TCC 1Sibelle - CCHLA - Universidade Federal da Paraíba

Transcripción

TCC 1Sibelle - CCHLA - Universidade Federal da Paraíba
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
LICENCIATURA PLENA EM LETRAS
HABILITAÇÃO EM LÍNGUA PORTUGUESA
PAPA-CAPIM: A REPRESENTAÇÃO DO INDÍGENA BRASILEIRO NAS
HISTÓRIAS EM QUADRINHOS
SIBELLE PRAXEDES PEREIRA
JOÃO PESSOA,
AGOSTO DE 2014
SIBELLE PRAXEDES PEREIRA
PAPA-CAPIM: A REPRESENTAÇÃO DO INDÍGENA BRASILEIRO NAS
HISTÓRIAS EM QUADRINHOS
Trabalho apresentado ao Curso de Licenciatura em
Letras da Universidade Federal da Paraíba como
requisito para obtenção do grau de Licenciado em
Letras, habilitação em Língua Portuguesa.
Profª. Drª. Maria Bernardete da Nóbrega
Orientadora
JOÃO PESSOA,
AGOSTO DE 2014
Catalogação da Publicação na Fonte.
Universidade Federal da Paraíba.
Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes (CCHLA).
Pereira, Sibelle Praxedes.
Papa-Capim: a representação do indígena brasileiro nas histórias
em quadrinhos / Sibelle Praxedes Pereira. – João Pessoa, 2014.
51f.:il.
Monografia (Graduação em Letras com habilitação em Língua
Portuguesa) – Universidade Federal da Paraíba – Centro de Ciências
Humanas, Letras e Artes.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Maria Bernardete da Nóbrega.
1. História em quadrinhos. 2. Indígena. 3. Imaginário. 4. Cultura imaginário. I. Título.
BSE-CCHLA
CDU 741.5
SIBELLE PRAXEDES PEREIRA
PAPA-CAPIM: A REPRESENTAÇÃO DO INDÍGENA BRASILEIRO NAS
HISTÓRIAS EM QUADRINHOS
Trabalho apresentado ao Curso de Licenciatura em Letras da Universidade Federal da
Paraíba como requisito para obtenção do grau de Licenciado em Letras, habilitação em
Língua Portuguesa.
Data de aprovação: ____/____/____
Banca examinadora
_________________________________________________________________________
Profª. Drª. Maria Bernardete da Nóbrega, DLCV, UFPB
Orientador
_________________________________________________________________________
Profª. Drª. Ana Cristina Marinho Lúcio, DLCV, UFPB
Examinador
_________________________________________________________________________
Profª. Drª. Gláucia Vieira Machado, DLCV, UFPB
Examinador
Dedico ao meu esposo, Alberto.
Ao meu pai e a minha mãe.
Meus três corações.
Agradecimentos
Deus, meu melhor e maior amigo. Como agradecer pelo bem que tens feito a mim? A Ti,
minha vida, meu ar, meu tudo.
Alberto, esposo querido e companheiro. No dia em que eu disse “sim”, não foi só para
desfrutar de uma boa companhia, mas também para me sentir a mais feliz, a mais amada e
a mais completa das mulheres.
Lia e Paulino, pais não perfeitos, mas os melhores que eu poderia ter. Agora, “fora” de
casa, aquele excesso de cuidado e responsabilidade que eu reclamava o tempo inteiro faz
todo sentido nesse momento.
Shirlei e Paulino Filho, irmã amiga e irmão querido. Sendo parte de mim, sangue do meu
sangue não poderia deixá-los de citar. Com todas as brigas e os desentendimentos, temos
mais alegrias do que tristezas juntos, são os amados que eu quero carregar para sempre
perto de mim.
Sheila, irmã do meio. Minha revisora e crítica favorita. Por me ajudar nos momentos de
“desesperos” acadêmicos e a encontrar o tema que me deu mais prazer do que trabalho.
Maria Bernardete da Nóbrega, orientadora amável. Pessoa calma e tranquila, além de
educada ao extremo. Foi muito bom o passeio que fizemos juntas na tribo do curumim
Papa-Capim, conhecendo e aprendendo um pouco mais da sua cultura e referência.
Também não esquecerei o carinho e o amor com que se dedica às suas aulas, ao ponto de
sempre perder a hora, mas principalmente, pela sua inteligência e paciência. E isso me
inspira.
Ana Marinho, professora especial. Com seu jeito simples e calado, agrada e conquista de
uma maneira que eu não saberia explicar, talvez pela criatividade, pela escrita fenomenal,
pela experiência e pelo conhecimento na sua área e em outras mais. Não poderia e nem
gostaria de deixá-la de fora nesse momento, pois foi através do projeto, das aulas e das
leituras na sua companhia que conheci melhor os caminhos da literatura.
CNPq, pela bolsa do PIBIC. Possibilitou a minha entrada na pesquisa através do projeto
“Guia de obras de literatura infanto-juvenil para uma educação fundamentada nos Direitos
Humanos”, orientado pela Professora Doutora Ana Cristina Marinho Lúcio. E me permitiu
conhecer com mais clareza a literatura infantil/juvenil, embora tão complexa, tão
incrivelmente inesquecível.
Gláucia Machado, professora marcante. Simpática, alegre e gentil. São poucos os
adjetivos que a descrevam e a definam. As suas aulas dão sempre um gosto de “quero
mais”, pois tem a forma mais linda de ensinar que é também a de aprender. E com toda a
diversidade de ideias e pensamentos em sala de aula, mantém a serenidade e o jeito
cativante de provocar e instigar o aluno à liberdade de visão e posicionamento.
Professores da graduação: Daniela Segabinazi, Expedito Ferraz, Fátima Melo, Ferrari
Neto, Graça Carvalho, Leonor dos Santos, Pedro Francelino, Rinaldo de Fernandes,
Socorro Pacífico, entre tantos outros. Pelo contágio da alegria de ensinar, pelo incentivo do
olhar para a profissão com mais sabor e, sobretudo, pelo compartilhar das leituras e dos
conhecimentos.
Colegas da graduação: Juliana Carolina (minha madrinha), Juliana Dantas (doçura em
excesso), Márcia Carlos (alegria contagiante), Nadilma (mais madura e sensível depois
de Heitor), Renata (a risada mais divertida que eu conheço), Sayonara (menina esperta e
inteligente). Por compartilharmos dos mesmos sonhos e desejos para a profissão. Foi bom
conhecer cada uma, suas histórias, manias, alegrias, decepções e loucuras. Pelos passeios,
eventos e encontros, por simplesmente, marcarmos para estudar e só conversar. As
especiais, Aline, Angélica e Irany. Pela alegria que me dão quando estamos juntas, pela
franqueza e sinceridade nas longas e agradáveis conversas. Por serem as pessoas com
quem mais gasto crédito do celular.
E não menos importante, o sujeito/objeto deste trabalho, o Papa-Capim. Por me
apresentar a sua aldeia, sua turma, seus costumes e suas tradições. E por me fazer refletir
mais sobre a minha cultura depois de conhecer a sua.
“Antes que o homem aqui chegasse
Às Terras Brasileiras
Eram habitadas e amadas
Por mais de 3 milhões de índios
Proprietários felizes
Da Terra Brasilis
Pois todo dia era dia de índio
Todo dia era dia de índio
Mas agora eles só tem
O dia 19 de Abril.”
Jorge Ben Jor. Todo dia era dia de índio. Álbum Bem-vinda Amizade, 1981.
RESUMO
Este trabalho se propõe analisar a construção da representação do indígena nas histórias em
quadrinhos (HQ) das revistas da Maurício de Sousa Produções, com ênfase no personagem
Papa-Capim e sua turma. Delimita como base os pressupostos teóricos formulados por
Bhabha (2007), Brostolin; Cruz (2011), Campos (2013), Jobim (2002; 2008), KochGrünberg (2006), Larrosa (1994), Nelly Novaes Coelho (1991), Stuart Hall (1997; 2003;
2006), dentre outros. Constitui o corpus desta pesquisa a análise das revistas/almanaques
do Chico Bento (nº 43, 72, 87, 345, 346 e 409) e de personagens da Turma da Mônica,
como os almanaques do Cascão (nº 43 e 44), Cebolinha (nº 44) e Magali (nº 43), entre o
período de 2000 e 2014. O gênero quadrinhos, sua linguagem e panorama histórico, bem
como o lugar de Maurício de Sousa nessa conjuntura, suscita a retomada das categorias
analíticas identidade, cultura, imaginário e representação social, engendradas na própria
construção da narrativa da qual Papa-Capim e sua turma são protagonistas. À guisa de
inferências finais, esta temática vem provocar um olhar crítico sobre a consolidação de um
sistema de representação de identidades no contexto indígena brasileiro, por enfatizar as
diversas formas pelas quais o índio no/do Brasil passou a ser representado nas HQ.
Palavras-chave: História em Quadrinhos. Papa-Capim. Representação indígena.
Imaginário. Cultura. Identidade.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Imagem 1 - Maurício de Sousa..........................................................................................19
Imagem 2 - Pássaro Coleirinho/a......................................................................................24
Figura 1 – Desenhos/modelos criados com tipos de balões para HQ ..............................17
Figura 2 - Caricatura de Maurício de Sousa.....................................................................20
Figura 3 - Papa-Capim, personagem de Maurício de Sousa............................................22
Figura 4 - Nascimento do Cafuné e origem do nome.......................................................25
Figura 5 - Caraíba afundando em areia movediça............................................................28
Figura 6 - Papa-Capim e Cafuné, preparando flechas para caçar.....................................34
Figura 7 - Papa-Capim e Cafuné, com arco e flecha.........................................................34
Figura 8 - Papa-Capim e o Pajé da sua tribo.....................................................................34
Figura 9 - Tupã, o deus da tribo de Papa-capim, apartando brigas de tribos rivais..........35
Figura 10 - Encontro entre caraíba, Papa-Capim e Cafuné..............................................36
Figura 11 - O caraíba procura convencer Papa-Capim de não caçar jacarés....................37
Figura 12 - O caraíba procura convencer Papa-Capim de não caçar micos-leões............37
Figura 13 - O caraíba “cuidando” do Papa-Capim............................................................38
Figura 14 - Caraíba na floresta sendo salva pelo cacique da tribo....................................40
Figura 15 – Caraíba compara o índio ao herói da selva africana, Tarzan.........................41
SUMÁRIO
PARA COMEÇO DE CONVERSA............................................................................ 10
1 HISTÓRIA EM QUADRINHOS: MAS ESSA HISTÓRIA NÃO É DE
AGORA.......................................................................................................................... 14
1.1 O GÊNERO QUADRINHOS: DA INFORMAÇÃO À IMAGINAÇÃO ............ 15
1.2 HISTÓRIA EM QUADRINHOS TAMBÉM TEM HISTÓRIA .......................... 17
1.3 E ENTÃO MAURÍCIO DE SOUSA ENTRA NA HISTÓRIA ........................... 19
2 PAPA-CAPIM: O CURUMIM DA HQ BRASILEIRA ........................................ 22
2.1 BRINCANDO DE TOPONÍMIA: PORQUE PAPA-CAPIM? PORQUE
CAFUNÉ? POR QUÊ? ............................................................................................... 23
3 ENTRE CARAÍBAS E CURUMINS, PAPA-CAPIM E A REPRESENTAÇÃO
DO INDÍGENA BRASILEIRO NAS HQ .................................................................. 30
3.1 PAPA-CAPIM: O PERSONAGEM TIPICAMENTE BRASILEIRO? ............... 33
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................... 44
REFERÊNCIAS............................................................................................................46
REVISTAS EM QUADRINHOS ANALISADAS..................................................48
ANEXOS ....................................................................................................................... 49
10
PARA COMEÇO DE CONVERSA...
