rigidez, em contradição a sua flexibilidade natural, seu poder de assumir caráter metamórfico. Para se entender este e sua sexualidade, há que se entender a música que ele quer tocar. Sobre isto, Freud fala que o prazer é a música que o corpo quer tocar. E, em se falando de restrições ao prazer e alegria, não há escola mais contraditória que a religiosa, mais precisamente a cristã – com todo o seu poder sempre influente na cultura ocidental. Adora-se a mulher-mãe (mãe de Jesus), mas fazem um silêncio catedrático a respeito da mulher-amante. Jesus, filho da mulher-mãe (Maria), não pode ter passado pelos canais de Maria, porque o que diz esta ―escola‖ é que seu filho subitamente apareceu. Para os seus seguidores o sexo tem apenas a função utilitária da reprodução – não conseguem crer que Deus pudesse nos dar prazer. É como se o sexo humano tivesse que ser como o sexo animal (de acordo com as leis da natureza); não pensam o sexo humano como produto histórico-cultural (portanto, demasiado humano). O segredo, o espaço vazio que resta, o qual se questiona Rubem Alves e que Foucault procura respostas, aparece nos escritos bíblicos: de repente, Adão e Eva (após ingerirem a ‗fruta proibida‘) sentiram ―transformações‖ em seus corpos, e aquilo que tinha saído lindo das mãos do Criador, torna-se, verdadeiramente vergonhoso – cobriram-se com as primeiras folhas que encontraram. Há uma ―escola‖, agora, que fala por si só. O que se pode fazer, ainda, é contemplar e receitar alguns escritos que introduzam ao seu discurso. A ―escola‖ poética demonstra que a alma sem o corpo é uma exilada infeliz. Traduz-se em naturalizar o desejo de um corpo unir-se a outro, como belo e bom; ou na máxima de Santo Agostinho: ―Ama e faze o que quiseres‖. Por meio de quais palavras e de qual educação sexual se ocasionar o corpo pode tornar-se mais apto a desenvolver-se bonito; portanto mais propício a ser lugar de alegrias e prazer. Ou tornar-se feio, encolhido e rígido. ―A decisão é dos educadores‖, como diz Rubem Alves. REFERÊNCIAS ALVES, Rubem. E aí? Cartas aos adolescentes e a seus pais. Campinas, SP: Papirus, 1999. FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. Rio de Janeiro: Graal, 1979. _______. História da Sexualidade I: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Graal, 1985. SERRES, Michel. Variações sobre o Corpo. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004. _______. Cinco Sentidos. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. www.wikipédia.org.br. Acessado em: 06/10/09, às 19h23min. 264 08 - OS PARADIGMAS EMERGENTES DA EDUCAÇÃO FÍSICA E O DESAFIO DO PARADIGMA EDUCACIONAL EMERGENTE Osvaldo Nonato dos Santos FACULDADES INTEGRADAS DE PATOS – FIP [email protected] O atual cenário da sociedade global, numa conjuntura educacional paradigmática presente na prática pedagógica, problematiza a realidade educativa e suas múltiplas relações com o objeto e o sujeito a partir da noção da complexidade. Na crise de princípios e valores, é inquestionável revermos nossa prática pedagógica e nossa visão de mundo contemporâneo, como educadores comprometidos com a valorização do ser humano. Precisamos considerar o velho modelo de ciência positivista que pelo qual vem influenciando a Educação e conseqüentemente a Educação Física. Para início é preciso refletir: Qual a razão de ser um paradigma tradicional na crise atual? Qual o princípio do conceito atual de pensamento, valores e percepções que prevalecem no mundo moderno? Este estudo tem como objetivo evidenciar as abordagens pedagógicas da Educação Física Escolar: metodologia do ensino aberto; crítico superadora; construtivista e crítico-emancipadora, propondo uma aliança com o paradigma educacional emergente. A relação entre Educação Física e o desafio do paradigma emergente caracterizam um ambiente que leve a considerar as diversas dimensões do fenômeno educativo e seus aspectos físicos, biológicos, mental, psicológico, cultural e social. Na realidade a Educação Física teve grande influência do paradigma newtoniana-cartesiana construída por pensamento da cultura ocidental que caracterizou a ciência nos séculos XVII, XVIII e XIX dentre elas a Revolução Científica, o Iluminismo e a Revolução Industrial – a metáfora do universo-máquina que moldou a era industrial. Paradigma ainda dominante, hoje na sua versão econômica, ou seja, metáfora do universo-mercado. Os princípios epistemológicos e filosóficos positivistas influenciaram a educação de prevalecimento de um sistema paternalista, hierárquico, autoritário, dogmático e a presença de uma escola que exige memorização, repetição, cópia, que dá ênfase ao conteúdo, ao resultado, ao produto, recompensando o conformismo, a "boa conduta", punindo os "erros" e as tentativas de liberdade e expressão. Lembrando Edgar Morin (1987, p.15), ―a ciência criou a possibilidade de destruir a humanidade ou manipulá-la, coisa que ninguém havia conseguindo antes‖. Neste contexto, caberia indagar: Qual o modelo de ciência hoje? Qual o referencial teórico capaz de nortear a busca de um novo paradigma para a Educação Física? Que dimensões propormos refletir sobre o impacto da história das tendências pedagogias conservadoras e progressistas como crise de paradigmas? Tentando encontrar respostas para essas indagações, novos referenciais teóricos na crise da educação física na modernidade o paradigma emergente é validado por um complexo de teorias que formam um arcabouço científico. Portanto, o paradigma emergente reflete a necessidade de uma profunda reforma no sistema de 265 pensamento científico, para essas teorias do conhecimento foram escolhidos Jean Piaget, Paulo Freire, Seymour Papert e Howard Gardner. Os aspectos dessas teorias têm uma visão de totalidade e descrever a multidimensionalidade identificado como sendo um paradigma educacional emergente construtivista, interacionista, sociocultural e transcendente. Compreendendo o processo como construção, ação do sujeito sobre o objeto, reconhecendo que o sujeito e o objeto são organismos vivos, que construí relações com o mundo físico e social. Significa ultrapassar o conceito do nosso encaixamento no cosmo amplia a nossa consciência, acentuando os sentimentos de humildade, fraternidade, solidariedade e compaixão, contribuindo para a construção de um mundo mais harmonioso, com um pouco mais de paz e felicidade que todos buscam. A produção do conhecimento sobre a Educação Física no paradigma emergente buscar desafiar os limites do modelo de paradigma tradicional/conservador para um modelo de paradigma complexo e holístico. É neste sentido que buscamos: No aluno a visão do todo, com talentos únicos (emocionais, intelectuais e espirituais) com sensibilidade sobre o valor da vida e das relações dos seres com a natureza numa perspectiva auto-expressão, criação, investigação, liberdade, visão crítica e humana. No professor procure analisar e transcender limites da antiga estrutura fragmentada buscando uma prática pedagógica cientificamente embasada considerando o contexto social do educando, ensinando com amor e resgatando o sentido humano. Na metodologia educacional, a interdisciplinaridade envolvendo todas as áreas do conhecimento contemplando um currículo flexível e de acordo com os interesses dos alunos com autonomia e o desenvolvimento individual e coletivo, relações dinâmicas e abertas cultivando a consciência critica. No processo de avaliação instigar o crescimento pela troca de experiência num processo de auto-avaliação ultrapassando a quantificação do rendimento e contemplando uma abordagem qualitativa. E na escola como instituição libertadora, democrática, dialógica e critica cuja função é criar ambiente estruturado a partir de razões históricas, filosóficas, sociológicas e ideológicas. 09 - A RELAÇÃO ENTRE TENDÊNCIA E PRÁTICA PEDAGÓGICA DOS PROFESSORES DE EDUCAÇÃO FÍSICA DO 6º A0 9º ANO CICLOS DO ENSINO FUNDAMENTAL DA REDE MUNICIPAL DE IPANGUAÇU-RN Osvaldo Nonato dos Santos Faculdades Integradas de Patos – FIP [email protected] Este trabalho em fase de projeto, tem como objetivo de analisar e verificar as tendências e práticas pedagógicas da Educação Física Escolar na rede municipal da cidade de Ipanguaçu. Diante do exposto, através deste trabalho procuraremos responder a seguinte situação problemática: No que constitui a prática educativa, pedagógica e didática nas aulas de Educação Física? A discussão que emoldura esta problemática envolve a compreensão das tendências pedagógicas, o programa curricular, a relação objetivo-conteúdo- 266 método, a avaliação, planejamento escolar (plano da escola, plano de ensino e o plano de aula), e o projeto político pedagógico. O universo de pesquisa foi realizada nos 10 pólos da Rede Municipal de Ensino do Município de Ipanguaçu – RN. A amostra foi composta dos professores de Educação Física, supervisores escolares e os gestores na Rede Municipal de Ensino do Município de Ipanguaçu – RN. A pesquisa foi realizada inicialmente a partir de pesquisa bibliográfica ligados ao tema às tendências pedagógicas nas abordagens da Educação Física Escolar da educação brasileira. Utilizou-se de entrevista não estruturada, análise de diálogo com professores, supervisores e gestores, documentos oficiais, livros e atas da escola, a proposta pedagógica nos anos finais da Secretaria Municipal de Educação e o projeto político pedagógico. Diferentes respostas têm sido formuladas para tentar encontrar o "caminho" que deve seguir uma prática pedagógica que atenda todas as necessidades da Educação Física em sua intervenção na sociedade, bem como dê, à mesma, as margens de seu conteúdo. Esses "caminhos" têm sido chamados de abordagens, e se apresentam de maneiras distintas quando se refere ao conteúdo e à identidade da Educação Física, principalmente a aplicada no ambiente escolar. No final dos anos 70, e nos anos 80, período de denuncias, estudos, revelações e descobertas do papel da Educação Física sobre o poder hegemônico, dominante, determinante e opressor (MEDINA. 1990). Neste período surgem movimentos renovadores da educação Física dito como ―humanista‖ na pedagogia, com características filosóficas em torno do ser humano, sua identidade, valor e críticas sociais. Neste sentido que MEDINA (1983) interpreta a existência de três concepções: convencional, modernizadora e revolucionária. Por outro lado GHIRALDELLI JÚNIOR (1988) classifica cinco concepções: higienista, militarista, pedagogicista, competitivista e popular, para CASTELLANI FILHO (1988) refere-se a três concepções: biologização, psicopedagogização e transformadora. Os autores, em geral, concordam em classificar as tendências pedagógicas, tomando-se base por um referencial fora da própria área, nas teorias educacionais pautadas nas propostas de Paulo Freire, da pedagogia libertadora, e de Dermeval Saviane e José Carlos Libânio, pedagogia histórico-crítica. Essa crítica estabelecida nos anos 80 contribuiu bastante para criticar o modelo de paradigma biológico conservador da Educação Física, abrindo debates sobre outras formas de compreender a Educação Física. Neste cenário aparece o nascimento de concepções e práticas pedagógicas libertadoras, transformadoras, na perspectiva de uma práxis para a construção de um corpo livre, democrático, cultural e social. Neste período esboçam elementos no sentido de operar-se uma crítica à sua função sócio-politica (COLETIVO DE AUTORES, 1993). Colocando em cenas diferentes concepções: desenvolvimentista, humanista, construtivista, fenomenológica, antropológica-cultural, histórico-crítica, histórico social, sistêmica e crítico-superadora. Pode-se observar algumas dessas concepções em produções como: ―Educação Física Escolar: Uma Abordagem Desenvolvimentista‖ (TANI et al.. 1988); ―Educação de Corpo Inteiro: Teoria e Prática da Educação Física‖ (FREIRE, 1989); ―Educação Física Humanista‖ (OLIVEIRA, 1985); ―Educação Física Escolar: Uma Abordagem Fenomenológica‖ (MOREIRA, 1991); ―Diretrizes Gerais para o 267 Ensino) de 2º Grau: Núcleo Comum – Educação Física e Sociedade‖ (BETTI, 1991); ―Metodologia do Ensino de Educação Física‖ (COLETIVOS DE AUTORES, 1992). Neste contexto, a identidade da Educação Física ganha produções de cunho filosófico, sociológico, histórico, antropológico e pedagógico. Atualmente a Educação Física conta com quatros propostas de destaque dentro das abordagens emergentes: metodologia do ensino aberto; crítico superadora; construtivista e crítico-emancipadora. Tomando por base no discurso dos professores nas escolas pesquisadas e na fundamentação teórica, percebemos haver o predomínio de uma prática pedagógica pautada na cultura corporal, denominada critico social, mas também com algumas incoerências referentes às tendências conservadoras, refletindo assim uma prática competitivista e militarista. O conhecimento interdisciplinar no projeto político pedagógico da escola, trabalhando sua especificidade a Educação Física Escolar tendo como objetivo contribuir na formação geral do aluno, através do desenvolvimento das capacidades motoras, cognitivas, afetivas e sociais. 10 - AVALIAÇÃO DO NÍVEL DE ESTRESSE DOS PROFESSORES DO MUNICÍPIO DE IPANGUAÇU - RN Osvaldo Nonato dos Santos Faculdades Integradas de Patos – FIP [email protected] O século XXI ressalta a importância de revermos a nossa práxis para que possamos atuar realmente como gestores educacionais comprometidos com as mudanças sociais. Sendo a saúde entendida como um bem estar físico, mental, espiritual e social e a gestão numa visão mais humanizada. Controlar o estresse do dia-a-dia vai aumentar o rendimento dos professores e ajudá-los na preparação do organismo pra lidar com as situações que se apresentam, sendo então uma resposta do mesmo a um determinado estímulo, a qual varia de pessoa a pessoa. O estresse é normal em nossa vida. Ninguém vive sem estresse. O problema é quando ele torna excessivo causando desequilíbrio nas funções orgânicas, emocional e mental. No estado de tensão nossas glândulas supra renais entram em ação produzindo adrenalina no fígado causando a gordura convertida em açúcar (energia) e a circulação sangüínea reduza-se em alguns locais para que o cérebro e os músculos sejam melhores irrigados se este estado torna-se crônico, a pessoa está sensível ao infarto, derrame, hipertensão, colesterol alto, e dores generalizada, portanto a ação prolongada do nível e estresse negativo além da perda acentuada de qualidade de vida aumenta muito os risco de vencer problemas de saúde física, psicológica, social e profissional. Além do desafio de controlar a classe, os professores enfrentam pressões dos alunos, dos pais, dos colegas, dos políticos e dos administradores. São afetados pelos sucessos e fracassos de seus alunos e pelas próprias 268 exigências. O nível de estresse médio demonstra que à necessidade dos professores/as aproveitarem para repensar seu modo de vida e enquanto no nível de estresse baixo pede um maior envolvimento dos professores/as no trabalho sem se abalar pelas pressões do dia-a-dia na sala de aula. Este trabalho tem como objetivo contribuir, através da implantação de um programa preventivo na área de saúde física e mental comunitária, para um melhor desempenho do educador de acordo com o perfil o século XXI, os fatores que interferem neste perfil entre o estresse, a auto-estima, a importância do trabalho corporal como estratégia e contribuição para minimizar estes fatores. A pesquisa foi realizada através da aplicação de entrevistas com os dozes professores/as das Escolas Municipais de Ipanguaçu – RN e através de estudos bibliográficos. A pesquisa apresentou à seguinte analise: nenhuns dos/as professores/as entrevistados apresentaram grau de estresse alto; 46,23% dos entrevistados possuem um grau de estresse médio e 35,18% dos entrevistados apresentaram de estresse baixo. A relação entre stress, auto-estima, trabalho corporal, mostra que é necessário abrir e sair da ―caixinha‖, pessoal, profissional, tradicional, para nova atuação que se encontra em outros contextos com pouco acesso, mas repleto do saber da vida, da dor, do sentimento, da arte, da emoção, da competência de viver. Entender os agentes estressores no que causa as doenças ou contribui para que elas se manifestem requer um olhar para a sociedade, para o sistema educacional como um todo e para a relação com o trabalho, para isso a escola podem fazer: Fortalecer uma gestão democrática que favoreça as relações interpessoais; Qualificar o tempo do trabalho em equipe; Participar da gestão do aprendizado. Diretores e coordenadores ser co-responsáveis pelos resultados educacionais; Aproximar a família da escola; Participar da construção do currículo da rede; Desenvolver um trabalho sistemático que discuta princípios, valores e regras para melhorar o relacionamento entre professores e alunos e entre todos na equipe escolar e, sobretudo avaliar constantemente as condições de trabalho da equipe e acompanhar os casos de adoecimento. 11 - DA EDUCAÇÃO RURAL À EDUCAÇÃO DO CAMPO: UMA ABORDAGEM INTRODUTÓRIA 18 Simone Cabral Marinho dos Santos José Willington Germano-Orientador No início da década de 1990 até os dias atuais vemos a presença marcante de trabalhadores rurais na cena política e na pauta de reivindicações na história de lutas do nosso país, marcando o surgimento de um projeto de 18 Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, da UFRN e Professora do Departamento de Educação- CAMEAM/UERN. 269 educação protagonizado por esses sujeitos e suas organizações sociais. A educação, como direito subjetivo19, é um direito social, organizadora e produtora da cultura de um povo. Nesse sentido, as organizações populares, apesar das dificuldades, têm formado sujeitos reivindicadores de seus direitos, colocando a educação como elemento fundamental nesse processo de formação e transformação social e humana. A educação do campo, portanto, surge com a emergência dos movimentos rurais na cena política, reivindicando direitos que lhes são específicos, entre eles, uma educação que possa atender as suas demandas locais e as exigências tecnológicas do mundo atual. A garantia dos direitos e a correção das diferenças instituídas na esfera da igualdade é o que move o debate em torno do direito à educação do campo, vez que se configura com uma ação estratégica de emancipação e afirmação das relações de pertença, ao mesmo tempo diferenciadas e abertas. O modelo que se propõe, preconiza o respeito às diversidades culturais, além de ser uma alternativa à hegemonia do modelo urbanizado da educação brasileira. A educação enquanto organizadora e produtora da cultura de um povo e produzida por uma cultura — a cultura do campo — não pode permanecer seguindo a lógica da exclusão do direito à educação de qualidade para todos e todas. O debate atual em torno de uma Educação do Campo não se estabelece em oposição à Educação Rural. Na verdade, essa expressão amplia o processo de formação humana que passa a ser construído a partir de referenciais culturais e políticos para a intervenção dos sujeitos na realidade. Para além de uma simples opção de terminologia, Educação do Campo tem um significado político e histórico, pois marca um momento em que a educação, de fato, deva assumir a identidade do meio rural, não só de forma diferenciada, mas que seja capaz de contribuir com a emancipação humana. Assim, o campo é aqui concebido como um espaço de criação e diversidade, ao mesmo tempo produto e produtor de cultura, não meramente espaço de produção econômica e lugar de atraso. Nesse sentido, ele não se identifica com o tom de romantismo e nostalgia de um passado rural de abundância e felicidade que subestima a evidência dos conflitos políticos e sociais, tampouco, com a visão idealizada das condições materiais da cidade, em face do processo de urbanização que deverá homogeneizar o espaço nacional (BRASIL/MEC; 2002). Não se trata de ter o urbano como parâmetro, o rural como adaptação, mas a possibilidade de dinamizar o processo formativo dos sujeitos da educação que se pretenda emancipatório. A educação, portanto, poderia recriar o campo porque possibilitaria a reflexão na práxis da vida e da organização social, no local onde ocorre. Concebe-se, assim, a educação do campo como uma relação e uma prática social realizada a partir dos interesses da sociedade, dos sujeitos sociais a quem se destina, ou seja, camponeses, agricultores e extrativistas (assentados, sem terra, ribeirinhos); trabalhadores do campo (assalariados, 19 É aquele pelo qual o titular de um direito pode exigir imediatamente o cumprimento de um dever e de uma obrigação. Trata-se de um direito positivado, constitucionalizado e dotado de efetividade. 270 meeiros, etc.), pescadores, quilombolas, indígenas, todos os povos da floresta. Por isso, a luta por uma educação do campo reconhece ―o povo do campo como sujeitos das ações e não apenas sujeitos às ações de educação, de desenvolvimento e assumem como sua tarefa educativa específica a de ajudar às pessoas e às organizações sociais do campo para que se vejam e se construam como sujeitos, também de sua educação‖ (CALDART; 2004, p. 151-152, grifos no original). Desse modo, pensar uma educação do campo expressa a necessidade que homens e mulheres, submetidos a um modelo agrícola hegemônico, excludente, insustentável e seletivo, dê conta da compreensão crítica dos mecanismos que o produzem e sustentam, assim como das possibilidades dos sujeitos produzirem mudanças nessa dinâmica. Por isso, a luta é por uma educação no e do Campo. No: o povo tem direito a ser educado no lugar onde vive; Do: o povo tem direito a uma educação resultante das reivindicações dos processos formativos, vinculada à sua cultura e às suas necessidades humanas e sociais (CALDART, 2004). Os sentimentos dos que vivem na e da terra recriam o sentimento de pertença e reconstroem suas identidades com a terra e sua comunidade, não excludentes, mas de afirmação. O desafio, pois, para a política de educação do campo está na reestruturação do sistema de ensino no meio rural, vez que as experiências de educação do campo tem sido mais freqüente no âmbito não-formal, a exemplo do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA), coordenado pelo Instituto Nacional de Reforma Agrária (INCRA), as atividades de assistência técnica e extensão rural, desenvolvidas pelo Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER) e as experiências das Escolas Itinerantes, idealizadas pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), com o objetivo de atender crianças e adolescentes acampadas com suas famílias, ausentes das escolas oficiais. Neste cenário, as pautas de reivindicações de movimentos sociais, particularmente, de trabalhadores rurais e o envolvimento dos mais diversos setores, incluindo os governamentais, tem contribuído decisivamente para construir uma pauta de discussão nacional sobre a política de educação do campo, como é o caso da Articulação Nacional por uma Educação do Campo. Trata-se de um grupo permanente de discussão criado como resultado da I Conferência Nacional por uma Educação do Campo, realizada em Luziânia (GO) em 1998, com objetivo de envolver diferentes sujeitos e entidades na mobilização e debate sobre a educação do campo no cenário nacional. Posteriormente, o Conselho Nacional de Educação, aprovou em 2002, através da Câmara da Educação Básica, as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (Resolução CNE/CEB nº 01 de 03 de abril de 2002), em consonância com o artigo 28 da atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9.394/96, que propõe medidas de adequação da escola à vida do campo e às especificidades que a matéria em educação do campo exige. A referência no corpo da legislação educacional brasileira específica à Educação do Campo é uma reivindicação histórica dos povos do campo, significando um passo importante no sentido 271 de priorizar políticas públicas para este setor, além de possibilitar novas estratégias de reivindicação de lutas dos sujeitos do campo. Ainda em 2002, por ocasião da aprovação dessas Diretrizes o Grupo Permanente Articulação Nacional por uma Educação do Campo, realizou em Brasília, o I Seminário Nacional de Educação do Campo, envolvendo diferentes entidades, órgãos públicos, movimentos sociais e sindicais em função do debate nacional sobre a implementação de uma política de educação do campo. Em 2004, no âmbito governamental, é criada a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD), juntamente com a coordenação de Educação do Campo, vinculada ao Ministério da Educação (MEC). A partir desse ano são realizados seminários em vários estados brasileiros para discutir e difundir as ações de educação do campo realizados pela secretaria e demais entidades. No Rio Grande do Norte, em particular, o Seminário Estadual de Educação e Diversidade do Campo, assim chamado, foi realizado em 2005, cujo documento final foi a elaboração da Carta do Rio Grande do Norte para a Educação do Campo, ou mesmo, Carta de Natal, reunindo um conjunto de medidas, ações e iniciativas a serem realizadas no Estado em favor da educação do campo. Um outro resultado desse Seminário foi a criação do Comitê Gestor de Educação do Campo, composto por diferentes instituições sociais e organizações governamentais e não-governamentais. Ainda em 2004 é realizada a II Conferência Nacional por uma Educação do Campo, também em Luziânia (GO), reunindo 1.100 participantes, de acordo com o documento Declaração Final da Conferência. O evento marcou um momento importante para a educação do campo, não apenas porque reuniu um grande contingente de sujeitos representantes das mais diversas áreas de atuação da educação do campo, mas por provocar e incentivar a criação de mecanismos de permanente mobilização em torno da educação do campo, através de Fóruns e Comitês Estaduais, como foi o caso do Comitê criado um ano depois da Conferência no Rio Grande do Norte, por ocasião do Seminário Estadual. Essas ações são importantes para refletirmos sobre o papel estratégico dos sujeitos sociais em contribuir com ações e atividades que possam dar conta das especificidades de uma política de educação do campo, rompendo assim, com a lógica predominante do modelo hegemônico de educação urbana. Para tanto, é preciso construir uma unidade para a tarefa que se coloca para os sujeitos do campo: a de reafirmar o compromisso coletivo com uma visão de campo, de educação e de política pública, superando o ideal de escola concebida como uma invenção da cidade para preparar as elites para governar e a camada popular para ser mão-de-obra. Assim era vista a escola do campo, cujas ações gestavam-se a partir de um modelo de educação urbanizador por acreditar que o desenvolvimento industrial faria desaparecer a sociedade rural, estando o campo fadado ao esquecimento, à superação e ao atraso econômico. Assim, a dimensão da participação apresenta-se como fato decisivo na elaboração e definição das políticas públicas efetivamente voltadas para a educação do campo. REFERÊNCIAS 272 AZEVEDO, Márcio Adriano. Política de educação do campo: concepções, processos e desafios. In: CABRAL NETO, Antonio et. al. (Org.). Pontos e contrapontos da política educacional: uma leitura contextualizada de iniciativas governamentais. Brasília: Líber Livro Editora, 2007. BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Diretrizes Operacionais para a Educação Básica do Campo. Resolução CNE/CEB n. 1, de 03 de abril de 2002. CALAZANS, Maria Julieta; CASTRO, Luis Felipe Meira de; SILVA, Hélio, R. S. da. Questões e contradições da educação rural no Brasil. In: WERTHEIN, Jorge; BORDENAVE, Juan Diaz. Educação rural no terceiro mundo: experiências e novas alternativas. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981. CALDART, Roseli Salete. Por uma educação do campo: traços de uma identidade em construção. In: ARROYO, M.; CALDART, R. S.; MOLINA, Mônica C. Por uma Educação do Campo. Petrópolis (RJ): Vozes, 2004. LEITE, C. S. Escola Rural: urbanização e políticas educacionais. São Paulo: Cortez, 1999. (Coleção Questões da Nossa Época, 70). GT7 – Imagem, Cultura e Sociedade – Sala H8 – Setor II Prof. Dr. Itamar de Morais Nobre – UFRN [email protected] Ementa: O Grupo de Trabalho: Imagem, Cultura e Sociedade, em sua primeira edição no III Ciclo de Estudos em Ciências Sociais, do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte reúne pesquisadores interessados em partilhar o conhecimento gerado no campo do ensino, pesquisa e extensão. Acolhe reflexões resultantes de pesquisas e experiências vivenciadas na área das Ciências Humanas e afins, cujo objeto tenha sido a imagem nas suas diversas linguagens: fotografia, pintura, cinema, vídeo e televisão. Propõe-se, assim, a ampliar os debates nas diversas áreas do conhecimento que abordem a imagem como interface para educar, comunicar, refletir sobre práticas socioculturais, artísticas e políticas, ambientais e científicas, envolvendo a transdisciplinaridade, reforçando o caráter emergencial de uma nova ciência. Objetivos: Reunir pesquisadores interessados em partilhar o conhecimento gerado no campo do ensino, pesquisa e extensão, resultante de pesquisas e experiências vivenciadas na área das 273 Ciências Humanas e afins, cujo objeto tenha sido a imagem nas suas diversas linguagens: fotografia, pintura, cinema, vídeo e televisão. GT7 – Imagem, Cultura e Sociedade Trabalhos Aprovados RESUMOS SIMPLES 01 - ROUPAS PARA CORPOS MARCADOS: Identidade, corpo e roupa no reality show estadunidense America’s Next Top Model Edílson Brasil de Souza Júnior Resumo: America‘s Next Top Model (ANTM) é um reality show estadunidense formado por jovens mulheres cujo sonho é se tornar a próxima top model americana. Criado pela supermodelo Tyra Banks, em sete anos, já foram produzidas treze temporadas nos EUA e mais 28 versões do programa em diferentes países do mundo, incluindo o Brasil (Brazil‘s Next Top Model, transmitido pelo canal Sony, mesma emissora que transmite ANTM). As 13 concorrentes que participam do reality, a fim de alcançarem o tão almejado posto de top model, submetem-se a todo tipo de controle e manipulação estética e corporal sugeridas durante a permanência no reality. Assim, as modelos têm a estrutura, tamanho e cor dos seus cabelos alterados, bem como lhes são dados conselhos de como devem andar, falar e se vestir para que possam transmitir aos potenciais clientes e para o público uma imagem real de modelo. A dissertação Pretty Ladies: Identidade, corpo e roupa no reality show America‘s Next Top Model analisará como os diversos discursos das candidatas e dos jurados do programa em torno da conjunção perfeita entre o corpo e a roupa se adequam às exigências mercadológicas da cultura da mídia e de que forma esses mesmos discursos refletem questões sociais e culturais contemporâneas ligadas à identidade, ao corpo, ao vestuário, ao gênero e à sexualidade. No CESO, pretendo apresentar um artigo referente ao terceiro capítulo da dissertação. Intitulado Roupas para corpos marcados, o artigo, de maneira semelhante ao capítulo, buscará compreender como são constituídas as representações midiáticas dos corpos femininos considerados normais, em virtude dos padrões sócio-culturais da atualidade. Para tanto, serão analisadas a participação no programa de uma transexual não operada (Isis King, na 11ª temporada) e de uma modelo GG (Whitney Thompson, na 10ª temporada). Dessa forma, objetiva-se perceber como o ideal de corpo tem sido construído na contemporaneidade e de que forma a roupa é útil às representações/expectativas sócio-culturais criadas em torno da identidade corporal considerada ―normal‖ (neste caso, o corpo magro e visivelmente heterossexual). Palavras-chave: Identidade/ Cultura / Mídia / Corpo / Roupa 274 02 - MIDIA E IDOSO: OLHARES SOBRE A CULTURA MIDIATICA Janaina Bezerra de Queiroz – UEPB Maria Lindaci Gomes de Souza – UEPB Patrícia Cristina de Aragão Araújo – UEPB Resumo: O mundo contemporâneo está marcado pelos avanços da comunicação e da informática e por várias transformações tecnológicas e científicas, como também, pelo envelhecimento populacional, assim principia a discussão de algumas questões pertinentes à velhice na sociedade brasileira contemporânea, transformações estas que caminha para a homogeneização, o aprofundamento da sociedade de consumo permitiu mudanças de hábitos, comportamentos e cultura, em que os meios de comunicação (a televisão) possuem papel de destaque, criando e divulgando uma ideologia. Nesse sentido, empregamos como textos publicitários aqueles de alta circulação social e tendem a se tornar mais e mais comuns em virtude das características da sociedade em que vivemos baseadas na produção e no consumo de mercadorias. São textos que atuam justamente no sentido de convencer o público a comprar determinado produto ou, ainda, no sentido de despertar a consciência do público para a destruição do nosso planeta, para problemas sociais, entre outros. Desse modo, o presente trabalho objetiva refletir acerca da imagem do idoso veiculada pela mídia, em especial pela mídia televisiva, que divulga produtos direcionados a este público e, por ser a comunicação publicitária utilizada como indicador, produto e reflexo dos valores culturais da sociedade. Produções estas que reforçam estereótipos; ditam padrões de comportamento e estimulam o consumo. Como cidadãos críticos e reflexivos identificamos que pesquisas nestas áreas se torna essencial considerando-se que, no cenário atual, verifica-se o envelhecimento populacional, a transformação no perfil da sociedade e a força influenciadora das ideologias reforçadas pelos meios de comunicação. Para a tessitura metodológica faremos uma análise sobre a imagem do idoso na mídia televisiva, visto as significantes transformações que têm marcado as relações de sociabilidade contemporânea. Após, a análise constatamos que a mídia oferece uma nova constituição de representação da imagem do idoso neste cenário, pois uma das preocupações do século XXI é o crescimento do envelhecimento da população, este fato merece uma atenção especial para este público. Verificamos, também, a expansão da imagem do idoso nos meios publicitários, ao passo que nas décadas de 70 e 80 do século XX havia pouca participação destes e, quando sucedia enfatizava as características negativas e desrespeitosa, por meio de estereótipos de dependência física e afetiva, de insegurança e de isolamento. Este fato ocorria devido a cultura do nosso país, no qual a publicidade trabalha com sonhos e idealizações numa sociedade cuja cultura é adepta ao culto à jovialidade, a preferência por atores jovens e bonitos. Embora, a partir dos anos 1990 houve um aumento gradativo da participação do idoso na mídia. Constatamos que é possível encontrar personagens em um grande número de narrativas e na publicidade existe uma demanda de atores da terceira idade para 275 representar papéis. Esse fato pode estar relacionado ao fator econômico, o aumento da população idosa e, consequentemente, ao aumento de consumidores da terceira idade. Outro fato que contribui para a mudança é o reconhecimento do idoso como potencial consumidor e essa nova imagem está relacionada ao mercado de consumo: se antes as empresas em seus anúncios tratavam o ―velho‖ com indiferença, a partir do momento que ele foi considerado consumidor, passou a ter para o mercado outra importância. (BRANDÃO, 2007) Entretanto, sabemos que a imagem do idoso veiculada pela mídia vem carregada de estereótipos, como: expectativa negativa da velhice, massificação da imagem. Além de perder importância e valor no mundo da comunicação, tornando-se quase invisível na mídia, embora representem a maior quantidade de telespectadores. Palavras-chave: Mídia . Idoso . Sistema Capitalista 03 - COMPARTILHANDO A ANTROPOLOGIA: O vídeodocumentário como pesquisa e difusão de conhecimento Renato Maia Resumo: Este trabalho refere-se à construção de documentários em vídeo como pesquisa e possibilidade de compartilhar conhecimento. A proposta é a inversão do percurso da antropologia enquanto disciplina como instrumento de colonização para a possibilidade de compartilhar conhecimento abolindo a divisão clássica entre pesquisador e pesquisado através da construção de vídeos etnográficos. O artigo inicialmente faz uma reflexão, a partir da crítica pós-colonialista, das origens das pesquisas antropológicas e a relação com a expansão colonialista européia. Em seguida aborda a mudança paradigmática da antropologia com ênfase nos trabalhos realizados por Jean Rouch e o surgimento da antropologia visual. A segunda etapa deste trabalho direciona-se ao mapeamento de novas possibilidades de construção e compartilhamento do conhecimento antropológico direcionado a pesquisa e produção áudio-visual. Assim, são analisados alguns documentários que trazem uma nova proposta de produção e de estrutura de elaboração, tais como: Um passaporte húngaro (Sandra Kogut, 2002), O prisioneiro da grade de ferro (Paulo Sacramento, 2003) e 33 (kiko Goifman, 2003). Também serão levadas em consideração novas experiências da antropologia visual como o projeto Vídeo nas aldeias onde a elaboração dos vídeos-documentários é feita pelos próprios nativos. A parte final trata da elaboração de uma proposta de pesquisa feita através do vídeo-documentário, a partir das experiências analisadas, buscando novas possibilidades de realizar trabalhos acadêmicos onde o conhecimento possa ser compartilhado, num processo de troca, de mútua absorção/cooperação, superando o abismo que existe entre a academia e as comunidades e grupos pesquisados. Na produção desses vídeosdocumentários todo o processo de elaboração, todas as etapas são formuladas e concretizadas conjuntamente. Tanto as divisões clássicas da antropologia entre pesquisador e pesquisado, quanto às hierarquias cristalizadas na produção de documentários (diretor, produtor, personagens) 276 são rejeitadas e substituídas por relações descentralizadas, igualitárias, polifônicas e dialógicas. Palavras-chave: Vídeo-documentário, antropologia visual, metodologia. 04 - MEMÓRIA DE UMA LUTA PELA TERRA, PELA VIDA E POR EDUCAÇÃO NO SEMIÁRIDO NORDESTINO Antônia Mábia Zulina de Oliveira20 Resumo: A fotografia como imagem do real carrega em si significados, referentes próprios da realidade. Sendo assim, ela transpõe o universo das palavras por promover reflexões que vão além do que é dito – pois se insurge pelo olhar. Comumente as imagens provocam questionamentos, embelezam, entristecem, produzem sentimentos, registram momentos. Para Gico et al (2004) a fotografia ―realimenta o imaginário transpondo códigos lineares, possibilitando a polissemia do discurso visual, tornando-se um signo cuja indicialidade representa, de forma mais próxima, as peculiaridades do seu referente.‖ Nesse sentido, a autora corrobora nossa proposição de que a fotografia pode ser utilizada como representação social da realidade ao conduzir singularidades, reproduzir instantes vividos, espaços e tempos que serão apreendidos por outros, indo além de quem fotografou. Dessa forma, a fotografia pode conduzir logicamente uma história como a que narraremos adiante. Nobre et al (2006) e Nobre (2004) que acreditam e creditam à fotografia a capacidade de narrativa visual e, é fazendo um cotejamento de suas idéias com as de Gico, que idealizamos este trabalho que tem como objetivo narrar a luta pela terra de alguns movimentos sociais e a sua conquista cuja história contamos através de fotografias que de certa forma retratam essa conquista e o processo de organização da Agrovila Paulo Freire, no Assentamento Eldorado dos Carajás II, em Mossoró no Rio Grande do Norte. Compreendemos que é possível perceber pelas imagens as mudanças ocorridas na vida dos assentados que atualmente já contam com casas para morar e com escola para os filhos, produzem hortaliças e mel e sonham com um futuro com menos sofrimentos e melhores condições de existência. Deriva-se este estudo de uma experiência no Programa de Residência Agrária do Governo Federal de junho de 2005 a abril de 2007, como vivência do Curso de Especialização em Agricultura familiar Camponesa e Educação do Campo. GT7 – Imagem, Cultura e Sociedade Trabalhos Aprovados RESUMOS EXPANDIDOS 20 Engenheira Agrônoma e especialista em Educação do Campo. 277 1 - ROUPAS PARA CORPOS MARCADOS: Identidade, corpo e roupa no reality show estadunidense America’s Next Top Model Edílson Brasil de Souza Júnior 21 Introdução: America’s Next Top Model (ANTM) é um reality show estadunidense formado por jovens mulheres cujo sonho é se tornar a próxima top model americana. Criado pela supermodelo Tyra Banks, em sete anos, já foram produzidas treze temporadas nos EUA e mais 28 versões do programa em diferentes países do mundo, incluindo o Brasil (Brazil’s Next Top Model, transmitido pelo canal Sony, mesma emissora que transmite ANTM). As 13 concorrentes que participam do reality, a fim de alcançarem o tão almejado posto de top model, submetem-se a todo tipo de controle e manipulação estética e corporal sugeridas durante a permanência no reality. Assim, as modelos têm a estrutura, tamanho e cor dos seus cabelos alterados, bem como lhes são dados conselhos de como devem andar, falar e se vestir para que possam transmitir aos potenciais clientes e para o público uma imagem real de modelo. A dissertão Pretty Ladies: Identidade, corpo e roupa no reality show America’s Next Top Model analisará como os diversos discursos das candidatas e dos jurados do programa em torno da conjunção perfeita entre o corpo e a roupa se adequam às exigências mercadológicas da cultura da mídia e de que forma esses mesmos discursos refletem questões sociais e culturais contemporâneas ligadas à identidade, ao corpo, ao vestuário, ao gênero e à sexualidade. No CESO, pretendo apresentar um artigo referente ao terceiro capítulo da dissertação. Intitulado Roupas para corpos marcados, o artigo, de maneira semelhante ao capítulo, buscará compreender como são constituídas as representações midiáticas dos corpos femininos considerados normais, em virtude dos padrões sócio-culturais da atualidade. Para tanto, serão analisadas a participação no programa de uma transexual não operada (Isis King, na 11ª temporada) e de uma modelo GG (Whitney Thompson, na 10ª temporada). Dessa forma, objetiva-se perceber como o ideal de corpo tem sido construído na contemporaneidade e de que forma a roupa é útil às representações/expectativas sócio-culturais criadas em torno da identidade corporal considerada ―normal‖ (neste caso, o corpo magro e visivelmente heterossexual). 2 - MIDIA E IDOSO: OLHARES SOBRE A CULTURA MIDIATICA Janaina Bezerra de Queiroz – UEPB Maria Lindaci Gomes de Souza – UEPB 21 Conhecido profissionalmente como Júnior Ratts, Edilson Brasil é Mestrando do Curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Ceará e bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível – Capes. E-mail: [email protected]. 278 Patrícia Cristina de Aragão Araújo – UEPB O mundo contemporâneo está marcado pelos avanços da comunicação e da informática e por várias transformações tecnológicas e científicas, como também, pelo envelhecimento populacional, assim principia a discussão de algumas questões pertinentes à velhice na sociedade brasileira contemporânea, transformações estas que caminha para a homogeneização, o aprofundamento da sociedade de consumo permitiu mudanças de hábitos, comportamentos e cultura, em que os meios de comunicação (a televisão) possuem papel de destaque, criando e divulgando uma ideologia. Nesse sentido, empregamos como textos publicitários aqueles de alta circulação social e tendem a se tornar mais e mais comuns em virtude das características da sociedade em que vivemos baseadas na produção e no consumo de mercadorias. São textos que atuam justamente no sentido de convencer o público a comprar determinado produto ou, ainda, no sentido de despertar a consciência do público para a destruição do nosso planeta, para problemas sociais, entre outros. Desse modo, o presente trabalho objetiva refletir acerca da imagem do idoso veiculada pela mídia, em especial pela mídia televisiva, que divulga produtos direcionados a este público e, por ser a comunicação publicitária utilizada como indicador, produto e reflexo dos valores culturais da sociedade. Produções estas que reforçam estereótipos; ditam padrões de comportamento e estimulam o consumo. Como cidadãos críticos e reflexivos identificamos que pesquisas nestas áreas se torna essencial considerando-se que, no cenário atual, verifica-se o envelhecimento populacional, a transformação no perfil da sociedade e a força influenciadora das ideologias reforçadas pelos meios de comunicação. Para a tessitura metodológica faremos uma análise sobre a imagem do idoso na mídia televisiva, visto as significantes transformações que têm marcado as relações de sociabilidade contemporânea. Após, a análise constatamos que a mídia oferece uma nova constituição de representação da imagem do idoso neste cenário, pois uma das preocupações do século XXI é o crescimento do envelhecimento da população, este fato merece uma atenção especial para este público. Verificamos, também, a expansão da imagem do idoso nos meios publicitários, ao passo que nas décadas de 70 e 80 do século XX havia pouca participação destes e, quando sucedia enfatizava as características negativas e desrespeitosa, por meio de estereótipos de dependência física e afetiva, de insegurança e de isolamento. Este fato ocorria devido a cultura do nosso país, no qual a publicidade trabalha com sonhos e idealizações numa sociedade cuja cultura é adepta ao culto à jovialidade, a preferência por atores jovens e bonitos. Embora, a partir dos anos 1990 houve um aumento gradativo da participação do idoso na mídia. Constatamos que é possível encontrar personagens em um grande número de narrativas e na publicidade existe uma demanda de atores da terceira idade para representar papéis. Esse fato pode estar relacionado ao fator econômico, o aumento da população idosa e, consequentemente, ao aumento de consumidores da terceira idade. 279 Outro fato que contribui para a mudança é o reconhecimento do idoso como potencial consumidor e essa nova imagem está relacionada ao mercado de consumo: se antes as empresas em seus anúncios tratavam o ―velho‖ com indiferença, a partir do momento que ele foi considerado consumidor, passou a ter para o mercado outra importância. (BRANDÃO, 2007). Entretanto, sabemos que a imagem do idoso veiculada pela mídia vem carregada de estereótipos, como: expectativa negativa da velhice, massificação da imagem. Além de perder importância e valor no mundo da comunicação, tornando-se quase invisível na mídia, embora representem a maior quantidade de telespectadores. 03 - COMPARTILHANDO A ANTROPOLOGIA: O vídeo-documentário como pesquisa e difusão de conhecimento Renato Maia Este trabalho refere-se à construção de documentários em vídeo como pesquisa e possibilidade de compartilhar conhecimento. A proposta é a inversão do percurso da antropologia enquanto disciplina como instrumento de colonização para a possibilidade de compartilhar conhecimento abolindo a divisão clássica entre pesquisador e pesquisado através da construção de vídeos etnográficos. O artigo inicialmente faz uma reflexão, a partir da crítica pós-colonialista, das origens das pesquisas antropológicas e a relação com a expansão colonialista européia. Em seguida aborda a mudança paradigmática da antropologia com ênfase nos trabalhos realizados por Jean Rouch e o surgimento da antropologia visual. A segunda etapa deste trabalho direciona-se ao mapeamento de novas possibilidades de construção e compartilhamento do conhecimento antropológico direcionado a pesquisa e produção áudio-visual. Assim, são analisados alguns documentários que trazem uma nova proposta de produção e de estrutura de elaboração, tais como: Um passaporte húngaro (Sandra Kogut, 2002), O prisioneiro da grade de ferro (Paulo Sacramento, 2003) e 33 (kiko Goifman, 2003). Também serão levadas em consideração novas experiências da antropologia visual como o projeto Vídeo nas aldeias onde a elaboração dos vídeos-documentários é feita pelos próprios nativos. A parte final trata da elaboração de uma proposta de pesquisa feita através do vídeo-documentário, a partir das experiências analisadas, buscando novas possibilidades de realizar trabalhos acadêmicos onde o conhecimento possa ser compartilhado, num processo de troca, de mútua absorção/cooperação, superando o abismo que existe entre a academia e as comunidades e grupos pesquisados. Na produção desses vídeos-documentários todo o processo de elaboração, todas as etapas são formuladas e concretizadas conjuntamente. Tanto as divisões clássicas da antropologia entre pesquisador e pesquisado, quanto às hierarquias cristalizadas na produção de documentários (diretor, produtor, personagens) são rejeitadas e substituídas por relações descentralizadas, igualitárias, polifônicas e dialógicas. 280 04 - MEMÓRIA DE UMA LUTA PELA TERRA, PELA VIDA E POR EDUCAÇÃO NO SEMI-ÁRIDO NORDESTINO Antônia Mábia Zulina de Oliveira 22 Introdução: A fotografia como imagem do real carrega em si significados, referentes próprios da realidade. Sendo assim, ela transpõe o universo das palavras por promover reflexões que vão além do que é dito – pois se insurge pelo olhar. Comumente as imagens provocam questionamentos, embelezam, entristecem, produzem sentimentos, registram momentos. Para Gico et al (2004) a fotografia ―realimenta o imaginário transpondo códigos lineares, possibilitando a polissemia do discurso visual, tornando-se um signo cuja indicialidade representa, de forma mais próxima, as peculiaridades do seu referente.‖ Nesse sentido, a autora corrobora nossa proposição de que a fotografia pode ser utilizada como representação social da realidade ao conduzir singularidades, reproduzir instantes vividos, espaços e tempos que serão apreendidos por outros, indo além de quem fotografou. Dessa forma, a fotografia pode conduzir logicamente uma história como a que narraremos adiante. Nobre et al (2006) e Nobre (2004) que acreditam e creditam à fotografia a capacidade de narrativa visual e, é fazendo um cotejamento de suas idéias com as de Gico, que idealizamos este trabalho que tem como objetivo narrar a luta pela terra de alguns movimentos sociais e a sua conquista cuja história contamos através de fotografias que de certa forma retratam essa conquista e o processo de organização da Agrovila Paulo Freire, no Assentamento Eldorado dos Carajás II, em Mossoró no Rio Grande do Norte. Compreendemos que é possível perceber pelas imagens as mudanças ocorridas na vida dos assentados que atualmente já contam com casas para morar e com escola para os filhos, produzem hortaliças e mel e sonham com um futuro com menos sofrimentos e melhores condições de existência. Deriva-se este estudo de uma experiência no Programa de Residência Agrária do Governo Federal de junho de 2005 a abril de 2007, como vivência do Curso de Especialização em Agricultura familiar Camponesa e Educação do Campo. Durante o período de com/vivência com as famílias assentadas procuramos registrar os momentos que considerávamos marcantes no intuito de construir a história da Agrovila na qual desenvolvíamos a pesquisa, por meio de fotografias consideradas por nós como históricas e também, de conhecer outras fotografias feitas por outros atores sociais, fazíamos também o registro em um caderno de campo, de algumas atividades desenvolvidas pelos assentados no tocante à educação do campo na tentativa de compreender qual o sentido que elas davam a educação. As fotografias contam a história de um contexto de lutas por emancipação social no semiárido nordestino: O semi-árido nordestino caracteriza-se por solos que durante o inverno se encharcam com as águas da chuva e que ressecam com facilidade no verão quando há estiagem, dado o clima tropical quente com temperatura anual de 26° C.Estas características ambientais têm gerado dificuldades para a sobrevivência das pessoas que habitam essa região e tem demandado inúmeras políticas sociais. A fotografia como imagem do real carregando em si significados, referentes próprios da realidade. Sendo assim, ela transpõe o universo das palavras por promover reflexões que vão além do que é dito – pois se insurge pelo olhar, assim, trazemos a fotografia para contar a história 22 Engenheira Agrônoma e especialista em Educação do Campo. 281 dos assentados na Agrovila Paulo Freire, no Assentamento Eldorado dos Carajás II, em Mossoró no Rio Grande do Norte. Desse modo, acreditamos que a fotografia tem aqui a capacidade de narrativa visual, fazendo o cotejamento do antes e do depois neste trabalho que tem como objetivo narrar a luta pela terra de alguns movimentos sociais e a sua conquista, cuja história contamos através de fotografias que de certa forma retratam essa conquista e o processo de organização dos assentados, conforme apresentamos a seguir. Considerações finais: De junho a outubro de 2005, observamos o estado de ansiedade das famílias assentadas em relação às condições de moradia, de produção para subsistência, à educação das crianças e a sua própria educação. Visualizamos que mesmo naquelas condições de moradia em barracas de lonas, sem energia elétrica e sem água tratada, os adultos estudavam no próprio acampamento, o que eles denominavam de Escola de Lamparina. Para as crianças e jovens, havia um transporte disponível para conduzi-los à escola. A Escola da Lamparina é uma atividade real e concreta que sinaliza para a falta de educação do campo no Brasil desde o período colonial. Os agricultores, mesmo necessitando da leitura e da escrita para guiar a vida profissional, até mesmo nas vivências cotidianas, não têm esse direito assegurado, apesar de garantido por Lei. Entendemos que: a questão agrária no Brasil pode ser compreendida observandose situações reais em qualquer parte do país e que estas podem ser analisadas tendo como parâmetro teorias que dão sustentação a análises mais abrangentes, no sentido em que as situações vividas pelos povos do campo não divergem umas das outras, no tocante à falta de condições materiais de existência. Isto revela que não lhes são assegurados os direitos e garantias fundamentais constitucionalmente tutelados. Assim, concluímos que é imprescindível, apesar da existência de muitas frentes de lutas, reinventar a emancipação social com e para os povos do campo, é necessário agir para a implementação de uma educação do campo no sentido e significado proposto anteriormente por Molina (2006). Sobre o que deixamos para reflexão: Está terminando o tempo da inocência e começando o tempo da política. Os pobres da terá, durante séculos excluídos, marginalizados, têm caminhado em silêncio e depressa no chão dessa longa noite de humilhação e proclamam, no gesto da luta, de resistência, da ruptura, da desobediência, sua nova condição, seu caminho sem volta, sua presença maltrapilha, mas digna, na cena da História. (MARTINS (1996) apud ALENCAR, 2000, p. 83). Compreendemos que é possível perceber pelas imagens fotográficas as mudanças ocorridas na vida dos assentados que atualmente já contam com casas para morar, com escola para os filhos, produzem hortaliças e mel e sonham com um futuro com menos sofrimentos e melhores condições de existência. Assim, a fotografia torna-se uma narrativa visual como propõe Nobre (2004) pela possibilidade de mostrar a existência de uma realidade em suas nuanças concretas; outras leituras poderão ser feitas pelo leitor das fotografias, mas a nossa é de informa que ocorreu mudanças qualitativas no território desses assentados. REFERÊNCIAS GALENO, Alexsandro. Imagens da Terra: por uma poética da Luta Política. (1996). Dissertação de Mestrado em Ciências Sociais. Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Natal/ Brasil: 1996. GICO,Vânia ; NOBRE, Itamar de Moraes ; SILVA, Lenina Lopes Soares. Itinerário Social da Medicina: a memória fotográfica em Natal. In: V Congresso LusoBrasileiro de História da Educação, 2004, Évora. Anais. Évora : Universidade de Évora, 2004. 282 NOBRE, I. M. A Fotografia Como Narrativa Visual. In: XXII Reunião Anual da ABA, 2004, Olinda/PE. Programa e Resumos da XXII Reunião Anual da ABA, 2004. NOBRE, I. M; GICO, Vânia de Vasconcelos. Fotocartografia Sociocultural: uma proposta metodológica. In: Simpósio Internacional Métodos Qualitativos nas Ciências Sociais e na Prática Social, 2006, Recife/PE. Anais do Simpósio Internacional Métodos Qualitativos nas Ciências Sociais e na Prática Social, 2006. OLIVEIRA, Antônia Mábia Zulina de. Narrativas e olhares sobre o processo de construção da vida comunitária na Agrovila Paulo Freire, no assentamento Eldorado dos Carajás II, Mossoró/RN. Monografia (Especialização em Agricultura Familiar Camponesa e Educação do Campo – Programa Residência Agrária) – Universidade Federal do Ceará. Mossoró, 2007. GT8 – Desenvolvimento, Políticas Públicas e Terceiro Setor – Sala A4 – Setor II Prof. Dr. João Bosco Araújo da Costa (UFRN) Profª. Drª. Maria Ivonete Soares Coelho (UERN/UFRN) [email protected] Ementa: Este GT se constitui num espaço temático para a reflexão de estudos e pesquisas que tem como enfoque os temas do desenvolvimento,das políticas públicas e do terceiro setor. Trata-se de estudos empíricos que ampliem as reflexões sobre os novos papéis atribuídos ao poder público local, os padrões de interação entre poder público e atores sociais, o papel do Estado, do mercado e da sociedade como agentes do desenvolvimento. O GT Justifica-se pela importância e emergência desta trilogia temática e por ampliar as possibilidades de reflexão dos temas que informam as linhas de investigação da base de pesquisa "Poder Local, Cultura Política e Políticas Públicas‖ do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. GT8 – Desenvolvimento, Políticas Públicas e Terceiro Setor TRABALHOS APROVADOS – RESUMOS SIMPLES 01 O SENTIDO DA REPRESENTAÇÃO POLÍTICA Autor: Pablo Thiago Correia de Moura. E-mail: [email protected] Resumo: Exporei aspectos relevantes da ampliação do campo da representatividade para além do campo político, como fator essencial para democratização das estruturas políticas no sentido de paradigmas, vícios e surgimento para novos alicerces numa visão mais horizontal e menos vertical e particular da política partidária; onde a representação política possibilita a sociedade civil identificar-se e influenciar a direção política do país. Também ver que essas perspectivas de representação da sociedade civil por 283 novos atores transformam não só o campo da mesma como modifica a noção de sociedade civil representada em substituição a uma perspectiva de sociedade civil soberana. A representação transforma e expande a política na medida em que não apenas coloca os representantes ou o Estado como protagonistas das ações decisórias, mas quando enfoca esse protagonismo para a sociedade civil. Palavras-chave: Democracia Representativa, Sociedade Civil, Movimentos Sociais, Democracia Direta. 