Desde a chegada dos europeus, por possuir características geográficas e étnicas tão
distintas, o território brasileiro sempre provocou um deslumbramento em viajantes do
“novo mundo”, principalmente cientistas e aventureiros europeus, que transformaram suas
aventuras, observações e experiências em relatos que foram recebidos com extrema
curiosidade pelo mundo. Além do estudo da natureza, os viajantes registraram a vida social
das épocas em que aqui estiveram influenciando grandemente as interpretações do país
desde então.
Resquícios dessas ‘interpretações’ são possíveis de serem identificados nas
Histórias em Quadrinhos (doravante, apenas HQ1) construídas no Brasil e sobre o Brasil,
como é o caso de Tico-Tico (1905), Zé Carioca (1940), Chico Bento (1960) e Turma da
Mônica (1963)2 que adquirem caráter um tanto complexo, especialmente quando
direcionadas ao público infantil. Isso porque essas histórias podem se configurar como
forma de construção imagética do Brasil na medida em que constituem “representações” da
realidade observada a partir da tentativa de captação do olhar da criança e relacionando-se,
com frequência, ao imaginário e ao simbólico.
À guisa de esclarecimento, entende-se aqui Representação como um processo de
construção simbólica, segundo Stuart Hall (1997, p. 61, traduzido) para quem a
representação envolveria a produção de significados através da ligação de três coisas: “o
que podemos geralmente chamar de o mundo das coisas, pessoas, eventos e experiências; o
mundo conceptual – os conceitos mentais que levamos em nossa mente; e os signos,
arranjados nas línguas que ‘significam’ ou comunicam estes efeitos”.
Assim, com o intuito de dar sentido e forma às circunstâncias em que os sujeitos
sociais se encontram, as representações são fruto da atividade criadora desses sujeitos,
“elaborando” a realidade social em símbolos. Por meio da circulação do discurso, esses
símbolos acabam por se tornar quase tangíveis, cristalizando-se ou renovando-se no
1
Ao longo do texto, utilizaremos a sigla HQ para o singular e o plural do termo histórias em quadrinhos,
conforme a maneira adotada por diversos autores neste trabalho.
2
A HQ do Tico-Tico foi lançada pelo jornalista Luís Bartolomeu de Souza e Silva, em 1905. Em 1930 entrou
em decadência, perdendo espaço para outras publicações norte-americanas. Circulou em almanaques
ocasionais até a década de 1970. Zé Carioca foi criado pelos estúdios Walt Disney no início dos anos 40,
inspirado pela técnica de J. Carlos, cartunista brasileiro. Foi mais conhecido no Brasil que nos EUA.
Continua circulando em revistas mensais publicadas pela Editora Abril, mas com histórias antigas. A última e
inédita de suas narrativas apareceu em 2001. Chico Bento foi criado em 1960, por Maurício de Sousa. Em
1963 teve sua publicação como personagem secundário e no ano seguinte, passou a ser o personagem
principal das suas narrativas. A revista só foi publicada em 1982. A Turma da Mônica foi criada em 1963,
também por Maurício de Sousa (inicialmente em tiras de jornais), mas foi lançada em 1970 para HQ.
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cotidiano. Nesse sentido, podemos entender as construções das HQ a que nos propomos
estudar neste trabalho como repletas de representações pautadas, muitas vezes, sob a
perspectiva do olhar estrangeiro já marcado por um horizonte histórico contextual
delimitado por estereótipos há muito instituídos.
O interesse pelo tema se deu com a participação, na qualidade de bolsista, no
projeto de pesquisa referente ao Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica
(PIBIC/UFPB/DLCV) cadastrado no grupo de pesquisa no Conselho Nacional de Pesquisa
(CNPq), no período de agosto de 2012 a julho de 2013 e intitulado “Guia de obras de
literatura infanto-juvenil para uma educação fundamentada nos Direitos Humanos” e com
o plano de trabalho intitulado “Negociações identitárias na literatura infanto-juvenil:
personagens, valores e cotidiano das populações afrodescendentes e indígenas no Brasil”.
A pesquisa sobre os povos indígenas foi o meu plano de trabalho individual. O projeto,
orientado pela Professora Doutora Ana Cristina Marinho Lúcio, objetivava a leitura, a
discussão e a análise de livros que contemplassem temáticas no campo de estudos das
literaturas africanas, afro-brasileiras e indígenas que tenham um bom material gráficoeditorial e que não possuam um caráter panfletário3, moralista e estereotipado que é
característica de inúmeras obras encomendadas e postas em circulação para satisfação do
mercado editorial.
Com o andamento da pesquisa, da expansão das leituras e das análises das obras
infantis sobre as populações indígenas na literatura infantil/juvenil, desenvolvemos o
interesse não só por essa literatura como pela temática, ampliado ainda mais quando das
discussões encetadas durante as leituras e os trabalhos apresentados. A partir daí, estava
aberto o caminho para a confluência de ideias que começaram a surgir com a leitura das
HQ que apresentam como personagem o indígena criado por Maurício de Sousa, o PapaCapim.
As narrativas do Papa-Capim (um menino indígena que protagoniza aventuras junto
com sua turma e, principalmente, com o seu amigo Cafuné) constituem o núcleo a partir do
qual o autor narra histórias ligadas ao meio ambiente, já que é perfeitamente integrado à
sua tribo e à natureza. Vale ressaltar que as histórias do Papa-Capim são situadas num
contexto de vida indígena em que tomam parte de um conjunto de práticas que procuram
“ensinar” sobre quem são ou como devem ser “os índios”, em meio às imagens que foram
construídas acerca do indígena. E da mesma maneira, buscam informar sobre quem somos
3
Refere-se a folhetos, escritos em prosa ou em verso e cujo conteúdo, frequentemente de caráter
sensacionalista e violento, era dirigido a figuras públicas ou eventos importantes.
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“nós” ou como devemos ser quando mostram, por exemplo, a preocupação com a natureza,
a limpeza dos rios, o cuidado com os animais e com as pessoas.
Sob esta perspectiva, procurando entender como se processam e se constroem as
imagens presentes nessas narrativas, neste trabalho visamos a discutir a representação do
“ser” indígena brasileiro nas HQ. E, nesse caminho, intentamos relacionar esse sujeito ao
território onde esse conhecimento é fornecido. Salientamos, portanto, que as aventuras do
Papa-Capim criadas por Maurício de Sousa são endereçadas especialmente para crianças,
como uma gama variada de gêneros e personagens em histórias cheias de diversão,
brincadeiras e entretenimento, além das ilustrações com cores chamativas e atraentes.
Assim, essa “percepção de que as histórias em quadrinhos podem ser utilizadas de
forma eficiente para a transmissão de conhecimentos específicos, ou seja, tendo uma
função utilitária e não somente de entretenimento” (VERGUEIRO, 2009, p. 85) levou-nos
a tecer reflexões que viam a figura de um índio, o Papa-Capim, construído sob os moldes
europeus, constituído de uma imagem de certo modo estereotipada do que supostamente
seria a vida indígena.
Como afirma Kellner (2001, p. 9), “As narrativas e as imagens veiculadas pela
mídia fornecem os símbolos, os mitos e os recursos que ajudam a constituir uma cultura
comum para a maioria dos indivíduos em muitas regiões do mundo de hoje”. E isso
colabora para a construção de um modelo do que é ser índio nessas histórias. O que nos
parece “natural” é a construção cultural e faz sentido porque se articula nesta rede de
significações que vamos construindo e que nos vão constituindo cotidianamente.
Dessa maneira, para melhor esclarecer nossas reflexões e compor esta análise
reunimos dez revistas/almanaques com publicações mensais do Chico Bento (nº 43, 72, 87,
345, 346 e 409) e também de outras personagens da Turma da Mônica, como os
almanaques do Cascão (nº 43 e 44), Cebolinha (nº 44) e Magali (nº 43), todas de Maurício
de Sousa. Essas histórias ainda podem ser encontradas em edições especiais de revistas da
mesma linha. Por ser uma obra extensa, seria inviável levantar um acervo muito grande,
deste modo, optamos por um recorte menor, visto que se trata de um trabalho de conclusão
de curso. Selecionamos e analisamos edições publicadas nessas revistas entre o período de
2000 e 2014, constituindo ao todo mais de 14 anos de publicações, que trazem histórias do
Papa-Capim e sua turma. Conforme dados apresentados nas referências dispostas ao fim
deste texto.
A escolha por esse recorte temporal se deu pelo fato de que a publicação de
episódios com aventuras do Papa-Capim é bastante esporádica, o que nos obrigou a
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ampliar o repertório de busca e filtrar, nessa procura, as narrativas que respondiam ao
nosso problema de pesquisa: que imagens do índio brasileiro são produzidas nas HQ de
Maurício de Sousa, cuja construção narrativa para o personagem Papa-Capim e seu
universo indígena elabora “representações” que podem ser consideradas oriundas de um
imaginário europeu há muito enraizado?
Para tanto, este trabalho encontra-se dividido em três capítulos: o primeiro capítulo
fará uma contextualização do gênero HQ, desde seus primórdios até os dias atuais,
destacando as de Maurício de Sousa. O segundo capítulo irá levantar informações sobre as
referências do personagem Papa-Capim, isto é, em qual revista aparece, e fazer, ainda,
alusões sobre o significado dos nomes dos personagens, de algumas expressões utilizadas
na história, sobre a tribo e a sua localidade, numa espécie de “brincadeira” toponímica.
Depois de abordar alguns pontos importantes e relevantes para um melhor
conhecimento sobre o gênero indicado, Maurício de Sousa e seu personagem indígena, o
terceiro capítulo tratará do estudo das HQ selecionadas, pois a partir da teoria e análise das
narrativas apresentadas nas revistas avaliadas, traçaremos elementos teóricos e conceituais
ao mesmo tempo em que apresentaremos os dados da pesquisa, através de diálogos e/ou
ilustrações. Por fim, o capítulo se encerra com a discussão dessas representações do
índio/personagem Papa-Capim no imaginário do público no Brasil.
O que se pretende, dadas às limitações de um trabalho de conclusão de curso, é
partilhar as provocações que nos foram feitas com a leitura divertida e instrutiva, das
aventuras do Papa-Capim e sua tribo. Ainda, é refletir criticamente sobre como, ao intentar
formar o universo infantil com histórias sobre os povos primitivos do Brasil, o respeito por
eles, seus costumes e tradições, assim como o cuidado com a natureza, o autor traça uma
imagem do indígena brasileiro calcada nas descrições feitas pelos viajantes que por aqui
passaram, elaborando suas HQ com imagens que de algum modo denotam um olhar
estrangeiro (ainda que pretensamente “brasileiro”, ecológico e politicamente correto) sobre
a questão indígena.
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1 HISTÓRIA EM QUADRINHOS: MAS ESSA HISTÓRIA NÃO É DE AGORA...
Fonte: Chico Bento, n. 43, 2014, p. 43.
Para início de conversa, em se tratando de material direcionado ao público infantil,
é preciso ter em mente que, quando bem utilizadas, as HQ podem servir como
entretenimento, diversão, exercício à criatividade e à imaginação da criança. Além disso (e
principalmente até), ao terem seus enredos construídos e narrados por meio de imagens e
textos, de forma sequencial, o caráter informativo dessas histórias, muitas vezes,
contribuem para a afirmação ou a negação de estereótipos construídos sobre a nossa
cultura, como declara Sonia M. Bibe Luyten (1989, p. 8) para quem,
O conteúdo das HQ, muitas vezes é inadequado à nossa realidade. A influência
(positiva ou negativa) deste poderoso meio de comunicação, que atinge
principalmente o público infanto-juvenil, é um assunto muito sério, tendo em
vista os altos índices de consumo.
Sob este enfoque, dada a complexidade do material objeto de nossa análise, é que
podemos discutir sobre esse meio de comunicação (ou melhor, de difusão de ideias), uma
vez que, “a forma quadrinizada foi e está sendo amplamente usada como forma de trazer à
memória popular a valorização do ser humano” (LUYTEN, 1989, p. 9), isto é, da
consciência crítica popular. Pois, para entender os processos formadores dessa
complexidade, do uso da HQ como meio de comunicação e o porquê dos altos índices de
consumo, é necessário voltar um pouco no tempo, numa espécie de retrospectiva ou
flashback (na HQ, as lembranças de um personagem costumam vir representadas por meio
de um balão em forma de nuvem). Esse retorno ao passado torna-se imperativo pela
necessidade de estabelecimento de um horizonte histórico que nos permita melhor entender
os contextos em que a HQ se desenvolveu e se insere no Brasil.
Isso porque, nós, leitores adultos e infantis, realizamos a leitura em contraponto e
comparação com nossas reservas culturais, literárias e visuais. E as interpretações
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realizadas provam que “nossa visão possível sobre o presente e o passado, bem como
nossas expectativas sobre o futuro, pagam tributo ao horizonte em que nos inserimos”
(JOBIM, 2002, p. 134). E é nessa retrospectiva que já de antemão buscaremos indício de
como Maurício de Sousa, através do seu Papa-Capim, embora pareça defender o ideal
rousseauniano4 do índio intocado, apresenta um índio não mais puro e já marcado pelos
efeitos da civilização, nocivas a ele.
1.1 O GÊNERO QUADRINHOS: DA INFORMAÇÃO À IMAGINAÇÃO
Hoje, cada vez mais, encontramos os quadrinhos por toda a parte. Na sua maioria,
servem para divertir, distrair, entreter, mas também podem conduzir a uma mensagem
instrucional, pois procuram transmitir conhecimentos mais educativos e informativos,
podendo, por exemplo, serem usados em campanhas sobre a educação no trânsito, a
economia de água, cuidados com o meio ambiente, alertas sobre riscos de doenças e outros
perigos ou, até mesmo, dar orientações sobre o respeito aos animais e às pessoas.
Para Selma Oliveira (2007, p. 23) “As histórias em quadrinhos convertem-se em
possibilidades de naturalização de valores, modelos e paradigmas que são decalcados na
memória coletiva sob a forma de representações, que são absorvidas como normas e
verdades” e, o que vemos nos quadrinhos é uma gama de diferentes gêneros, o de estilo
mais cômico – charge, cartum, caricatura e as populares e conhecidas tiras e o que
aproxima parte dos gêneros, em especial as charges e as tiras cômicas, da linguagem
jornalística (linha apoiada no fato de serem textos publicados em jornal). Daí ter também
um teor informativo, inicialmente.
Conforme Scott McCloud (2005), o modelo de ilustração baseado em figuras
universais – presente nos personagens de Maurício de Sousa – chama-se cartum e existem
motivos bastante lógicos para que ele seja tão utilizado e bem aceito pelos leitores de HQ.
Pois para o autor, “simplificar personagens e imagens pode ser uma ferramenta eficaz de
narrativa em qualquer meio de comunicação. O cartum não é só um jeito de desenhar, é um
modo de ver” (MCCLOUD, 2005, p. 31).
Para Maurício de Sousa, o cartum é como uma forma de amplificação através da
simplificação. Ele reduz a imagem excluindo detalhes acessórios, concentrando-se apenas
4
Com base na tese do filósofo suíço Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) sobre o homem do estado de
natureza (conhecido como “bom selvagem”), defende-se que o índio é bom por natureza, pois ainda não foi
corrompido pela sociedade, que é má.
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nos elementos específicos da construção do seu significado. Dessa forma, é promovida sua
universalização, pois esse estilo de desenho concentra a atenção do observador numa ideia,
e não num objeto específico. Ou seja, quanto mais “cartunizado” o desenho for, mais
pessoas conseguirão se identificar com ele. Em outras palavras, através do cartum, é
possível fazer com que os leitores fiquem mais envolvidos com a trama, pois eles poderão
se reconhecer nas personagens e se imaginar em seus papéis (MARTINS, 2011).
Quanto às características formais, a HQ é definida através de dois tipos de
linguagens: a gráfica (imagem) e a verbal (texto escrito). Para ter maior compreensão da
mensagem nas narrativas, o leitor precisa relacionar os elementos da imagem com os do
texto. O diálogo na HQ é feito dentro de balões, quadrados ou retângulos, ou seja, o texto é
incorporado à imagem de forma direta.
Sonia M. Bibe Luyten, em Histórias em quadrinhos: leitura crítica (1989), nos
mostra de maneira clara e simples alguns elementos que compõem a HQ, como os balões,
as onomatopeias, a representação dos movimentos e a gestualidade.
Os Balões são semelhantes a um círculo onde está o texto com as falas das
personagens. O contorno dos balões varia conforme o desenhista, no entanto, alguns são
comuns, como os que apresentam linha contínua (a fala em tom normal); linhas
interrompidas (a fala é sussurrada); ziguezague (quando há um grito ou uma personagem
falando alto); em forma de nuvem (pensamento, lembrança, sonho). Há ainda outros casos
em que a fala de uma determinada personagem pode aparecer sem contorno de balão,
como uma lâmpada acesa = ideia brilhante; corações = amor; estrelas = tombo,
atordoamento, etc.
As Onomatopeias representam os sons no quadrinho, pois imita os sons do
ambiente, como por exemplo, ploft, tóim, para brigas, pancadas; blam, toc-toc para uma
batida; buuuum para uma explosão; chuáá para o som da água. E há os sons produzidos
por pessoas e animais (ronc, para mostrar quando se está com fome ou até mesmo
roncando; zzzzz, para sono; rrrrrr, para o rosnado de um cão; puf para cansaço; gronch
para quando se está comendo, etc.).
Na Representação do Movimento a imagem é fixa, mas existem recursos para dar
movimento, como por exemplo, a velocidade (linhas retas); a trajetória dos objetos (linhas
retas, curvas); tremor (imagem duplicada), etc.
E, por fim, a Gestualidade, representada através da expressão facial e corporal:
rosto verde e bochechas cheias = enjoo, mal-estar; boca aberta e olhos arregalados =
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espanto, susto; ombros caídos, olhos para baixo = tristeza; corpo trêmulo, cabelos
arrepiados, olhos bem abertos, roendo unhas = medo, assombro.
Esses elementos encontram-se representados na figura abaixo, extraída do blog
Solução Pedagógica (2012), com desenhos criados e apresentados pelo professor Emilson
Martiniano para explicar melhor aos seus alunos os tipos e modelos de balões para as HQ,
numa espécie de proposta pedagógica para o trabalho com o gênero textual:
Figura 1: Desenhos/modelos criados com tipos de balões para HQ.
Fonte: <http://solucaopedagogica.blogspot.com.br/2012/01/2-aula-da-discilpina-generos-textuais.html>.
Acesso: 02 de abr. 2014.
Para produzir HQ, o desenhista precisa conhecer todos esses recursos gráficos, pois
além de dar dinamismo às histórias, concede mais realidade dentro do determinado
contexto em que a história acontece, tendo em vista que a eficiência e habilidade dessas
circunstâncias representadas nas narrativas, através do movimento dos objetos e das
expressões gestuais, dão mais vida não só à história, mas aos personagens.
1.2 HISTÓRIA EM QUADRINHOS TAMBÉM TEM HISTÓRIA
A primeira HQ foi criada pelo artista americano Richard Outcault em 1895. Os
“comics”, como eram chamados, com os seus quadros e balões de texto, tornaram-se a
principal atração nos jornais sensacionalistas de Nova York com o “Yellow Kid” (“garoto
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amarelo”). Com essa nova manifestação artística, o sucesso das tirinhas de Outcault,
causou grande concorrência entre os jornais nova-iorquinos, pois queriam ter o “Yellow
Kid” em suas páginas.
Foi no século XIX que as HQ começaram a ser publicadas no Brasil, tomando esse
cunho mais cômico. A edição de revistas próprias de HQ no país começou no início do
século XX. Como a primeira publicação de quadrinhos de que se tem notícia do Brasil foi
O Tico-Tico, em 1905. Mas, apesar do Brasil contar com grandes artistas durante a história,
as narrativas eram transmitidas ao público brasileiro sem qualquer alteração no seu enredo,
pois a influência estrangeira ainda permaneceu por muito tempo nessa área, com o
mercado editorial dominado pelas publicações de quadrinhos americanos, europeus e
japoneses.
Em O Tico-Tico, as personagens Chiquinho e Jagunço, são Buster Brown e seu
cachorro Tige, criados por Richard Outcault. Eram desenhos copiados com apenas os
nomes modificados, ou seja, mais “abrasileirados”, pois no enredo, os personagens tinham
hábitos e rotinas bem diferentes das nossas.
Na década de 1920, surgiu uma nova tendência, – as publicações passam a adotar
desenhos caricaturais mais fiéis às pessoas e objetos – conhecida como “comic books”, nos
EUA, e “gibis” no Brasil. A expressão “Gibi” foi utilizada como um título de uma revista
em quadrinhos no Brasil em 1939. Na época, o termo também significava moleque,
negrinho, porém, com o tempo a palavra passou a ser associada a “revistas em quadrinhos”
e, desde então, virou uma espécie de “sinônimo” no Brasil para as HQ.
Na década de 1940, surgiram as primeiras revistas de HQ com desenhos e textos
nacionais, sem deixar, ainda, a clara e presente influência de modelos estrangeiros, nesse
caso, o modelo americano. Só em 1960, apareceria algo legitimamente brasileiro nos
quadrinhos: Pererê, de Ziraldo. A história retrata a figura de saci – elemento do nosso
folclore –, além de nossos costumes e tradições, através de seus enredos.
No início da década de 1970, Maurício de Sousa passou a distribuir tiras de
quadrinhos com os seus primeiros personagens e a editar suas próprias revistas com a
Turma da Mônica. Sendo que a não aceitação dos jornais, dos grandes diretores e do
próprio público, justamente pelo costume em digerir material americano há 30 anos, fez
com que ele e sua equipe, buscassem a lógica do consumo: histórias que apresentassem os
mesmos tipos de enredos que todos estavam habituados.
19
1.3 E ENTÃO MAURÍCIO DE SOUSA ENTRA NA HISTÓRIA...
Imagem 1: Maurício de Sousa.
Fonte: <http://entretenimento.r7.com/bate-papo/mauricio-de-sousa.html>. Acesso: 04 de abr. 2014.
Nascido em Santa Isabel, São Paulo, no dia 27 de outubro de 1935, Maurício de
Sousa, é cartunista brasileiro, criador da Turma da Mônica, e vários outros personagens de
HQ. O mais famoso e premiado autor brasileiro em quadrinhos. Membro da Academia
Paulista de Letras, ocupando a cadeira 24, tornando-se assim o primeiro quadrinista a ser
empossado por esta Academia.
Em 1959, quando trabalhava com reportagens policiais no jornal Folha da Manhã
(atual Folha de S. Paulo), criou seu primeiro personagem – o cãozinho “Bidu”. A partir de
uma série de tiras em quadrinhos com “Bidu e Franjinha”, publicadas semanalmente na
Folha da Manhã, Maurício de Sousa iniciou sua carreira como desenhista. Nos anos
seguintes criou diversos personagens – “Cebolinha”, “Piteco”, “Chico Bento”,
“Penadinho”, “Horácio”, “Raposão”, “Astronauta”, etc. Em 1970, lançou a revista da
“Mônica”, sua personagem mais famosa, pela Editora Abril.