02 DESENVOLVIMENTO, ASSOCIATIVISMO E PARTICIPAÇÃO EM ASSENTAMENTOS RURAIS Autor: Melquisedeque de Oliveira Fernandes E-mail: [email protected] Resumo: Os projetos de assentamentos rurais, enquanto unidades de produção agrícola e espaço de desenvolvimento social visam, através da organização política dos assentados, um ordenamento político e social cujo sentido seja, entre outros, reinventar valores e habilitar as famílias para sociabilidade política participativa e democrática. O espaço reservado para tal sociabilidade são as associações de produtores rurais. Objetivamos com esse trabalho discutir o sentido que assume o processo de reinvenção de valores dos assentados (diante da orientação participativo-democráticas) em 30 assentamentos de reforma agrária no RN, a partir das situações identificadas como tensas e conflituosas, originadas da sociabilidade política no espaço das associações. Palavras chave: desenvolvimento,reforma agrária, assentamentos rurais. 03 POLÍTICAS PÚBLICAS DE INCLUSÃO DIGITAL COMO EXPANSÃO DAS LIBERDADES Maria Aparecida Ramos da Silva Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da UFRN: [email protected] Resumo: Esta pesquisa é parte de um estudo mais amplo sobre a avaliação da efetividade de políticas públicas de inclusão digital na rede pública de ensino de educação básica no município de Natal/RN. Compreende-se que a dinâmica do mundo contemporâneo mudou consideravelmente com o advento das novas tecnologias de informação e comunicação (TIC), principalmente o computador e a internet, que provocaram significativas mudanças nas forças produtivas, nas relações de produção e nas formas de sociabilidade humana. Paradoxalmente, essas transformações trouxeram em seu âmago uma nova forma de exclusão/privação social: a exclusão 284 digital, que atinge uma grande parcela da população. Assim, exclusão digital é contemporaneamente uma nova forma de privação/exclusão social para amplos setores da sociedade e o acesso às novas TICs têm como resultado preponderante a expansão das capacidades e liberdades dos indivíduos. Palavras-chave:Inclusão digital. Exclusão digital. Políticas públicas. Avaliação de políticas públicas. 04 POLÍTICAS PÚBLICAS E DESENVOLVIMENTO: UMA ANALISE DO PROGRAMA DE DOCUMENTAÇÃO DA TRABALHADORA RURAL – MDA/INCRA Dalvanir Avelino E-mail: [email protected] Resumo: O artigo discute o papel das políticas públicas na promoção do desenvolvimento a partir de uma análise acerca da experiência desenvolvida no PROGRAMA DE DOCUMENTAÇÃO DA TRABALHADORA RURAL, executado pelo INCRA e MDA, no estado do Rio Grande do Norte. Parte-se do pressuposto de que o sentido atribuído à idéia de desenvolvimento é determinante na definição da agenda pública, bem como dos problemas que serão enfrentados por meio destas. Buscou-se, portanto investigar a contribuição do referido programa no processo de expansão das liberdades das trabalhadoras rurais. Para tanto o percurso metodológico compreendeu a realização de pesquisa documental, bibliográfica e de campo. Na pesquisa de campo, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com trabalhadoras rurais que participaram dos mutirões de execução do programa, bem como gestores e profissionais que atuam emissão dos documentos e articulação dos diversos parceiros que o viabilizam. O estudo indica que o desenvolvimento poderá ser alcançado com a remoção dos obstáculos que impedem as trabalhadoras rurais de constituírem-se como cidadãs. O acesso à documentação constitui-se, portanto, uma porta de entrada para outros programas e políticas públicas que em articulação contribuem para a eliminação de privações de diversas ordens e a conseqüente expansão das liberdades dessas mulheres. Palavras-Chaves: Gênero, desenvolvimento e políticas públicas. 05 ASSISTENCIA SOCIAL: TEMA DE PESQUISA E OBJETO DE AVALIAÇÃO 285 Maria Ivonete Soares Coelho (UERN/UFRN) E-mail: [email protected] Resumo: Assistência Social no Brasil tem sua trajetória histórica demarcada pelo assistencialismo, clientelismo, filantropia e ações pontuais de governos e da sociedade. Pós 1988, com a nova Constituição Federal, a assistência social ganha o status de política pública componente do sistema de seguridade social. Ocorre, portanto, uma mudança paradigmática para o campo do direito. Este fato, por si só, insere a assistência social tema de pesquisas de graduação e pós-graduação nas diversas áreas/campos de saber. Outro componente deste fenômeno é a sua condição de realizar-se localmente, leia-se municípios, exigindo basicamente para sua existência local a formatação de conselho municipal, plano municipal e fundo municipal. Este processo culmina com avanços que serão identificados com criação do Sistema único da Assistência Social – SUAS, em 2004. Neste cenário visualizamos como perspectivas ,a partir de estudos direcionados ao processo de doutoramento em Ciências Sociais, as necessidades de pensar este tema aliando-o as demandas reflexivas em torno do desenvolvimento,de nossas (e novas) institucionalidades,de campos de disputas pela afirmação da política,paradigma em processo de construção, e do assistencialismo,campo concreto de realização.Neste particular ganha também significado, o sentido dado a assistência social por seus usuários,como forma de legitimar (ou não)as novas definições e marcos legais,induzidas pelas percepções a partir dos efeitos/impactos em suas vidas. Neste ambiente, ampliando o tema e consolidando-o como objeto de avaliação, visualizamos a produção teórica no campo da pesquisa de avaliação de políticas públicas, particularmente da pesquisa de efetividade (ARRETCHE,2007),bem como,além de dar conta da demanda da realidade demarcada pela ampliação de políticas e programas sociais, possibilitar uma (re) significação da assistência social e do desenvolvimento em termos locais/municipais,buscando identificar e valorar as efetivações(SEN,1993,2000) na vida de seus usuários. Palavras-chave: Políticas Públicas; Avaliação de Políticas Públicas; Asssitencia Social; Desenvolvimento. GT8 – Desenvolvimento, Políticas Públicas e Terceiro Setor TRABALHOS APROVADOS – RESUMOS EXPANDIDOS 286 (Resumos Expandidos não enviados pelos autores para publicação). GT9 – Tecendo e vivenciando histórias de violência – Sala H10 – Setor II Drª. Teresa de Lisieux Lopes Frota (IBRAPES-UVA) [email protected] Ms. Adriana Aparecida de Souza (UFRN) Ementa : Pretende-se discutir as diversas relações, visões da violência enquanto fenômeno social, analisando destacando o modo como a sociedade coloca, relata e nomeia as práticas violentas em suas realidades sociais, apreendendo assim os vários significados construídos socialmente sobre o fenômeno. Este grupo de trabalho visa, portanto, a ampliar e a aprofundar os debates em torno da temática proposta. Objetivos: Promover o debate sobre a temática de violência; Trocar idéias sobre as experiências dos pesquisadores, estudantes e interessados na temática; Viabilizar a socialização de áreas e/ou campos de estudos propiciando diferentes olhares. GT9 – Tecendo e vivenciando histórias de violência TRABALHOS APROVADOS RESUMOS SIMPLES 01 - “TÁ LÁ O CORPO ESTENDIDO NO CHÃO”: UM ESTUDO DO CASO DO LINCHAMENTO DE AREIA BRANCA - RN Francisco Augusto Cruz de Araújo Ciências Sociais – UERN [email protected] Resumo: Esta pesquisa baseia-se no estudo de um caso de linchamento ocorrido no ano de 1993 na cidade de Areia Branca - RN. O objetivo deste trabalho é reconstituir a partir de narrativas jornalísticas o cenário em que o linchamento ocorreu, bem como perceber os fatores que influenciaram a comunidade a praticar ―justiça com as próprias mãos‖ à revelia do poder legal. Esta pesquisa estrutura-se a partir de narrativas publicadas em dois jornais de circulação regional que participaram da cobertura do fenômeno: jornal Gazeta do Oeste e o Mossoroense. O material jornalístico forneceu informações suficientes para a reconstituição do cenário em que o linchamento ocorreu e pôde revelar a ―justiça popular‖ como uma iniciativa privada para a solução de conflitos cotidianos desencadeados por fatores como o descrédito da sociedade nas instituições de segurança e justiça, o crescente sentimento de medo e insegurança ligados à violência social, como a exposição a situações de pobreza e miséria. As notícias analisadas evidenciam a aceitação e naturalização de uma forma de controle social baseada eminentemente em meios violentos, respaldadas pela mídia, que 287 constrói a idéia de ―justiça‖ e ―cidadania‖ sobrepostas até em valores como a preservação da vida e da dignidade humana, contrapondo os direitos das vítimas linchadas aos direitos da sociedade. Palavras-chave: violência; linchamento; mídia; justiça popular 02 - VIOLÊNCIA INTRAFAMILIAR E O PAPEL DO ESTADO Autora: Adriana Aparecida de Souza Orientador: José Willington Germano Agência financiadora: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) Resumo: Este estudo trata da violência intrafamiliar contra crianças e adolescentes, buscando apreender como o estado vê esse tipo de violência bem como a sociedade. Visando compreender como se dá essa relação no seio familiar buscou-se elencar de que maneira são fomentados as praticas de agressão entre mães e filhos no contexto familiar, abordando como as relações de violência se configuram infligindo os direitos das crianças. Assim, procurou-se analisar e discutir o papel da família e do conselho tutelar como órgão de proteção às crianças da cidade de natal. Em nossas análises construídas a partir de entrevistas com conselheiros tutelares, constatamos que este órgão atua de forma assistencialista, e ao fazer essa atuação apenas responsabiliza a família delegando a culpa pelos problemas e principalmente pela violência intrafamiliar enfrentados pelas crianças como exclusivo da família, desviando assim, a responsabilidade do estado e da sociedade. Palavras-chave: estado; direitos das crianças; violência intrafamiliar. 03 - TECENDO HISTÓRIAS SOBRE A VIOLÊNCIA: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA Gleydson Rodrigues da Silva- UFRN Resumo: Este trabalho pretende apresentar um relato de experiência fruto do projeto de extensão ―tecendo histórias para entender a violência‖, desenvolvido no grupo de pesquisa cultura, política e educação, do departamento de ciências sociais, da universidade federal do rio grande do norte. o projeto objetiva trabalhar com a temática violência, destacando o modo como a sociedade coloca, relata e nomeia as práticas violentas em suas realidades sociais. o presente trabalho busca assinalar o projeto em questão como um espaço educativo por excelência. focando a discussão no conceito de violência simbólica segundo Bourdieu. Palavras-chave: educação; violência simbólica; Bourdieu. 288 04 - PEDAGOGIA DA PALMADA: O MESTRE ESCOLA WITTGENSTEIN IN TRATENBACH Mônica Gicéia Carvalho Costa EDUCAÇÃO – FAL [email protected] Resumo: O episódio sobre o qual foi analisado aqui aconteceu em 1922, e durante esse entretempo, quando Wittgenstein abandonou a filosofia e decidiu se tornar mestre-escola em uma região pobre, mas bela, da baixa Áustria. Quais seriam os seus motivos para atitudes pouco educativas? Como um mestre-escola preparado formalmente para educar os pequenos pode ter atitudes abomináveis para com uma criança? Só uma análise minuciosa nos revela estas facetas. Esta pesquisa bibliográfica e de campo busca revelar a formação para o magistério de um dos maiores filósofos do sec. XX. Daí, o filósofo, conhecendo as circunstâncias históricas específicas do gênero humano, decidiu não desprezar o que havia de eficiente nos métodos de disciplina rígida da escola tradicional na cidade de Trattenbach. Palavras chave: magistério, educação, violência, mestre-escola. GT9 – Tecendo e vivenciando histórias de violência RESUMOS EXPANDIDOS 01 - “TÁ LÁ O CORPO ESTENDIDO NO CHÃO”: UM ESTUDO DO CASO DO LINCHAMENTO DE AREIA BRANCA - RN Francisco Augusto Cruz de Araújo Ciências Sociais – UERN [email protected] (Resumo Expandido não disponibilizado pelo autor para publicação) 02 - VIOLÊNCIA INTRAFAMILIAR E O PAPEL DO ESTADO Autora: Adriana Aparecida de Souza Orientador: José Willington Germano Agência financiadora: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) Esse trabalho visa discutir quais as conseqüências da violência intrafamiliar para a efetivação dos direitos da criança e do 289 adolescente, assim como o Estado e a família vêem esses direitos. Tendo como objetivo entender as conseqüências da violência intrafamiliar aos direitos das crianças e adolescentes. Este texto é fruto de estudos preliminares da pesquisa intitulada: Violência intrafamiliar e suas conseqüências para o desenvolvimento da aprendizagem das crianças . Contextualizando o problema, entende-se que a violência intrafamiliar contra crianças no Brasil é uma questão social complexa que envolve questões sociais e culturais e especialmente estatais. Entende-se que a infância tem seus direitos garantidos pelo Estado através do Estatuto da Criança e do Adolescente. Entretanto, dados do Instituto de Pesquisa e Estatística Aplicada em uma pesquisa realizada em 2005, revelam que a violência intrafamiliar contra crianças e adolescentes ocorre em todas as partes do país. Essa pesquisa apontou que 84,8% de 19.373 dos chamados abrigamentos, decorrentes de decisões jurídicas que acarretam a suspensão do pátrio poder nas quais os pais ou responsáveis perdem o direito sobre a tutela da criança ou do adolescente ficando estes abrigadas sobre a guarda do Estado. Observou-se que esse total se refere a crianças e adolescentes abrigados em instituições que sofreram violência intrafamiliar, então, esses dados corroboram as preocupações sobre a problemática como um problema social de conseqüências ainda não mensuradas, ou até mesmo estudadas com finalidades voltadas para políticas públicas. Para que se compreenda essa realidade exige-se uma investigação permanente sobre as situações de violência vivenciadas pelos diferentes segmentos da sociedade. Percebe-se, no entanto, que as práticas violentas contra crianças e adolescentes, na esfera familiar, vêm perdendo a delimitação de espaço privado, já que essas práticas estão sendo cada vez mostradas pela mídia e os casos de violência intrafamiliar têm extrapolado o considerado aceitável. Embora tais práticas sejam mais estudadas e debatidas hoje, através de um novo olhar sobre a infância, pela mídia e a própria sociedade, isto apenas tem dado maior visibilidade a esse problema social, à medida que as crianças são representadas, pela sociedade e pelo Estado como sujeitos portadores de direitos. A trajetória da história da criança se fez à margem dos adultos, sofrendo violência, humilhações, etc, sendo prisioneira da escola, da igreja, da legislação, do sistema econômico, passando por 290 abandonos, vivendo situações de violências cotidianas, como abusos sexuais, doenças, queimaduras e fraturas que sofriam tanto no lar como no trabalho. Atualmente, a visão da infância também sofreu alterações, a qual se constatou que a criança possui uma diferença radical do adulto e que todas as crianças têm oportunidades iguais. O modelo de educação que desvalorizava e combatia o desejo das crianças, valorizando a disciplina a obediência esta sendo duramente criticado (Arès, 1978, Del Priore, 1991). E um novo modelo que visa privilegiar a criatividade, a iniciativa e a cooperação entre os indivíduos vem sendo constantemente estimulado. Essa representação de criança que não a reconhece como sujeito de direito, como um ser que tem função social, faz parte de um momento histórico. Sendo assim, entende-se que as crianças são seres sociais, e dessa forma têm uma história, e estabelecem relações segundo seu contexto de origem. Dessa maneira, ocupam um espaço geográfico e são valorizadas de acordo com os padrões do seu contexto familiar e com a sua própria inserção nesse contexto. Elas são, portanto, enraizadas num todo social que as envolve e que nelas imprime padrões de autoridade, linguagem, e costumes. A valorização e o sentimento atribuídos à infância nem sempre existiram da forma como na atualidade do século XXI são concebidas e difundidas, tendo sido modificados a partir de mudanças econômicas e políticas da estrutura social. Sendo assim, atualmente a educação se propõe a promover as condições de desenvolvimento da criança em todos os seus aspectos, a saber, cognitivo, social, afetivo, emocional e ético. Este pensamento é fruto de um novo olhar dado a educação em que se acredita que o educar significa atender às necessidades da criança como um ser complexo e multifacetado. A partir desse novo olhar o Estado passou a interferir na vida familiar. Bem como, impôs uma regulação sob a família que agora se tornou a responsável pelo funcionamento econômico; transmissão do patrimônio; procriação de crianças e pela sua socialização, saúde e transmissão de valores do meio social. A nova visão representativa das crianças e dos adolescentes, possibilitou mudanças também em algumas formas enraizadas no social da família sobre o que seria educar, entre elas a visão da pedagogia e da psicologia que determinam que a punição corporal 291 não seria adequada para a educação de crianças e de adolescentes, considerando que essas práticas poderiam desencadear exacerbações que levariam a violência física, além de outros traumas de ordem psicológica. Essa prática que não era nem questionada como violência começa a mudar, surgindo discussões sobre o que seria, ou não violência intrafamiliar. Visando proteger as crianças e os adolescentes, surgiu todo um movimento em prol da garantia de direitos a esses seres em formação. Essa preocupação se consolidou apenas no ano de 1980, modificando a percepção de direito de violência sobre as crianças e adolescentes. Dessa forma, por meio da declaração dos direitos da criança e com o surgimento de uma vasta campanha de questionamentos da ―política nacional de bem-estar do menor‖ e do ―código de menores‖, surgiram também nesse período denúncias graves sobre a situação enfrentada pela infância brasileira, como também a constante violação de seus direitos. As emanações da Constituição Brasileira de 1988 para as crianças e os adolescentes vão começar a se concretizar com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), este reúne um conjunto de normas do ordenamento jurídico brasileiro que tem como objetivo a proteção integral da criança e do adolescente, aplicando medidas, e expedindo encaminhamentos. Foi elaborado na tentativa de colocar o Brasil numa campanha nacional de reconhecimento dos direitos da criança e do adolescente. A sua concretização foi possível com a implantação, em 1990, sendo utilizado como medida de proteção à vítima e prevenção do fenômeno. O Código Penal Brasileiro também reprime os abusos correcionais ao prescrever na (LEI Nº. 2.848/1940), no delito de maus tratos: Art. 136 – Expor a perigo de vida ou a saúde de pessoas sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentos ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina. Observa-se, dessa forma, que no Brasil existe toda uma estrutura legal, isto é, leis que garantem os direitos da criança e do adolescente, porém o que percebe-se é que a lei não está 292 garantindo o reconhecimento desses direitos, pois existe no Brasil toda uma cultura de submissão que a criança deve obediência a seus pais, já que são eles os responsáveis legais e ―naturais‖, e a desobediência tem sinônimo de punição. O que acontece é que a nossa sociedade ainda cultiva a punição corporal ou castigo físico como um dos meios para disciplinar os seres humanos. O controle então se dá pelo corpo, como uma forma de construção e de controle das instituições disciplinares. Sendo assim, a família tem o poder de definir padrões de comportamento, atos e práticas possíveis e as proibidas, exercendo assim, um controle do corpo. Nesse sentido, o controle do corpo vem pela punição física, o ―corpo é percebido como um campo para várias intervenções‖. De acordo com Caldeira, os brasileiros naturalizam a inflição da dor, como corretivos, e que essas intervenções não são necessariamente dolorosas ou violentas. ―Na verdade, algumas são vistas como aspectos desejáveis e atraentes da cultura brasileira.‖ (CALDEIRA, 2000, p. 369-370). Todavia, mesmo tendo seus direitos garantidos pela lei, as crianças e adolescentes não são reconhecidos pelos pais e nem pela sociedade como portadores de direitos, havendo necessidade da criação de meios para que a violência sofrida por crianças e adolescentes, dentro de sua própria família, seja denunciada e apurada. Entretanto, isto mostra que o Brasil, na procura de melhores condições de vida para sua população infanto-juvenil, adotou a doutrina da proteção integral com a edição do ECA. Busca, também, a garantia do direito à vida, à educação, à saúde, à convivência familiar etc., através de uma concepção extremamente coerente que pensa a formação do homem desde sua infância para uma vida digna a todos e um maior crescimento como nação. Ainda que o reconhecimento da criança como sujeito de direitos tenha surgido, essa conquista se deu principalmente através do movimento de direitos humanos, e do discurso da psicologia, pedagogia que visava o bem-estar da criança, ou seja, instituições que discursavam sobre a percepção de criança, práticas educacionais e também os problemas enfrentados por crianças e adolescentes que são vítimas de violência. Possibilitando o surgimento de meios legais de intervenção da violência sofrida por crianças e adolescentes. Entretanto, esta apenas passou a ser reconhecida assim no momento em que houve mudança na forma 293 de pensar social, ainda que não seja de forma homogênea, já que a grande maioria da população brasileira não compreende as leis de proteção de crianças e adolescente. Tem-se a certeza que este pequeno artigo não dá conta de uma problemática complexa como a que envolve a efetivação dos direitos da criança e do adolescente principalmente, quando o maior risco ocorre dentro contexto intrafamiliar, isto é, em âmbito privado. Bem como o papel do Estado na garantia dos direitos das crianças de dos adolescentes. No entanto, pontua-se aspectos que podem ser levados em consideração em estudos com tal temática qual seja acreditar ser uma variável fundamental, a falta de articulação entre a família, o Estado e a sociedade, onde cada um responsabiliza o outro. Nesse universo o Estado responsabiliza a família pelos maus tratos, violência, negligência etc, a família culpabiliza o Estado que não fornece as condições básicas de sobrevivência. Quando na realidade todos são responsáveis o Estado com a responsabilidade de promover condições básicas de sobrevivência, a família proporcionando os cuidados necessários à sobrevivência de seus membros e a sociedade, fiscalizando e reivindicando melhores condições de vida e de cidadania. Entretanto, é de fundamental importância que se busque cada vez mais discutir e conscientizar as diferenças entre educar, disciplinar e de violência que coexistem por linhas bastante tênues. E que a maior parte das pessoas não se preocupam com a força até que esta se transforma em violência, ou seja, quando a força é usada além de limites prescritos e mal definidos. Portanto, se a força física é vista como eficiente na resolução de conflitos, mesmo que esta eficiência seja temporária, é provável que a força física seja usada para resolver o problema seguinte. Ressalte-se que na sociedade brasileira pode-se dizer que convivem paralelamente dois pensamentos sobre a violência contra crianças: o que acredita que só serão considerados violência os casos de castigos imoderados e/ou cruéis, isto é, os que deixam marcas no corpo das crianças; e, o que acredita que todas as medidas punitivas que atinjam o corpo da criança e/ou adolescente podem e devem ser consideradas violência, uma vez que provoca dor física. Este último engloba como violência, os castigos tidos como leves, como é o caso da palmada. Vale salientar que o segundo é fruto de discursos de instituições, como Organizações 294 Não Governamentais (Ongs) de direitos humanos, psicólogos e de pedagogos, que foram difundidos na sociedade. Compreende-se, por fim, que os comportamentos e os valores são aceitos socialmente e variam de acordo com cada cultura, no entanto, se entende-se que educar é transmitir valores, comportamentos, isto é, fornecer modelos, deve-se também deixar claro e expor cada vez mais a diferença entre educar e agredir fisicamente, educar e punir como forma de disciplinamento. REFERÊNCIAS ARIÈS, P. História da criança e da família. Rio de Janeiro: Zahar, 1978. AZEVEDO, Maria Amélia. Hitting mania: domestic corporal punishment of children and adolescents in Brasil. Viviane N. A. Guerra e Maria A. Azevedo (Org.) São Paulo, Iglu, 2001 BRASIL. Lei 8.069/90. Dispõe sobre o Estatuto da criança e do adolescente (ECA). São Paulo: IDEC, 2000. CALDEIRA, Teresa P. do R. Cidade de muros: Crime, segregação e cidadania em São Paulo. São Paulo: Editora 34/ Edusp, 2000. DEL PRIORE, Mary. História da criança no Brasil. São Paulo: Contexto, 1991. FALLUH, Santiago. O levantamento de informações sobre direitos violados de crianças e adolescentes no Sistema de Informações para Infância e Adolescência (SIPIA – módulo I): conteúdo e metodologia. Texto para discussão nº. 1012 – IPEA, Brasília, março de 2004. SOUZA, Adriana A. de. Os anjos podem ferir: um estudo sobre a violência intrafamiliar. Dissertação. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais, Natal, 2009, 107 f. 03 - TECENDO HISTÓRIAS SOBRE A VIOLÊNCIA: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA 295 Gleydson Rodrigues da Silva23 [email protected] O presente trabalho pretende apresentar um relato de experiência fruto do Projeto de Extensão ―Tecendo Histórias Para Entender a Violência‖, grupo de estudos integrante do Grupo de Pesquisa ―Cultura, Política e Educação‖ do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Esse projeto busca estreitar as relações Universidade-Sociedade. Investigando os campos de expressão da violência enquanto fenômeno social, analisando as suas dimensões psíquicas, sócioculturais e políticas. Seu objetivo principal é trabalhar com a violência destacando o modo como a sociedade coloca, relata e nomeia as práticas violentas em suas realidades sociais, apreendendo assim os vários significados construídos socialmente sobre o fenômeno. Este relato busca assinalar o projeto ―Tecendo Histórias Para Entender a Violência‖ como espaço educativo por excelência. Colocando o referido projeto como uma instituição que promove um processo educativo em torno da discussão sobre o conceito de violência simbólica, segundo Pierre Bourdieu. Pode-se dizer que violência simbólica é um ―poder invisível que só pode se exercer com a cumplicidade daqueles que não querem saber que a ele se submetem ou mesmo que o exercem‖ (CASTRO apud BOURDIEU, 1998). Esse tipo de manifestação da violência nem sempre é perceptível, ela serve, segundo Bourdieu, como uma maneira de legitimar e fortalecer as relações de dominação existentes em nossa sociedade e podem ou não ser demonstrada fisicamente. Para o autor, essas relações de dominação institucionalizam sua autoridade sem conflitos. Através da participação dos seminários de discussão teórica, das palestras em instituições de ensino e outros e demais eventos científico-acadêmicos promovidos pelo projeto em apreço, pude apurar meus saberes cognitivos em relação as mais diversas manifestações de violência, em especial ao conceito de violência simbólica, como coloca Bourdieu. Em sua obra, ―Pedagogia e Pedagogos, Para Quê?‖, o filósofo da educação José Carlos Libâneo diz que, ―o acontecer educativo corresponde a ação e ao resultado de um processo de formação dos sujeitos [...]‖ (p. 72). Nesse sentido afirmo que, o processo 23 Graduando do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e Bolsista de Iniciação Científica do Grupo de Pesquisa Cultura, Política e Educação do Departamento de Ciências Sociais da mesma universidade. 296 experienciado por mim, no ―Tecendo Histórias Para Entender a Violência‖, foi um processo educativo por excelência. Para Carlos Libâneo o processo educativo ―corresponde à ação educadora, às condições e modos pelos quais os sujeitos incorporam meios de se educar‖ (2005, p.84). O autor também coloca que, o processo educativo visa, sempre, alcançar propósitos explícitos e intencionais. Com a intenção de promover aprendizagem através das atividades própria dos sujeitos. Partindo, então, dessa discussão proposta por Libâneo o projeto ―Tecendo Histórias Para Entender a Violências‖ é um agente que promove o aprendizado em volta do conceito de violência simbólica, e, dessa forma, pode ser visto como uma instituição geradora da educação-processo. REFERÊNCIAS CASTRO, Magali de. Um estudo das relações de poder na escola pública de ensino fundamental à luz de Weber e Bourdieu: do poder formal, impessoal e simbólico ao poder explícito. Rev. Fac. Educ., São Paulo, v. 24, n. 1, Jan. 1998. FROTA, Teresa de Lisieux. Entre O Pavilhão e O Inferno: trajetórias de meninos infratores no CEDUC/Pitimbu. João Pessoa: Idéia, 2007. LIBÂNEO, José Carlos. Os significados da Educação, Modalidades de Prática Educativa e A Organização do Sistema Educacional. In: Pedagogia e pedagogos, para quê? 8ª Edição. São Paulo: Cortez, 2005. 