Em 1986, saiu da Editora Abril e levou seus personagens para a Editora Globo. Só
em 2006 saiu da Editora Globo e, atualmente está na Panini Comics, uma multinacional
italiana. Em 2007, Mônica foi homenageada “Embaixadora do UNICEF”. Pela primeira
vez um personagem de histórias infantis recebe esse título. Na mesma cerimônia, Maurício
de Sousa foi homenageado “Escritor para Crianças do UNICEF”. Em 2008, o Ministério
do Turismo nomeou Mônica “Embaixadora do Turismo Brasileiro”.
Entre quadrinhos e tiras de jornais, suas criações chegam a cerca de 50 países. O
autor já chegou a um bilhão de revistas publicadas. Os quadrinhos se juntam a livros
ilustrados, revistas de atividades, álbum de figurinhas, CD-ROMs, livros tridimensionais e
livros em braile. Além de mais de 100 indústrias nacionais e internacionais são licenciadas
para produzir quase 2.500 itens com os personagens de Maurício de Sousa, entre jogos,
20
brinquedos, roupas, calçados, decoração, papelaria, material escolar, alimentação, vídeos e
DVDs, revistas e livros. Em 2013, a Turma da Mônica comemorou seus 50 anos.
Figura 2: Caricatura de Maurício de Sousa.
Fonte: <http://radioativoblog.blogspot.com.br/2009/06/mauricio-de-sousa-parte-1-inspiracao.html>.
Acesso: 04 de abr. 2014.
Ao conhecer um pouco mais a trajetória do quadrinista mais famoso do Brasil no
mundo das HQ, podemos considerar que para o mercado o fator principal e,
provavelmente, o mais lógico de todos é a universalização dos quadrinhos, dado que,
tornando-se mais valorizados, são, portanto, mais rentáveis.
Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, em dezembro de 19825, Maurício de
Sousa fala que a “História em quadrinhos é, antes de tudo, roteiro. Não é desenho: desenho
vem na sequência. O que eu busco é roteiro, história, texto”. O que nos deixa com a
satisfação em saber que além de destacar em seus gibis, suas ilustrações coloridas e bem
humoradas, procura associá-las a histórias com o interesse, principalmente, nos
personagens, seus diferentes modos de vida e no ambiente em que vivem. Mas o que
extraímos dessa “liberdade” no roteiro das suas narrativas é justamente o que diz Sonia M.
Bibe Luyten (1985) em relação ao trabalho do cartunista sobre a falta de retratação da
cultura brasileira em suas personagens.
A partir disso, esta contextualização faz-se necessária para o corpus deste trabalho,
uma vez em que, a análise de um de seus personagens, o Papa-Capim, traz consigo a
possibilidade da discussão sobre a representação desse sujeito que faz parte de um cenário
já construído, moldado e idealizado pela visão do “outro” (o estrangeiro), não do índio.
Essa representação está ancorada a um tipo de contexto e de cultura alocada como
um modelo supostamente adequado. O que nos fez, a partir disso, desmistificar esse olhar
5
SOUSA, MAURÍCIO. Uma conversa com Maurício de Sousa: depoimento. [Dezembro de 1982]. São
Paulo: Jornal Folha de São Paulo. Atualmente, o Editor do UOL Tablóide repassa a entrevista em seu site.
Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/tabloide/entrevistas/2004/03/24/entrevista. jhtm>. Acesso em: 05
de abr. 2014.
21
que se tem sobre o indígena, isto é, sem as influências do seu colonizador, que o coloca
com essa imagem geralmente já formada e imposta.
22
2 PAPA-CAPIM: O CURUMIM6 DA HQ BRASILEIRA
Fonte: Cebolinha, n. 44, 2014, p. 53.
Papa-Capim é um personagem indígena brasileiro, ainda criança, criado em 1970,
que se apresenta nas revistas de HQ da Turma da Mônica e/ou nas do Chico Bento da
Maurício de Sousa Produções. O Papa-Capim é um índio, ligado à sua tribo e à natureza.
Seu sonho é se tornar um adulto sábio como o Pajé da sua tribo. É um menino esperto que
não só ama a natureza, mas também entende os animais e está frequentemente caçando,
pescando e brincando, geralmente, em companhia do seu melhor amigo, Cafuné (criado em
1967, era o personagem principal de uma HQ criada por Maurício de Sousa. Os demais
personagens de apoio só surgiriam em 1970, como o atual personagem principal PapaCapim).
Figura 3: Papa-Capim, personagem de Maurício de Sousa.
Fonte: <http://blogmaniadegibi.com/2013/05/50-anos-turma-da-monica-turma-do-papa-capim/>.
Acesso: 10 de mai. 2014.
Papa-Capim é protagonista nas suas narrativas e objeto de estudo do nosso trabalho.
Para isso, precisamos de subsídio sobre suas origens e os significados de alguns nomes e
expressões. Seria uma espécie de estudo dos topônimos, uma vez que se trata dos
6
Nome de origem Tupi que designa menino; criança. De modo geral, assim são chamadas as crianças
indígenas.
23
significados dos nomes próprios de lugares, da sua origem e da sua ligação com a história e
a geografia. Fizemos, portanto, uma breve pesquisa sobre tais referências, a fim de obter
subsídios mais precisos para a análise das histórias do curumim. Como as narrativas são
exibidas em uma floresta, dentro de uma tribo, tivemos o interesse em conhecer a
procedência dessas pequenas e escassas informações que nos são apresentadas,
especialmente, às crianças.
Em leituras das HQ e pesquisas realizadas em sites da internet, obtivemos, além de
poucos, sempre os mesmos resultados a respeito das referências sobre o Papa-Capim e a
sua turma. Em uma primeira leitura, inicialmente imaginamos que a ambientação e o
surgimento das histórias do menino indígena eram provavelmente nas florestas da
Amazônia. Porém, em entrevista concedida a Hugo Silva em novembro de 20037, Maurício
de Sousa cita o projeto para novas e futuras personagens para aquela “banda” (referindo-se
ao norte do país) quando declara os planos de “uma turma amazônica baseada em tribos
deste local tão específico do Brasil e, por isso, bastante diferente, por exemplo, do PapaCapim”. Isso prova que a selva brasileira da qual o indiozinho faz parte não é a amazônica.
Para termos uma comprovação mais atualizada, enviamos um e-mail8 à editora da
Maurício de Sousa Produções, para buscar novas e mais “seguras” informações e evitar
dúvidas a respeito do assunto. Assim, em retorno às nossas perguntas, originalmente, PapaCapim e a sua tribo, habitava o sul da Bahia. Mas hoje, são utilizados costumes comuns
das nações da parte leste do país. E atualmente, estão estudando novas famílias de
indígenas para o lado da Amazônia.
2.1 BRINCANDO DE TOPONÍMIA: PORQUE PAPA-CAPIM? PORQUE CAFUNÉ?
POR QUÊ?
A toponímia é definida como estudo etimológico dos nomes de lugares. A análise
dos topônimos, portanto, costuma se restringir aos aspectos linguísticos e históricos da
sua origem sem levar em conta que a denominação dos lugares é, de fato, um processo
político-cultural que merece uma abordagem além do nome atribuído a uma localidade.
7
SOUSA, MAURÍCIO. O pai dos planos infalíveis e das coelhadas devastadoras: depoimento. [Novembro
de 2003]. São Paulo: Site Universo HQ (atualmente a entrevista está indisponível neste site). Entrevista
concedida a Hugo Silva. Disponível em: <http://julianita.oliveira.blog.uol.com.br/arch2012-06-10_2012-0616.html>. Acesso em: 07 abr. 2014.
8
Conferir ao final deste trabalho em anexos (p. 49) o e-mail enviado à editora da Maurício de Sousa
Produções com perguntas sobre a origem, referência e localidade da floresta e da tribo onde se passam as
histórias do personagem Papa-Capim e o e-mail de resposta enviado por uma das funcionárias responsáveis
pela comunicação integrada da editora, Daniela Gomes, com as devidas informações.
24
Para Jörn Seemann (2005) em sua pesquisa sobre A toponímia como construção
histórico-cultural, a análise e a pesquisa histórica contextualizada dos nomes dos lugares,
suas diferentes origens (por exemplo, tupi, português) e sua distribuição espacial, são para
revelar a dinâmica da sua denominação e renominação no tempo e no espaço. E sob uma
perspectiva histórico-cultural, o autor considera a denominação de lugares como tomada de
posse do espaço e como referência e orientação, afirmando que
Todos os lugares habitados e um grande número de sítios característicos na
superfície da Terra têm nomes – frequentemente há muito tempo. A toponímia é
uma herança preciosa das culturas passadas. Batizar as costas e as baías das
regiões litorâneas foi a primeira tarefa dos descobridores [...]. O batismo do
espaço e de todos os pontos importantes não é feito somente para ajudar uns aos
outros a se referenciar. Trata-se de uma verdadeira tomada de posse (simbólica
ou real) do espaço (CLAVAL, 2001, p. 189 apud SEEMANN 2005, p. 209).
A necessidade em encaixar essa breve discussão sobre a toponímia foi por intuito
em fundamentar a nossa intenção de comentar sobre os significados e expressões dos
nomes e das palavras usadas nas HQ do Papa-Capim, pois é basicamente o que fazemos
neste capítulo: uma discussão/explicação sobre as diferentes proveniências dos nomes,
resultantes de aspectos geográficos, da fauna, flora ou outras características.
O cartunista Maurício de Sousa escolheu para os personagens das histórias de PapaCapim e de sua turma nomes da fauna brasileira e com significados indígenas. Assim,
Papa-Capim é o nome de uma ave brasileira que habita florestas de clima tropical. No
Dicionário, o nome faz parte da zoologia brasileira e tem por expressão Coleirinho/a: “Ave
emberizídea canora, que ocorre no Brasil da BA (Bahia) ao RS (Rio Grande do Sul); papacapim”9. A localidade onde encontramos esse tipo de ave comprova o lugar onde a aldeia
do nosso curumim provavelmente estaria situada.
Imagem 2: Pássaro Coleirinho/a.
Fonte: <http://bulupapacapim.blogspot.com.br/p/fotos.html>. Acesso: 17 de abr. 2014.
9
Definição do Dicionário Mini Aurélio: o dicionário da língua portuguesa. 8 ed. Curitiba: Positivo, 2010.
25
Além do Papa-Capim, há outros personagens que fazem parte do núcleo principal
da história, os chamados personagens coadjuvantes, que são especialmente o Cafuné (que
significa carinho na cabeça), um indiozinho muito medroso, narigudo e brincalhão que é o
grande e inseparável amigo do Papa-Capim, pois sempre ajuda seu amigo nos deveres e o
acompanha nas aventuras pela mata. Na tirinha abaixo, a história que conta a origem do
seu nome, determinado por ocasião de seu nascimento:
Figura 4: Nascimento do Cafuné e origem do nome.
Fonte: <http://duasepocas.blogspot.com.br/2013/10/monica-n-37.html>. Acesso: 19 de abr. 2014.
É interessante verificar em algumas narrativas a existência de uma observação
(espécie de nota de fim de quadro) que o autor faz a fim de explicar algo que se faz
importante para entendimento da história. No caso da história acima, isso acontece no
segundo quadro, à esquerda, em que a necessidade dessa explicação se dá em decorrência
de justificar para o leitor, em forma de instrução, sobre o costume indígena de, na hora do
parto, o pai ficar na rede gemendo, como se tivesse sentindo dores.