04 - PEDAGOGIA DA PALMADA: O MESTRE ESCOLA WITTGENSTEIN IN TRATENBACH MÔNICA GICÉIA CARVALHO COSTA EDUCAÇÃO – FAL [email protected] (Resumo Expandido não disponibilizado pelo autor para publicação) GT 10 – Sociedade, Memória e Educação no Brasil - Auditório A – CCHLA 297 Prof. Dr. José Willington Germano (UFRN) Profa. Dra. Dalcy da Silva Cruz (UFRN) [email protected] Ementa: O Grupo de Trabalho Sociedade, memória e educação no Brasil vem se consolidando desde a primeira edição do CESO e tem como proposta básica reunir pesquisadores, estudiosos e estudantes da pós-graduação e da graduação, visando promover o debate de ideias, no sentido de, pensar e discutir, conjuntamente, as relações entre sociedade e educação existentes no contexto social e cultural brasileiro. A temática que engloba sociedade, memória e educação articula diferentes conhecimentos, saberes, pensamentos e práticas sociais em uma perspectiva transdisciplinar. Assim, considera-se, dentre outros, como temas importantes para esta discussão articulatória trabalhos e estudos que tratem de relações de trabalho; de educação e trabalho; pensamento social; memória social e institucional; memória e história da educação; memória de professores; políticas educacionais; pensamento militar e educação; práticas sociais contra-hegemônicas; história de movimentos sociais; e pensamento religioso e educação, bem como relatos de experiência em pesquisas científicas e de formação acadêmica. Espera-se, assim, contribuir para a ampliação e o aprofundamento da temática e ao mesmo tempo, oferecer um espaço de diálogo para questões relativas às Ciências Sociais e à Educação. Objetivo: Promover o debate de idéias entre pesquisadores em diferentes níveis de formação no sentido de, pensar e discutir, conjuntamente, as relações entre sociedade e educação existentes no contexto social e cultural brasileiro. GT 10 – Sociedade, Memória e Educação no Brasil TRABALHOS ACEITOS – RESUMOS SIMPLES 01 - HISTÓRIA VISUAL E USO DA CHARGE NO ENSINO DE HISTÓRIA Rayane Dionisio da Silva (UERN) e-mail: [email protected] Resumo: Este trabalho tem como objetivo problematizar a produção de imagens, em especial às charges, com intuito de promover uma reflexão sobre o ensino de história. Pretendemos revelar as possibilidades de análises referentes ao uso da imagem no trabalho do historiador e contribuir para um diálogo entre o estudo das imagens, o ensino e a pesquisa. Desta forma, a imagem é um manifesto da memória e são hipercomunicativas. Estudar a origem de uma imagem seja fotografia, pintura, cinema ou charge 298 é adentrar no imaginário contemporâneo de uma época e trazer consigo estereótipos vistos e ditos característicos de uma determinada sociedade. Para melhor compreensão do objeto, utilizaremos como referencial os pressupostos teóricometodológicos relacionados os seguintes autores: Bezerra de Menezes (2003), Burke (2004), Benjamim (1994) dentre outros que partilham das novas abordagens sobre os objetos da história, a pesquisa e as fontes. Palavras-chave: imagem, charge, ensino de história ..... 02 - TRAJETÓRIA DE FORMAÇÃO DA JUVENTUDE EM BUSCA DO ACESSO À UNIVERSIDADE PÚBLICA Geovânia da Silva Toscano - Departamento de Ciências Sociais e-mail: [email protected] Luzia Ferreira Pereira Eneas - Departamento de Educação/UERN Patricia Francilianne Marques Silva - Aluna de Ciências Sociais/UERN Resumo: A pesquisa é fruto de um projeto de extensão desenvolvido em Campo Grande-RN, projeto este que oferece um curso de Pré-vestibular para aqueles que em virtude de um ensino médio deficitário não conseguem ingressar na Universidade. Busca-se neste projeto investigar o universo daqueles que desejam ingressar no ensino superior de uma Universidade pública, investigando o perfil socioeconômico trilhando pela suas trajetórias de formação quando terminam o ensino médio público naquela cidade. Como procedimento metodológico para a investigação sobre a juventude no percurso de sua formação elegeu-se trabalhar com história de vida, com um público alvo de 25 jovens aliados a questionário aplicados durante a oberservação exploratória. Pretende-se aplicar os questionários com os alunos oriundos do ensino médio de escola pública concluintes de 2008 e 2009. Espera-se oferecer contribuições às discussões sobre demanda e acesso às Universidades públicas e sobre a relevância de ações universitárias para a melhoria da formação dos jovens no contexto contemporâneo na região do semi-árido potiguar. 03 - A PRÁTICA DO CUIDAR: UM MERGULHO NAS MEMÓRIAS DE MÃES DA CIDADE DE NATAL Adriana Aparecida de Souza(PPGCS/UFRN) e-mail: [email protected] José Willington Germano (Orientador) e-mail: [email protected] 299 Agência financiadora: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) Resumo: Este trabalho visa discutir a prática do cuidar de crianças na percepção das mães de bairros populares da cidade de Natal/Rio Grande do Norte. Pretende-se refletir sobre/e se, as mudanças na organização social e nas relações sociais, bem como nos papéis e percepções do indivíduo dentro da família trouxeram mudanças importantes para a memória individual e coletiva das entrevistadas. Tem como suporte empírico memórias de mães atendidas no Conselho Tutelar da cidade, buscando-se entender o que seria o cuidar na época em que essas mães eram crianças e se há relação dessa prática do cuidar com as ações praticadas com seus filhos. Procede-se do estudo inicial que ora subsidiam a pesquisa intitulada: Violência intrafamiliar e suas conseqüências para o desenvolvimento da aprendizagem das crianças. Palavras-chave: Palavras-chave: Memórias; Práticas de cuidar; Aprendizagem. 04- UMA PARTE MUSICAL E MÍTICA EM LÉVI-STRAUSS Betania Maria Franklin de Melo (UFRN) e-mail: [email protected] Resumo: Através do pensamento de Lévi-Strauss, diferentemente da Música, a arte da Pintura congela a paisagem que prende a um tempo, a música não, os sons são libertos. Embora descrito na partitura, uma música apresentada sempre passa por um processo de releitura que descaracteriza do real materializado. É sempre uma nova construção, uma nova interpretação, que abrange novas significações. Desta forma, se entende o Mito que é infinito, tem um campo enorme de variação se organiza e se transforma. A forma de fuga, como nas composições de John Sebastian Bach, discorre de uma melodia que foge o tempo inteiro entre as vozes, assim como um Mito foge no tempo. O reconhecimento do ritornello na estrutura da obra musical norteia a volta a um território, antes soado pelo instrumentista, e a repetição do mesmo trecho, ou seja, passar por todos os compassos tal como foi tocado pela primeira vez, é um diferencial significativo, que permite ter nova interpretação. O pulo, para a casa de 2ª vez, simbolicamente traduz igualdade, mas na pureza do território, é uma resignificação, seja para continuar ou desfechar a obra. O Mito opera como um ritornello tem meios, voltam, repetem, reexperenciam, são recriados, continuam e aparentam ter um fim. Palavras-chave: Música, Mito, Partitura 300 05 - REFLEXÕES ACERCA DA ESCOLARIZAÇÃO DOS PROFESSORES E DESEMPENHO ESCOLAR NA REGIÃO METROPOLITANA DE NATAL Mércia Maria de Santi Estácio – PPGCS/UFRN e-mail: [email protected] Simone Cabral Marinho– PPGCS/UFRN e-mail: [email protected] Resumo: Este artigo tem o propósito de discutir a escolarização dos professores que atuam no Ensino Fundamental e Ensino Médio na rede pública municipal, estadual e federal na Região Metropolitana de Natal. Trata-se de uma pesquisa quantitativa cujo ponto de partida foi os micro dados do Censo Escolar de 2003. Nosso objetivo foi investigar o processo de escolarização e formação dos professores, premissas indispensáveis na qualificação do ensino. Para isso, analisamos dados que retratam aspectos centrais para o problema em questão, como: o número de professores em exercício na sala de aula; a escolarização dos professores; a relação entre a escolarização dos professores e as taxas de aprovação, reprovação e abandono. Palavras-Chave: Formação. Região Metropolitana de Natal. Escolarização Professores 06 - A EXPERIÊNCIA DA FUNDAÇÃO CASA DO CAMINHO EM EDUCAÇÃO PARA A CONSTRUÇÃO DE UMA CIDADANIA PARTICIPATIVA Fábia Lúcia Alves de Lima Albuquerque (UERN) e-mail: [email protected] Resumo: Este artigo tem como objetivo Identificar e reconhecer como os vários saberes são singularidades do processo de escolarização. A educação deve se voltar para a formação do sujeito em sua complexidade, em sua dimensão multidimensional. Daí, contemplar os valores éticos e morais como atividade transversal, reflexiva e contextualizada com determinada realidade ser mais uma imposição curricular, trata-se de uma construção solidária, vinculada ao desejo de emancipação daquele grupo social como um todo. A proposta da Fundação Casa do Caminho é resgatar o contexto histórico e cultural, com vistas em pensar a educação informal enquanto sujeitos, espaços, prédios, ruas, lares e cenas do cotidiano da circunvizinhança dos bairros Barrocas II e Cajazeiras, na cidade de Mossoró/RN. Todo o projeto da FCC tem como objetivo maior, proporcionar os mecanismos necessários à construção de uma cidadania participativa, onde o homem, a mulher, o jovem a criança e o idoso possam desenvolver, nos diversos espaços, atividades sistematizadas, lúdicas, musicais, 301 esportivas e sociais, discussões sobre os problemas comuns àquela comunidade. Dentro dessa perspectiva, as ações da Fundação são experimentadas através de programas cuidadosamente planejados, obedecendo a orientação pedagógica regular e descrevendo uma rotina de dias e horários específicos para sua aplicação. Os atores sociais envolvidos nos programas, em sua totalidade, vivem em situação de risco e vulnerabilidade social. Por isso, a educação tem um papel fundamental no atual estágio de desenvolvimento do Brasil e do mundo. Ela é fator primordial na construção de cidadãos conscientes, capazes de construir seu próprio destino. Numa expectativa que alcance não só os saberes formais ou curriculares, a educação complementar aplicada na FCC reafirma os propósitos que vinculam o homem ao seu contexto social, ou seja, implementa ações que instigam os sujeitos a pensar sobre como ser artífice de sua própria promoção social. Palavras Chaves: Educação. Cidadania participativa. Valores éticos e morais. Saberes culturais 07 - O TEMPO E A MEMÓRIA SOCIAL NA AUTOPOESIA DE MARIA DE LOURDES XAVIER Joicy Suely Galvão da Costa (UFRN) e-mail: [email protected] Gleydson Rodrigues da Silva(UFRN) e-mail:[email protected] Resumo: Esta reflexão é fruto da pesquisa ―Memórias do Brasil: Itinerários e Singularidades da Formação Social, Educativa e Cultural de autores brasileiros‖, desenvolvida no Grupo de Pesquisa Cultura, Política e Educação, do Departamento de Ciências Sociais da UFRN. Neste trabalho, pretende-se avaliar o processo de construção do tempo e da memória social a partir de autobiografias compostas de poemas. Nesse sentido, encontramos nas poesias de Maria de Lourdes Xavier uma escrita de si e de experiências coletivas vivenciadas no passado: um registro do tempo e da alma. Na discussão, apresentaremos a idéia da poesia enquanto rito de recordação, além de produtora de um tempo específico, este precisamente memorialístico e carregado de semânticas sociais. Palavras-chave: tempo, memória social, autobiografia poética 08 - EROTISMO E CENSURA EM ODAIR JOSÉ Joicy Suely Galvão da Costa [email protected] Graduanda em Ciências Sociais (UFRN) Resumo: Este trabalho é resultado de apontamentos de meu projeto monográfico. Nele, pretendo discutir a relação entre a 302 palavra erótica e a censura em algumas canções do artista popular Odair José, amplamente perseguido pelos dispositivos legais de controle das produções culturais, instituídos pela ditadura militar de 1964 no Brasil, por suas composições possuírem um caráter conflitivo com os ideais de ordem moral e política impostos pela ideologia da caserna a todas as esferas da vida humana, inclusive sexual. Discutirei acerca do papel da chamada música ―cafona‖ como veículo híbrido de conformismo, estigmatização e crítica social. Palavras-chave: Erotismo, Ordem Moral, Odair José 09 - ENTRE SERRAS E CURVAS: AVENTURAS NAS ESCOLAS RURAIS DE DOUTOR SEVERIANO/RN Maria Euzimar Berenice Rego Silva (Professora do CAMEAM/UERN e doutoranda no PPGCS/UFRN) e-mail:[email protected] Vânia de Vasconcelos Gico (Orientadora) e-mail: [email protected] Leandro Trajano Santana (Colaborador) Aluno do Curso de Pedagogia/DE/CAMEAM/UERN Maria Elis Natália Alves Silva (Colaboradora) Aluna da Especialização em Educação de Jovens e Adultos/DE/CAMEAM/UERN Maria Alcione de Queiroz (Colaboradora) Aluna do Curso de Pedagogia/DE/CAMEAM/UERN Wandemberg Jácome de França (Colaborador) Aluno do Curso de Pedagogia/DE/CAMEAM/UERN Agência Financiadora: CAPES Resumo: Relato aqui as aventuras vividas durante o período de visita nas escolas das comunidades rurais do Município de Doutor Severiano, Alto-Oeste do Rio Grande do Norte. Viajando nas inclinadas ladeiras severianenses ao sabor do vento, do sol e de uma camada fina de poeira de seu solo, às vezes vermelho outras marrom, e guiada por um motoqueiro simples e grande conhecedor dessas estradas, fui conhecendo alguns desafios e prazeres vivenciados por educadores(as) em seu cotidiano escolar, bem como hábitos e práticas das comunidades em que estes(as) lecionavam. Dessa forma, fui conhecimento aspectos da singularidade de suas vidas pessoais e profissionais e dos trajetos de sua formação. A ferramenta principal utilizada, nestes momentos, foi o diálogo, introduzido seja através da leitura do poema Metade de Oswaldo Montenegro, durante nossa participação na Semana Pedagógica das escolas da rede municipal em maio de 2009, seja da leitura e escuta (quando as condições dos equipamentos das escolas permitiram) da música Passos do Saber de Marcinha, que alimentava a conversa entre educadores(as) e pesquisadora, tendo por base suas narrativas orais sobre formação, vivências rurais e cotidiano escolar. Foram visitados onze estabelecimentos de ensino rural, localizados nas seguintes 303 comunidades: Bom Sucesso, Frade, Chapada, Jardim, Merejo, Péde-Serra-dos-Correias, Guardado, Fazenda e Lagoa de Dentro. As salas de aula dessas escolas eram compostas de modo diverso, sendo que algumas atendiam apenas a Educação Infantil, outras o Ensino Fundamental e as demais a Educação de Jovens Adultos/as (EJA). Desses estabelecimentos, sete pertenciam ao Centro Municipal de Ensino Rural, que tinha nove turmas mutisseriadas, das quais seis adotavam a proposta da Escola Ativa. Também visitamos cinco estabelecimentos de ensino urbanos. Destes temos duas escolas estaduais, uma atuando no Ensino Médio e a outra no Ensino Fundamental (1º ao 9º ano) e na EJA. Os três estabelecimentos municipais urbanos compreendem uma escola de Educação Infantil, uma escola do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental e uma escola com turmas do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental e de EJA. A diversidade paisagística e institucional das escolas colava-se às singularidades das vivências de cada educador(a). Suas falas evocaram (JOSSO, 2004, 2006) as heranças familiares, as experiências profissionais e pessoais vividas no campo, que ajudaram a compor suas experiências formadoras e a elucidar os desafios enfrentados cotidianamente, seja nas aventuras vividas nas curvas e ladeiras de alguns percursos diários até as escolas rurais, seja no cotidiano familiar e escolar, que na luta por melhores condições salariais levam muitos(as) educadores(as) a constituírem um vínculo de 60 horas semanais na rede municipal de ensino, atuando em duas ou mais escolas, ou mesmo atuarem tanto na rede municipal como estadual, ou ainda lecionarem várias disciplinas numa mesma escola ou em escolas diferentes, inclusive atuando em mais de um nível ou modalidade de ensino, seja em Doutor Severiano ou em cidades circunvizinhas, tais como: Encanto e São Miguel. Outra peculiaridade desse município é a forte relação com o Estado do Ceará, em virtude de suas fronteiras geográficas, levando alguns(as) educadores(as) a buscar a formação superior (graduação e pós-graduação) em instituições desse estado. Palavras-chave: Educação do Campo. Formação dos(as) Educadores(as). Cotidiano escolar. Memória 10 - ÉTICA E CULTURA: RASTROS DE UMA LEITURA Lenina Lopes Soares Silva (PPGCS/UFRN) e-mail: [email protected] José Willington Germano [email protected] Resumo: A ética como fundamento e construto humano é formada no processo auto-organizativo de interação do homem bio/psico/social e cultural. Esta é a proposição básica destes rastros de leitura. Segundo Morin (2005) ela pode ser interpretada 304 em sentido complexo através de estratégias metodológicas operadas por argumentações que partem do contexto social, histórico e cultural – enquanto todo, no/do qual o homem é integrante – como uma das partes, da qual emergem as crises fragmentadoras do ser e, por conseguinte, da ética. Buscamos, neste relato de leitura, discutir os fundamentos estruturais do pensamento complexo quais sejam: o dialógico, o de recursão e o hologramático como instrumentos mentais com possibilidades de unir racionalmente o indivíduo, a espécie e a sociedade e, também, o cosmos e as culturas onde são construídos os pensamentos que fundam, a ética, reiterando a relevância e a pertinência da subjetividade na natureza que os totaliza e transcende e, ao mesmo tempo, os integra. No cotejamento do corpus interpretativo e auto-organizativo as reflexões são alinhadas ao pensamento de Edgar Morin, particularmente no que se refere às proposições suscitadas pela leitura do livro: ―O Método 6: ética.‖ Porto Alegre: Sulina, 2005. Esperamos, dessa forma, trazer ao debate a conexão entre os sujeitos e a sociedade na qual estão inseridos, como sujeitos de sua própria história de vida, com sua linguagem, culturas e normas, com/formadoras da ética como construto humano, base fundante da ―humanidade da humanidade‖. Palavras-chave: Ética; Cultura; Pensamento Complexo. 11PRÁTICAS AVALIATIVAS E SUBJETIVIDADES: REFLEXÕES SOBRE PODER NO ESPAÇO ESCOLAR PRODUÇÃO OS EFEITOS DE DE José Gllauco Smith Avelino de Lima [email protected] Resumo: Este trabalho situa-se na confluência entre as Ciências Sociais, a Filosofia e a Pedagogia, trazendo à discussão as relações entre práticas avaliativas escolares, disciplina, poder e produção de subjetividades. Elege como objetivo principal a análise sobre o modo como a sistemática avaliativa se constitui num canal de circulação de poder, gerando ações disciplinadoras e potencialmente produtoras de subjetividades no espaço escolar. As reflexões estão ancoradas em estudos bibliográficos, dos quais se destacam as contribuições de Michel Foucault (1979; 2009), Pierre Bourdieu (2005), Suely Rolnik (1997), Elisabeth Roudinesco (2008) e Franco Cambi (1999). Apresenta como considerações gerais o caráter disciplinador das práticas avaliativas escolares, em especial, da prova. Considera, também, o fato de tais práticas estarem presas a redes de poder e dominação que hierarquizam e esquadrinham os indivíduos que integram o campo social que é a escola, inserindo-os no interior de códigos lingüísticos voltados à 305 documentação dos movimentos individuais e coletivos no intuito de controlá-los através de práticas aprobatórias. Palavras-chave: Educação escolar; Práticas avaliativas; Poder; Disciplina; Subjetividade GT 10 – Sociedade, Memória e Educação no Brasil TRABALHOS ACEITOS - RESUMOS EXPANDIDOS 01 - HISTÓRIA VISUAL E USO DA CHARGE NO ENSINO DE HISTÓRIA Rayane Dionisio da Silva (UERN) e-mail: [email protected] Introdução: A pesquisa intitulada ―História Visual e o uso da charge no ensino de História‖, tem como objetivo inicial, ao menos, neste texto, mostrar a relevância do tema que se dá pela importância, de demonstrar o campo da cultura visual está se consolidando na historiografia; agregando análises que fundamentam o estudo das imagens, analisando aspectos formais da linguagem imagética e problematizando a construção social. Deste modo, o objetivo é promover uma reflexão sobre o uso da charge na construção do conhecimento histórico no ensino de história. Desta forma, a produção de charges, seja em jornais,revistas e livros didáticos que refletem o surgimento de estereótipos vistos e ditos como características de uma sociedade com seus problemas e choques de forças que se divergem em determinado tempo e espaço. As Charges no Ensino de História: As charges são discursos que permitem a pluralidade de leituras, geralmente satirizadas sobre um determinado acontecimento, seja, político, econômico e social, sempre de forma irônica e engraçada, contribuindo para aquisição dos saberes histórico. Vale ressaltar que durante muito tempo a imagem visual, teve problemas referentes à sua historiografia, pois as imagens eram vistas como mero meio ilustrativo, não tendo status de historicidade, Isto é, não era explorado explicitamente pelos historiadores como documento histórico. Em contrapartida, os estudos voltados á utilização da imagem, se deu amplamente na metade do séc.XIX, junto com a História da arte, Antropologia visual e a Sociologia. As imagens são hipercomunicativas pedem ser caracterizadas como uma marca testemunhal na qual possuem uma escrita, leitura e conseqüentemente uma linguagem. Segundo Agostinho (1994) a imagem é uma memória. Vale dizer que o historiador que aplica a imagem como documento tem quer saber indagá-las para 306 compreender, perceber e, principalmente, ouvi-las, as respostas. Assim, como qualquer documento escrito,seja oficial ou não, a imagem deve ser explorada rigorosamente,fazendo a crítica interna e externa. Ampliação do estudo das imagens, conforme aponta Burke (2004), contribuindo para a história das mentalidades. Neste caso, as charges em particular estão inseridas, num horizonte cultural, ou seja, elaborado a partir de uma história cultural, que lidar, com o tratamento do cotidiano, valores, crenças, costumes e discursos entre outras formas. Diante dessa perspectiva, traduzem sua forma de entender e codificar o mundo em que vivem Isto é, representá-lo. A partir da concepção de Chatier (2003), que denomina a propor o conceito de representação, que na acepção do autor permite ―ver uma coisa ausente‖, a relação entre representação como imagem de um objeto ausente, supõe conforme o autor ―a distinção radical entre aquilo que representa e aquilo que é representado, por outro lado, a representação como exibição de uma presença, como apresentação pública de algo ou alguém‖. Para Chatier o conceito de representação é ponto central da nova história cultural em que ele é advogado dos ANNALES. Em decorrência deste sentido, ao utilizar a charges revela-se a relação simbólica que traz consigo a representação que constitui um instrumento de conhecimento para a construção dos saberes históricos, por meio de um objeto ausente, através de uma substituição por uma imagem, capaz de representar tal como ela é propiciando também a ―imaginação social‖ referente aos sujeitos históricos envolvidos nem determinada charge. Procuramos evidenciar a reflexão acerca do conhecimento histórico, presente nas charges. Tal conhecimento não se restringir apenas o conhecimento acadêmico, mas sim, os diversos focos de circulação social. Desta maneira, as charges trabalham com a mudança de ideias, atitudes, políticas, e sociais. Sabe-se que hoje são poucos historiadores que utilizam a imagem como documento histórico. Entretanto, quando a utilizam não sabem explorar seu uso corretamente e nem levantar problematizações em torno da imagem como fonte histórica em relação ao passado. Sendo assim, como qualquer texto escrito que possui evidência histórica, a imagem é tida como documento, tem uma lógica, normas, um processo, portanto, uma objetividade. Neste sentido tem certa relatividade dependendo da visão do historiador e demonstrar que a história não é neutra que há diferente ponto de vistas de uma situação, dependendo da sociedade e os grupos sociais pertencente ao lugar que ocupa em uma dada época. O efeito deste propósito é chamar atenção para os historiadores 307 utilizarem as fontes visuais, para que possam dimensionar a pesquisa histórica, dentro da academia e no espaço escolar. Não pretendemos aqui demonstrar, somente a consideração das fontes visuais, atribuídas ao século XIX, como muitos historiadores abordam, mas sim aplicar na História recente, ou seja, do tempo presente. Segundo Burke (2004:14) chama atenção, para os historiadores que pretende atingir o uso das imagens no seu campo de trabalho, com relação à forma de lidar com estas fontes que ao mesmo tempo é objetivo e subjetivo. As imagens não são feitas apenas para serem vistas, mas para serem lidas e deste modo, que os historiadores culturais se apropriam do uso das imagens para diversas necessidades e estratégias metodológicas. A preocupação, no entanto, não é centrada apenas numa prática pedagógica relacionada ás imagens (apesar de facilitar na construção do conhecimento histórico escolar), mas para definir atitudes, representações sociais, crenças, ideias e valores socialmente reconhecidos por um grupo ou classe social, embutida nas charges que se expressam por meio de uma linguagem verbal e não verbal. Considerações Finais: Como vimos, estamos diante de um tema bastante ―vivo‖ e complexo que continua sendo importante seja para compreender as várias facetas da produção cultural, neste campo aberto para pesquisa e reflexões; seja para propor novas abordagens no campo do Ensino de história que constitui um dos objetos de pesquisa do profissional de história e mostrar que também se aprende historia com os ―olhos‖. REFERÊNCIAS BURKE, Peter. Testemunha ocular: história e imagem. Tradução Vera Maria Xavier dos Santos. Revisão técnica Daniel Aarão Reis Filho. SP: Edusc, 2004. _______. A Escrita da História: novas perspectivas. Tradução de Magda Lopes. São Paulo: Editora UNESP, 1992. _______. O que é história cultural? Tradução Sérgio Goes de Paula. Rio de Janeiro: Jorge Zoihar Ed. 2005. _______. A Escola dos ANNALES (1929-1989): a revolução francesa da historiografia a terceira geração. São Paulo: Ed. UNESCO, 1997. MENEZES, U. T. B. de. Fontes visuais, cultura visual, história visual. Balanço Provisório, Proposta cautelares. RBH. v. 23, n. 45, 2003. CHATIER, Roger. A história cultural entre práticas e representações: Tradução de Maria Manuela Galhardo. Rio de Janeiro: Ed. Difel, 1990. 308 02 - TRAJETÓRIA DE FORMAÇÃO DA JUVENTUDE EM BUSCA DO ACESSO À UNIVERSIDADE PÚBLICA Geovânia da Silva Toscano - Departamento de Ciências Sociais e-mail: [email protected] Luzia Ferreira Pereira Eneas - Departamento de Educação/UERN Patricia Francilianne Marques Silva - Aluna de Ciências Sociais/UERN (Resumo expandido não enviado pelas autoras para publicação) 03 - A PRÁTICA DO CUIDAR UM MERGULHO NAS MEMÓRIAS DE MÃES DA CIDADE DE NATAL Autora: Adriana Aparecida de Souza Orientador: José Willington Germano Agência financiadora: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) Introdução: Este estudo trata de uma análise das práticas de cuidar de um grupo de mães da cidade de Natal atendidas pelo Conselho Tutelar, visando apreender como são construídas as relações no cotidiano das mães. Tendo como objetivo entender como são construídas as práticas de cuidar, busca-se entender o que seria o cuidar na época em que essas mães eram crianças e se há relação dessa prática do cuidar com as ações praticadas com seus filhos. Percebe-se que a memória se modifica e se rearticula conforme posição que ocupamos e as relações que estabelecemos nos diferentes grupos de que participamos. Como também que a memória está submetida a questões inconscientes, como o afeto, a censura, entre outros. As memórias individuais alimentam-se da memória coletiva e histórica e incluem elementos mais amplos do que a memória construída pelo indivíduo e seu grupo. Como afirma Ecléa Bosi (2003) a linguagem é o instrumento socializador da memória, pois reduz, unifica e aproxima no mesmo espaço histórico e cultural vivências tão diversas como o sonho, as lembranças e as experiências recentes. Compreende-se que os relatos das mães que aqui discute-se são representações vivas não apenas de suas vivências cotidianas, mas de suas lembranças que tomam corpo e vida em seus relatos. Na história da Sociedade Ocidental nota-se que a relação de mãe e filho nem sempre foi tão próxima; em alguns momentos históricos não existiam laços afetivos entre mãe e filhos. Essa relação foi 309 sendo modificada de acordo com as necessidades dadas pela sociedade. A partir do século XX, a mãe passou não só a ter o papel de zelar pela saúde física de seu filho, mas também a ser responsável pela educação deles. Essa educação ocorre na prática do cuidado e é representada pelo discurso das entrevistadas como sendo a mulher/mãe a responsável pela criança, verbalizada nas palavras de uma das mães entrevistadas: ―para ser mãe você tem que ser uma mãe muito ativa, responsável‖. Isto implica outras responsabilidades, ou seja, o cuidar da saúde, da higiene, da educação, da alimentação, proteção e carinho. Esse interesse pelos filhos e a questão do cuidar, e amamentar das mães, em sua própria casa, transformando-os em objetos de toda a sua atenção, passou a ser uma relação tão ―natural‖ que as mulheres absorveram como se isso nascesse com elas, não percebendo que é algo construído social e culturalmente. Percebe-se que na representação do que é ser mãe nos discursos das entrevistadas, a questão do amor materno, essa mudança de pensamento é traduzida pela fala de uma mãe quando diz: ―foram criados aqui todos limpinhos, não deixava andar rasgado, aquele cuidado grande‖. Esta verbalização indica que o cuidar está ligado à higiene, mas provavelmente implica carinho e proteção, pois também em outros momentos, a mesma relatou que ―não consegue dormir enquanto os filhos não estão todos dentro de casa.‖ Entretanto, a maternidade é uma experiência complexa, que pode gerar sentimentos contraditórios, assim como o comportamento materno que não é de forma alguma universal, para se falar aqui em instinto materno. Como bem nos diz Badinter (1985, p.16), ―a amamentação no seio e os gritos do recém-nascido estão longe de provocar, em todas as mães, as mesmas atitudes.‖ O amor materno não está inscrito na natureza feminina. Ele é apenas um sentimento humano, que é construído socialmente e cultivado culturalmente na relação entre mãe e filho, como tal, é incerto, frágil, imperfeito, multifacetado, podendo ou não existir nesta relação. As mulheres que não conseguem realizar o papel de mãe concretamente passaram a ser vistas pela sociedade como imperfeitas, trazendo também para as mulheres, de forma subjetiva, que elas apenas se completam como mulheres se elas conseguirem realizar o papel de mãe com perfeição. Nota-se também que a sociedade critica a mãe que não realiza seu dever de cuidar, como destacada na fala da irmã de uma das mães, uma das entrevistadas: ―têm meninos ai que não tem nem o que comer, moram em barracos, mas a mãe cuida, ela não perde a guarda, porque o negócio é cuidar‖. As que se distanciam do modelo ―ideal‖ 310 de mãe podem ser acusadas de egoísmo, maldade e até de desequilíbrio. A percepção do papel da mulher perante a sociedade também foi notada por Fonseca (2000) em uma pesquisa realizada numa comunidade pobre da Cidade de Porto Alegre, na qual a imagem da mulher girava quase exclusivamente em torno de suas tarefas domésticas, nas quais ela deveria ser uma mãe devotada e uma dona-de-casa eficiente. Em alguns depoimentos das mães entrevistadas em Natal, o cuidar refere-se ao atendimento das necessidades vitais dos filhos como uma obrigação, algo que ―tem que ser cumprido‖. Esta afirmação sugere que existe uma percepção de uma exigência social em relação aos deveres dos pais que pode, ou não, estar associada ao prazer de cuidar. Pode-se perceber nas representações de maternidade das entrevistadas essa dedicação no relato das entrevistadas em torno das lembranças de suas infâncias. Minha mãe era quem tomava conta da gente naquela época não tinha creche, ela que tinha que tomar conta mesmo. Ela acordava de madrugada para fazer as coisas lavar roupa, varrer casa, colocar comida no fogo. [...] A gente estudava, meu pai trabalhava de vigia. Tudo era mãe quem fazia, batia, brigava, reclamava, e se brincar ainda hoje ela faz. Minha mãe não ficava na mão do filho como eu não. A gente a respeitava. Discussão: De acordo com esta entrevistada, as representações dos papéis dos seus pais eram bem definidos; a mãe dedicava-se ao cuidado do lar e dos filhos, enquanto o pai tinha o papel de prover o sustento da casa. Esta idéia é sugestiva para o entendimento de uma reprodução de valores associados aos papéis do masculino e do feminino; o primeiro pelo prover, e o segundo pelo cuidar, na percepção desta mãe. É ainda notada no discurso das mães entrevistadas, as quais remetem que o pai não ajuda no sustento do filho, e de que lhe caberia essa função, inclusive alegando que o papel delas de cuidar é cumprido. E que esse ideal da figura feminina é a de boa dona-de-casa; essa representação foi percebida na fala de uma outra mãe: ―eu acho que a mulher perfeita ela é honesta, vive dentro de casa, não vive fazendo coisas erradas, uma mulher que vive só para os filhos‖. Esta fala diz bem o que se tem como ideal de mãe, aquela que é cheia de devoção e amor aos filhos, sem erros, perfeita, quase sobrenatural, uma cuidadora dos filhos, segundo as representações das entrevistadas. Nas entrevistas, visualizamos que a idéia que se tem de mãe é aquela que cuida, alimenta, leva à escola, ao médico. Como pode ser percebido na fala de uma mãe: ―a mãe tem que cuidar, o negócio é cuidar, a mãe tem que tomar zelo, cuidar dar banho, 311 comida, colocar na escola, e isso eu faço‖. As palavras de uma outra mãe sugerem que o cuidar exprime o suprimento de necessidades básicas. Isto não exclui, no entanto, o fato de que é possível encontrar nas classes sociais mais favorecidas relações entre pais e filhos que reduzem a idéia de cuidado maternal ao suprimento das necessidades e demandas materiais. Dessa forma, o que fica claro é que, perante a sociedade e para as próprias mães as crianças estão sob sua responsabilidade e cabelhes se dedicarem ao máximo para cumprir este papel imposto pela sociedade e, de certa forma, legitimado por elas. E que esse ideal de mãe ainda esta presente não apenas nas lembranças das entrevistas mais em seu cotidiano. Tem-se a certeza que este pequeno artigo não dá conta de uma problemática complexa como a que envolve a relação de cuidar de mães para com filhos principalmente, quando isto envolve questões emocionais. Um dos aspectos que podem ser levados em consideração em estudos com tal temática qual seja acreditar ser uma variável fundamental, são as atribuições que se colocar sob a responsabilidade das mães, o bem-estar dos filhos é sempre responsabilidade da mãe. Nesse universo o Estado e a sociedade responsabiliza a mãe seja por maus tratos, violência, negligência etc. Sendo assim, a família é vista como a detentora do papel principal, que é a função de propiciar o cuidado, no sentido de proteção e afetividade, disciplina e socialização; por outro lado, é por meio da violência e do abuso que ela pode se tornar um instrumento de maus-tratos, machucando, punindo e controlando a criança, podendo ameaçar a integridade física e psicológica da mesma. Considerações Finais: Evidencia-se que a representação da educação baseia-se em suprir as necessidades vitais, como alimentação, vestimenta e proteção. Nessa visão, educar significa cuidar da criança, como também as dificuldades enfrentadas com a criação dos filhos. A educação também passa por questões, como o preparo para o futuro, repetição ou negação da própria educação e tradição, provisão de afeto e garantia da sobrevivência da criança pelo atendimento das suas necessidades vitais. REFERÊNCIAS ARIÈS, P. História da criança e da família. Rio de Janeiro: Zahar, 1978. BADINTER, Elisabeth. Um amor conquistado: O mito do amor materno. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1985. BOSI, E. O Tempo Vivo da Memória. São Paulo: Ateliê, 2003. 312 DEL PRIORE, Mary. História da criança no Brasil. São Paulo: Contexto, 1991. DEL PRIORE, Mary. A família no Brasil Colonial. São Paulo: Moderna, 1999. FALCKE, Denise; WAGNER, Adriana. Mães e madrastas: mitos sociais e autoconceito. Estudos de Psicologia. Natal, v. 5, n. 2, jul./dez. 2000. FONSECA, Claúdia. Caminhos da adoção. São Paulo: Cortez, 2006. FONSECA, Claúdia. Da circulação de crianças à adoção internacional: questões de pertencimento e posse. Cadernos Pagu, nº. 26 Campinas Jan./June 2006. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php. Acessado em Janeiro de 2007. SARTI, Cynthia Andersen. A família como espelho: um estudo sobre a moral dos pobres. São Paulo, Cortez, 2003. SOUZA, Adriana A. de. Os anjos podem ferir: um estudo sobre a violência intrafamiliar. Dissertação. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes 04 - UMA PARTE MUSICAL E MÍTICA EM LÉVI-STRAUSS Doutoranda: Betania Maria Franklin de Mélo Orientador: Prof. Dr. Alex Galeno Universidade Federal do Rio Grande do Norte e-mail: [email protected] Introdução: Por um período de 20 anos, a obra das Mitológicas se tornou real para o mundo, apresentada em quatro livros, LéviStrauss registrou fatos de sua experiência onde autor e observados se emaranhavam entre o Brasil Central e a América do Norte. Em entrevista com Diddier Eribon, no livro De Perto e de Longe, LéviStrauss assegura que na tetralogia, as Mitológicas há consonância entre música e mito, (2005, p.248) assim, desenvolveremos um estudo bibliográfico mapeando os mitos e adequando a estrutura de uma partitura musical. Reflexões sobre uma parte musical e mítica em LéviStrauss: A partitura musical, ou um trecho de um tema está na mente do compositor, antes de escrevê-la nos pentagramas. Ao sistematizar as idéias melódicas, o surgimento da harmonia, se antemiza no ser do músico que compõe. Um texto de uma partitura musical consta de pauta, claves, notas, compassos, fraseados e tantos outros símbolos musicais que permitem serem interpretados e soados. Na música tonal, a tonalidade escolhida pelo compositor com propósitos característicos dada à função, é distinguida logo no inicio da pauta, no lugar conhecido como armadura. O intérprete 313 visualiza a quantidade de sustenidos ou bemóis, ou mesmo se estiver isenta destes símbolos, e entende qual caminho da escala da tonalidade descrita, sendo esta a tonalidade principal. Assim, é o Mito. Podemos conciliar a tonalidade principal com o mito de referência, como escreve Lévi-Strauss. Nas Mitológicas I, O Cru e o Cozido, os Bororos do Brasil Central é o Mito referencial. Apesar de seguir à América do Norte, depois de estudar os índios do Brasil, ou como chama da América Tropical, o fio condutor ou o mito de referência é considerado aos Bororos. Este mito, Bororos, pode devido à riqueza e fecundidade se transformar no interior dele mesmo ou em suas relações. Seguindo a leitura, os mitos particulares de um certo eixo possuem traços de uma população ou pertencentes a populações vizinhas. Na seqüencia da descrição dos mitos os Bororos são citados muito presentes até ao nº 122 dos 187 apresentados nas Mitológicas I. Ao pensar na estrutura de uma partitura, quando escrita no sistema tonal, como no período barroco e clássico da história da música Ocidental, a tonalidade, que compreende o nome da tônica da escala maior ou menor, seguia um longo trecho. Em seguida, um novo trecho era escrito em uma tonalidade do V grau, chamada da Dominante, esta tinha afinidade com a principal, fugindo da tonalidade referencial primeira. Outra forma seria também passar para a tonalidade relativa, que é a tonalidade relativa da inicial. A estrutura como na forma sonata, passava de uma sessão para outra após o ritornello, e seguindo então outra tonalidade. Uma nova informação era dada, ou com os sustenidos ou bemóis para que norteasse o intérprete para a modulação, ou seja, novo território, ou da passagem para outra escala. Na abertura das Mitológicas I, Do cru ao Cozido, quando LéviStrauss refere a um Mito de uma sociedade, depois de outros da mesma sociedade, em seguida, mitos de sociedades vizinhas, situando no mesmo contexto etnográfico e assim, depois a sociedades afastadas, porém com ligações reais historicamente e geograficamente justificadas entre elas, remete a teorização musical que a partir do tom principal, os tons vizinhos, diretos e indiretos, os tons afastados, relativos, com características de afinidade compreendem uma estrutura no universo musical, para uma tonalidade inicial, comparativamente aos Mitos. Os esquemas condutores míticos podem simplificar, enriquecer, e transformar agarrando por um duplo movimento que Lèvi-Strauss escreve de prospectivo ou retrospectivo, seqüencias extraídas de mitos provenientes de populações remotas ou de mitos descartáveis por parecerem inúteis. Além, disso os mitos sofrem margem de variação, devido a contagem dos narradores que é enorme. Quando o esquema mítico passa por transformação esta, 314 afeta todos os seus aspectos. E, algo de ordem transparece sobre o caos. Enquanto Mitólogo dedica a desmontar os Mitos e não em acreditar na análise mítica, não mostra como os homens pensam nos Mitos, mas como os mitos se pensam nos homens, e a sua revelia. (LÉVI-STRAUSS, 2004, p. 31) Os Mitos pensam entre si. Entre o plano do pensamento do sensível em oposição ao plano do inteligível, o exercício do pensamento lógico e a percepção estética, há uma via intermediária, que é a música. A arte está no meio entre o conhecimento científico e o pensamento mágico. As causas profundas entre a Música e o Mito fizeram com que nas Mitológicas as formas musicais como: Sonata, Sinfonia, Cantata, Tocata, Invenções, Prelúdio, Fuga fossem detalhadas na divisão dos capítulos, estas construções consideradas pelo autor como ‗análogas‘ aos Mitos, têm suas diferenciações seja nas estruturas ou nos períodos da história, ou nos compositores. Uma sonata clássica difere de uma sonata barroca de Domênico Scarlatti, a forma de fuga, como nas composições de John Sebastian Bach, discorre de uma melodia que foge o tempo inteiro entre as vozes, assim como um Mito foge no tempo, e como outras semelhanças. Vejamos as palavras de Lévi-Strauss: ―Antes de surgirem na música, a forma ―fuga‖ ou a forma ―sonata‖ já existiam nos mitos‖. (Lévi-Strauss, 2005, p.249) Para Werneck os mitos é som, que dar-se em partituras, mito é cor, é pássaros, é corpo celeste, fragmentos e ruínas como olhar de um caleidoscópio. Através do pensamento de Lévi-Strauss, diferentemente da Música, a arte da Pintura congela a paisagem que prende a um tempo, a música não, os sons são libertos. Embora descrito na partitura, uma música apresentada sempre passa por um processo de releitura que descaracteriza do real materializado. É sempre uma nova construção, uma nova interpretação, que abrange novas significações porque a música envolve a emoção. O duplo contínuo na qual apresenta Lévi-Straus, o primeiro, sendo a matéria constituída de acontecimentos históricos de onde cada sociedade extrai para elaborar seus mitos. O segundo, sons irrealizáveis tem seu lugar no tempo psicofisiológico do ouvinte. Este duo levistraussiano faz aplicação a história de um mito. Como o regente de uma orquestra e a orquestra, emissor e receptor, os mitos não tem autor. O que é Mito nas palavras de Lévi-Strauss, em entrevista: Poderíamos, também, procurar definir o mito em oposição a outras formas de tradição oral: lenda, conto... mas, essas essas distinções nunca são claras. Talvez essas formas não desempenhem exatamente o mesmo papel nas culturas, mas são produzidas pelo mesmo espírito, e 315 o analista não pode deixar de explorá-las em conjunto. [...]. É característica do mito, diante de um problema, pensá-lo como homólogo a outros problemas que surgem em outros planos: cosmológico, físico, moral, jurídico, social etc e analisar tudo em conjunto. Na primeira parte das Mitológicas I, o Canto Bororo, o Mito 1, é apresentado pela Ária do Desaninhador de Pássaros. Se pensarmos na música, a Ária de acordo com Allorto, é: A composição vocal cuja característica saliente é a expressão melódica, subordinada o acompanhamento rítmico e harmônico. As Árias e os duetos, os núcleos de concentração das emoções e das paixões eram e são os trechos escutados pelo público com maior atenção, sendo nas árias que os compositores e cantores, cada qual na própria esfera de competência, tem ensejo de fazer alarde de pericia, profissionalismo e maturidade expressiva.‖ (ALLORTO, 1989. p. 22 e 23). Em seguida, vem o Recitativo. E, Bennet explica, como: ―A linha melódica vocal ondulava de acordo com o significado do texto, e acompanhava de perto o ritmo da pronúncia natural das palavras, Foi esse estilo meio cantado, meio recitado que ficou conhecido como recitativo‖. (BENNET, 1986, p.36). Antes da narrativa do M 2, Bororo, surge a Primeira Variação, e Allorto indica que: Variação é um processo e uma forma. Como forma, a mais comum é a do tema e Variações. Um simples, tema, as mais vezes tomado de uma obra preexistente oferece ao músico o ensejo de compor agradáveis e habilidosas variações. É o caso, para dar um exemplo, da melodia do Dueto <<nel cor piu non mi sento>>, da Ópera La molinarade Paisello, sobre o qual Beethoven escreveu seis espirituosas variações para piano‖(ALLORTO, 1989, p. 141). A variação é decorrente de um tema antes apresentado. Para tanto, a variação pode ser variação 1, variação 2 e assim pó diante, ou 1ª variação 2ª. Há sempre um tempo intercalando o pensamento do tema e de sua transcrição. Este meio pode ser comparado, ao espaço entre os sinais de repetição da escrita da partitura, como é o ritornello. O reconhecimento do ritornello na estrutura da obra musical norteia a volta a um território, antes soado pelo instrumentista, e a repetição do mesmo trecho, ou seja, passar por todos os compassos tal como foi tocado pela primeira vez, é um diferencial significativo, que permite ter nova interpretação. O pulo, para a casa de 2ª vez, simbolicamente traduz igualdade, mas na pureza do território, é uma resignificação, seja para continuar ou desfechar a obra. O Mito 316 opera como um ritornello tem meios, voltam, repetem, reexperenciam, são recriados, continuam e aparentam ter um fim. Considerações Finais: Ousada analogia, a música não existe sem o tempo da marcação, chamado de pulsação, movimento em que o pulso humano faz de baixo para cima e volta a marcar sua batida subseqüente, nesta cantarola rítmica, onde tempo faz música e música faz tempo, a alteridade descrita por Montaigne, mostra como esta interdependência criada nas relações sociais, a noção do outro. Esta pode se chamar de ‗outridade‘ ou naquilo que é de completo estranhamento, quando não é do comum, apanhamos como inteligível à música e o tempo. Criando assim o termo, Mitúsica, a territorialização do tempo na descrição da música na qual envolve estes elementos interdependentes. Os mitos operam em grupos, tais como as notas soam em acordes, ou seguidas formando um fraseado musical, uma idéia musical que reverbera no ser do ouvinte, mesmo que tenha ou não, uma letra. REFERÊNCIAS LÉVI-STRAUSS & Didier Eribon. De perto e de longe. Título original: De près et de Loin.Tradução: Léa Mello e Julieta Leite. São Paulo: Cosac & Naify, 2005. LÉVI-STRAUSS, Claude. O Crú e o Cozido. Mitológicas I. Título original: Le cru ET Le cuit (Mitologiques I). Tradução: Beatriz Perrone Moisés. São Paulo: Cosac & Naify, 2004. MONIZ, Luis Cláudio. Mito e música em Wagner e Nietzsche. São Paulo: Madras, 2007. PASSETTI, Dotothea Voegeli. Lévi-Strauss, Antropologia e Arteminúsculo incomensurável. 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Programa de Pósgraduação em Ciências Sociais, Natal, 2009, 107 f. 05-REFLEXÕES ACERCA DA ESCOLARIZAÇÃO DOS PROFESSORES E DESEMPENHO ESCOLAR NA REGIÃO METROPOLITANA DE NATAL/RN/BRASIL Mércia Maria de Santi Estácio – PPGCS/UFRN e-mail: [email protected] Simone Cabral Marinho– PPGCS/UFRN e-mail: [email protected] 317 Introdução: Considerada um fator estratégico passível de elevação da qualidade do ensino, a formação de professores tem sido, equivocadamente, vista com o objetivo de estabelecer um perfil desejável de profissional em um quadro de atribuições práticas genericamente delineadas, desconsiderando os limites demarcados pelos próprios interesses e valores que orientam os docentes e que são inerentes à cultura das escolas. Outrossim, se caracteriza o ―perfil profissional‖, por meio de uma listagem de competências cognitivas e docentes que deveriam ser desenvolvidas pelos cursos formadores (AZANHA, 2004). Esses intensos debates reafirmam a necessidade de uma política de formação de professores, que esteja pautada numa sólida formação teórica, no contato com a realidade escolar, em novas linguagens de interpretação e comunicação do mundo vivido e no trabalho coletivo interdisciplinar, dentre outras. Mas é o desempenho escolar um dos principais desafios posto ao profissional da educação, vez que este tem sido motivo e justificativa de cursos de formação, que se vêem com o desafio de suprir, através de conteúdos e práticas educativas, déficits de desempenho de aprendizagem. Os baixos índices de desempenho escolar revelados pelo índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) têm revelado, na verdade, grandes índices de exclusão educacional, o que exige políticas de avaliação constante sobre o desempenho escolar, premissa condicional para a qualidade do ensino, numa realidade como a brasileira, cuja cultura de avaliação é recente. Embora a avaliação seja comumente relacionada à idéia de mensuração, fortalecendo a ênfase no aspecto quantitativo, a partir de padrões de medida, a avaliação também abrange os aspectos qualitativos que envolvem comportamentos, atitudes e posturas subjetivos. Para isso, o olhar e a preocupação do pesquisador não se reduzem aos números e as fórmulas (BRANDÃO, 2003), embora, estas sejam fundamentais para desenhar, categorizar, compreender e analisar o objeto de estudo. É nesse viés que se enquadra o nosso trabalho: como os dados estatísticos poderão fornecer elementos visíveis e compressíveis da realidade social investigada, no nosso caso, que possam relacionar o quadro de formação de professores com os dados de desempenho escolar. Neste sentido, pretende-se apresentar um quadro escolarização e formação inicial dos professores da rede municipal, estadual e federal de ensino nos níveis do ensino fundamental e médio da Região Metropolitana de Natal, combinado com o índice de desempenho escolar, a partir da avaliação das taxas de abandono, aprovação e reprovação, tomando como referência os micro dados do Censo Escolar de 2003. 318 Escolarização dos professores e desempenho escolar na Região Metropolitana de Natal/Rn/Brasil: Como dissemos acima, teremos como universo de investigação a Região Metropolitana de Natal (RMN), que, tem pouco mais de um milhão de habitantes e 2,5 mil km². Criada formalmente em 1997 abrange nove municípios: Natal, Parnamirim, São Gonçalo do Amarante, Ceará Mirim, Extremoz e Macaíba, Monte Alegre, Nísia Floresta e São José de Mipibú. Segundo Clementino e Pessoa (2008), é considerada uma metrópole em formação, tendo em vista que a ‗consciência metropolitana‘ ainda é tímida, apesar de já ser institucionalizada há mais de uma década. As informações utilizadas neste artigo são provenientes do Censo Escolar, realizado no Brasil, em 2003. Trata-se de um levantamento de estatísticas educacionais de abrangência nacional, realizado anualmente pelo Ministério da Educação, através do Instituto de Estudos e Pesquisas em Educação (INEP). Esse Censo dispõe de informações sobre as instituições escolares nos diversos níveis e modalidades de ensino, número de matrículas, de alunos, infra-estrutura, pessoal técnico e administrativo, características dos docentes, entre outros. Abrangendo toda a educação básica em seus níveis (educação infantil, ensino fundamental, ensino médio) e modalidades de ensino (ensino regular, educação especial e educação de jovens e adultos), os seus resultados permitem obter dados por região, unidades da federação, municípios e localização da escola. A análise sobre a qualificação dos professores e desempenho escolar é baseada em 632 escolas públicas (federal, estadual e municipal) ativas dos municípios da Região Metropolitana de Natal. A análise é feita em dois movimentos. O primeiro faz referência à formação e qualificação dos professores no nível fundamental e médio, já o segundo, incorpora a esta análise indicadores de desempenho escolar. As variáveis consideradas para a análise estão relacionadas com a formação e escolarização dos professores, a elas se somam indicadores do desempenho escolar (taxas de aprovação, reprovação e abandono) nesses níveis de ensino. A descrição dos indicadores apresentados no texto teve, evidentemente, um caráter introdutório, embora, possam servir como ponto de partida para futuras e mais aprofundadas reflexões, particularmente, às que se referem aos estudos qualitativos quando se tratar de formação docente e desempenho escolar. Reflexões Finais: Mas uma das conclusões possíveis a respeito dos dados coletados é a de que a formação dos professores deve estar articulada a sua atuação profissional, tomando a escola como referência. No ensino médio houve concentração de professores com formação em nível superior - licenciatura plena -, 319 diferentemente, do ensino fundamental. Porém, foi no ensino fundamental, que a taxa de aprovação é maior nos casos em que não há professores com esse tipo de formação, revelando fragilidades no processo formativo docente, bem como, outros condicionantes que afetam o desempenho escolar, não mencionados, por limitações empíricas deste trabalho. Neste viés, somos levados a crer que o professor com formação superior geraria um aumento da taxa de aprovação. Porém, não cabe creditar à sua formação tal desempenho, mas e principalmente à relação de comprometimento que tais profissionais estabelecem com a docência, neste ponto reside o diferencial que promove a aprendizagem e consequentemente o aumento das taxas de aprovação. Também não podemos esquecer que são igualmente preocupantes as taxas de abandono e reprovação, que se revelam em proporções quase equivalentes tanto no ensino fundamental quanto no médio. Se é questionável a aprovação automática, a repetência também é. Em casos de índices de reprovação e abandono a elevação progressiva nos níveis de desempenho escolar do aluno é tarefa desafiadora para os profissionais da educação. Pensamos ser necessário um aprofundamento do trabalho, ampliando seus horizontes, bem como, identificando novas possibilidades tanto para o avanço dos professores no que tange a sua formação, como para os alunos e sua aprovação, reprovação ou abandono. Apesar de estarmos nos referindo a quantidades, é impossível esquecer que cada um dessas quantidades representa um cidadão que é portador de uma história de vida com perspectivas e expectativas futuras, que podem ser ampliadas e modificadas. REFERÊNCIAS AZANHA, José Mário Pires. Uma reflexão sobre a formação do professor da escola básica. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.30, n.2, p. 369-378, maio/ago, 2004. BRANDÃO, Carlos Rodrigues. A pergunta a várias mãos: a experiências da pesquisa no trabalho do educador. São Paulo Pulo: Cortez, 2003. (Série Saber com o Outro; v. 1.). BRASIL. MINSTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Micro dados do Censo Escolar de 2003. Brasília-DF: MEC/Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2006. RIOS NETO, Eduardo Luiz G.; RIANI, Juliana de Lucena R. (Orgs.). Introdução à demografia da educação. Campinas-SP: ABEP, 2004. CLEMENTINO, Maria do Livramento Miranda; PESSOA, Zoraide Souza. Segmentação numa metrópole em formação. 320 Disponível em: www.cchla.ufrn.br/rmnatal/observatoriodasmetropoles. Acesso em: 15/12/2008. 06 - A EXPERIÊNCIA DA FUNDAÇÃO CASA DO CAMINHO EM EDUCAÇÃO PARA A CONSTRUÇÃO DE UMA CIDADANIA PARTICIPATIVA Fábia Lúcia Alves de Lima Albuquerque (UERN) e-mail: [email protected] Introdução: Este artigo tem como objetivo identificar e reconhecer como os vários saberes são singularidades do processo de escolarização. A educação deve se voltar para a formação do sujeito em sua complexidade, em sua dimensão multidimensional. Daí, contemplar os valores éticos e morais como atividade transversal, reflexiva e contextualizada com determinada realidade ser mais que uma imposição curricular, trata-se de uma construção solidária, vinculada ao desejo de emancipação daquele grupo social como um todo. A Fundação Casa do Caminho (FCC) insere-se na classificação de entidade beneficente; portanto é uma instituição que atua no terceiro setor do Estado. Formalmente desenvolve suas atividades desde o ano de 2005, em sua sede situada à Rua Marechal Deodoro, 2000, Cajazeiras, Mossoró, Rio Grande do Norte. A Experiência da Fundação Casa do Caminho em Educação: Os programas desenvolvidos FCC são voltados para a assistência e promoção social dos seus participantes, famílias que têm como domicilio os bairros Barrocas II e Cajazeiras. O objetivo da FCC é a promoção da educação, em valores morais e humanos, de crianças, adolescentes, jovens e adultos, em ação integrada à família, proporcionando-lhes condições de desenvolvimento e promoção humana, através da aquisição de novos referenciais de vida e de relação com o mundo. A sistemática é trabalhar concomitantemente a família toda, ou seja, em sete (07) programas distintos a FCC atende desde a criança até o idoso. Com um planejamento que respeita as precárias condições sociais de cada sujeito, isto, partindo da vulnerabilidade social e do risco em que se encontra à espreita, a instituição tem como objetivo desenvolver seus programas de maneira que a criança possa encontrar, em casa, um ambiente favorável à assimilação de novos referenciais diante das adversidades. Um programa maior – Educando - abarca outros sete projetos, a saber: Projeto Educar, que desenvolve atividades de educação complementar à escola formal em três dias da semana; Projeto Motivados para Vencer, que desenvolve atividades com 321 adolescentes voltados ao preparo para o mercado de trabalho, inserção em cursinhos preparatórios para o vestibular; Programa Seja bem Vindo, que acompanha as gestantes das famílias inscritas, oferecendo palestras sobre DTS, cuidados com a gravidez, nutrição e confecciona junto com a gestante um kit enxoval para a mãe e o bebe; Programa Renascer, destinado a idosos, desenvolve atividades artesanais e manuais; Programa Cultural, que trabalha a musicalidade instrumental, a dança e a expressão corporal; e o Programa Mudança de Hábitos, direcionado às mães com a aplicação de tarefas de sociabilização, dinâmicas de grupo em que são trabalhados temas que se relacionam com o quotidiano da comunidade. Todos os programas têm como fundo a Educação em valores morais. Pelo exposto, nosso olhar se detém nas atividades desenvolvidas por esta instituição, principalmente o Programa Mudança de Hábitos. O objetivo desta pesquisa foi identificar se os valores morais incutidos no planejamento das ações incidem sobre o modo com que as mulheres percebem sua cidadania, sobre vários aspectos. O perfil sócioeducativo dos participantes da Fundação Casa do Caminho aponta para a necessidade de uma ação educacional mais próxima para a realidade em que vivem. O que deve propiciar à criança, ao jovem, ao idoso e às famílias de um modo geral, horizontes novos de realização pessoal e social, através de sua valorização como elemento transformador desta realidade. Também foi importante para esta pesquisa conhecer como, efetivamente, acontecem as ações da Fundação Casa do Caminho, que estatui como objetivo um ambiente diferenciado, em que poderá ser discutida e apreendida uma educação para a cidadania, através de instrução informal de valores morais e humanos, dentro de um clima que traz como princípio norteador as próprias atitudes dos sujeitos envolvidos. Pesquisar sobre o pensar democrático e cidadão a partir de uma formação em Direitos Humanos, tendo como referência uma experiência prática, justifica uma reflexão acerca do papel da FCC neste processo, como forma de aprimorar o trabalho já desenvolvido, com interesse na aplicação, utilização e conseqüências práticas do conhecimento adquirido a partir desta análise. A pesquisa de campo teve como atores vinte mulheres – correspondente a um percentual de vinte por cento do grupo -, que participam do programa Mudança de Hábitos da fundação. Os dados coletados foram obtidos através de entrevista escrita, no modelo de questionário fechado, com a finalidade de identificar se as pessoas entrevistadas reconhecem os serviços públicos básicos e como eles funcionam em sua comunidade e, ainda, se a FCC favorece sua participação enquanto cidadão. 