Quanto à universalidade desse costume indígena, não acreditamos ser, de fato,
comum a todas as tribos brasileiras. Na tira, a observação que Maurício de Sousa faz a essa
prática, há, provavelmente, uma espécie de construção de um personagem generalizante.
Pois, o que podemos destacar, em pesquisa feita sobre esse costume denominado por
26
especialistas de couvade10, que é comum a alguns povos indígenas na África e na América
do Sul. No Brasil, era natural dos índios Tupinambás, que fizeram parte da Confederação
dos Tamoios11, na luta contra os colonizadores portugueses. Atualmente, existem alguns
núcleos dos índios Tupinambás, o maior deles fica na Bahia, na aldeia de Sapucaieira, um
dos doze núcleos indígenas estabelecidos na região entre Canavieiras e Ilhéus. Com isto, é
possível que se encontre a prática de couvade, especificamente em algumas dessas tribos.
Outra personagem é Jurema que, embora se mostre pouco sobre a personagem nas
tramas, representa a figura feminina dos curumins. Jurema tem com Papa-Capim uma
afinidade especial, uns dizem que eles são namorados, outros, que são apenas amigos. O
nome da personagem tem origem em uma planta da família das leguminosas, tipicamente
nordestina.
Há os personagens secundários e/ou auxiliares, como o Pajé, o curandeiro da tribo
do Papa-Capim. É um velho índio e o mais sábio da aldeia, pois está sempre inspirando e
orientando os índios com os seus ensinamentos sobre a tradição, os costumes da tribo e os
segredos da natureza. O Cacique Ubiraci (cujo nome significa madeira boa) é o chefe da
tribo, um índio forte e guerreador, também admirado e invejado pelos indiozinhos pela sua
força e valentia. Tupã (o Trovão) é o deus dos índios, aparece algumas vezes nas HQ, de
cima das nuvens12, em alguns momentos divertindo-se com os indiozinhos, e em outros
momentos, está só para ajudá-los em algumas confusões. Oncinha é uma onça domesticada
pelo Papa-Capim quando era filhote.
Existem ainda muitos outros personagens, mas estes mencionados são os mais
frequentes e, conquanto apareçam poucas vezes nas narrativas, são os mais conhecidos,
isto é, são considerados os personagens fixos. Há histórias em que surgem novos
personagens que só ilustram algum fragmento na narrativa.
10
Termo oriundo da língua francesa para designar o costume em algumas tribos indígenas do homem em
simular o trabalho de parto, repousando após o nascimento do filho, recebendo visitas e presentes. Para a
psicologia é chamada de “síndrome de couvade”, o que não chega a ser considerada uma patologia, mas se
refere a homens que sentem uma proximidade emocional com a gestação tão intensa a ponto de apresentar
alterações comuns à mulher durante a gestação.
11
Revolta iniciada pelos índios Tupinambás entre 1556 e 1567 no litoral brasileiro, mais precisamente, na
capitania de São Vicente (nas proximidades do atual estado de São Paulo). O nome “tamoio” vem do tupi
“tamuya”, que significa “ancião”. A revolta englobou também as tribos dos Guaianazes, dos Aimorés e dos
Temiminós contra os colonizadores portugueses. Os indígenas se revoltaram contra o governador da
capitania, Brás Cubas, pois este queria colonizar a região com a implantação das primeiras plantações de
cana-de-açúcar mediante a escravização dos índios.
12
Conferir a ilustração com o deus Tupã no capítulo 3 (figura 9, p. 35).
27
Além dos nomes indígenas para os personagens, outras expressões também são
usadas, especialmente quando há encontros entre os índios e os caraíbas13. Geralmente, há
algum tipo de conflito que ocasiona quase sempre a expulsão dos caraíbas da floresta (ou
são mineradores ou caçadores), quando não, acaba em amizade e até na troca de objetos
entre ambos, como por exemplo, um arco e flecha ou uma lança por um espelho, um rádio,
entre outros utensílios.
Fazendo uma relação aqui com os tempos da colonização (século XVI) desde a
descoberta do Brasil e dos primeiros contatos entre os portugueses e os índios. Como o
trabalho principal dos indígenas era a extração de pau-brasil, madeira usada para a
fabricação de tinturas e essa função era tida como obrigatória, para haver um contrapeso
das horas trabalhadas, eles realizavam uma espécie de “prática comercial”, isto é, trocavam
mercadorias. Realizavam, pois, a antiga prática de escambo14, logo, a troca de objetos
aparece como conciliação nas narrativas e é sugerida como uma espécie de amenizadora de
conflitos.
Em algumas histórias onde Papa-Capim e seus amigos vivem, a tribo indígena está
bem próxima da cidade, porém, sem contato algum com o mundo urbano, pois o que
notamos é que a cultura e a tradição deles, pelo menos na maioria das vezes, não sofre
influência direta dos brancos. Essa aproximação fica clara e evidente que não parte dos
índios, mas do homem branco e, se formos discutir essa intrusão nas áreas indígenas, seria
entrar na história e falar da série de abusos dos conquistadores europeus, que levaram
muitos à extinção ou ao declínio acentuado.
Sabemos que existem os direitos dos índios à preservação de suas culturas
originais, à posse territorial e ao desfrute exclusivo de seus recursos e que são garantidos
constitucionalmente, entretanto, na prática cotidiana a efetivação desses direitos tem se
revelado muito difícil e altamente controversa, pois através das notícias em jornais,
revistas, a mídia em geral, a questão indígena está sempre cercada de violência, corrupção,
assassinatos e, outros crimes, que têm originado inúmeros protestos tanto nacionais quanto
internacionais. Claro, que o contato de civilização não precisa ser, necessariamente,
predatório.
E isso é assunto para outra conversa...
13
Nome dado pelos índios nas HQ analisadas neste trabalho, para denominar o homem branco. Vem do tupi
Kara’ib: sábio, inteligente. A origem do nome caraíba estaria no sul das Índias Ocidentais e na costa norte da
América do Sul. Os caraíbas eram povos indígenas das Pequenas Antilhas que deram o nome ao mar do
Caribe.
14
Prática utilizada durante o início da colonização portuguesa do Brasil (século XVI), os índios por não
conhecerem outra forma de moeda, faziam trocas de mercadorias.
28
Quando o homem branco nas narrativas do Papa-Capim aparece, as suas ações são,
em regra, contra o meio ambiente, para caçar, poluir ou desmatar, mas, logo são expulsos.
Quando o autor quer apresentar uma lição de moral e mostrar uma mensagem ecológica ao
final da história, o caraíba “mau” leva um castigo, se arrepende e depois passa a ajudar os
índios a reconstruir a mata que ele destruiu.
Outras características que chamam a atenção é que os índios representados nessas
HQ de Maurício de Sousa estão sempre usando tangas (como o Papa-Capim que usa uma
tanga vermelha) e, frequentemente, utilizam arco, flecha e lanças para caçar, uma vez em
que tiram o seu sustento da floresta. Ainda, consultam o Pajé em caso de doenças, dúvidas,
receios, tristezas, admiram a Jaci15, adoram ao deus Tupã, dentre outras expressões da
cultura indígena.
Em muitas histórias do Papa-Capim, como defesa natural, aparecem pequenos
bancos de areia movediça (figura 5) ou seriam pântanos (provavelmente visto como muito
comum na região da floresta onde se passa a história, o Sul da Bahia), em que os caraíbas
que entram na selva com ou sem más intenções normalmente ficam atolados e, claro, são
salvos por Papa-Capim e/ou sua turma.
Na figura a seguir, a caraíba perdida na floresta é salva pelo Cacique Ubiraci,
quando cai em um banco de areia movediça. O que corrobora com a questão de Rousseau,
“o bom selvagem” que ajuda a mocinha indefesa.
Figura 5: Caraíba afundando em areia movediça.
Fonte: Chico Bento, n. 43, 2014, p. 43.
A razão pela qual tratamos dos demais personagens das tramas de Papa-Capim é
essencial para o estudo ficcional, pois eles estão inteiramente vinculados aos fatos,
acontecimentos e às ações das histórias, além de possibilitar a leitura e a comunicação com
o leitor mirim por meio de sua identificação com o personagem (KHÉDE, 1986). Como
bem declara Sonia Salomão Khéde (1986, p. 8), “estudamos os personagens a partir de
15
Em tupi guarani significa “lua”. Nesse caso, Jaci seria o deus Lua.
29
temas nos quais eles aparecem configurados”, acrescenta ainda que, “Porém, a maioria dos
temas permite constatar que os personagens da literatura infanto-juvenil brasileira
contemporânea nos levam para a discussão de perfis culturais onde aparecem as questões
de sempre: identidade, etc.”. O que a autora está fazendo é justamente uma crítica a essa
vinculação automática do personagem de ficção a uma discussão de “identidade”.
Dessa maneira, mesmo que os nomes e as expressões sejam de origem tupi e
próximas à localidade onde acontece o enredo do Papa-Capim e sua turma, não há um
conhecimento preciso dessas informações nas histórias. Pois, para um maior
esclarecimento da localização da tribo e da floresta, é necessária uma pesquisa mais
aprofundada e detalhada dessas referências, uma vez em que a maioria das informações
encontradas em alguns sites é incerta.
As pesquisas e leituras fundamentadas em vários críticos e estudiosos nessa área
(HQ, Maurício de Sousa e Cia.) nos fizeram ver a questão do estereótipo ainda muito forte
e influente nos enredos e nos personagens ditos brasileiros, de Maurício de Sousa. Claro
que jamais nos esqueceremos da tese de que ele foi de certa forma, atraído pelo mercado
cultural e por leitores não só brasileiros, mas também estrangeiros, tendo, portanto, que
agradar a todos.
Assim sendo, o estudo das representações sociais presentes nas histórias do
personagem indígena do desenhista Maurício de Sousa, nos fez identificar papéis e valores
construídos sob um olhar do homem branco sobre o índio. Para tanto, nos daremos a
oportunidade de uma pesquisa com a finalidade em apresentar análises e teorias dessa
visão que se tem sobre a imagem estereotipada do personagem indígena expressa na HQ de
Maurício de Sousa, o curumim Papa-Capim e sua turma.
30
3 ENTRE CARAÍBAS E CURUMINS, PAPA-CAPIM E A REPRESENTAÇÃO DO
INDÍGENA BRASILEIRO NAS HQ
Fonte: <http://blogmaniadegibi.com/2013/05/50-anos-turma-da-monica-turma-do-papa-capim/>.
Acesso: 03 de jun. 2014.
Refletir sobre este tema visa não só discutir/abordar a identidade indígena em meio
a tantas outras expressões nas quais a figura do índio se faz presente na literatura infantil e
juvenil, mas, analisar de forma crítica essas edições/revistas de HQ. Principalmente, visa
problematizar, na atualidade, as noções que se tem sobre esse tema, isto é, sobre a questão
das representações em torno do indígena brasileiro e como está sendo apresentado e, sob
que padrão é construído esse conceito para todo o tipo de público, especialmente para as
crianças, tendo em vista que, por ser uma literatura ao alcance de todos, muitos entram no
mundo da leitura a partir dela.
Os estudos das HQ foram realizados procurando como um ponto de partida a
construção do sujeito com algum tipo de leitura, seja de uma imagem ou de um discurso,
em razão de, quando se entra em uma cena e ao construí-la, esse sujeito é composto e
subjetivado pelos discursos que atuam nessa cena, logo, se posiciona como sujeito. Assim,
a partir da leitura dessa cena, isto é desse texto, vai se compondo uma leitura das coisas
descritas e, sobre isso, podemos pensar como Stuart Hall, que a “produção de significados é
através da linguagem” (1997, p.16), pois tendo essa linguagem estabelecida e tida como
“verdadeira”, de certa forma, constitui ou pretende constituir o sujeito.