322 A natureza da pesquisa segundo o nível de apresentação dos dados é descritiva, interpretativa, analítica, pois tem como objetivo principal a descrição das características do fenômeno proposto ao estudo. A fonte é a própria entrevistada em seu meio ambiente próprio. E a coleta de dados feita nas condições naturais em que os fenômenos ocorrem, desde os levantamentos, que são mais descritivos, até estudos mais analíticos. A proposta da FCC é resgatar o contexto histórico e cultural, com vistas em pensar a educação informal enquanto sujeitos, espaços, prédios, ruas, lares e cenas do cotidiano da circunvizinhança dos bairros Barrocas II e Cajazeiras, na cidade de Mossoró/RN. Todo o projeto da FCC tem como objetivo maior, proporcionar os mecanismos necessários à construção de uma cidadania participativa, onde o homem, a mulher, o jovem a criança e o idoso possam desenvolver, nos diversos espaços, atividades sistematizadas, lúdicas, musicais, esportivas e sociais, discussões sobre os problemas comuns àquela comunidade. Dentro dessa perspectiva, as ações da Fundação são experimentadas através de programas cuidadosamente planejados, obedecendo à orientação pedagógica regular e descrevendo uma rotina de dias e horários específicos para sua aplicação. Os atores sociais envolvidos nos programas, em sua totalidade, vivem em situação de risco e vulnerabilidade social. Moral, ética e política são temas recorrentes na vida comunitária. São as ações morais que emprenham as idéias e o sentido da comunidade. Quanto mais desenvolvidos os conceitos referentes a estes três assuntos, mais solidariedade dar-se-á em seu meio. Por isso, a educação tem um papel fundamental no atual estágio de desenvolvimento do Brasil e do mundo. Ela é fator primordial na construção de cidadãos conscientes, capazes de construir seu próprio destino. Numa expectativa que alcance não só os saberes formais ou curriculares, a educação complementar aplicada na FCC reafirma os propósitos que vinculam o homem ao seu contexto social, ou seja, implementa ações que instigam os sujeitos a pensar sobre como ser artífice de sua própria promoção social. Entre os indicadores fundamentais de desenvolvimento de uma sociedade, a educação, sem sobra de dúvidas, é um forte referencial; somam-se ao contexto desta, a expectativa de vida e o poder de compra. O despertar de consciências é um processo educacional. Considerações Finais: A tradição repassa valores morais de geração para geração; os provérbios, os adágios, a música, o teatro, as brincadeiras lúdicas e as atividades esportivas, estão para a sociedade como instrumento popular de saberes, regras, costumes e conceitos. Esta gama de possibilidades formais e nãoformais de educação pode e deve ser agente potencializador em 323 defesa dos direitos do homem, favorecendo a rede de sistemas que tem por objetivo a efetivação dos direitos humanos e fundamentais. REFERÊNCIAS ALVEZ, R. Conversas sobre Educação.7 ed. São Paulo: Verus, 2007. ARANTES, V. A. (Org.). Educação e valores. São Paulo: Summus editorial, 2007. (Coleção pontos e contrapontos). BITTAR, E. C. B. Ética, Educação, Cidadania e Direitos Humanos: Estudos filosóficos entre cosmopolitismo e responsabilidade social. São Paulo: Manole, 2004. BRASIL. Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos. Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos: 2007. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007. 76 p. CABRAL, E. H. de S. Terceiro Setor: Gestão e Controle Social. São Paulo: Saraiva, 2008. FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 46 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005. ______. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. (Col. Leitura). ______. Pedagogia da Esperança: Um reencontro com a Pedagogia do Oprimido. ed. 15. São Paulo: Paz e Terra, 1992. ______. Educação como prática da Liberdade. 31 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2008. ______. Educação e Mudança. 31 ed. Tradução de Moacir Gadotti e Lillian Lopes Martin. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979. (Col. Educação e Comunicação, v. I). ______. Ação cultural para a liberdade e outros escritos. 12 ed. São Paulo: Paz e Terra, 2007. (Col. o Mundo Hoje, v. 10). ______. Extensão ou comunicação? 13 ed. Tradução de Rosisca Darcy de Oliveira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977. (Col. o Mundo Hoje, v. 24). ______. Importância do ato de ler: Em três artigos que se completam. ed. 49. São Paulo: Cortez, 2008b. (Col. Questões do nosso tempo, v. 13.). ______.; SHOR, I. Medo e Ousadia: O cotidiano do professor. ed. 12. Tradução de Adriana Lopez. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986. (Col. Educação e Comunicação, v. 18). HABERMAS, J. A Inclusão do Outro: Estudos de Teoria Política. ed. 3. Tradução de George Sperber; Paulo Astor Soethe; Milton Camargo. São Paulo: Loylola, 2007. JOVCHELOVITCH, S. Os contextos do saber: Representações, comunidade e cultura. Tradução de Pedrinho Guareschi. Petrópolis/RN: Vozes, 2008. (Col. Psicologia social). 324 MONTAÑO, C. Terceiro Setor e questão social: Crítica ao padrão emergente de intervenção social. 4 ed. São Paulo: Cortez, 2007. MORIN, E. Saberes Globais e Saberes Locais: O olhar transdisciplinar. Organização e Tradução de Paula Yone Stroh. Rio de Janeiro: Editora Garamond Ltda., 2008a. (Col. Idéias Sustentáveis). ______. Cabeça bem feita: repensar a reforma e reformar o pensamento. ed.15. Tradução de Eloá Jacobina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2008. RESENDE. T. de A. Roteiro do Terceiro Setor: Associações e fundações. O que são, como instituir, administrar e prestar contas. 3 ed. rev. Atual e ampli. Belo Horizonte: Prax Editora, 2006. 07 - O TEMPO E A MEMÓRIA SOCIAL NA AUTOPOESIA DE MARIA DE LOURDES XAVIER Joicy Suely Galvão da Costa Graduanda em Ciências Sociais (UFRN) [email protected] Gleydson Rodrigues da Silva Graduando em Ciências Sociais (UFRN) [email protected] Introdução: O estudo de memória é um campo relativamente recente nas Ciências Sociais. Seus primeiros estudos foram feitos através do trabalho de Halbwachs. Halbwachs, deu um novo olhar para os estudos de memória. O autor desenvolveu o conceito de memória coletiva e o aplicou em seus estudos, afirmando que o passado é (re) lembrado nos mais diversos grupos sociais. Argumentou em seus escritos que o gérmen das recordações pessoais deve levar em consideração a influência que sobre estas exercem as instituições sociais. É exatamente através de um olhar sociológico a respeito das recordações que podemos ressignificar a atividade de escrita de si. Por meio de um memorial podemos identificar posturas, políticas e visões de mundo de uma época. Nos escritos encontram-se reproduzidos padrões sociais e até mesmo protestos a um tipo de cultura, modo como a sociedade se organiza. Nesse contexto, a escrita de si envolve não só uma interpretação da própria vida como também a de outros. A memória é, assim, um exercício para além do individuo. É um exercício individual construído incessantemente a partir do coletivo. É nessa perspectiva sociológica da memória que nosso trabalho surge. Tendo suas reflexões iniciais realizadas no âmbito da pesquisa ―Memórias do Brasil: Itinerários e Singularidades da Formação Social, Educativa e Cultural de Autores Brasileiros‖, e desenvolvida no Grupo de Pesquisa Cultura, Política e Educação, do 325 Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Aqui, pretendemos avaliar o processo de construção do tempo e da memória social a partir de autobiografias compostas de poemas. Nesse sentido, encontramos nas poesias de Maria de Lourdes Xavier uma escrita de si e de experiências coletivas vivenciadas no passado: um registro do tempo e da alma. Tempo e memória social na autopoesia de Maria de Lourdes Xavier: A poetisa Maria de Lourdes Xavier nasceu em 18 de março de 1928, na capital do Rio Grande do Norte, numa família pobre e humilde. Apesar das dificuldades, seus pais, José Xavier de Almeida e Neusa de Araújo Xavier, sempre investiram na educação e no futuro dela e de seus irmãos. Maria de Lourdes levou uma infância simples e feliz e desde criança teve facilidade em escrever. Estudou no colégio Imaculada Conceição até completar o curso primário. Lá, ganhou a oportunidade de ser aluna de Edgar Barbosa e Severino Bezerra. Estudou também no colégio Atheneu, onde conheceu muitas pessoas que mais tarde fariam parte da elite intelectual e profissional da sociedade natalense. Durante a juventude, conquistou alguns admiradores e fantasias amorosas. Nada muito concreto, pois sempre foi muito recatada. Ainda nessa época, o seu grupo de convivência era recheado de pessoas importantes como Portinari, Januário Cicco e Luís da Câmara Cascudo, com quem teve uma grande amizade. Cursou Farmácia na Universidade de Recife com a intenção de ajudar seu pai na educação de seus irmãos mais novos. Após ter terminado o curso, foi premiada por ter sido a melhor aluna e convidada para lecionar na mesma Universidade, onde ela se tornou a segunda professora mulher. Foi nessa temporada, em Recife, que ela conheceu Hélio Dantas (que na época era Deputado Estadual) com quem veio a se casar. Seu casamento foi bastante conturbado e durou vinte anos. Deste casamento nasceram duas filhas: Evelyn e Nara. Maria de Lourdes lecionou também no curso de Farmácia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. E exerceu várias funções administrativas, como vice-diretora da mesma faculdade, Presidente do Conselho Estadual da Mulher do Rio Grande do Norte, Diretora do Departamento de Serviço Social do Estado do Rio Grande do Norte, Coordenadora do curso de Farmácia, Presidente do Conselho de Farmácia, entre outros. Podemos dizer que os escritos de memória de Maria de Lourdes Xavier possuem poesias que retratam e/ou reinterpretam cenários coletivos de uma Natal do passado, com todo o seu perfil político e sociocultural. 326 Nesse sentido, afirmamos que a linguagem poética tem uma forte carga de recordação. Recordamos a todo instante e isso, como já disse Halbwachs, nos enlaça nos grupos sociais dos quais fazemos parte. Podendo fazer, através da recordação, um resgate e uma reconstrução de um tempo pretérito. Através da poesia podemos reconstruir uma época e descobrir como se davam as ralações sociais no passado. Descobrir a história, os anseios e as preocupações de uma época. Considerações Finais: Os relatos de Maria de Lourdes Xavier, e mais especificamente, suas poesias estão repletas de significados de memória. Revelam não só a própria interpretação de fatos ocorridos no passado como também abrem caminho para que possamos entender a época em que viveu, e como se davam as relações sociais de seu tempo. Servindo, assim, para a sua perpetuação para além de sua trajetória de vida e contexto sociocultural. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Maria da Conceição de. & FARIAS, Carlos Aldemir. (Org.) Narrativas de tempo, escrituras da alma. Natal: Flecha do Tempo, 2008. CATROGA, Fernando. Memória, História e Historiografia. Coimbra: Quarteto Editora, 2001. PERALTA, Elsa. Abordagens teóricas ao estudo da memória social: uma resenha critica. Arquivos da Memória: Antropologia, Escala e Memória. n. 2. Centro de Estudos de Etnologia Portuguesa, 2007. SANTOS, Boaventura de Sousa. Uma Cartografia Simbólica das representações sociais: o caso do direito. In: A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. 2005. 08 – 08 - EROTISMO E CENSURA EM ODAIR JOSÉ Joicy Suely Galvão da Costa [email protected] Graduanda em Ciências Sociais (UFRN) (Resumo expandido não enviado pela autora para publicação) 09 - ENTRE SERRAS E CURVAS: AVENTURAS NAS ESCOLAS RURAIS DE DOUTOR SEVERIANO/RN Maria Euzimar Berenice Rego Silva 327 Prof. do Dept. Educação/CAMEAM/UERN e discente do Doutorado do PPGCS/UFRN [email protected] Orientadora: Vânia de Vasconcelos Gico - Profª do PPGCS/UFRN Colaboradores(as): Leandro Trajano Santana - Aluno do Curso de Pedagogia/DE/CAMEAM/UERN Maria Alcione de Queiroz - Aluna do Curso de Pedagogia/DE/CAMEAM/UERN Maria Elis Natália Alves Silva - Aluna da Especialização em Educação de Jovens e Adultos/DE/CAMEAM/UERN Wandemberg Jácome de França - Aluno do Curso de Pedagogia/DE/CAMEAM/UERN Agência Financiadora: CAPES Introdução: Relato aqui algumas das aventuras vividas durante o período de visita nas escolas do Município de Doutor Severiano, Alto-Oeste do Rio Grande do Norte. Embora tenha visitado também cinco estabelecimentos de ensino urbanos, destaco aqui momentos vivenciados nas escolas das comunidades rurais. Também visitamos cinco estabelecimentos de ensino urbanos. Destes temos duas escolas estaduais, uma atuando no Ensino Médio e a outra no Ensino Fundamental (1º ao 9º ano) e na Educação de Jovens Adultos/as (EJA). Os três estabelecimentos municipais urbanos compreendem uma escola de Educação Infantil, uma escola do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental e uma escola com turmas do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental e de EJA. Aventuras nas Escolas Rurais de Doutor Severiano/RN: Percorrendo as inclinadas ladeiras severianenses ao sabor do vento, do sol e de uma camada fina de poeira de seu solo, às vezes vermelho outras marrom, e guiada por um motoqueiro simples e grande conhecedor dessas estradas, fui conhecendo alguns desafios e prazeres vivenciados por educadores(as) em seu cotidiano escolar, bem como hábitos e práticas das comunidades em que estes(as) lecionavam. Dessa forma, fui percebendo aspectos da singularidade de suas vidas pessoais e profissionais e dos trajetos de sua formação. Nesse percurso foram visitados onze estabelecimentos de ensino rural, localizados nas seguintes comunidades: Bom Sucesso, Frade, Chapada, Jardim, Merejo, Pé-de-Serra-dos-Correias, Guardado, Fazenda e Lagoa de Dentro. As salas de aula dessas escolas eram compostas de modo diverso, sendo que algumas atendiam apenas a Educação Infantil, outras o Ensino Fundamental e as demais a EJA. Desses estabelecimentos, sete pertenciam ao Centro Municipal de Ensino Rural, que tinha nove turmas mutisseriadas, das quais seis adotavam a proposta da Escola Ativa. O contato com a comunidade educacional severianense foi intensificado a partir de abril deste ano. Este processo deu-se através de quatro momentos distintos: realização de um encontro 328 com equipes gestoras e pedagógicas de suas escolas e da Secretaria Municipal de Educação; a participação em atividades desenvolvidas pelas unidades de ensino, especialmente nos momentos de planejamento, como a Semana Pedagógica das escolas da rede municipal em maio de 2009; realização dos Diálogos Autobiográficos: trilhas da formação dos/as educadores/as do sertão, atividade de formação cujo centro são as narrativas sobre experiências formadoras dos(as) educadores(as) inscritos neles; e a realização de visitas às escolas das redes municipal e estadual desse município. A ferramenta principal utilizada, nestes momentos, foi o diálogo. Introduzida seja através da leitura do poema ―Metade‖ de Oswaldo Montenegro, durante nossa participação na Semana Pedagógica das escolas da rede municipal em maio de 2009 e realização de visitas nas duas escolas urbanas da rede estadual de ensino, seja da leitura e escuta da música Passos do Saber de Marcinha, que alimentava a conversa entre educadores(as) e pesquisadora, tendo por base suas narrativas orais sobre formação, vivências rurais e cotidiano escolar, durante as visitas nas demais escolas. Neste último momento, procurava observar, fotografar e filmar aspectos internos e externos em cada escola, tais como: atividades de discentes, cartazes, murais, organização dos espaços escolares, as proximidades da escola, móveis e equipamentos existentes e as vivências das salas de aula. Percorria as salas de aula e dialogava com os(as) discentes sobre suas comunidades, relação com o campo e a escola. Contudo, nem sempre foi possível passar em todas as salas de aula nos três turnos. Geralmente encerrava a visita dialogando com os(as) educadores(as) no final dos turnos matutino e vespertino. Conforme a quantidade de turnos em funcionamento na escola visitada. Reflexões Finais: Vários momentos foram marcantes, provavelmente farão parte de minhas memórias de longa duração ou autobiográficas (BRANDÃO, 2008), e outros restará como possibilidade o esquecimento, o não-dito, o interdito (BRANDÃO, 2008), que juntos comporão as minhas experiências formadoras (JOSSO, 2004; PINEAU, 2001, 2006a, 2006b) nesse doutoramento em Ciências Sociais. Lembro-me, especialmente, da mistura de curiosidade, expectativa ansiosa, inibição e carinhosa receptividade das comunidades escolares rurais e ainda guardo o canto de uma turma de crianças quando entrei na sala de aula, munida de filmadora e máquina fotográfica: ―Como vai visitante como vai...‖. Incentivados pela leitura/escuta de Passos do saber, cada educador(a) presente escolhia uma parte da música que mais tinha lhe tocado e falava de suas relações de pertencimento ao campo e o cotidiano das escolas rurais. Um dos trechos mais destacado foi: 329 ―Quantos saberes vem do viver/Quanta alegria nos traz o saber/Educar/Saber amar/A sociedade poder transformar‖. A diversidade paisagística e institucional das escolas colava-se às singularidades das vivências de cada educador(a). Suas falas evocaram (JOSSO, 2004) as heranças familiares, as experiências profissionais e pessoais vividas no campo, que ajudaram a compor suas experiências formadoras e a elucidar os desafios enfrentados cotidianamente, seja nas aventuras vividas nas curvas e ladeiras de alguns percursos diários até as escolas rurais, seja no cotidiano familiar e escolar, que na luta por melhores condições salariais levam muitos(as) educadores(as) a constituírem um vínculo de 60 horas semanais na rede municipal de ensino, atuando em duas ou mais escolas, ou mesmo atuarem tanto na rede municipal como estadual, ou ainda lecionarem várias disciplinas numa mesma escola ou em escolas diferentes, inclusive atuando em mais de um nível ou modalidade de ensino, seja em Doutor Severiano ou em cidades circunvizinhas, tais como: Encanto e São Miguel. Outra peculiaridade desse município é a forte relação com o Estado do Ceará, em virtude de suas fronteiras geográficas, levando alguns(as) educadores(as) a buscar a formação superior (graduação e pós-graduação) em instituições desse estado. REFERÊNCIAS BRANDÃO, Vera Maria Antonieta Tordino. Labirintos da memória: Quem sou? São Paulo: Paulus, 2008. (Questões fundamentais da nossa época, 7). JOSSO, Marie-Christine. Experiência de vida e formação. São Paulo: Cortez, 2004. MONTENEGRO, Oswaldo. Metade. In: Oswaldo Montenegro 25 anos: ao vivo. Rio de Janeiro: Warner, 2004. 2 CD. Faixa 7 Cd 1. Disponível em: <http://vagalume.uol.com.br/oswaldomontenegro/metade.html>. Acesso em: 05 out.2009. PINEAU, Gaston. Experiências de aprendizagem e histórias de vida. In: CARRÉ, Philippe; CASPAR, Pierre (Dir.). Tratado das ciências e das técnicas da formação. Lisboa: Instituto Piaget, 2001. p.327 - 348. ______. As histórias de vida como artes formadoras da existência. In: SOUZA, Elizeu Clementino de; ABRAHÃO, Maria Helena Menna Barreto (Orgs.). Tempos, narrativas e ficções: a invenção de si. Porto Alegre, RS: EDIPUCRS; Salvador, BA: EDUNEB, 2006a. p.41 - 59. ______. As histórias de vida em formação: gênese de uma corrente de pesquisa-ação-formação existencial. Educação e Pesquisa: revista da Faculdade de Educação da USP, São Paulo, v. 32, n. 2, p. 329 - 343, maio/ago. 2006b. 330 10 - ÉTICA E CULTURA: RASTROS DE UMA LEITURA Lenina Lopes Soares Silva (PPGCS/UFRN) e-mail: [email protected] José Willington Germano (Orientador) e-mail: [email protected] Introdução: A ética como fundamento e construto humano é formada no processo auto-organizativo de interação do homem bio/psico/social e cultural. Esta é a proposição básica destes rastros de leitura. Segundo Morin (2005) ela pode ser interpretada em sentido complexo através de estratégias metodológicas operadas por argumentações que partem do contexto social, histórico e cultural – enquanto todo, no/do qual o homem é integrante – como uma das partes, da qual emergem as crises fragmentadoras do ser e, por conseguinte, da ética. Trata-se de um relato de leitura orientada, o qual denominamos de rastros de leitura que foram moldados na artesania dos diálogos percorridos na disciplina ―TEORIAS CONTEMPORÂNEAS DA CULTURA,‖ ministrada pela professora doutora Maria da Conceição Xavier de Almeida, no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Objetivo: Buscamos discutir os fundamentos estruturais do pensamento complexo quais sejam: o dialógico, o de recursão e o hologramático como instrumentos mentais com possibilidades de unir racionalmente o indivíduo, a espécie e a sociedade e, também, o cosmos e as culturas de onde emergem os pensamentos que fundam a ética, reiterando a relevância e a pertinência da subjetividade na natureza que os totaliza e transcende e, ao mesmo tempo, os integra. Estratégias Metodológicas: No cotejamento do corpus interpretativo e auto-organizativo as reflexões são alinhadas ao pensamento de Edgar Morin, particularmente no que se refere às proposições suscitadas pela leitura do livro: ―O Método 6: ética.‖ Porto Alegre: Sulina, 2005, quais sejam os três princípios básicos do pensamento complexo: o dialógico, o de recursão e o hologramático para pensar a ética como construto humano na/da cultura. Ética e Cultura em uma leitura pelos caminhos do Pensamento Complexo: Observamos que o princípio dialógico pode ser inserido no cerne de qualquer questão sobre ética, no instante em que o antagonismo aparente seja superado pelo pensar organizador e criativo que une o indissociável numa mesma realidade. 331 De igual modo o princípio de recursão proporciona a compreensão e a interpretação dos indivíduos – atores sociais, sujeitos, produtores e receptores de causas e efeitos por eles produzidos através de suas ações com os outros (ecologia da ação). Há, dessa forma, uma conexão entre estes dois princípios e a sociedade na qual vivem os homens, como sujeitos de sua própria história de vida, com sua linguagem, culturas e normas. Interpretação esta que já engloba o princípio hologramático, de acordo com Morin, pois tais instrumentos do pensamento possibilitam religar, compreender e sentir (ter compaixão). Esperamos, dessa forma, trazer ao debate a conexão entre os sujeitos e seus saberes e a sociedade na qual estão inseridos, como condutores de vida, com sua linguagem, culturas e normas, com/formadoras da ética como construto humano, base fundante da ―humanidade da humanidade‖. Para construir uma trajetória baseada nestes princípios, em sua escrita, que não negasse o ponto de partida da ―humanidade da humanidade‖ Morin vai deixando brechas para a fruição de um novo caminho para os diálogos sobre ética e cultura. Tal caminho é encontrado pela via dos operadores da complexidade (já citados), instrumentais do pensamento, nos quais ele vai de forma dialógica discutindo a ética. Usa-os como pontes capazes de possibilitar travessias entre a dispersão social dos indivíduos, do próprio indivíduo dele mesmo, da espécie, da sociedade e da cultura, entre os saberes e as ações humanas, então, consegue religar o que é fundamental para a humanização dos humanos, enquanto fomentadores e construtores da ética que está em crise nas sociedades atuais; sem descurar da cultura. De todos os tópicos tratados no livro, sem prescindir dos demais, o que nos deu mais segurança, para compreendermos a temática foram às proposições levantas pelo autor na terceira parte: Autoética (p. 103-107) na qual em síntese o autor oferece um quadro sinótico conclusivo das questões colocadas, especialmente no III capítulo: Ética da religação. Neste capítulo são discutidos (o que ouso chamar de guias) – os sentimentos humanos imprescindíveis para a formação da ética. Não da ética normótica, dos manuais, mas a ética que tem como imperativo a religação com o outro, à comunidade, à sociedade, à humanidade. (p.104). Entretanto, se o livro terminasse nesta parte, não saberíamos como proceder a uma ecologia da ação com significado ético e edificante, proposta nas partes subseqüentes a esta. Se o autor não tivesse continuado a sua escritura não teria brindado os leitores com a proposição de uma ética como condução de vida o que ele resume como cuidar do outro – no amor – cuidando de si mesmo – como ser eco/ético, posicionando-se diante do mundo, respeitando a cultura, sabendo lidar com ela dialogicamente. Ficaria, portanto, faltando no livro o 332 sujeito/autor que opera observando-se de forma recursiva no holograma científico, tecnológico, histórico e humano, para poder atuar de forma recursiva social e culturalmente sem se perder de si mesmo, de sua espécie e de sua cultura. Reflexões Finais: Esperamos, dessa forma, ter trazido ao debate a conexão entre os sujeitos, a sociedade e a cultura, compreendendo os humanos como sujeitos produtores e construtores sociais de ética, base fundante da humanidade existente em todo e qualquer humano. Por fim, sugerimos para a reflexão: ―a ética nunca está pronta: não é um bem de que se possa ser proprietário; deve incessantemente regenerar-se e o faz no circuito religação, compressão, compaixão‖ (MORIN, 2005, p.197), no seio de uma ―cultura psíquica‖, portanto, uma cultura humana... ―Morin ainda nos diz: como toda ―medicina é amor‖ para não tropeçar mortalmente pelo caminho, desfazendo seus rastros singulares, ―ame para viver, viva para amar. Ame o frágil e o perecível, pois o mais precioso, o melhor, inclusive a consciência, a beleza, a alma, são frágeis e perecíveis‖ (MORIN, 2005, p. 202), tente auxiliar a natureza a humanizar a humanidade latente no homem – em você. REFERÊNCIAS MORIN, Edgar: O Método 6: ética. Porto Alegre: Sulina, 2005. 11-PRÁTICAS AVALIATIVAS SUBJETIVIDADES: REFLEXÕES PODER NO ESPAÇO ESCOLAR E PRODUÇÃO SOBRE OS EFEITOS DE DE José Gllauco Smith Avelino de Lima O trabalho em pauta pretende refletir sobre as práticas avaliativas na escola e suas implicações disciplinares, buscando discutir as relações entre os ―discursos de verdade‖, no sentido foucaultiano, produzidos e reproduzidos em torno da avaliação da aprendizagem, os efeitos de poder desencadeados a partir de tais discursos e a formação de subjetividades no espaço escolar. Dito de outro modo, trata-se de suscitar o debate sobre o modo como o poder circula nas malhas do tecido avaliativo escolar ―fabricando‖ e modelando indivíduos através de práticas disciplinadoras embutidas em atividades de cunho aprobatório. É importante ressaltar, nesse sentido, que a análise ora delineada não pretende uniformizar nem caricaturizar as práticas de avaliação, entendendo-as como algo negativo por excelência. Busca-se apenas tornar saliente o aspecto disciplinar admitido pela 333 avaliação da aprendizagem quando realizada no interior de relações verticalizadas entre professores e alunos e como tais práticas estão diretamente ligadas à formação da subjetividade dos estudantes. As reflexões aqui expostas partiram de estudos bibliográficos, dos quais se destacam as análises de Michel Foucault (1979; 2009), Pierre Bourdieu (2005), Suely Rolnik (1997), Elisabeth Roudinesco (2008) e Franco Cambi (1999), além de alguns dos comentadores da obra destes autores. Priorizou-se uma perspectiva historiográfica de análise, recorrendo-se às contribuições da História da Educação para a compreensão dos ―discursos de verdade‖ inerentes ao ato de educar e suas implicações disciplinares na formação dos indivíduos em quatro épocas históricas , quais sejam: a época clássica; a época medieval; a época moderna e a época contemporânea. Na época clássica, centrou-se a análise nos modelos educativos das duas principais póleis gregas, Atenas e Esparta, visando observar como tais modelos de educação veicularam discursos de verdade que contribuíram para o disciplinamento e a ―fabricação‖ dos indivíduos. Na época medieval, enfatizou-se as reflexões em torno do modelo educativo cristão e sua relação com a formação de mentes ajustadas à moral da Igreja Católica. Nas épocas moderna e contemporânea, buscou-se pontuar como o discurso científico em educação possibilitou o redimensionamento da instituição escolar e de seu ideal formativo, possibilitando a construção de novas formas de disciplinamento por meio, dentre outros elementos, de novas práticas avaliativas, em especial, a prova. As reflexões construídas neste trabalho permitiram perceber a estreita relação entre a educação, as práticas disciplinares inerentes à instituição escolar e a produção da subjetividade. A recorrência analítica aos ideais formativos característicos das quatro épocas históricas tratadas nesta análise constituiu recurso valioso para a compreensão do discurso educativo enquanto rede de circulação do poder, de disciplinamento de corpos e mentes, bem como espaço de produção e modelagem de uma subjetividade ajustada a certo ―tronco‖ discursivo. Cabe salientar, mais uma vez, que a análise aqui exposta não pretendeu entender a totalidade das práticas de avaliação como algo nefasto por excelência, pois se reconhece que novas ações avaliativas de caráter mais dialógico estão sendo experienciadas por muitas instituições de ensino, sejam elas de nível secundário ou superior. Buscou-se pontuar o caráter disciplinar admitido pela avaliação da aprendizagem quando realizada no interior de relações verticalizadas entre professores e alunos, problematizando o tom proibitivo emanado dessas relações. 334 A partir dessas análises, observou-se que as práticas avaliativas, das quais foi destaque a prova, estão presas, por vezes, a redes de poder e dominação que hierarquiza e esquadrinha os indivíduos que integram o campo social. Observou-se ainda, que a escola os insere no interior de códigos lingüísticos voltados à documentação dos movimentos individuais e coletivos no intuito de controlá-los. Visualizou-se, por fim, que a prova, nesta perspectiva, longe de se constituir como um instrumento para a otimização do processo de ensino e de aprendizagem, tornou-se um meio eficaz de classificação e hierarquização dos alunos, transformando-se num veículo de poder responsável não somente pelo processo educativo destes no interior da escola, mas também por seus futuros. Operacionalizada desta maneira, transforma-se num caminho que conduz à docilidade e à utilidade do corpo e da mente, determinando gestos, comportamentos e subjetividades. REFERÊNCIAS BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. 6. ed. São Paulo: Perspectiva, 2005. CAMBI, Franco. Parte I – O mundo Antigo, Cap. III – A educação na Grécia. In. História da Pedagogia. São Paulo: Fund. Ed. da UNESP, 1999. _____. Parte II – A época medieval, Cap. I – Características da educação medieval. In. História da Pedagogia. São Paulo: Fund. Ed. da UNESP, 1999. _____. Parte III – A época moderna, Cap. I – Características da educação moderna. In. História da Pedagogia. São Paulo: Fund. Ed. da UNESP, 1999. _____. Parte IV – A época contemporânea, Cap. I – Características da educação contemporânea. In. História da Pedagogia. São Paulo: Fund. Ed. da UNESP, 1999. FOUCAULT, Michel. Verdade e Poder. In. Microfísica do Poder. 24. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1979. _____. Genealogia e Poder. In. Microfísica do Poder. 24. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1979. _____. Soberania e Disciplina. In. Microfísica do Poder. 24. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1979. _____. Terceira parte – Disciplina. In. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. 36. ed. Petrópolis/RJ: Vozes, 2009. LOPES, Sérgio Luiz. A (anti)pedagogia da nota na escola. 2006. 126 f. il. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais). Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais. Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Natal/RN, 2006. NETO-VEIGA, Alfredo. Foucault e a Educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2003. 335 NOGUEIRA, Maria Alice; NOGUEIRA, Cláudia M. Martins. Bourdieu e a Educação. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2006. PAIVA, A. Crístian S. Sujeito e laço social: a produção da subjetividade na arqueologia de Michel Foucault. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 2000. ROLNIK, Sueli. Uma insólita viagem à subjetividade: fronteiras com a ética e a cultura. In: LINS, D. (Org.). Cultura e Subjetividade: saberes nômades. Campinas: Papirus, 1997. ROUDINESCO, Elisabeth. A parte obscura de nós mesmos: uma história dos perversos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008. 336 2.4 Encerramento: LÉVI-STRAUS: NATUREZA E CULTURA Dia 09/10 (sexta-feira) 19h – Auditório Consequinho CCHLA Mesa-Redonda: Professora Doutora Dalcy da Silva Cruz (UFRN) e Professor Doutor Ailton Siqueira Fonseca (UERN) 2.4.1 Comunicação do Professor doutor Ailton Siqueira Fonseca (UERN) O PENSAMENTO POÉTICO: UM ELO ENTRE NATUREZA E CULTURA Ailton Siqueira de Sousa Fonseca24 ―Quando tudo está dito, só resta cantar‖(Leloup) O CESO deste ano homenageia, merecidamente, o antropólogo Claude Lévi-Strauss. Nessa mesa de encerramento eu deveria falar sobre a relação entre natureza e cultura em sua obra. Mas não quero aqui falar sobre o que ele falou, porque muitos já leram suas obras e trabalham com elas em suas aulas e pesquisas. Quero falar de algumas categorias de seu pensamento e de como essas categorias influenciaram meu próprio pensamento. Minha fala será dividida em três breves momentos: no primeiro, falarei de duas categorias do pensamento de Lévi-Strauss, o pensamento selvagem e o pensamento domesticado; no segundo, irei refletir – como um entrelaçamento dos pensamentos anteriores - sobre o pensamento poético e, no terceiro, irei abordar, de forma mais específica, a expressão viva do momento anterior na poesia de um cordelista mossoroense, poeta de grande produção intelectual que já alcança reconhecimento nacional e estimula pesquisas diversas em nível de pós-gradução: Antônio Francisco. Aqui, enfoco a relação entre natureza e cultura em sua mais recente obra Os animais têm razão (2009). Exercitando o pensamento não ortodoxo, permitindo-me ―voar fora da asa‖ como diria o poeta Manoel de Barros, vou mostrar como o pensamento desse antropólogo está presente na leitura que faço 24 É professor adjunto da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN, Dr. em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, coordenador do Grupo de Pesquisa do Pensamento Complexo – GECOM/UERN. 337 de alguns temas. É desse jeito que penso homenageá-lo: não falar do que ele falou, mas daquilo que ele me ajuda a falar. Com essa reflexão não pretendo responder a nada. Também não tenho a intenção de excluir nada porque sou movido por uma inspiração imagística e poética que me diz, nas palavras de Paul Valery que ―a verdade e a mentira tendem para o mesmo fim‖ (Valery, 2005, p. 14); inspiração que permite enxergar a síntese das antíteses, a complementaridade entre o sim e o não, entre o falso e o verdadeiro; inspiração que faz os contrários dançarem coladinho como um casal de noivos dançam a sua música nupcial. O primeiro desafio posto a esse pensamento dialógico e sintético é resolver ou rearticular a dicotomia entre natureza e cultura. É importante reconhecer que essa dicotomia é apenas uma dentre tantas outras presentes em nosso cotidiano, em nossa educação, em nossa cultura como, por exemplo, a dicotomia entre real e imaginário, ciência e literatura, biológico e cultural, humano e animal. Nossa cultura é marcada pelas apartações, fragmentações, porque nosso pensamento é racional, linear, dicotômico e reducionista. Não exercitamos o pensamento intuitivo, sintético, holístico e nãolinear. Falta-nos um pensar integrativo, sistêmico, complexo. Nossa ciência acadêmica foi criada e se tornou alimentadora do primeiro tipo de pensamento. A literatura, a arte, a poesia parece que não ficou imune a este, mas foi possuída pelo pensamento integrativo, complexo. Na verdade, essas duas formas de pensar coexistem em cada um de nós, mas culturalmente privilegiamos apenas a primeira. Na obra O pensamento selvagem, Claude Lévi-Strauss identifica, por meio de outras palavras e recursos, esses dois tipos de pensamentos. É bom lembrar que essa nomenclatura ―pensamento selvagem‖ não deve ser confundida com o pensamento do selvagem, pois este não existe. O que existe, nesse caso, é uma forma de pensar selvagem, porque opera por meio da aproximação e da síntese, da intuição e da analogia, da imaginação e da observação detalhada. Trata-se de um pensar mais metafórico, imagística e criativo. ―Um pensamento próximo do sensível‖, nas palavras de Lévi-Strauss (1989, p. 30). Esse pensamento sensível se opõe ao pensamento domesticado, àquele que se processa por meio dos métodos e teorias, das regras e do raciocínio analítico e linear. O pensamento selvagem não classifica as coisas para conhecê-las. Faz o contrário: conhece as coisas para classificá-las. O primeiro chega às coisas para elaborar seus conceitos. O segundo elabora seus conceitos para chegar às coisas. É claro que tanto num como no outro há lógica e sistematicidade e nenhum deles tem funções apenas de utilidade prática. 338 Para os dois casos, há um mesmo objeto de conhecimento: o universo circundante como meio de satisfazer suas necessidades práticas e cognitivas, imaginárias e reais. Associando os conhecimentos metódicos ao conhecimento analógico, o sensível ao intelectual, o selvagem ao domesticado têm-se uma combinação muito importante. Para mim, o pensamento poético é essa combinação, está na interface do pensamento selvagem com o pensamento domesticado. Para Lévi-Strauss, ―os elementos da reflexão mítica estão sempre situados a meio-caminho entre perceptos e conceitos‖ (LéviStrauss, 1989, p. 33). Penso que o mesmo ocorre com o pensamento poético. Assim como ―o gênio do pintor consiste em unir conhecimento interno e externo, ser e devir‖ (Lévi-Strauss, 1989, p. 41), o gênio do poeta consiste em religar natureza e cultura, sim e não, prosa e poesia, praticando, com isso, a síntese das antíteses. É esse pensamento sintético, ou seja, que uni o que está separado, que bricola diferentes coisas na construção de uma nova. Como na poesia do bricoleur, a poesia do poeta não se limita a falar das coisas, mas por meio das coisas. Por motivos diversos, as diversas coisas se tornam motivos de versos. As coisas se deixam abordar tanto pela aridez das idéias como pela suavidade do pensamento. Isso é uma forma de dizer que, na ciência, o conceito precisa ser suavizado para que seja esclarecido; outra maneira de insinuar que nem sempre conhecemos as coisas pelo rigor da razão ou da cientificidade. O pensamento analítico também tem necessidade de suavidade, necessita, portanto, do pensamento sensível para poder se aproximar ainda mais das coisas. Precisa ser humanizado para ficar ajudar o ser humano a dar sentido à sua vida e motivar as suas ações. Vejo na poesia popular a suavidade do pensamento que sabe ser rigoroso sem ser grosseiro, ser profundo sem perder a leveza, ser único e, ao mesmo tempo, plural; pensamento que sabe pensar em sentir e sentir em pensar, como dizia Fernando Pessoa. As poesias ditas populares trazem um manancial de significados e imagens implicadas que são extremamente importantes para a ampliação do conhecimento explicativo da ciência. É esse manancial que nos faz tomar consciência de nossa frágil condição humana nesse planeta tão instável. O Pensamento Poético: Recentemente, o grupo de pesquisa que coordeno (Grupo de Pesquisa do Pensamento Complexo) voltou suas atenções para a importância da cultura popular ou, mais especificamente, da poesia do repente. É bom esclarecer que consideramos não haver oposição hierárquica entre poesia popular e poesia erudita, popular e moderna, porque elas sempre trabalham com a mesma matéria-prima, mesmo que o produto 339 seja diversificado. Pode-se mudar o linguajar, a estética, o estilo, mas a matéria é a mesma. Visando possibilitar a construção de um novo sujeito do conhecimento e um novo estatuto para a ciência humanística, conferindo a esta uma constituição mais metafórica e poética, mas não menos rigorosa, nosso foco centra-se nos poetas repentistas de duas grandes cidades do interior do RN: Mossoró e Açu. Pelo contato que o grupo vem fazendo com esse ―objeto de pesquisa‖, percebe-se que há nesses ―homens ordinários‖ (CERTEAU), uma perene memória, um inesgotável tesouro histórico e cultural e um fecundante manancial crítico e criativo onde partilham um desígnio comum, algo que os inspira e os sustenta. Eles elaboraram, a partir de diferentes concepções, perspectivas ou visões de mundo, um conhecimento e uma meditação sobre o que estar acontecendo no mundo e, principalmente, ao seu redor. Eles pensam e sentem o mundo de forma inteira, vêem tudo e captam o sentido de ser das coisas. Como diz o poeta Antonio Francisco tudo que existe tem uma razão de existir. Então que demos a elas um sentido que ultrapasse o sentido utilitário da necessidade de possuir. A arte do repente popular está, pouco a pouco, desaparecendo da nossa cultura. É uma arte muito próxima daquilo que Bachelard chama de ―A intuição do instante‖(2007). Esse instante do repente não se apresenta contrapondo-se ao passado das experiências, à memória. Ao contrário, ele é um meio de juntar, em um só momento, temporalidades diversas. O repente surge como uma meditação do instante e se expressa em um único momento que jamais será repetido, mas esse instante se apresenta com memórias de muitos outros instantes. Tudo ocorre como de fato parecem ser: as coisas não nos pertencem. O nosso ser não é a morada delas. Elas nos visitam, portanto, são passageiras, momentâneas, vêem de algum lugar e vão para algum lugar; somos um caminho, uma ponte para as coisas passarem. Apesar de ninguém conseguir construir uma casa sobre uma ponte, a arte do repente se constitui como uma tentativa de construir uma casa sobre a ponte por onde as coisas passam. Por meio da intuição do instante, por meio da palavra improvisada, o repentista tenta capturar o que passa em sua mente, capturar de repente e num repente essas coisas que estão passando em nossas vidas, em nossas realidades profundas; tentativa de fazer de suas palavras a moradia dessas coisas que aparecem já condenadas a desaparecem em seguida. Atribuímos ao instante o ponto de partida e a base de uma explicação compreensiva da sociedade, uma centelha da criação que é tão necessária à poesia quanto à ciência, à cultura e à educação dos valores humanos. 340 Os repentistas são ―exímios em captar a profundidade horizontal das relações conscientes entre pessoas e entre pessoas e coisas‖ (SANTOS, 2008, p. 89). Em suas poesias ou repentes há um implicado conhecimento sobre o homem, a vida, a sociedade, a cidade e as relações humanas. De forma geral, na poesia sempre há uma dimensão epifânica, uma aura de mistério e revelação. No cordel, na cantiga de viola ou no repente há ―uma reflexão profunda vivida sobre a pungência de se estar no mundo‖, uma grande interrogação sobre o destino humano, como percebemos no repente Improviso sobre o fim: Quando o céu mostra o crepúsculo Que o dia chega ao fim Um aperto, uma saudade Eu sinto dentro de mim Enquanto estou contemplando Eu fico a Deus perguntando Se o fim da vida é assim. (Dias; Paraibano, 2008, p.34). Ou no poema de Antônio Francisco que diz: A nossa vida não passa De uma chama amarela Num castiçal de ilusão Tremendo em cima da vela Com a boca do destino Foi não foi soprando nela. E quando o destino quer Faz o que quer com a gente Quem mente dia a verdade, Quem diz a verdade mente. O valente vira frouxo E o frouxo fica valente. (FRANCISCO, 2009b, p. 52). Como um bricoleur, o poeta sempre coloca na poesia alguma coisa de si: sua indignação, suas interrogações, sua leitura de mundo, seus valores, sentimentos, seu universo mítico e imaginário, sua estupefaciência diante daquilo que é. Se há uma tendência do pensamento domesticado colocar palavras e ciência em corpos vazios de expressão para que os mesmos possam dizer aquilo que ele deseja ouvir, o pensamento poético escuta as vozes silenciadas que há em cada corpo aparentemente vazio de expressão. Em cada corpo, em cada objeto, há muitas vozes silenciadas. Ao que parece o pensamento poético trás essa outra voz que vem do vazio e do silêncio das coisas. Por isso que, aos onívoros literários, é necessário uma escuta sensível do texto ou da poesia que se ler. Isto porque a poesia do 341 leitor precisa tocar a poesia do poeta para, por sua vez, sentir a poesia do poema e assim se comunicarem entre si. Para tanto, muitas vezes ―temos que nos libertar dos livros e dos mestres para reencontrarmos a primitividade poética (BACHELARD, 1989, p. 44). Isso se faz necessário porque quase sempre ―a vida literária é uma vida demasiado escolar, demasiado fiel aos heróis da escola, um trecho frio de eloqüência‖ (BACHELARD, 1989, p. 58). Talvez fosse melhor não estudar e não pensar a poesia. Melhor seria simplesmente ficar perto dela, senti-la, como um amante sente o amor de sua amada ao estar junto dela; entregar-se a ela para descobrir que, com toda sua riqueza, a poesia fala de coisas que as palavras não traduzem, mas sem as palavras as coisas não existiriam, não se comunicariam. Assim como o ser humano não deve somente pensar porque isso o deixa insensível, assim também ele não pode somente sentir porque o deixará flexível demais. Dizem que o homem está condenado a interpretar. Vou agora interpretar um livro, um poema de Antônio Francisco, poeta mossoroense, para mostrar como essa relação entre natureza e cultura está presente em seu pensamento poético ou em seus versos. A Poesia de Antônio Francisco e a Relação Entre Natureza e Cultura: Esse poeta é, simultaneamente, popular e erudito, escreve como quem planta uma semente para o futuro. Faz de suas palavras as fazedoras do amanhã. Sua escrita é uma meditação, um grito de liberdade, um sonho a ser sonhado por quem a ler. Como ele mesmo disse: Escrever é meditar Todo dia, o dia inteiro, Fazer do vento uma escada, Do luar um candeeiro, Pra ver o rosto de Deus Por detrás do nevoeiro. É viajar dia e noite No barco da Liberdade, Num rio feito de versos Pela criatividade, Olhando pela janela Dos olhos da humanidade. É viver plantando sonhos Onde mais ninguém plantou, Sonhar colhendo a semente Do sonho que ele sonhou, E sugar o mel das pétalas Da roseira que murchou. (Francisco, 2009b, p. 13). 342 Ao contrário do poeta Manoel de Barros que constrói palavras novas escovadas de pedras antigas, este poeta não inventa novas palavras, porque as velhas e usais palavras, quando arrumadas de novas maneiras, dizem aquilo que nenhum neologismo ou ―ideoleto‖ pode expressar. Em sua poesia a natureza estar cheia de surpresas e encantos incompreensíveis: Quem já passou no sertão E viu o solo rachado, A caatinga cor de cinza, Duvido não ter parado Pra ficar olhando o verde Do juazeiro copado. E sair dali pensando: Como pode a natureza Num clima tão quente e seco, Numa terra indefesa Com tanta adversidade Criar tamanha beleza. (Francisco, 2009, p.7). A natureza é viva, boa e encantadora. Seus escritos são exercícios de um pensamento sensível que não ver dicotomias entre natureza e cultura, entre homem e animal. Como na obra de Clarice Lispector, encontramos em seus poemas macacos-homens e homens-macacos, uma bricolagem de seres diferentes. Diferentemente de Gôngora que ―chega a fazer de seu poema uma grande Natureza-morta‖ (Lorca, 2000, p. 74), Antônio Francisco faz de seu poema uma grande Natureza-viva e comunicante. Com o recurso da ficção, ele dar voz àqueles que jamais falarão. Ou melhor: por meio de sua voz, faz falar aqueles que estão condenados ao silêncio, aqueles que não conhecem o verbo: os animais. Como ocorre nos cordeis Meu sonho (2006), A lenda da Ilha Amarela (s.d.) e Os animais têm razão (2009), os bichos falam a língua dos homens, mas os homens não conhecem a língua dos animais. Na boca dos animais estão as palavras que os homens não pronunciam porque, ao se afastarem da natureza, afastaram-se também daquele pensamento que sente e intui, que pensa e sente as coisas a seu redor. Ao transformar a linguagem muda da natureza na língua dos homens, é como se o poeta dissesse que os seres humanos estão condenados a entender somente a sua própria língua. Quase sempre nos esquecemos de apreender o que está em nossa volta. Não percebemos que a natureza nos diz muito mais do que somos do que nós mesmos. Perceber e dar significado aquilo que se torna invisível diante de olhos que não enxergam. 343 O poeta transforma tudo que sua imaginação toca em matéria de poesia. Ele não cria a partir do nada e sim a partir das coisas naturais, das coisas do mundo. No poema ―Os animais têm razão‖ ele recria a natureza para a natureza falar não de si, mas das coisas humanas e da cultura. Percebe-se com isso que o poeta trabalha em parceria com a natureza: a natureza faz sua parte. O homem também faz a dele. A natureza cria o animal com cérebro, mas a imaginação do poeta põe pensamentos nele. A natureza faz o animal com boca para comer, o poeta põe palavras na boca do animal. A natureza dar a comida, o homem cria as maneiras na mesa. A natureza pare o homem nu, a cultura o veste. Talvez tenha sido isso que fez JeanYves Leloup dizer: ―O homem é uma mistura de natureza e aventura‖ (Leloup, 2002, p. 11). Natureza, o biológico, o invariante da espécie. Aventura, aquilo que acrescentamos ao biológico, o que fazemos do que somos. A aventura está no fato da criatura criar a si mesmo e o que lhes falta. A obra Os animais têm razão é uma mistura de natureza e aventura: o poeta não inventa os animais, porque eles já existem na fauna nordestina. Ele dar aos animais existentes o que não existe neles: as palavras, a razão discursiva, a sabedoria. Isso imprime em seus versos o coração da natureza e as palavras dos homens, versos diversos que mostram toda liberdade criacional do seu autor. Assim, suas palavras se tornam tão naturais como é o canto de um pássaro que canta na madrugada esperando um novo dia nascer diante de si. Com sua curiosidade e imaginação natas, para Antônio Francisco, as plantas e os animais são tão familiares quanto os seres humanos. E os seres humanos, às vezes, se apresentam tão estranhos como animais selvagens. Os animais têm tudo aquilo que o homem rejeita em si: o rato é acusado de ser ladrão, o porco de ser sujo, a cobra é traiçoeira e venenosa, o burro é burro porque é desprovido de raciocínio, o cachorro é violento. Mas nos animais também se encontram todas as virtualidades humanas: há indignação, princípios de igualdade de direitos, preocupação com o planeta, com a justiça social e o sentimento de revolta. A revolta é uma das marcas do humano. Como disse Bachelard se referindo a Lautreamont: ―a função imediata da pessoa é revoltarse‖ (1989, p. 59). Revolta-se porque tem consciência da realidade, das injustiças, dos problemas. Revolta é indignação. Na obra Os animais têm razão, a revolta não acontece na esfera do labor ou da ação social coletiva. Ocorre na esfera discursiva: a palavra é a ferramenta de revolta e o meio de expressá-la ao mundo. Ela denuncia a injustiça social, a violência, o medo, a ganância e a inveja. Denuncia a frágil razão humana que nem sempre percebe 344 que o homem pertence ao meio ambiente, mas o meio ambiente não pertence ao homem. Nessa obra, percebemos que ao ser dada aos animais, a palavra revolucionou a natureza, porque permitiu a cobra criticar o homem dizendo: É certo, eu tenho veneno, Mas nunca fiz um canhão. E entre mim e o homem, Há uma contradição: O meu veneno é na presa, O dele no coração. (Francisco, 2009, p.22) Diferentemente do que acontece na obra A revolução dos bichos de George Orwell, na obra de Antônio Francisco, os bichos não fazem uma revolução. Revoltam-se com as injustiças do mundo e mostram por meio dos diálogos entre eles, a ilusão de si em que vivem os humanos; revoltam-se porque tem razão. E o homem mesmo sendo racional não tem a razão que os animais possuem: razão crítica. É importante ressaltar que todo diálogo entre os animais, acontece enquanto o poeta está deitado numa rede, em juazeiro acima deles. Entre o sono e a vigília o poeta escuta o que os bichos conversam. Ao acordar na manhã seguinte, ele não sabe se aquilo foi sonho ou realidade, mas sabe que tudo que foi dito é verdade. Tudo acontece como se a razão do poeta precisasse ser suavizada pelo sonho para poder compreender melhor outras realidades. A reunião ou diálogo dos bichos ocorre a noite, no escuro, como se a clareza dia não correspondesse a clareza das idéias ou como se as idéias não fossem tão claras quanto o sol que brilha no Sertão. Poderíamos voar fora da asa e pensar que a consciência vem quando a mente não está alerta, vigilante. A noite insinua que a razão precisa adormecer um pouco para fazer a consciência despertar. Entre o sono e a vigília escuta-se a outra voz, voz da poesia que o poeta escreve. Na verdade, é a conversa entre os animais que faz aumentar a consciência do homem sobre o mundo e sobre si mesmo, ao ponto de perceber que o ser humano é um estranho animal que ainda não tem o conhecimento de si próprio. O único animal que quer se diferenciar dos outros, ser especial e esquece as sábias palavras do cachorro que dizem aos demais animais: - Amigos, todos vocês tem razão... O homem é um quase nada Rodando na contramão, Um quebra-cabeça humano Sem prumo e sem direção. (Francisco, 2009, p. 30) 345 Há, sem duvida, em sua obra um complexo da vida animal. Como nas histórias infantis, os animais são os personagens principais, comunicam-se não somente entre si mesmos, mas também com o leitor e o homem, de forma geral. Antônio Francisco não chega a fazer psicologia e nem sabedoria humana em forma de fábula animal, a exemplo de La Fontaine. Os animais não representam o sopro primordial da vida nem o coração pulsante da natureza, como acontece na literatura de Clarice Lispector: eles se mostram com razão, razão sensível sim, mas analítica também. Em sua obra, não são os homens que criticam os homens. Os animais cumprem esse papel revolucionário e inquietante de crítica a humanidade como acontece no cordel ―A lenda da Ilha Amarela‖ e em ―Os animais têm razão‖: O porco dizia assim: - pelas barbas do capeta! Se nós ficarmos parados A coisa vai ficar preta... Do jeito que o homem vai, Vai acabar o planeta (Francisco, 2009, p. 14) Penso que esse poeta, escreve uma poesia selvagem para ficar mais perto desses animais domesticados e cheios de verdades. A fala dos animais serve para o homem conhecer o que ele não conhecia. Os animais conhecem a sedução, o canto, as estratégias de sobrevivência, mas não a mentira. Portanto, a fala dos animais é tida como uma das mais verdadeiras, porque a mentira só pertence aos homens. O ser humano é o único animal que mente para os outros e até para si mesmo. Com isso, ao recorrer aos animais como personagens é como se eles devolvem ao poeta, a matéria de sua própria poesia: aquela parcela de conhecimento da natureza, da vida e da sociedade que o homem estar perdendo e aquela parcela de autoconhecimento que não temos. A sabedoria dos animais não vem dos livros e sim do coração: Já tinham lido e relido O livro de Salomão E como tinham aprendido Estava no coração E não na ponta dos dedos Fazendo calos na mão (Francisco, s.d. p. 3). Se a noção de sociedade foi construída em oposição à natureza, hoje, a noção de natureza pode reconstruir a sociedade, pois esta também é um sistema vivo como aquela da qual foi apartada. 346 Como percebemos acima, nesse aspecto, a literatura tem muito a dizer e a contribuir. Quando os animais têm razão, os homens deixam de ser únicos, deixam de ser exclusivos e excluídores de sua parte animal, com a qual luta constantemente para domesticá-la. A poesia estimula no homem um outro olhar sobre ele mesmo e sobre o mundo em que vive. São as chamas da poesia que avivam as paixões humanas mais profundas e o nos faz caminhar. É o coração ardente do poeta que dá a poesia o mesmo fogo que faz a Sarça do deserto viver em chamas sem nunca morrer e se queimar. São essas chamas que me faz pensar e repensar a ciência e a minha vida. Talvez o pensamento poético possa transformar a prosa do mundo num princípio esperança. REFERÊNCIAS BACHELARD, Gaston. A intuição do instante. Tradução: Antonio de Padua Danesi. São Paulo: Verus Editora, 2007. ________. Lautréamont. Tradução: Maria Isabel Braga. Lisboa: Litoral Edições. 1989. _______. DIAS, Sebastião; PARAIBANO, João. Improviso sobre o fim. In: Poetas do repente. Recife: Fundação Joaquim Nabuco. Ed. Massangana, 2008. FRANCISCO. Antônio. Os animais têm razão. Brasília: Conhecimento Editora, 2009. ________. A lenda da Ilha Amarela. Mossoró: Queima-Bucha, n. 15, s.d. ________. Sete contos de Maria. Mossoró: Fundação Vingt-un Rosado, 2009b. ________. Dez cordéis num cordel só. Mossoró: Queima-Bucha, 2006. LELOUP, Jean-Yves. Amar... apesar de tudo: encontro com Marie de Solemne. Tradução: Guilherme João de Freitas Teixeira. São Paulo: Verus, 2002. LÉVI-STRAUSS, Claude. O pensamento selvagem. Tradução: Tânia Pellegrini. São Paulo: Papirus, 1989. LORCA, Federico Garcia. Conferencias. Tradução: Marcos Mota. Brasília: Editora Universidade de Brasília: São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 2000. SANTOS, Boaventura de Sousa. Um discurso sobre as ciências. São Paulo: Cortez Editora, 2008. VALÉRY, Paul. A alma e a dança e outros diálogos. Tradução: Marcelo Coelho. Rio de Janeiro: Imago, 2005. 