Por conseguinte, dando destaque à questão da representação, esse significado por
meio da linguagem é resultado não de algo externo, mas das nossas convenções sociais,
culturais e linguísticas, pois é a maneira com a qual produzimos ao mesmo tempo os
significados e as coisas, que ele é construído/produzido. Neste sentido, Hall (1997)
também declara que,
o significado não é direto, nem transparente e não permanece intacto na
passagem pela representação. Trata-se de um cliente escorregadio que muda e se
31
adapta conforme o contexto, o uso e as circunstâncias históricas. Jamais é
definido. Está sempre adiando, seu encontro com a Verdade Absoluta. Está
sempre sendo negociado e inflectido, para ressoar em novas situações (HALL,
1997, p. 9).
Nesse contexto, a figura do nosso pequeno personagem é produzida/construída
através da representação que lhe é fornecida por meio da sua imagem posta nessas HQ. Ou
seja, desde as primeiras leituras que obtivemos sobre os índios, através das cartas e relatos
dos viajantes, das histórias contadas em livros e nas próprias imagens, por exemplo, a
visão que lhe foi colocada é a mesma que temos hoje: estereotipada.
É como se esta criação imagética transmitisse um discurso que de um lado assume
uma índole rosseauniana e, de outro, adota um viés estrangeiro que gravita entre a
admiração e a leitura maniqueísta do modus vivendi das comunidades primeiras do Brasil.
É a partir de Sheila Praxedes P. Campos (2013) em sua dissertação de mestrado
intitulada “Entre o Real, o Ficcional e o Poético: de como Theodor Koch-Grünberg narrou
a Amazônia”, que atentaremos para o fato de que boa parte dos discursos que discutem ou
pretendem incorporar a matriz da cultura indígena, a título de tema ou argumento, têm
origem nas descrições quase sempre exotizantes16 dos exploradores naturalistas e viajantes
que por aqui estiveram entre os séculos XVIII e o XX.
Partimos do princípio de que é principalmente por meio de imagens, narrativas e
relatos de viagens que o imaginário de um lugar é expresso, constituindo ao
longo dos séculos uma vasta literatura de viagem.
Essa apropriação torna-se interessante a fim de compreender os elementos que
contribuíram para criar e difundir diferentes “versões” das identidades locais,
como também para perpetuar estereótipos e imagens definidoras da
“autenticidade” dos lugares visitados. O relato de viagem, desse modo, inventa
formas de representação com o uso e manipulação de símbolos, objetivando
criar, reforçar e afirmar imagens e cenários.
Essa informação é reforçada ao pensarmos que, até meados do séc. XIX, os
relatos de viagem permanecem como uma das poucas fontes de conhecimentos
sobre o Brasil, daí que a influência deles na composição do imaginário sobre o
país adquire maior proporção (CAMPOS, 2013, p. 88).
Como podemos ver, o discurso presente nas narrativas de Papa-Capim tem
antecedentes poderosos e já muito assimilados pela intelectualidade brasileira, sobretudo
em sua fixação nas minorias a partir de sua autenticidade simbólica. A gravitação em torno
de uma minoria é fundamental, por ínfima que possa parecer, no sentido de caracterização
identitária, pois é exatamente este fator diferencial que fornece as pistas para a criação de
16
O sentido do termo no contexto do nosso trabalho seria que o exotismo do lugar é apropriado pelo olhar
estereotipado dos viajantes, isto é, esse estranhamento é aceito ou até mesmo desejado no sentido de atribuir
um aspecto exótico.
32
uma imagem de identidade nacional calcada nas origens indígenas. É das menores
especificidades que nasce a aura exótica.
E é nesse sentido que avança a primeira camada da criação de uma imagem
identitária para o índio brasileiro, no âmbito da HQ, no afã de construir, a partir do
mínimo, do específico, da minoria diferenciada e recognoscível, um símbolo que
represente esta identidade imaginada. Mas este símbolo da minoria, embora não possamos
compreender isso pela via direta, está prenhe de outros discursos: o discurso do estrangeiro
e o discurso rosseauniano. E isso equivale dizer: o discurso dos viajantes, seu
deslumbramento e sua construção/perpetuação da imagem da América selvagem e exótica,
mas pura, incivilizada, inculta e bela.
Sob esta perspectiva, a população indígena descrita nas HQ do Papa-Capim é
exibida em um lugar que lhe é conferido como um modelo já convencional, que põe no
centro a identidade e na periferia as diferenças, subordinando-as. Stuart Hall (1997), em
seu texto A centralidade da cultura, afirma que “a cultura global necessita da ‘diferença’
para prosperar – mesmo que apenas para convertê-la em outro produto cultural para o
mercado mundial”. Em outras palavras, o homem se faz com a cultura que o cerca, pois o
seu modo de ser, agir e pensar está em constante contato com outras formas de
representação, como bem afirma o mesmo autor em outro momento, “a cultura é um modo
de vida global” (HALL, 2003, p.136).
Por essas relações do homem com a sociedade estarem em frequente mudança na
modernidade, a identidade indígena passou a ser concebida como o resultado da relação
entre o “eu” e a “sociedade”, numa troca mútua e contínua. Hall (2006) acredita que isso
tenha provocado uma “fragmentação do sujeito”, tornando-se passível de ter identidades
que surgem de acordo com o momento, com as representações culturais com as quais o
sujeito interage. Um mesmo sujeito pode apresentar, inclusive, identidades contraditórias.
Na mesma linha de pensamento, quando descrevemos, traduzimos, explicamos as
coisas, estamos fornecendo sentidos, gerando sujeitos e produzindo-nos como sujeitos de
determinados discursos (LARROSA, 1994). Logo, a ideia que se tem dos índios é essa
exposta e reproduzida nas imagens, isto é, “um sujeito histórico, reflexo de suas relações,
um sujeito construído na ambivalência” (BROSTOLIN; CRUZ, 2011, p. 158). Essa cultura
eurocêntrica se dá, geralmente, pela ressignificação da própria identidade indígena, uma
vez que se adapta a novas condições de vida ou é coagido a essas condições.
Deste modo, para dar ênfase à discussão da representação na questão indígena nas
HQ analisadas, constataremos a recorrência dessa construção da identidade e da cultura do
33
nosso índio sob os moldes estabelecidos e apresentados de maneira inalterável, uma vez
em que a “Nossa sociedade é fruto da visão etnocêntrica, na qual uma cultura é tida como
superior e as outras culturas como inferiores, sendo julgadas e explicadas como
inadequadas” (BROSTOLIN; CRUZ, 2011, p. 159). Apesar dessa visão mecanicista, é sob
este prisma que procuramos focalizar a nossa pesquisa, especificamente nessa amostragem
das representações do índio nas HQ. Ainda, é possível atrair para a reflexão de uma visão
universal e de uma linguagem única, superior e melhor, colocada na literatura infantil e
juvenil como sendo verdade absoluta da realidade identitária e cultural dos povos
indígenas.
3. 1 PAPA-CAPIM: PERSONAGEM TIPICAMENTE BRASILEIRO?
O curumim da nossa pesquisa vive suas aventuras em uma floresta, de onde
averiguamos que os costumes e as tradições são preservados e fora do alcance do homem
branco, embora este, de vez em quando, apareça. Na aldeia onde encontramos o nosso
índio, sua morada é em uma oca e tudo o que ele precisa para o seu sustento retira da mata
ao seu redor e, assim, a vida indígena é colocada como inteiramente voltada às questões da
natureza.
É ainda conveniente pontuar que usualmente os enredos das histórias do PapaCapim estão relacionados a problemas ambientais que ocorrem nas proximidades da tribo e
são desencadeados com frequência pelas ações do homem branco. Essa situação de
transgressão e maculação do espaço indígena faz com que a maioria das narrativas tenha
como o objetivo maior a responsabilidade de passar uma lição de moral, a fim de “adaptar”
sujeitos ecológicos.
Nas ilustrações apresentadas abaixo, o Papa-Capim e o companheiro Cafuné
(figuras 6 e 7) mostram a vida natural que os índios das HQ estudadas costumam levar,
sendo também identificados de maneira bem característica: têm pele escura (marrom),
vestem-se com tangas, usam cabelos lisos e bem cortados, além de, normalmente,
encontrarem-se munidos de arcos e flechas para caçar e/ou pescar.
Essa caracterização tem relação direta com a imagem mental que temos do índio,
construída há muito tempo, configurando-se como um suposto modus vivendi natural dos
índios facilmente aceito pelo leitor em seu horizonte de expectativa.
34
Figura 6: Papa-Capim e Cafuné, preparando flechas para caçar.
Fonte: CHICO BENTO, n. 409, 2002, p. 13.
Figura 7: Papa-Capim e Cafuné, com arco e flecha.
Fonte: CHICO BENTO, n. 409, 2002, p. 15.
Há ainda, os índios adultos, como exemplo, o Pajé (figura 8) e o Tupã (figura 9)
que aparecem com pinturas, colares, penas na cabeça, entre outros acessórios comuns da
cultura indígena.
Figura 8: Papa-Capim e o Pajé da sua tribo.
Fonte: CHICO BENTO, n. 346, 2000, p. 13.
35
Figura 9: Tupã, o deus da tribo de Papa-capim, apartando brigas de tribos rivais.
Fonte: CASCÃO, n. 44, 2014, p. 23.
Na figura 9, temos o deus Tupã, que também aparece com acessórios peculiares à
cultura, sendo modelo de um índio adulto, ainda é o grande apaziguador das brigas entre as
tribos rivais que de vez em quando aparecem nas histórias. Nos dois primeiros quadrinhos
da ilustração acima, notamos além do Papa-Capim, o nosso índio-personagem, proveniente
de uma tribo baiana, há mais uma confirmação das tribos da mesma procedência: os
Botocudos, também chamados aimorés, como de costume usavam botoques labiais e
auriculares, eram índios de tribos localizadas em montanhas desde a época da colonização,
remanescentes hoje em algumas partes do sul da Bahia.
A exposição do costume dos índios na maioria dos enredos nessas HQ, apesar de
ser mostrada como comum para eles (como a maneira de se adornarem), em parte, é tida
como se fosse anormal, pois é vista de modo preconceituoso. Vemos isso na própria
representação do Dia do Índio17, como menciona Petersen, Bergamaschi e Santos (2012, p.
191), quando “na maioria das vezes, crianças têm seus rostos pintados e usam cocares,
entoam ridículos ‘uuuus’, sem qualquer reflexão sobre o indígena da vida real”. Posto isto,
o entendimento que destacamos nessas histórias é de que o índio mostra ser um sujeito de
certa forma idealizado, com um papel sem importância e sem perspectiva de vida na
sociedade brasileira. E além de visto com uma imagem marcada por estereótipos, essas
festividades e suas expressões culturais, revelam o desconhecimento da diversidade
cultural do nosso país.
Luciano (2006) fala que a grande diversidade de identidades e etnias que
diferenciam os vários povos indígenas do Brasil seria “importante para a superação da
17
No I Congresso Indigenista Internacional, realizado na cidade de Patzcuaro, México, em 1940, foi
instituído o Dia do Índio. Mas foi acatado somente em 1943, pelo Decreto-Lei nº 5.540, de 02 de junho de
1943, pelo então presidente, Getúlio Vargas. E o dia 19 de abril passou a ser o “Dia do Índio”.