347 2.4.2 Comunicação da Professora Doutora Dalcy da Silva Cruz VEREDAS DA CULTURA BRASILEIRA Dalcy da Silva Cruz25 Abertura: A cultura como um processo de produção do conhecimento, tem se constituído ao longo da história, num movimento dialético conectando idéias e condições históricas, resultado da ação do homem (CRUZ,1997). Foi sempre assim embora tenha apresentado mudanças em momentos diferentes. No mundo antigo, expressou-se em projetos de irrigação, forma religiosa, de educação, de objetos de arte e de uso cotidiano, a mostrar um modo de vida. Na modernidade e na contemporaneidade, embora o processo tenha sido o mesmo, apresentou-se com uma dualidade expressa pelo paradigma do ―Ocidente que, além de dualizar razão – imaginação, sujeito - objeto, liberdade - determinismo, sensível-inteligível, pensamento selvagem – pensamento domesticado, separa, hierarquiza, distingue, exclui, degenera o saber em concepções mutilantes e fragmentárias‖ (CARVALHO, 2003, p. 96). A cisão entre cultura cientifica e cultura humanística é concebida de forma que quando se fala em cultura há uma suposta classificação: cultura popular, cultura culta, cultura artística etc. Em todos os momentos da história, o homem sempre se utilizou das forças da natureza, dos mitos, da religião, do trabalho, da produção material, da tradição e da ciência, da artes para explicar o mundo. Tanto que Prigogine diz que ―a ciência é a expressão da cultura. Difícil definir suas fronteiras‖ (2009 p. 84). Seguindo a trajetória de Edgar Morim, entendo do já falado, que a produção do conhecimento e, conseqüentemente, da cultura, comporta, de maneira dialógica e concomitante, tanto a humanidade como a animalidade do conhecimento. Nesse sentido, remarco o que diz Almeida (1993) ao lembrar que a ―pulsão cognitiva é o que funda a constituição das sociedades humanas, sua historicidade, constitui a cultura, produz um Ser leitor, interpretante e impressor de sentidos, vontades, desejos, produtor e consumidor de conhecimento‖ (ALMEIDA,1993, p.35). Uso a fala de Morim para reafirmar essa concepção: 25 Dalcy da Silva Cruz é graduada em Geografia/Universidade Federal da Paraíba e Sociologia e Política/Fundação José Augusto, Especialista em Educação, mestra em Sociologia Rural/ Universidade Federal da Paraíba, doutora em Educação/Universidade Federal do Rio Grande do Norte e pósdoutora em Filosofia/Universidade Nova de Lisboa. Professora da UFRN, integra os Grupos de Pesquisa Cultura, Política e Educação e Estudos da Complexidade, estuda Sociologia Rural em temas como educação, memória, questão agrária, estudos sobre Caio Prado Júnior, pensamento social e cultura. 348 A cultura, que é a característica da sociedade humana, é organizada/organizadora via o veículo cognitivo que é a linguagem, a partir do capital cognitivo coletivo dos conhecimentos adquiridos, das aptidões apreendidas, das experiências vividas, da memória histórica, das crenças míticas de uma Sociedade. Assim, se manifestam ‗representações coletivas‘, ‗consciência coletiva‘, ‗imaginário coletivo‘(MORIM, 1991, p. 17). 1° TEMPO: A partir desse breve percurso sobre cultura, quero lembrar como foi abordada a cultura brasileira pelos pensadores que no século XX viram e interpretaram o Brasil. Inicio, pois, este trajeto pelas Veredas da Cultura Brasileira, partindo do Brasil Colônia, tomo como referência alguns pensadores e um artigo que escrevi em 1967, denominado ―Cultura e Intelectualidade brasileiras: da oralidade ao ensaismo,‖ apresentado em um Seminário sobre História, Sociedade e Educação no Brasil, realizado na UNICAMP. Em 2000 reescrevi o texto para um Congresso realizado em Coimbra, também sobre História da educação, cujo título passou a ser ―Cultura no Brasil Colônia: o Saber oralizado‖. Em ambos, a centralidade da discussão aponta a matriz oral que fundamentou o saber desde o Brasil Colônia, prática reforçada pelos colonizadores lusitanos, pelos jesuítas e reafirmada com a abertura das Escolas de Direito. Com o propósito de apreender a trama do tecido cultural, o estudo situa-se em três momentos da história: a prática da oralidade no Brasil Colônia; o surgimento da crônica de religiosos e viajantes estrangeiros e o aparecimento do ensaismo históricosociológico‖(CRUZ, 1997, 2000, p.1). Essa periodização foi uma maneira de encaminhar a discussão e o entendimento de como se deu a produção do conhecimento no Brasil, posteriormente concebido como um sistema organizado que se denominou de ―Pensamento Social Brasileiro‖. Segui as pegadas, inicialmente, de quatro pensadores os quais apresentam características muito particulares quanto ao assunto. LIMA (1978) que considera ter havido uma ―desarticulação da cultura nativa‖ com a chegada dos colonizadores lusitanos admitindo que ocorreu tanto na América Latina, como no Brasil, cuja cultura nativa, ‗embora desarticulada‖, ainda predomina sob a ―forma de resíduos (mitos, lendas, costumes, modo de conduta, monumentos), passíveis de entrarem como peças em novas articulações‖, mesmo admitindo que a cultura da Metrópole tenha se colocado como imposição ― de cima como parte de uma política de terra arrasada‖ (LIMA, 1978, p. 28). A outra pegada é a de SODRÉ (1970), que trata de uma ―cultura transplantada‖ como sendo uma herança assimilada com a presença dos colonizadores portugueses. Como conseqüência, houve uma incorporação do Brasil ao mercado internacional que, a partir daí começou a existir. ―como nada existia aqui de interessante para o surto mercantil da época‖, os europeus criaram uma riqueza fundamentada na única mercadoria existente: a terra que passou a produzir para o exterior (SODRÉ, 1970, p.5). Dessa produção agrícola - no caso - a cana de açúcar, fundou-se a empresa colonizadora. Dessa perspectiva, ―os elementos destinados à empresa de 349 colonização, isto é, de ocupação produtiva - no caso do Brasil - provem do exterior, são aqui transplantados tanto os Senhores – os que exploram o trabalho alheio, como os trabalhadores – os escravos‖ (SODRÉ, 1970, p.5). Portanto, a partir deste momento, a organização do trabalho, a força de trabalho, o estilo das construções, a religião, a educação, a língua, foram elementos trazidos da Europa e da África, isto é, vieram de fora (CRUZ, 2009), ―tanto os elementos humanos como os recursos materiais‖. Assim, ―numa produção transplantada e exigências externas, surge naturalmente uma cultura também transplantada‖ (SODRÉ, 1970, p. 5 ). Já Candido (1985; 1987) compreende que o processo cultural no Brasil se deu a partir de uma tentativa de integração de padrões europeus, embora, tenha prevalecido mais características da oralidade devido à estratégia utilizada pela Igreja na prática do púlpito, da tribuna, dos saraus, do recitativo, do teatro e do canto. Essa estratégia formou também um público mais restrito composto pelos freqüentadores de sermões e saraus. ―A cerimônia religiosa, a comemoração pública, foram ocasiões para se formar públicos mais duradouros em literatura colonial, dominada pelo sermão e pelo recitativo‖ (CANDIDO, 1985, p. 78). Além dessas características, o entusiasmo pela ―natureza exuberante e exótica, marcou também o saber e a cultura produzidos pelos viajantes naturalistas, transmitidos através das crônicas e diários de viagem‖ (CRUZ, 1993, p. 146-147). Essa exaltação pela natureza já vem de antes em ―projeções utópicas que atuaram na fisionomia da conquista e da colonização‖ com a carta de Colombo inaugurador do tom deslumbrante da natureza, reforçado posteriormente por Caminha que descreveu com entusiasmo as belezas e exuberâncias das riquezas tropicais: na terra recém descoberta ―em se plantando tudo dá‖. A visão paradisíaca foi reforçada com a visão de Antônio Vieira, no século XVII (CANDIDO, 1978). A literatura nos séculos posteriores vai reforçar esse cenário com um sentimento nativista e ―um tipo de história por meio de avaliação da mestiçagem e do contato de culturas‖,uma tensão atravessou toda história e, com maior expressão a produção do conhecimento e da cultura, uma vez que a literatura foi desenvolvida, tornando-se politicamente, uma ―peça eficiente do processo colonizador‖, embora também, uma forte expressão de libertação (CANDIDO, 1987, p. 165). A reconstituição dessa história é para CRUS COSTA, (1962, p. 51), a ―condição inicial, e essencial para o exame e a clara compreensão da história das idéias no nosso continente e consideração de nossa origem colonial‖. E eu acrescentaria, para se compreender mais profundamente a nossa cultura e o encontro do pensamento e do pensado como lembra IANNI (2004). Há um sentimento que a separação entre pensamento universal e realidade nacional deve ser superada tanto que, no caso dos intelectuais com formação no espírito europeu ―sensíveis aos desafios do presente e aos enigmas do passado, passam a explicar como se compõe e decompõe o Brasil como nação‖ (IANNI, 2004, p. 25). Como pode-se apreender da fala do filosofo: Ao transocianismo saudosista de uns e ao nacionalismo afoito e ingênuo de outros, sucederia uma geração na qual aparecem alguns homens dotados de uma formação nova e de uma técnica intelectual mais adequada à compreensão dos problemas da cultura e, talvez, por isso mesmo, dotados também de uma 350 compreensão mais exata do país e de nossa história (CRUS COSTA, 1956, p. 441). Isso vai ocorrer em 1930 com novas formulações das principais interpretações do Brasil, trazendo o passado para visualizar o futuro por pensadores que, imbuídos de teorias européias, sentiram desafiados a entender e explicar a formação da sociedade, a sua cultura e o seu pensamento. Ainda mergulhados na herança escravista criaram a metáfora das ―três raças tristes‖. Aliás, é compreensível, uma vez que a presença do darwinismo social, do arianismo, do evolucionismo e do positivismo, correntes que compões o projeto civilizatório da modernidade, prevaleceu e, talvez ainda persista não só no imaginário dos estudiosos, mas nas pesquisas realizadas pela academia. A acumulação desses saberes predominantes até o final do século XIX, culminam com o aparecimento do ensaísmo nas duas primeiras décadas do século XX expandindo em trabalhos que serviram de marco na história da cultura brasileira, nos anos 30 com Gilberto Freyre, Caio Prado Júnior e Sérgio Buarque de Holanda. (CRUZ, 1993, p. 146-147). 2° TEMPO: No inicio do século XX, no entanto, surgiu a grande corrente de interpretadores do Brasil. Dando inicio a essa corrente, Euclides da Cunha, empenhado em cobrir, jornalisticamente, o confronto de Canudos cujo resultado foi o seu trabalho - OS SERTÕES - hoje um clássico, escreveu sobre as questões do Sertanejo. Apesar de ser o pioneiro na interpretação histórico-sociológica como diz Florestan Fernandes, sua visão não ultrapassou os limites do Brasil e do sertão. No entanto, teve visão das transformações em curso. Sua interpretação dos acontecimentos políticos desembocaram numa ―visão social e histórica do memento, encontrando uma explicação para o seu aparecimento‖ FERNANDES (1976). Com um suporte teórico fundado no esquema da diferença de raça que habita o litoral, o mestiço, um intruso inferior - e os que habitam no sertão - uma raça autônoma - vai lançar uma metáfora que ainda hoje é repetida: ― o sertanejo é, antes de tudo, um forte‖(CUNHA, 1956, p. 101). Sua visão sobre a terra é a de um espaço de aridez, de uma flora exótica e agressiva, das trilhas rápidas, agredidas pelo sol que queima sem piedade, dizendo que ali é o palco de um ―terror máximo dos rudes patrícios que ali se agitam – a seca‖ (CUNHA, 1956, p. 30). Do homem lembrou sua formação étnica, conjunto daqueles elementos índio, negro e branco. Mostra assim, em Os Sertões uma parte desconhecida do Brasil, principalmente, uma nova maneira de interpretá-lo (CRUZ, 2001). Euclides da Cunha abriu uma nova vereda sobre a questão racial que outros pensadores irão seguir como Alberto Torres, Oliveira Vianna, Manoel Bomfim, Paulo Prado, Gilberto Freyre, Caio Prado Júnior, Sérgio Buarque de Holanda, para lembrar alguns. Na opinião de Cruz Costa (1962, p. 55) Euclides da Cunha: Soube ver mais do que compreender, o que havia de contraditório na paisagem intelectual do Brasil de seu tempo, o que havia de paradoxal para não dizer de ridículo, na atitude da grande maioria dos intelectuais de então, presos na contemplação da Europa. Revelou em seu livro a situação dramática do homem do sertão, mostrou aos intelectuais ‗puros‘ das margens do Atlântico, abismados em grotesca e pasmada nostalgia de valores do 351 espírito para os quais eles não haviam colaborado e dos quais eram meros consumidores, a tragédia do homem humilde da terra. Alberto Torres, um outro pensador da época que expressou em suas obras a visão sobre a cultura brasileira, abordando questões sobre a organização política e da sociedade, lembrando a mistura de raças, as heranças da colonização lusitana e o problema da educação e sentimento de nacionalidade. Considerado o ideólogo do nacionalismo suas idéias são cheias de sentimento nacionalista rejeitando lições de ―mestres estrangeiros‖, valorizando a visão empírica. Compreendida que faltava ao Brasil a formação de um povo e uma consciência de nação. A favor da mestiçagem dizia que ―não temos senão, motivos, assim, para confiar na energia e na capacidade de nossas raças‖ (TORRES, 1972, p. 71). Sua idéia de nacionalismo se amparava em uma exploração racional das riquezas pelos brasileiros. Uma defesa intransigente de uma ―cultura autôctona‖, contra ―a imitação estrangeira, ao domínio cultural e econômico‖ (CRUZ, 2000, p. 39). Com Manoel Bomfim, o ensaio contou com um dos grandes pensadores da década de 20 do século passado, embora também contraditório e xenófobo como Alberto Torres. No entanto, por apresentar propostas polêmicas e discordantes dos seus pares, seus escritos foram pouco divulgados e ele, um pensador quase desconhecido no elenco dos interpretadores do Brasil. Usou em suas análises sobre o Brasil alguns instrumentos da teoria marxista e defendia um nacionalismo radical que ia da crítica aos colonizadores, considerados ―parasitários‖, à defesa das riquezas nacionais e das raças inferiores. Afirmava que o ―Brasil dispensado de conquistar sua independência foi, por isso, levado a guardar a infância do Estado portugueses, e a degradação dos seus governantes‖ (BOMFIM, 1996, p. 52). Responsabilizava os portugueses como sendo os responsáveis pelos ―males que parece não ter cura‖. A corrupção, os vícios intelectual, moral e políticos foram agravados com os ―fugidos de 1808 e que repetem até hoje, a mentalidade e os instintos com que aqueles aqui se acoitaram‖ (BOMFIM, 1996, p. 52). Para corrigir esses erros sugeria uma educação universalista, a qual passaria a oferecer a todos o acesso à escola contribuindo para integrar as camadas inferiores ao processo de desenvolvimento do país. (CRUZ, 2000, p. 45). Tinha a educação como um caminho para criar um espírito público, unir a nação e prepará-la para a democracia. Portanto, a educação eliminaria os males herdados da formação histórica, com os quais o estatus de nação não seria alcançado: ―como estamos, não somos nem nação, nem República, nem democracia‖ (BOMFIM, 1932, p. 43). Partindo, do conceito de ―parasitismo‖ como herança da formação inicial, ―o brasileiro seria um homem tornado conservador pela herança social e cultural derivada da mentalidade expoliadora da Colônia, baseada no trabalho escravo‖ (CANDIDO, 1990, p. 13). Manoel Bomfim, mesmo fazendo parte do ensaísmo do momento, destaca-se dos seus pares pelas suas análises radicais e discordantes dos demais. Nessa caminhada pelas Veredas da Cultura encontra-se um outro pensador que também analisa, interpreta e produz um conhecimento particular sobre o Brasil; Oliveira Vianna. Filho da aristocracia agrária esteve sempre ligado ao 352 poder, forte defensor do arianismo teve como orientação intelectual às idéias de Gobineau, Le Play e Ratzel, defensores da superioridade racial. Caldatário do pensamento conservador europeu e brasileiro, sempre privilegiou o papel do Estado, sua organização e atividade, ao que conferialhe um lugar proeminentemente ―civilizador‖. Sua premissa era de que a sociedade civil com sua fragilidade e um povo incapaz cultural e politicamente competia-lhe a tutela do seu poder e da sua dinâmica administrativa, ―Essa interpretação ressoa bastante no pensamento brasileiro, em setores empresariais, políticos, militares, jornalísticos, universitários‖ diz JANINI (2004 p. 35). Sua exaltação ao homem branco e ao que mora no campo leva-o a afirmar que só ―a vida dos campos, a residência nas fazendas, a feição de seu bucolismo e da sua tranqüilidade se torna uma predileção dominante da coletividade‖ (VIANNA, 1982, p.58). Sua defesa por um estado centralizador levou-o a considerar que às populações rurais seriam ―as matrizes da nacionalidade, delas do seu espírito, da sua laboriosidade, de seu afluxo humano, é que vivem as cidades do interior ou da costa, e crescem, e se desenvolveu‖ (VIANNA, 1982, p. 43). Foi nos anos 1920 do século que passou, que o Brasil passou por umas transformações particularmente importantes do ponto de vista político, econômico e cultural. Os movimentos culturais continuaram ocorrer mostrando a dinamicidade da história que apresentou um cenário bastante diversificado. Nesse contexto, 1922 se constitui em uma data simbólica: o surgimento do tenentismo; da Coluna Prestes; do Centro Dom Vital, fundação do Partido Comunista Brasileiro, culminando com a Semana de Arte Moderna em São Paulo. Tudo era prenúncio de outra época, uma nova era. Desse momento de efervescência emergiu outro pensador que também expressou sua visão de Brasil do passado com vistas ao futuro. Com um ensaio sobre a tristeza brasileira. Paulo Prado traçou um relato com suas impressões sobre o caráter nacional, o ufanismo reinante na história oficial, a cobiça do colonizador pelo ouro dos trópicos, a prática licenciosa da sexualidade. Paulo Prado afirmou que ―numa terra radiosa vive um povo triste‖. Uma tristeza originária das grandes paixões que moviam os colonizadores: ―a ambição pelo ouro e a sensibilidade livre e infrene que, como culto, a Renascença fizera ressuscitar‖ (Prado, 1981,p.17). as belezas dos trópicos encantaram os colonizadores que consideravam ter encontrado o paraíso terrestre. Mas predominou um interesse entre, além do ouro e das pedras preciosas, uma preocupação com a liberdade: viver livre e dominar, como único alento, a miragem que então incendiava a imaginação do mundo inteiro de não estar longe, mas sempre inatingível, o maravilhoso Dourado Senhor da Lagoa de Prata de Manoa e da cidade do ouro rodeada de montanhas reluzentes de pedrarias‖ (PRADO, 1981, p. 50). Com essa visão controversa quanto ao caráter do colonizador que daria origem a um povo triste, havia um outro elemento que teve influência no caráter do brasileiro: o erotismo exagerado que resultava do clima, da terra virgem e da mulher indígena ou negra, uma vez que: 353 Na terra virgem tudo incitava ao culto do vício sexual. Ao findar o século das descobertas, o que sabemos do embrião da sociedade então existente é um testemunho dos desvarios da preocupação erótica. Desses excessos de vida sensual ficaram traços indeléveis no caráter do brasileiro‖ (PRADO, 1981, p. 90-91). Dessa terra de ambições e luxuria exagerada criou-se um homem triste sem apelo ás letras, sem interesse pela leitura. Nas letras, apenas os bacharéis eram cultuados, por isso ―não se publica livros porque não há leitores, não há leitores porque não há livros‖. O analfabetismo corre paralelo ao bacharelismo. Tem-se por tanto um povo sem instrução, sem cultura intelectual, panorama mais movediço que a peste (PRADO, 1981, p. 146). Intervalo: A partir dos acontecimentos doa anos 20 criou-se uma atmosfera de ebulição cultural que Cândido (1987) aponta como um momento que: foi um eixo e um catalisador; um eixo em torno do qual girou de certo nodo a cultura brasileira, catalisando elementos dispersos para dispô-los numa configuração nova. Nesse sentido foi um marco histórico, daqueles que fazem sentir vivamente que houve um ―antes‖ diferente de um ―depois‖. Em grande parte porque gerou um movimento de unificação cultural, projetando na escala da nação fatos que antes ocorriam no âmbito das regiões. A este aspecto integrador é preciso juntar outro, igualmente importante: o surgimento de condições para realizar, difundir e ―normalizar‖ uma série de aspirações, inovações, pressentimentos gerados no decênio de 20, que tinha sido uma sementeira de grandes mudanças‖(CANDIDO, 1987, p. 181-182, grifos do autor). 3° TEMPO: Os pensadores dos anos 30 do século XX tornaram-se emblemáticos por surgirem com concepções novas sobre a fundação da Sociedade Brasileira e sua cultura tornando-se grandes interpretes do Brasil. Ao contrário dos pensadores das décadas anteriores, portavam um pensamento moderno europeu e norte-americano, o primeiro deles Gilberto Freyre seguindo Simmel e Boas, privilegiou como antropólogo e sociólogo e uma veia teórica do culturalismo orientando sua interpretação sobre a cultura como um mundo de sociabilidade superando os equívocos que contrapunham raça e cultura. Centralizou suas análises nas instituições sociais como a família patriarcal, como se fosse a miniatura da sociedade. Quanto a Sérgio Buarque amparado no pensamento alemão moderno, destacando-se Dilthey, Rickert e Weber, desenvolvem suas idéias a partir de tipos idéias, estilos de sociabilidade e épocas. Enfatizou o papel do público e do privado realçando o ―homem cordial‖ como uma metáfora das relações que nasciam da família patriarcal. A figura do homem cordial representou este aspecto conciliador das elites, preocupadas em atrair simpatias pessoais, em reforçar alianças de interesses particulares, oligárquicos. Através da metáfora da cordialidade referia-se à preocupação das elites dirigentes brasileiras de manter uma aparente harmonia, assim como sua capacidade de reagir com violência, quando os conchavos pessoais não bastavam (DIAS, 1998, p. 26). 354 Como o mais polêmico, mas não menos importante Caio Prado Júnior cujas análises têm raízes no pensamento marxista, teve uma visão muito especial sobre a formação brasileira. Partiu da produção material e relações de produção que expropriava o escravo e o trabalho livre, mostrando a grande desigualdade social que vai perpassar a sociedade até hoje. Com seu segundo livro, editado em 1942, aprofundou sua interpretação de veio marxista mostrando que o estatuto colonial nasceu da exploração capitalista, marcando os fundamentos da Colônia; sua contemporaneidade como fruto do capitalismo mercantil, ao mesmo tempo que expressava um atraso com o uso da monocultura e uma força de trabalho compulsória. O Brasil, portanto, nasceu contemporâneo com uma grande defasagem que era o escravismo. Tanto Freyre, como Sérgio Buarque e Caio Prado, levantaram questões pertinentes sobre a formação do Brasil e sua identidade. Caio Caracterizou com ênfase a colonização como sendo uma grande empresa comercial partindo do conceito ―sentido‖ da colonização que é mostrado ao longo de sua obra como sendo a forma como foi organizada a grande empresa comercial para explorar o novo espaço e produzir para o comércio externo. Portanto, a colonização nos trópicos apresentou: um acentuado caráter mercantil; será a empresa do branco, que reúne a natureza pródiga em recursos aproveitáveis para a produção de gêneros de grande valor comercial, o trabalho recrutado entre raças inferiores que domina: indígenas ou negros importados(...). No seu conjunto, é visto no plano mundial e internacional, a colonização dos trópicos toma o aspecto de uma vasta empresa comercial(...) destinada a explorar os recursos naturais de um vasto território virgem em proveito do comércio europeu. (PRADO JUNIOR, 1945, p.31). Encerramento: Nesse trajeto pelas Veredas da Cultura como tentativa de apreender o conhecimento produzido pelo povo brasileiro e sua cultura como expressão de sua ação, foi-me possível captar o real ou apenas as sombras? Se o conhecimento e a cultura são resultados de acontecimentos cognitivos que englobam processos que vão desde o bioenergético até os pessoais, penso que tenho aqui o resultado desse processo, embora em retalhos. Admito que o conhecimento como pensa Morin (1986) é ―um fenômeno multidimensional no sentido em que é, de maneira inseparável, ao mesmo tempo físico, biológico, cerebral, mental psicológico, cultural social‖ (p.15), Esse trajeto certamente, que mostrou a mobilização de todos esses elementos que possibilitaram tecer uma trama cultural que modelou os conhecimentos individuais e coletivos dos brasileiros construindo essa ―cultura e, via a cultura, a sociedade‖ as quais ―estão no interior do conhecimento humano‖ (MORIN, 1991, p. 20). REFERÊNCIAS ALMEIDA, Maria da Conceição de. Caminhos Cognitivos da complexidade. Natal: Vivência, UFRN, CCHLA. v.6.n.1. p.33-41. jan/jun, 1993. BOMFIM, Manoel. Cultura e educação do povo brasileiro, pela difusão de um povo brasileiro, pela difusão da instrução pública: como se 355 apresenta o problema – aspectos essenciais que os deslocam. Realidade que o condicionam. S.1: [Sn] 1932. _______. O Brasil Nação: realidade da Soberania Brasileira. 2. ed. 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As atividades realizadas foram as seguintes: 1- Palestra: O ato de pensar nas Memórias de Magda Soares, proferida por Dalliva Stephani Eloi Paiva, realizada no Setor II, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte para alunos de Graduação da UFRN e de outras instituições. Participaram 50 estudantes. 2 – Miniciclo de Cinema e Memória, organizado por Joicy Suely Galvão da Costa, realizada na Casa do Menor Trabalhador para alunos da Educação Básica. Participaram da atividade 49 estudantes. 358 3 RESULTADOS DO III CESO/2009 Atividades Quantidade de Atividades Trabalhos Apresentados Ceso em Sociedade 02 02 Minicursos 04 04 Grupos de Trabalho 09 76 Mesa Redonda 02 04 Atividades Culturais 02 02 Total 19 88 Quadro 1: Resultados do CESO/2009 Fonte: Site do III CESO 3.1 COMPARATIVO DE PRODUÇÃO ENTRE O I, II E O III CESO O número de atividades foi reduzido na comparação entre a primeira e a segunda edição do evento, continuando a diminuir na terceira edição. Houve uma queda pequena no índice de produtividade, quando comparamos o segundo e o terceiro CESO. Este índice de produtividade é a média entre as atividades desenvolvidas e os trabalhos apresentados. Índice de produtividade Atividades Produção I CESO 26 72 II CESO 22 104 III CESO 19 88 Quadro 2: Índice de Produtividade Fonte: Site do III CESO Produtividade 2.77 4.73 4.63 359 Gráfico: 1 – Comparativo de produção entre o I, II e o III CESO Fonte: Relatório do I CESO, II CESO e site do III CESO 360 4 III CESO: PERSPECTIVAS DE PRODUÇÃO As perspectivas de produção acadêmica/científica derivadas do III CESO, visualizadas são as seguintes: 1 – Publicação em uma Revista da UFRN de uma das conferências de abertura do III CESO; 2 – Publicação em uma Revista da UFRN de uma síntese do Relatório do III CESO; 3 – Publicação dos Anais do III CESO (on line). 361 CONSIDERAÇÕES FINAIS O evento trouxe resultados positivos para todos os envolvidos na formação stricto sensu do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, especialmente por ter permitido que alguns pós-graduandos e graduandos exercitassem, durante a formação, a capacidade de organização de eventos acadêmicos/científicos. Ressaltamos também a questão da produção e apresentação de 88 trabalhos oriundos de estudos realizados por estudantes e pesquisadores das instituições de ensino e pesquisa que participaram do evento, a saber: Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Universidade Federal de Pernambunco (UFPE), Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN), Falculdade de Natal (FAL), Faculdade para o Desenvolvimento do Rio Grande do Norte (FARN), Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA), Instituto Brasil de Pesquisa e Ensino Superior (IBRAPES). A terceira edição do CESO, a exemplo das anteriores, facilitou a interação entre os estudantes de pós-graduação e de graduação do Departamento de Ciências Sociais da UFRN, facilitando, desse modo, a troca de experiências formativas. As inúmeras temáticas tratadas no interior do evento possibilitaram a emergência de uma abordagem transdisciplinar, contribuindo para dar resistência ao movimento contra os reducionismos ainda em voga na academia. O III CESO foi palco de uma formação educativa calcada na importância do diálogo e da comunicação. Uma formação alicerçada na idéia de que o conhecimento é construído a partir de uma co-participação ativa dos sujeitos no ato de pensar. Salientamos, assim, o papel dialógico deste evento no processo comunicativo entre os estudantes. Por fim, o evento em sua terceira edição, cumpriu mais uma vez com o seu escopo principal ao possibilitar espaços para a produção, discussão, ressignificação, circulação e publicação do conhecimento. 362 REFERÊNCIAS CICLO DE ESTUDOS EM CIÊNCIAS SOCIAIS (I). 19, 20 e 21 de setembro de 2007. Natal/RN. Anais do I Ciclo de Estudos em Ciências Sociais. Natal/RN. Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes/UFRN. Disponível em CD-ROM. CICLO DE ESTUDOS EM CIÊNCIAS SOCIAIS (II). 02, 03 e 04 de dezembro de 2008. Natal/RN. Website do II Ciclo de Estudos em Ciências Sociais. Natal/RN. Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes/UFRN. Disponível em <http:// www.cchla.ufrn.br/ceso/ceso2008 >. Acesso em: 28/01/2009, às 15 horas. CICLO DE ESTUDOS EM CIÊNCIAS SOCIAIS (III): 07, 08 e 09 de outubro de 2009. Natal/RN. Website do III Ciclo de Estudos em Ciências Sociais. Natal/RN. Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes/UFRN. Disponível em http:// www.cchla.ufrn.br/ceso/ceso2009..