36
visão conservadora” (p. 49), a qual é concretizada na imagem que a sociedade tem do
índio, ora vendo nele uma figura romântica, o bom selvagem, ora um ser preguiçoso, ou
perigoso. Além disso, a sociedade costuma tratar os diversos povos indígenas brasileiros
como sendo um povo único, não levando em consideração a diversidade étnica e cultural
que permeia esses povos.
Essa suposta unicidade dos povos indígenas encontram referências em alguns
enredos do Papa-Capim, quando do encontro com o homem branco, geralmente
provocando profundos conflitos de alteridade. Em algumas situações, o homem branco
surge para destruir o habitat dos índios (figura 10), como um caraíba com “ar” de caçador,
equipado de uma espingarda, provavelmente procurando animais para caçar18.
Figura 10: Encontro entre caraíba, Papa-Capim e Cafuné.
Fonte: CHICO BENTO, n. 72, 2002, p. 25.
Em outros momentos, o homem branco aparece para cuidar do meio ambiente e
preservar espécies (figuras 11 e 12). O caraíba o tempo todo impede o Papa-Capim de
caçar algum animal para comer e, com isso, revela certa preocupação com o índio e a sua
alimentação, mesmo que haja culturas de preservação ambiental e do costume indígena de
pescar e/ou caçar para a sua sobrevivência, ao contrário, as ilustrações não configuram esta
preocupação.
18
Esse homem branco também não é brasileiro, é uma figura de filmes americanos, tipo explorador, caçador
de aventuras e riquezas.
37
Figura 11: O caraíba procura convencer Papa-Capim de não caçar jacarés.
Fonte: MAGALI, n. 43, 2014, p. 58.
Figura 12: O caraíba procura convencer Papa-Capim de não caçar micos-leões.
Fonte: MAGALI, n. 43, 2014, p. 59.
Nessas cenas, no mínimo, contraditórias, podemos ver aí duas questões: a realidade
que os índios vivem com o constante avanço do caraíba por meio da imposição de forma
bruta ou a imposição por um meio mais “delicado”, pois o “cuidado” e a “preocupação” do
homem branco com o indígena é de uma maneira ou de outra, uma forma a impor-lhes a
sua civilização. Conforme a afirmação de Bhabha (2007), para reforçar as representações
estereotipadas sobre os outros, as representações construídas no contexto da colonização,
em que o outro foi inventado como um inferior serve para justificar o domínio, a
colonização ou até mesmo o extermínio.
38
Figura 13: O caraíba “cuidando” do Papa-Capim.
Fonte: MAGALI, n. 43, 2014, p. 59.
Na figura 13, o caraíba ao oferecer alimento para o Papa-Capim, notamos que nada
mais é o “famoso” fast food19, muito comum nos EUA. Compreendemos com isso que
assim como a construção do indígena foi colocada inicialmente do ponto de vista dos
viajantes europeus em suas cartas e relatos, ou seja, a forma como se vestiam, agiam e
pensavam os índios, de acordo com o olhar dos europeus, essa concepção é também
reafirmada de maneira explícita na cultura americana capitalista, quando é percebido na
imagem o alimento tido como o mais “adequado” para o indígena, quer dizer, inferimos a
forma “correta” de se alimentar transmitida através dessa ilustração e, sendo este o
alimento do tipo mais comum de ser consumido pelos americanos no dia a dia atualmente.
Embora, hoje não seja um tipo de alimento necessariamente e totalmente
americano, pois se tornou comum em vários lugares e países pela praticidade. A questão
mais importante é o tipo de atitude paternalista, que não leva em conta a experiência e os
modos de vida dos índios (mesmo que seja de um Papa-Capim). Outra questão a ser
pontuada, é o tipo de olhar do Papa-Capim dirigido aos leitores. O que ele representa?
Cumplicidade? Indiferença? Dúvida sobre a “boa” intenção do caraíba? É um caso a se
pensar e se discutir em outro momento.
Quando o caraíba oferece sanduíches e refrigerante ao indiozinho, sugere que sua
pseudo preocupação em mantê-lo alimentado seria porque ele estaria também em extinção.
Será que o discurso dos viajantes, mais especificamente o sentimento expresso por KochGrünberg (2006, p. 372) em 1913 (“Pensa-se numa pobre alma que se separa do corpo e
19
Significa “comida rápida”, é o nome genérico dado ao consumo de refeições que são preparadas e servidas
em um intervalo curto de tempo. Geralmente são alimentos como pizzas, sanduíches, pastéis, etc.
39
desaparece na eternidade. Nessas melodias, reflete-se por assim dizer, todo o inevitável
destino da raça morena”), ainda ressoa, 100 anos depois, nas narrativas do Papa-Capim?
No final da figura 13, a fala do caraíba está clara a perpetuação do discurso dos
viajantes, ainda presente na história do nosso curumim, de que a “raça” indígena estaria em
extinção, seja em termos de desaparecimento físico, seja como diluídos no meio da cultura
dos brancos e,
A intenção é que, diante das imagens oferecidas pelo narrador, o leitor seja
impulsionado a também concordar com o viajante que, do alto de seu
conhecimento científico, vaticina o desaparecimento dos índios, não o físico,
mas o desaparecimento como “raça morena” que perde sua “cultura interior” em
contato com a cultura dos brancos (CAMPOS, 2013, p. 84).
E talvez seja essa a intenção de alguns narradores: usar linguagens poéticas,
humorísticas e até instrucionais para mover o leitor e o levar a crer no discurso por eles
proferido, seja o verdadeiro discurso ou o imaginário. Outra questão está no que Ângela
Ariadne Hofmann (2012) expõe em seu texto O mundo além da “terra à vista”: o lado de
cá do Oceano Atlântico é outra história, que o Brasil não conhece o Brasil e fala da
separação da homogeneidade das diferenças que,
Partindo da construção de conhecimento e da sua transmissão nas culturas
indígenas, podemos identificar um ato de leitura do mundo que se construiu e se
constrói por meio dos tempos, constituindo suas cosmovisões, que se distinguem
da concepção elaborada pela civilização ocidental (p. 129).
A autora ainda esclarece que,
Esse modelo de “ser humano ideal” parte de convenções e estilos de viver
considerados normais e controlados hegemonicamente sob a perspectiva do
pensamento construído na Idade Moderna, de vertente positivista e controladora
da sociedade, ditando, a partir de um restrito foco autoritário, o que é e o que não
é certo na vida social, buscando, dessa forma, “normalizar e automatizar os
corpos” (p. 130).
Assim e, sem esquecer que a Maurício de Sousa Produções trata temas como dos
indígenas, uma estratégia do mercado editorial, além de adotar uma posição de
“politicamente correta”, como uma forma de vender produtos, afinal, é necessário atrair
seu público leitor principal – a meninada. As HQ do Papa-Capim são vistas pelo sentido de
que servem para ensinar quais ações devem ser tomadas ante o processo de colonização do
homem branco sobre o indígena, isto é, para ensinar o que é “certo” e o que é “errado”,
40
buscando regular, principalmente os tipos de culturas como sendo diferentes. Através de
seus textos e imagens, estariam sendo produzidos significados que definem o que é de fato
melhor para todos e como devemos nos posicionar diante disso.
Outro ponto importante a ser destacado nessas figuras das histórias do Papa-Capim,
é que comumente, os caraíbas se apresentam vestidos com roupas estilizadas de caçadores,
como calças, bermudas e camisas com bolsos, de cores: bege, bordô, cáqui, verde e
marrom; botas escuras e chapéu, o popular estilo safari20. Há casos em que são mostrados
levando consigo espingardas ou outro tipo de armamento, confirmando mais a ideia de
caçador (cf. figura 10, p. 36). Até mesmo as mulheres que vão à floresta, para um passeio
ou para acampar, se vestem de tal forma (figura 14):
Figura 14: Caraíba na floresta sendo salva pelo cacique da tribo.
Fonte: CHICO BENTO, n. 43, 2014, p. 43.
Podemos até ver como sendo natural, além de ser a maneira mais apropriada, pois
se vamos a uma floresta ou uma selva, queremos nos proteger de insetos ou animais
menores e peçonhentos, mas a nossa forma de nos vestir, de fato, não é esta.
O que nos instiga e nos leva a pensar sob esta perspectiva, é o que chamamos do
processo denominado transculturação21, que expressa o contato entre culturas diferentes
para falar que subjugar e impor a cultura do mais forte, essa cultura conviverá com a
cultura do dominado. E também discutimos do que José Luís Jobim (2008) trata sobre
trocas e transferências culturais, que para ele, podem ser analisadas em função de seus
lugares de enunciação, pois sendo um lugar uma construção elaborada por várias gerações
20
Utilizado, geralmente, em expedições de caça na selva ou na savana africana. A tradicional “roupa para
safari” é conhecida pelo seu estilo apropriado para aventuras e passeios na selva, pois mantém uma espécie
de “camuflagem” com a sua cor neutra, se confundindo a esse cenário. Este tipo de roupa, podemos ver
representado nos filmes de Indiana Jones, personagem criado pelo cineasta americano George Lucas.
21
Termo proposto em 1940, pelo etnólogo e antropólogo cubano Fernando Ortiz, o qual destaca esse
processo transitivo de uma cultura para outra, um jogo de dominação imposto, sobretudo, pelo
empreendimento colonial. Já o crítico literário uruguaio Ángel Rama, acrescenta em seus estudos teóricos
(iniciados nos anos 70 e concluídos em 1982) sobre a comunidade cultural, o conceito de transculturação
narrativa para aplicar à análise literária a sua reflexão teórica acerca da literatura latino-americana.
41
de homens e mulheres que nele habitaram ou por ele passaram, e que ajudaram a formular
o sentido que tem,
A comparação com outras memórias, geradas em outros lugares, nas Américas
ou em outros continentes, por exemplo, pode permitir verificar analogias e
dessemelhanças entre o que se institui como ‘comunidade imaginada’ ou
‘imaginário coletivo’ (JOBIM, 2008, p. 113).
Está claro nas ilustrações que destacam elementos da cultura do homem branco e, é
visivelmente construída sob os moldes europeus, isso, devido à visão que muitas vezes
temos (e vemos) em relação aos povos indígenas, a qual foi trazida/escrita pelos viajantes
em suas cartas/relatos de viagens.
Em trechos da carta de Pero Vaz de Caminha (CASTRO 1996) o encontro entre
esses dois mundos, o nativo e o europeu, constatamos já de muito tempo o olhar deste,
sobre aquele:
A feição deles é parda, algo avermelhada; de bons rostos e bons narizes. Em
geral são bem feitos. Andam nus, sem cobertura alguma. Não fazem o menor
caso de cobrir ou mostrar suas vergonhas, e nisso são tão inocentes como quando
mostram o rosto. (...) traziam o lábio de baixo furado e metido nele um osso
branco e realmente osso, do comprimento de uma mão travessa, e da grossura de
um fuso de algodão, agudo na ponta como um furador. (...).
Os cabelos deles são corredios. E andavam tosquiados, de tosquia alta, mais que
verdadeiramente de leve, de boa grandeza e, todavia, raspado por cima das
orelhas. E um deles trazia por baixo da covinha, de fonte a fonte, na parte por
detrás, uma espécie de cabeleira feita de penas de ave, amarela, do comprimento
de um coto, muito basta e cerrada, que lhe cobria a nuca e as orelhas. (...)
(CASTRO, 1996, p. 79).
Além da visão europeia já consolidada, podemos reparar nessas narrativas em que
enquadram os tipos de alimentação provenientes da cultura americana, temos a visão do
nosso nativo construída também sob os moldes americanos (cf. figura 13, p. 38).
Observamos sobre a questão da “americanização” das HQ, por meio da forte influência nos
quadrinhos brasileiros, não só com as formas de alimentação, como, principalmente, a
expansão dos seus “super-heróis”, oriundos desta cultura.
42
Figura 15: Caraíba compara o índio ao herói da selva africana, Tarzan.
Fonte: CHICO BENTO, n. 43, 2014, p. 42.
Na figura 15, vemos a comparação clara entre o índio corajoso e o grande herói da
selva africana, Tarzan22. Sabemos que o homem das selvas fez (e ainda faz!) muito sucesso
entre nós, porém, é bom lembrarmos que apesar de ter surgido nos anos 30/40, “a
proliferação desses super-heróis, entre nós, quando nada, em nossa conjuntura política,
econômica ou social, se assemelhava à dos Estados Unidos que lhes deu origem”
(COELHO, 1991, p. 244) fez com que essas narrativas de HQ se tornassem ainda mais
interessantes para os leitores, mesmo que fugissem da realidade atual e da “brasilidade”,
sem, no entanto, “esquecer que heróis ou super-heróis, dramáticos ou cômicos, heróicos ou
desvalidos... são literatura antes de serem quadrinhos” (COELHO, 1991, p. 244-245). O
único intuito do mercado era (é) alcançar a todos, nem que para isso, apenas dê-lhe nomes
diferentes, para torná-los mais “nacionais”, como o cacique Ubiraci, o nosso Barzan
brasileiro.
Essa universalização é de todo influência do mercado editorial, das tendências e das
interpretações que surgiram nos heróis-em-quadrinhos e que foi desde a década de 1940
que a literatura quadrinizada se expandiu nessa aldeia global23 como bem explicam os
estudiosos da Comunicação. Nelly Novaes Coelho (1991) ainda acrescenta que essa
“parafernália cultural importada, que se impõe como alimento diário dos brasileiros” é
devido “(...) o poder dos meios-de-comunicação-de-massa em criar necessidades” (p. 244).
22
Personagem de ficção, surgido na literatura em 1914 e criado pelo escritor americano Edgar Rice
Burroughs, tornou-se popular e reconhecido de início em série, mais tarde foi divulgado em filmes e na
literatura quadrinizada. Em 1918, o seu sucesso eclodiu na versão cinematográfica.
23
Essa expressão foi cunhada pelo filósofo canadense Marshall McLuhan, com a intenção em destacar que o
progresso tecnológico tende a reduzir todo o planeta à mesma situação que ocorre em uma aldeia: um mundo
em que todos estariam de certa forma, interligados. Portanto, esse termo abordado no texto, explica que foi a
partir da invasão dos quadrinhos estrangeiros com os seus heróis que nos submetemos à cultura do “outro”.
43
E, em suma, afirma que se faz bem ou mal, ainda não é possível ter uma definição
completa.
A partir desses olhares, observamos que há um conceito muito simplificado dos
indígenas e isso parte da própria literatura que nos faz ver com os seus olhos as
representações produzidas no contexto da colonização, pois “a história tem mostrado que
eles são assassinados, explorados e perseguidos. Trata-se de uma violência que esconde o
preconceito de um País que não assume sua plurietnicidade” (GUERRA, 2010, p. 45). E
para não mostrar total exclusão das preferências eurocêntricas e norte-americanas nos
quadrinhos, quer sejam elas quanto ao reconhecimento das personagens com outras “de
fora”, quer sejam quanto ao contexto das histórias, apenas confrontamos que todo esse
“estrangeirismo” na literatura quadrinizada, aliena ante os verdadeiros problemas que
atormentam, de fato, os povos indígenas brasileiros.
44
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A construção da imagem do índio nessas HQ procura passar a ideia pretensa de
uma imagem de um índio brasileiro, por meio da localidade da sua tribo, de algumas
referências locais e significados com nomes nativos e/ou outras expressões. Porquanto, é
perceptível a fundamentação da figura do indígena nessas histórias, especificamente,
infantis, elaborada sob os moldes europeus e ainda, claramente, sob o modelo norteamericano de produção e veiculação, pois notamos essa similaridade através das suas falas,
do modo de agir, de pensar, de comparar personagens/heróis, até mesmo na maneira de
vestir e de comer. Enfim, de modo geral, de representar quase todo o contexto.
Da mesma forma, nos adverte Bergamaschi (2005, p. 39) que o nosso olhar para o
outro se dá desde o lugar que nos diz quando “do que nós somos e temos, do nosso ‘ser
ocidental’” é do processo de colonização o qual sofrem os índios, pois acrescenta que,
“julgando a partir da forma do viver ocidental. Claro que vivem à margem do mundo dos
‘brancos’, que os empurra e os ‘aperta’”. Assim, se confirmam as nossas hipóteses, não só
da forte e constante presença do “civilizado” caraíba na cultura dos povos indígenas, como
da inevitável invasão que estes padecem.
A intenção da pesquisa é analisar as representações do indígena brasileiro nas HQ e
poder refletir criticamente sobre a imagem que é mostrada da cultura ameríndia dentro da
literatura quadrinizada e, se está relacionada ao território onde esse conhecimento é
produzido. Para tanto, buscamos apresentar por meio de ilustrações a cultura do curumim
mais famoso dos quadrinhos, o Papa-Capim. Apesar de todos os meios em torná-lo
característico do Brasil, o nosso indiozinho não convence boa parte dos pesquisadores que,
conforme Vergueiro (1999) consideram criações como o Papa-Capim, insuficientes para
transmitir essa brasilidade e com desenho bastante firmado nos padrões estrangeiros.
O pequeno indígena que analisamos, em se tratando, de um incentivo aos cuidados
com a natureza, com o respeito ao próximo, sobretudo os adultos e, sendo ele ainda
criança, é válido admitir que existam formas boas, necessárias e adequadas de se educar
uma criança através de um simples “gibi”, mas será que só isso basta?
Cirne (1982, p.18) afirma que “(...) o discurso quadrinizado deve ser entendido com
uma prática significante e, mais ainda, como uma prática social que se relaciona com
processo histórico e o projeto político de uma dada sociedade”. O que nos faz crer que o
ideal nas HQ não é só exibir um índio, com “características” de índio, numa mata caçando
e pescando, para dizer ao mundo que está reproduzindo a diversidade do país em suas
45
narrativas, mas ver esse índio como integrante da nossa história forte e rica, da nossa
variedade étnica, além de evidenciar como ele representa a cultura do país como um todo.
A universalização dos “alimentos culturais” de que fala Nelly Novaes Coelho
(1991) e que são advindos de outras civilizações, isto é, os modelos estrangeiros que foram
colocados nas HQ brasileiras, podem cooperar (se já não cooperam) para a natural
alienação sobre a diversidade cultural do nosso país e sobre as diferenças entre as culturas.
Com isso, entendemos que mostrar essa pluralidade cultural do Brasil e o direito
dos povos indígenas de existir na sua multiplicidade étnico-cultural a começar na literatura
infantil e juvenil, ajuda na aceitação e preservação, como no dizer de Funari e Piñon de que
“os índios passem a ser considerados não apenas um ‘outro’, a ser observado a distância e
com medo, desprezo ou admiração, mas como parte deste nosso maior tesouro: a
diversidade” (2011, p. 116).
Diante disso, podemos depreender que as narrativas do Papa-Capim e sua turma,
embora permaneçam em sua intencionalidade humorística e também informativa,
apresentam indícios que não negam a falsa imagem de um indígena tido como tipicamente
brasileiro. Assim, firmamos que é por meio de imagens, narrativas, além de relatos de
viagens que o imaginário de um lugar é expresso.
A visão do homem branco nessas HQ (no caso, Maurício de Sousa) acaba por
conceber formas de representação com o uso da linguagem, partindo do princípio que é
através da linguagem que se constitui o sujeito, pois quando cria, reforça e afirma imagens
e lugares, conduz e contribui para determinar e difundir diferentes versões e visões das
identidades locais, como também para vincular estereótipos. Se não fosse a preocupação
em atingir o limite máximo no mercado capitalista em vendas, as HQ seriam além de
divertidas, um dos meios de produzir significado e conduzir o leitor, seja ele infantil ou
adulto, para uma grande referência da multiplicidade étnico-cultural do Brasil dentro da
narrativa.
46
REFERÊNCIAS
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REVISTAS EM QUADRINHOS ANALISADAS
CASCÃO (almanaque). Paixão na selva. Rio de Janeiro: Panini Comics, n. 43, 2014.
________ (almanaque). Os inimigos. Rio de Janeiro: Panini Comics, n. 44, 2014.
CEBOLINHA (almanaque). Tudo por uma garota. Rio de Janeiro: Panini Comics, n. 44,
2014.
CHICO BENTO (almanaque). Cacique Ubiraci, o herói da selva. Rio de Janeiro: Panini
Comics, n. 43, 2014.
_____________ (almanaque). Superproteção. Rio de Janeiro: Globo, n. 72, 2002.
CHICO BENTO. Coragem e medo. Rio de Janeiro: Globo, n. 345, 2000.
____________. História de um rio. Rio de Janeiro: Globo, n. 346, 2000.
____________. Flecha. Rio de Janeiro: Globo, n. 409, 2002.
____________. Superbichos. Rio de Janeiro: Panini Comics, n. 87, 2014.
MAGALI (almanaque). Extinção. Rio de Janeiro: Panini Comics, n. 43, 2014.
49
ANEXOS
50
De: Sibelle Praxedes [mailto:[email protected]]
Enviada em: terça-feira, 25 de março de 2014 15:59
Para: [email protected]
Assunto: Informações sobre o personagem Papa-Capim
Olá!
Gostaria de algumas informações sobre o personagem Papa-Capim, para a realização de
uma pesquisa acadêmica.
Bom, primeiro quero saber se nas revistas em que aparecem as histórias do Papa-Capim, há
alguma informação mais clara e concreta sobre a floresta em que vive o personagem, isto
é, qual o nome da tribo a que ele pertence?
Qual o verdadeiro significado do nome dele?
Existe a revista com o personagem adulto (como os da turma da Mônica e do Chico
Bento)? Se não, por quê?
Outra coisa: percebi q antes as histórias do Papa-Capim apareciam mais frequentemente
nas revistas do Chico Bento, agora, de vez em quando, aparecem nas revistas da Magali,
Cascão e em outras vezes é bem difícil encontrar...
Por favor, se puderem responder as minhas questões, agradeço muito e a minha pesquisa
também!
Obrigada!
Atenciosamente,
Sibelle Praxedes P. Risucci
51
RES: Informações sobre o personagem Papa-Capim
Daniela Gomes ([email protected])
Adicionar aos contatos
28/03/2014
Fotos
Para: [email protected]
Sibelle:
O Papa-Capim é um menino índio, perfeitamente integrado à sua tribo e à natureza.
Originalmente, ele habitava o sul da Bahia. Mas hoje utilizamos costumes comuns das
nações da parte leste do país. Estamos estudando novas famílias de indígenas para o lado
da Amazônia.
Ele é um garoto esperto, que ama a natureza e entende os animais. Seu sonho é se tornar
um adulto sábio como o pajé.
Mauricio escolheu os nomes dos personagens de sua turma baseando-se em nossa fauna
e em nomes indígenas: Assim, Papa-Capim é o nome de uma ave brasileira que habita
florestas de clima tropical.
Quanto a uma versão jovem, por enquanto ainda não foi desenvolvida. Quem sabe,
futuramente?
Qualquer outra dúvida, volte a entrar em contato conosco.
Um abraço,
Daniela Gomes

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